Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/09/2012 (Nº 41) O PROCESSO DE DESCARTE DE MEDICAMENTOS VENCIDOS PELAS FARMÁCIAS E SUAS IMPLICAÇÕES
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O PROCESSO DE DESCARTE DE MEDICAMENTOS VENCIDOS PELAS FARMÁCIAS E SUAS IMPLICAÇÕES

 

 

Daiane Lindner Radons¹; Bruna Aita Boemo²; Lucia Rejane da Rosa Gama Madruga³

 

 

¹ Mestranda em Administração – Universidade Federal de Santa Maria; Endereço: Rua Onze de Julho, 75, Camobi, Santa Maria/RS, CEP 97105-302. Telefone: (55) 9991-6788. E-mail: daialindner@yahoo.com.br.

 

² Graduanda em Administração – Universidade Federal de Santa Maria; Endereço: Rua Onze de Julho, 75, Camobi, Santa Maria/RS, CEP 97105-302. Telefone: (55) 9991-6788. E-mail: bboemo@hotmail.com.

 

³ Professora Doutora do Departamento de Ciências Administrativas  – Universidade Federal de Santa Maria; Endereço: Avenida Roraima, 1000 - CCSH - Prédio 74C/Sala 4123, Santa Maria/ RS, CEP 97015-372. Telefone: (55) 3220 9296. E-mail: lucia.rejane@hotmail.com.

 

 

RESUMO: Os medicamentos são um tipo de resíduo que apresentam um risco potencial à saúde pública e ao meio ambiente, já que seus resíduos possuem alguns componentes químicos resistentes, que podem contaminar o solo e a água. Nesse sentido, esse estudo tem por objetivo principal identificar as destinações que as farmácias dão aos medicamentos vencidos e seus impactos ao meio ambiente. Para tanto, foi realizada uma pesquisa com nove farmácias através de entrevistas semiestruturadas. Como principais resultados, destaca-se que o descarte de medicamentos vencidos, nos estabelecimentos pesquisados, é realizado por empresas terceirizadas e não há ações pontuais, propiciadas pelas farmácias, para a população depositar tais produtos em postos de recolhimento, evidenciando um descarte sem maior preocupação com questões de conscientização ambiental.

Palavras-Chave: Gestão de resíduos, Medicamentos vencidos, Sustentabilidade.

 

1.    INTRODUÇÃO

 

Atualmente a responsabilidade socioambiental vem ganhando espaço nas discussões mundiais, devido à maior conscientização tanto pela sociedade quanto pelas empresas. Essas últimas consideram a responsabilidade social somada a sua atuação econômica (GARCIA, 2002).

A transformação de materiais em produtos acabados e a prestação de serviços pelas empresas são atividades que geram resíduos. A união de um número cada vez maior de pessoas no planeta que consomem cada vez mais produtos e serviços tende a elevar de modo significativo a quantidade de lixo que é lançada ao meio ambiente todos os dias. Um tipo de resíduo que impacta fortemente na saúde pública e no meio ambiente é o descarte de medicamentos, que pode contaminar água e solo.

As empresas que atuam no Brasil precisam seguir a legislação que rege o seu setor quanto ao descarte destes efluentes. O setor de Serviços de Saúde precisa seguir as Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

A RDC nº33 dispõe que os serviços de saúde são responsáveis pelo correto gerenciamento de todos os Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) por eles gerados, atendendo às normas e exigências legais, desde o momento de sua geração até a sua destinação final. Em outras palavras, é responsabilidade de farmácias, drogarias e hospitais o correto destino dos de tais resíduos.

Especificamente, este trabalho procurou informações sobre os tratamentos dispensados aos medicamentos vencidos na cidade de Santa Maria/ RS, por meio de entrevistas realizadas em algumas farmácias da cidade e coleta de dados secundários.

Este estudo visa identificar as destinações que as farmácias dão aos medicamentos vencidos e seus impactos no meio ambiente. Outros objetivos correspondem a conhecer a disponibilidade de pontos de coleta desses resíduos da população, verificar a preocupação dos gestores das farmácias com questões ambientais e propor alternativas que minimizem os impactos ao meio ambiente provocados pelo descarte desse material.

