Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Trabalhos Enviados
04/06/2012 (Nº 40) RESTINGA: um fértil recurso didático
Link permanente: http://revistaea.org/artigo.php?idartigo=1258 
  

RESTINGA: um fértil recurso didático

 

Márcio Tavares Costa¹

¹ Biólogo, licenciado e bacharel, formado pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Pós-graduado lato senso em Educação Ambiental pela Universidade Cidade de São Paulo – UNICID. Técnico de Laboratório de Biologia da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA / Campus Uruguaiana. BR 472 - Km 592 - Caixa Postal 118 - Uruguaiana - RS - CEP: 97500-970. Fone: (55) 34218445. marciocosta@unipampa.edu.br

 

 

RESUMO

 

 

O presente trabalho relata uma aula in situ com duas turmas de quinta série do ensino fundamental da Escola Estadual Silva Gama, no município de Rio Grande - RS. Esta atividade ocorreu no ano de 2007, e objetivou elucidar o conteúdo abordado em sala de aula numa saída de campo. Considerando que as turmas desenvolviam conteúdos relacionados à botânica, o local escolhido para a saída foi a mata de restinga situada no bairro Parque São Pedro, caracterizada como Área de Preservação Permanente (APP), no próprio município. A inclusão da Educação Ambiental ao longo da trilha foi inevitável, devido, principalmente, ao estado de conservação na mata em alguns trechos. Participaram da atividade quarenta e quatro alunos e dois professores. De modo que os discentes mostraram-se muito carentes em relação a este tipo de exercício.

 

Palavras-chave: Educação Ambiental; Rio Grande; Aula.

 

 

INTRODUÇÃO

 

 

            No Brasil, há registros sobre iniciativas isoladas de inserção de temas ambientais no ensino formal a partir da década de 1950. Em sua maioria, eram atividades realizadas por professores do ensino básico e do ensino superior, que saíam das salas de aula com seus alunos para observar e estudar o ambiente que circundava a escola, o bairro, a cidade. Saídas que alguns chamavam de "estudos do meio" ou "trabalho de campo". Segundo Seniciato e Cavassari (2004), as aulas de campo constituem uma metodologia educativa eficaz, uma vez que aliam envolvimento e motivação dos alunos com a superação da fragmentação do conhecimento, tornando mais significativa a aprendizagem dos conhecimentos científicos. Além disso, permitem uma abordagem ao mesmo tempo mais complexa e menos abstrata dos fenômenos estudados, favorecendo a manifestação de sensações e emoções dos alunos. Porém, a aula de campo exige que o professor esteja muito bem preparado, para que possa atingir seus objetivos.

Assim, este testemunho relata a experiência adquirida através de uma aula realizada numa trilha, dentro de uma mata de restinga. Conforme Resolução 261/99 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) as restingas compreendem um conjunto de ecossistemas que englobam comunidades vegetais florísticas fisionomicamente distintas, situadas em terrenos predominantemente arenosos, de origem marinha, fluvial, lacunar, eólica ou combinações destas, de idade quaternária, em geral com solos pouco desenvolvidos. As quais ocupam uma estreita faixa de areias ao longo do litoral brasileiro.

Fragmentos deste tipo mata não são raros na cidade de Rio Grande. Fato que estimulou e facilitou o desenvolvimento da atividade com duas turmas de quinta série da Escola Estadual Silva Gama. Então, após o término do conteúdo básico de botânica referente às classes, os requisitos para a saída de campo estavam prontos. Não ao acaso, nossa visita ocorreu às vésperas da primavera de 2007.

Os quarenta e quatro alunos (Figura 1) puderam usufruir de uma aula prática in situ por aproximadamente três horas. Durante este período foram abordados, além de grande parte do conteúdo visto dentro da escola, temas como desmatamento, retirada de solo para aterro, espécies em extinção, impactos causados por aventureiros de motocicleta e rebanhos de gado que invadem a mata, consequências dos depósitos de lixo clandestinos e etc.

Ao final desta experiência a mata de restinga mostrou-se uma área muito fértil para trabalhos de campo. Por ser representante típica de uma cidade litorânea, apresentar uma grande diversidade florística, estar caracterizada como Área de Preservação Permanente (APP) e, apesar disso, estar sofrendo graves impactos ambientais. Os alunos mostraram-se prontos para explorar um novo meio, interessados em analisar tudo e eufóricos por estar conhecendo um ambiente tão próximo de suas casas e nem por isso conhecido.

 

restinga1.jpg

 

Figura 1. Turmas 51 e 52 da E.E. de Ensino Médio Silva Gama em uma Saída de Campo.

 
 

 

 


METODOLOGIA

 

 

Rio Grande é uma cidade litorânea, com 198.048 habitantes (IBGE 2011). Situado ao sul do Rio Grande do Sul, entre a Lagoa Mirim e a Lagoa dos Patos.

No total são trinta e uma escolas estaduais e sessenta e três da rede municipal de ensino. Especificamente a Escola Estadual de Ensino Médio Silva Gama localiza-se no bairro Cassino. Sendo a principal alternativa para os estudantes do bairro e arredores, como o bairro ABC, Bolaxa e Querência.

O planejamento para a aula in situ de botânica das turmas 51 e 52 começou três meses antes. Os conteúdos de aula foram reorganizados, de modo que o tema relacionado com a botânica terminasse no início da primavera. Para que assim, as crianças tivessem interadas e embasadas para a visitação.