 

2. RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL

 

            O homem evoluiu incrivelmente em aproximadamente cinco milhões de anos, deixou de ser um Australopithecus ramidus se transformando em um  Homo sapiens sapiens - espécie mais evoluída dos hominídeos. Durante essa evolução, a espécie humana começou a desenvolver o andar bípete, o que ampliou sua visão do ambiente. Pode-se afirmar que isso foi uma consequência do aumento da capacidade craniana que no inicio girava em torno de  650 cm³ e atualmente 1.450 cm³. Tal aumento também significou o domínio do homem (através da domesticação de plantas e animais) sobre o meio ambiente. A partir desse domínio, o homem deixou de ser dominado pela natureza, passando a ser dominador da mesma, subjugando-a de acordo com suas necessidades e desejos (VISENTINI, 2001).

Porém, o ilimitado domínio do homem sobre o planeta tem causado diversos efeitos nocivos sobre o meio ambiente tais como: extinção de espécies, a devastação ambiental, redução dos recursos naturais (BOFF, 2000). Perante isso, o ambiente externo traz novos desafios para as organizações, que precisam valorizar o comportamento ecologicamente correto, a busca por qualidade de vida no trabalho, postura ética e diversidade da força de trabalho devido a novos valores sociais, cultura e estilo de vida. Como consequência desses desafios, os consumidores começaram a demandar das empresas produtos e serviços de acordo com novos valores ambientais e sociais (ALIGLERI, 2009). 

De acordo com Aligleri (2009, p. 9) observa-se atualmente um cenário em que as empresas “necessitam aceitar e comprometer-se com as consequências e impactos de suas decisões e ações, além de responder as demandas de todos os afetados pelas suas atividades”.

O economista Friedman afirma que a empresa já beneficia toda a sociedade ao pagar impostos, sobretudo ao gerar empregos. Para este, é de competência do governo a resolução dos problemas sociais. Drucker também concorda com essa visão ao afirmar que o foco da empresa é o negócio, não cabendo a ela focar em outras áreas que não são de sua competência (ALIGLERI, 2009). 

Em contraposição a opinião de Friedman há um grupo de teóricos que afirma que a empresa deve apoiar ou desenvolver ações filantrópicas para as comunidades. Observa-se que estas ações de filantropia são baseadas no assistencialismo, no auxílio dos desfavorecidos, miseráveis excluídos em geral. Geralmente, ações assim são  feitas por empresários filantrópicos (MELO NETO, 2001).

Já Freeman concorda com esses teóricos e amplia o conceito de filantropia ao apresentar argumentos de que a empresa deve ser responsável por suas ações perante seus stakeholders (ou seja, partes interessadas). Para ele, a empresa deve ser sustentável economicamente, socialmente e ambientalmente (ALIGLERI, 2009). Em consequência disso, as empresas devem se preocupar com posturas socialmente corretas, ambientalmente sustentáveis e economicamente viáveis.

Segundo Ashley (2005), o conceito de filantropia é confundido com responsabilidade social. A definição de responsabilidade social compreende o relacionamento ético da empresa com todos os grupos de interesse que influenciam ou são impactados pelos stakeholders (ROSA et al, 2009). Os valores, políticas, cultura e estratégias das empresas devem ser considerados em seu relacionamento com os stakeholders e o meio ambiente.

A responsabilidade social adotada pelas empresas enfatiza a necessidade de considerar as partes envolvidas, adotando práticas que prezam pelo respeito ao meio ambiente.

O desenvolvimento da comunidade em que está inserida, a preservação do meio ambiente, uma comunicação transparente interna e externa, o investimento no ambiente de trabalho, no bem-estar dos funcionários, o retorno aos acionistas, a satisfação dos clientes e a sinergia com os stakeholders são exemplos de ações que caracterizam responsabilidade social empresarial. (GARCIA, 2002, p. 56).

 

            A empresa ambientalmente responsável investe em tecnologia antipoluição, recicla produtos e lixo, cria áreas verdes, mantem um relacionamento ético com órgãos de fiscalização e comunidade. Ainda é responsável pelo ciclo de vida de seus produtos e principalmente dissemina práticas de preservação do meio ambiente (ROSA et al, 2009). Caso a empresa seja irresponsável em suas práticas, podem ocorrer multas e indenizações, que influenciarão negativamente a saúde financeira, bem como sua reputação junto aos consumidores.

 

2.1 Descarte de Resíduos

Os resíduos estão recebendo devida importância na atualidade, sendo que as indústrias estão pressionadas a se adequarem às normas e legislações referentes à questão. Os medicamentos são um tipo de resíduo que apresentam um risco potencial à saúde pública e ao meio ambiente, já que seus resíduos possuem alguns componentes químicos resistentes, de difícil decomposição, que podem contaminar o solo e a água (UEDA et al, 2009).

De uma forma reducionista, considera-se que o processo de urbanização e a industrialização são os principais fatores responsáveis pela multiplicação dos problemas gerados com a produção de resíduos pela população (BARREIRAS e PHILIPPI JUNIOR, 2002). Segundo esses autores, a indústria não é a única grande vilã na geração de resíduos, considera-se que a geração exacerbada de resíduos é oriunda de modelos desenfreados de consumo, seguida de altíssimas taxas de desperdício, resultante de um processo decadente de modo de vida. 

O Ministério da Saúde e o Ministério do Meio Ambiente tratam dos resíduos sólidos de origem farmacêutica. Os órgãos de vigilância sanitária e ambiental são responsáveis pelos instrumentos legais, pelo fomento de pesquisas e pela fiscalização, para garantir que as atividades geradoras de resíduos dessa natureza lhes deem a destinação adequada (FALQUETO; KLIGERMAN; ASSUMPÇÃO, 2010). Esses órgãos possuem o mesmo objetivo, que é a preservação da saúde pública e ambiental através de medidas de controle dos medicamentos oferecidos à população.

Os principais agentes que geram resíduos de medicamentos são as indústrias farmacêuticas e, distribuidores, farmácias, drogarias e hospitais. As indústrias farmacêuticas são geradoras de uma quantidade considerável de resíduos sólidos devido à devolução e ao recolhimento de medicamentos do mercado, ao descarte de medicamentos rejeitados pelo controle de qualidade e perdas inerentes ao processo (FALQUETO et al, 2010).

Os distribuidores, farmácias, drogarias e hospitais se enquadram em regulamentos técnicos descritos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Conama, que consideram que estes atores são geradores de resíduos de serviços de saúde de todos os serviços relacionados com o atendimento à saúde humana ou animal, drogarias e farmácias de manipulação e distribuidores de produtos farmacêuticos. Assim, eles devem elaborar o Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS), a ser feito por profissional registrado no conselho da classe (FALQUETO et al, 2010). Estabelecimentos comerciais como farmácias, drogarias e centros de saúde não são obrigados por lei a recolher medicamentos (UEDA et al, 2009).

As duas possibilidades de destinação para medicamentos são a reutilização e o descarte. Nos Estados Unidos, muitas farmácias, recebem medicamentos vencidos ou em desuso (EICKHOFF; HEINECK; SEIXAS, 2009). Embora, existam controvérsias sobre a reutilização de medicamentos, pois, muitas vezes, não se conhecem as condições anteriores de armazenamento, este é um meio de aproveitar os medicamentos que “sobram” aos consumidores, sem necessidade de gerar resíduos.

O gerenciamento e destinação final de medicamentos no Brasil ainda não tem legislação específica em vigor. O tema é abordado pela RDC n° 306, de 7 de dezembro de 2004 (ANVISA, 2008) e que dispõe sobre o Regulamento Técnico referente ao gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Também é considerado pela Resolução do Conama n° 358, de 29 de abril de 2005 (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2005) que aborda sobre o tratamento e à disposição final dos resíduos dos serviços de saúde e permeia outras providências.