O local escolhido foi uma mata de restinga localizada no bairro Parque São Pedro (Latitude: 32° 6'49.92"S Longitude: 52°10'8.67"O) e está enquadrada como Área de Preservação Permanente pela Lei 4.771/65 (Código Florestal, art. 2º, alínea “f”). Houve um reconhecimento da área antecipadamente, bem como de seus potenciais temas a serem abordados ao longo da trilha.

            Todos foram transportados até o local da trilha por um ônibus alugado pela escola, com as respectivas autorizações dos pais de cada aluno assinadas. O tempo de percurso foi de aproximadamente quinze minutos (Figura 2). Entre as duas turmas, alguns não puderam ir à saída, contudo, os alunos presentes totalizaram quarenta e quatro. Estando dois professores responsáveis pela atividade. O tempo de duração da atividade foi de três horas. E a área de cobertura vegetal explorada é de 37.400m² aproximadamente.

 

 

restinga2.jpg

Figura 2. Trajeto percorrido (linha azul) com as crianças da escola até a mata visitada.

 
 

 

 


RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

 

A cidade de Rio Grande apresenta uma riqueza ecológica muito grande, mas ainda pouco explorada didaticamente. APP’s, Reserva Ecológica do TAIM, Área de Preservação Ambiental Lagoa Verde, EcoMuseu da Picada, Lagoa Mirim, Lagoa dos Patos, marismas, dunas, litoral e matas ciliares são apenas alguns dos itens que poderiam ser incluídos como recursos didáticos. Sem falar nos museus. E esta estagnação de certa forma paralisa a Educação Ambiental (EA).

Mas é sabido que em sua grande maioria, a falta de tempo impede tais explorações. Em pesquisas como a de Travassos (2006), sobre a prática da EA nas escolas, a falta de tempo dos professores está dentre as maiores dificuldades com 45,8% de citações em seus entrevistados. Para Corrêa et al. (2006), a falta de tempo é totalmente dependente dos baixos salários. Para que um professor tenha uma renda “razoável” deve trabalhar em duas ou três escolas. Neste ponto de vista, Viana e Oliveira, 2006, expõe que a melhoria dos salários, bem como o investimento na formação continuada desses profissionais e uma jornada de trabalho adequada, são elementos necessários para a valorização do trabalho docente.

E, embora este trabalho tenha o simples intuito de relatar uma saída de campo, algumas constatações foram feitas. Algumas simples, como a verídica necessidade de tempo para tal atividade. Outras estão de acordo com Taylor et al. (2001), quando esse afirma que crianças com distúrbio de déficit de atenção se concentram melhor quando estão em locais naturais e verdes.

Atividades similares na Escola Estadual Silva Gama ocorrem com frequência relativa. Apesar disso, as crianças demonstraram-se carentes com relação a trabalhos de campo. Fato constatado pela desorganização das turmas e pela euforia inicial dos jovens. Porém, a atenção desempenhada ao longo da aula in situ pelos alunos que apresentam maior dificuldade de concentração fez com que houvesse uma surpresa por parte dos professores, pois o interesse e a interação foram satisfatórios por parte da maioria. Ao longo da caminhada, vários itens foram abordados (Figura 3). Alguns superficialmente e outros, mais interessantes para as crianças, de forma mais aprofundada. Contudo todos inter-relacionados e diretamente ligados à EA.

Ao constatar o grande número de assuntos abordados na saída de campo e o interesse dos discentes na área (pois até 15 dias após a experiência havia comentários e dúvidas na classe), verifica-se que a mata em questão é um fértil recurso didático. O que não a torna exclusiva, podendo essa fertilidade ser expandida para diversas outras áreas.

Por fim, se a EA visa disseminar o conhecimento sobre o ambiente, construir valores, habilidades e atitudes para o desenvolvimento de uma comunidade sustentável através do despertar da preocupação individual e coletiva para essa questão, ela deve se fortalecer. E isso se dá com atividades diferenciadas. Pois essa nada mais é do que educação, em uma forma inovadora.

 

Apresentação1.jpg

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

           

 

 

 

Figura 3. Ilustração dos temas abordados na aula in situ. Todos relacionados.

 
 

 


BIBLIOGRAFIA

CORRÊA, S. A.; ECHEVERRIA, A. R.; OLIVEIRA, S. F. “A inserção dos parâmetros curriculares nacionais (PCN) nas escolas da rede pública do estado de Goiás – Brasil: a abordagem dos temas transversais – com ênfase no tema meio ambiente.” Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, Rio Grande, v. 17, p. 01-19, 2006.

SENICIATO, T.; CAVASSARI, O. “Aulas de campo em ambientes naturais e aprendizagem em ciências - um estudo com alunos do ensino fundamental”. Ciência e Educação, Bauru, v. 10, n. 1, p. 133-47, 2004.

TAYLOR, A.F.; KUO, F.E.; SULLIVAN, W.C. “COPING WITH ADD The urprising Connection to Green Play Settings”. Environment and Behavior, Vol. 33 N. 1, p. 54-77, 2001.

TRAVASSOS, E. G. A prática da educação ambiental nas escolas. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2006.

VIANA, P. A. M. O.; OLIVEIRA, J. E. “A inclusão do tema meio ambiente nos currículos escolares”. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, Rio Grande,v. 16, p. 01-17, 2006.

Ilustrações: Silvana Santos