A legislação brasileira garante que os serviços de saúde são os responsáveis pelo correto gerenciamento de todos os resíduos dos serviços de saúde (RSS) por eles gerados, devendo atender às normas e exigências legais, desde o momento de sua geração até a sua destinação final (EICKHOFF; HEINECK; SEIXAS, 2009).

Uma pesquisa realizada na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), por UEDA et al, (2009) sobre a conscientização da população a respeito do impacto ambiental do descarte de fármacos, apresentou como resultados, considerando um espaço amostral de 141 pessoas, que 88,6% dos entrevistados afirmaram descartar seus resíduos farmacológicos no lixo doméstico; 9,2% o descartam pelo esgoto e 2,2% têm outro meio de fazê-lo.  Ainda, a maioria das pessoas não tem conscientização do problema, pois se constatou que apenas 28,4% dos entrevistados já se ativaram a respeito do impacto ambiental causado pela ação. Esse fato mostra que é muito restrita a parcela da população que detém conhecimentos sobre o problema abordado.

 

3.            MÉTODO DO ESTUDO

 

A metodologia tem o objetivo de caracterizar o tipo de pesquisa realizada, definir o plano de coleta de dados, assim como análise e interpretação dos dados coletados. A pesquisa realizada é de caráter exploratório, com abordagem qualitativa. A pesquisa exploratória visa o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intenções, bem como proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou construir hipóteses (GIL, 2002).

Dessa forma, a fim de identificar a destinação de medicamentos vencidos pelas farmácias estudadas, foi realizado estudo de casos múltiplos, que segundo Yin (2001) proporciona a tipificação de diferentes práticas, a partir da definição de um caso inicial.

Foram escolhidas nove empresas segundo o critério de conveniência, a partir da localização das farmácias, número de filiais da mesma empresa na cidade e por sua notória participação no mercado local.

A coleta de dados foi realizada no mês de junho de 2011, na cidade de Santa Maria, interior do estado do Rio Grande do Sul, através de entrevistas semiestruturadas com gestores das farmácias consideradas e com o Conselho Regional de Farmácias. A entrevista é definida por Haguete (1997, p. 86) como sendo “o processo de interação social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado”.

As questões que compuseram o roteiro de entrevista abordavam informações sobre as farmácias, como número de funcionários e de lojas; sobre as práticas socioambientais; destinação de resíduos (medicamentos) e iniciativas para conscientização da população.

A fim de realizar o tratamento de dados, a análise de conteúdo foi escolhida, sendo optado pelo método de categorização. A análise de conteúdo é definida por Bardin (1997, p. 42 apud VERGARA, 2005, p. 15) como “um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição de conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção dessas mensagens”.

 

4.    ANÁLISE DE RESULTADOS

 

A análise dos dados coletados permitiu a descrição do processo de recolhimento de medicamentos vencidos das farmácias, considerando as dificuldades do processo, impactos socioambientais e sugestões de melhoria. 

Observa-se que a cidade de Santa Maria/RS é um centro regional, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2010) possui uma população de 261.031 pessoas. Muitas dessas se locomovem a fim de realizar os mais diversos tipos de tratamentos para a saúde e o bem-estar. Entrevista realizada com o Conselho Regional de Farmácias em Santa Maria/RS mostrou que nesta cidade encontram-se 151 farmácias, sendo que 114 delas são drogarias (farmácias privadas), 21 são farmácias de manipulação e 16 farmácias hospitalares e públicas, conforme verificado na figura a seguir.

 

 


Figura 1. Número de farmácias em Santa Maria/RS

Fonte: Conselho Regional de Farmácias

 

Através de entrevista realizada com 9 farmácias da cidade (para fins de estudo, as farmácias são abordadas como X1, X2, X3, X4, X5, X6, X7, X8, X9), foram identificadas as práticas adotadas no descarte de medicamentos vencidos, bem como a disponibilidade de ponto de recolhimento destes medicamentos em que a população possa depositar medicamentos vencidos, enfatizando a preocupação com o meio ambiente. Verificou-se que a farmácia X1 envia seus medicamentos vencidos para uma filial em outra cidade, onde o material é entregue para uma empresa terceirizada a fim de aplicar o destino correto. A empresa não possui políticas de recolhimento de remédios vencidos da população. A farmácia X2 pertence à mesma rede da X1 e por isso o destino dos dejetos acontece da mesma forma. 

A empresa X3 não possui pontos de recolhimento de medicamentos vencidos aos consumidores. A empresa terceiriza o descarte de medicamentos vencidos e não informou o nome da empresa responsável pela ação.

A farmácia X4 conta também como uma empresa terceirizada que recolhe os medicamentos fora do prazo de validade. A periodicidade da coleta é mensalmente e no mês anterior ao vencimento o item já é recolhido. Quanto ao ponto de recolhimento para os consumidores, o gerente entrevistado afirmou que a organização não tem essa prática e que tem há motivos suficientes para tal ação, uma vez que os medicamentos vencidos não podem ser mais aproveitados para tratamento médico. Assim, é possível perceber que o gerente não possui preocupação com a responsabilidade socioambiental, sendo que a atenção dada é referente à utilidade do produto.

Empresa terceirizada para a coleta dos medicamentos vencidos é utilizada pela X5, no período trimestral. O subgerente entrevistado relatou que a empresa tem perdas com o descarte desses produtos que não foram vendidos em tempo hábil, uma vez que o valor de cada item se enquadra como perda para a filial da farmácia correspondente. A fim de evitar tais perdas financeiras, a empresa conta com algumas estratégias como no momento de catalogar os medicamentos que chegam, os que estão há mais tempo nas prateleiras são identificados com fitas para serem priorizados pelos funcionários na hora de vendê-los. Ainda, a filial realiza controles para tentar negociar os produtos que estão no mês anterior ao vencimento com outras filiais, procurando adequar os medicamentos que são mais vendidos em tal unidade com aqueles que irão vencer na outra filial.

Diferindo das farmácias anteriores, a X6 possui a prática de coleta de medicamentos vencidos da sociedade, entregando-os para a empresa RTM Resíduos Especiais Ltda, que é responsável pela coleta, transporte, tratamento e destinação final de resíduos especiais na cidade. Essa organização divulga por meio da mídia que adota essa prática, de forma a conscientizar as pessoas da importância do descarte correto de tais substâncias químicas que compõe os produtos em estudo. Os medicamentos vencidos da farmácia também são entregues a empresa RTM.

A farmácia X7 se destaca das demais em razão de proporcionar aos consumidores além do recolhimento de medicamentos vencidos, também ela arrecada pilhas, baterias, blisteres, frascos, agulhas, ampolas e seringas. Tal material é entregue para a empresa EcoLog, da cidade de Santa Cruz do Sul/RS, responsável pela coleta e pelo destino de materiais como pilhas, baterias, celulares, medicamentos vencidos, frascos, agulhas e seringas, para dar a destinação adequada.

A empresa X8 não recolhe remédios e utiliza a mesma empresa de descarte da mencionada anteriormente. Por fim, a X9 não saberia informar sobre esses procedimentos. O Quadro 1 apresenta os principais aspectos considerados na pesquisa e os resultados de cada empresa.

A empresa RTM recolhe os dejetos de uma farmácia pesquisada, enviando-os para o estado de Santa Catarina, onde materiais de tal natureza são incinerados, considerando a legislação vigente para propiciar destinação adequada.

            A incineração é caracterizada como um processo químico utilizado para tratamento de resíduos, considerando a decomposição térmica via oxidação para destruir a fração orgânica do resíduo, reduzir seu volume ou ainda eliminá-lo em algumas vezes (VIEIRA, 2004). No caso de restar cinzas, elas são dispostas em aterros com segurança. De acordo com Rocca (1993) a incineração é talvez a melhor solução para os problemas no ambiente causados pela inadequada disposição de materiais tóxicos não degradáveis.

 

 

Quadro 1 – Principais destinos dados aos medicamentos vencidos pelas farmácias

 

Farmácia

Destino dados aos medicamentos vencidos

Possui ponto de recolhimento de medicamentos

X1

Envia o material para uma filial em outra cidade, onde o mesmo é entregue para uma empresa terceirizada.

Não

X2

Pertence a mesma rede da farmácia X1, por isso é o mesmo destino.

Não

X3

Terceiriza o descarte de medicamentos vencidos.

Não

X4

Empresa terceirizada coleta, que ocorre mensalmente.

Não

X5

Coleta trimestral por empresa terceirizada.

Não

X6

Empresa terceirizada responsável pela coleta.

Sim

X7

A empresa terceirizada recolhe vários produtos como pilhas, além de medicamentos vencidos.

Sim

X8

Utilização de empresa terceirizada.

Não

X9

Não sabe informar

Não sabe informar

    

            Tendo em vista os problemas que o descarte inadequado de produtos provenientes das farmácias pode causar no meio ambiente, como contaminação da água e solo, em função que os medicamentos apresentam substâncias químicas resistentes que são difíceis de decompor na natureza, são sugeridas algumas práticas no Quadro 2, que priorizam a responsabilidade socioambiental no descarte de medicamentos vencidos.

 

Quadro 2. Ações propostas com ênfase na responsabilidade socioambiental

Ação

Objetivo

Descrição

Promover campanhas de coleta de medicamentos vencidos

Conscientizar a população sobre o descarte adequado e os problemas que podem ocorrer com destinação incorreta

Realizar divulgação na mídia sobre a coleta, montar postos de recolhimento nas farmácias e encaminhar o material para destinação correta.

Medicamentos fracionados

Adquirir medicamentos na quantidade necessária, evitando desperdício e sobra.

Laboratórios devem produzir medicamentos fracionados, de modo a racionalizar o uso dos mesmos pelos consumidores, sendo comprada a quantidade necessária para o referido tratamento.

Educação socioambiental

Incentivar o estudo da responsabilidade socioambiental em escolas

Os órgãos responsáveis promoveriam ações em escolas para mostrar aos alunos a relevância da questão socioambiental e as implicações do descarte de medicamentos no ambiente.

           

 

No ano de 2006, o Ministério da Saúde divulgou um Manual de Gerenciamento dos Resíduos de Serviços de Saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006 apud EICKHOFF et al., 2009), que retrata a necessidade da adoção de medidas para o gerenciamento de resíduos da área da saúde. Porém, não há atenção especial à destinação final de medicamentos e nem especificação de soluções corretas para o descarte final, ficando a desejar essa questão.

 

5.    CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Visando auferir o objetivo proposto, foi realizada pesquisa exploratória que identificou a destinação dos medicamentos vencidos pelas farmácias consideradas e a existência de postos de recolhimento nessas empresas para que os consumidores possam propiciar a destinação correta a tais materiais.

A partir da pesquisa realizada verificou-se que o descarte de medicamentos vencidos é realizado por empresas terceirizadas que fazem esse serviço para as farmácias analisadas, contudo, não há ações pontuais para a população depositar tais produtos em postos de recolhimento, evidenciando um descarte sem maior preocupação com questões de conscientização ambiental.

De acordo com Garcia e Zanetti-Ramos (2004) vários estados e municípios possuem legislação própria específica sobre o gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde, estabelecendo normas para a classificação, armazenamento, coleta, transporte e disposição final desses resíduos. Dessa forma, fica evidenciada a necessidade de criação de leis específicas para o descarte de medicamentos na região em questão.

Com o desenvolvimento do estudo, ações foram propostas para minimizar os impactos do descarte inadequado no ambiente, bem como incentivar a conscientização dos consumidores para adoção de práticas que contribuem na responsabilidade socioambiental, tais como promover campanhas de coleta de medicamentos vencidos, medicamentos fracionados e educação socioambiental.

            Como sugestão de futuras pesquisas, sugere-se análise de farmácias de diferentes cidades para investigar a legislação correspondente ao assunto e a conscientização das pessoas sobre responsabilidade socioambiental. O estudo apresentou limitação quanto à dificuldade para coletar dados, sendo que os gerentes das farmácias não tinham disponibilidade para a entrevista.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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Ilustrações: Silvana Santos