Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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20/12/2003 (Nº 7) DIAGNÓSTICO AMBIENTAL DE CATENDE E PALMARES PARA ELABORAÇÃO DE UM PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL
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A PAISAGEM

DIAGNÓSTICO AMBIENTAL DE CATENDE E PALMARES PARA ELABORAÇÃO DE UM PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Isabelle Maria Jacqueline Meunier[1]

Ana Lícia Patriota Feliciano1

José Serafim Feitosa Ferraz2

Lucimauro Antônio Alves Oliveira3

Luís Carlos Marangon1

RESUMO

O trabalho procurou realizar um diagnóstico ambiental dos municípios de Catende e Palmares, na Zona da Mata pernambucana, a partir de entrevistas com estudantes, professores e moradores em geral dos dois municípios, como forma de subsidiar ações de educação ambiental. Foram entrevistados 70 estudantes, 30 professores e 30 moradores dos dois municípios. A maioria dos estudantes dos dois municípios informou trabalhar os temas ambientais nas escolas, principalmente por meio de pesquisas, apresentações e redações, além de serem citadas atividades extra-classes, principalmente em Catende. As principais fontes de informação dos estudantes sobre o meio ambiente foram os livros da escola e a televisão. Por outro lado, grande parte dos professores afirmaram tratar do tema em suas escolas, embora só um tenha participado de capacitação específica. A maioria se informa também por meio dos livros didáticos e dos meios de comunicação. Foram identificados os maiores problemas ambientais nos dois municípios, tendo sido enfatizados a poluição dos rios, a deficiência da limpeza urbana, o destino do lixo, os desmatamentos e as queimadas. Conclui-se que as maiores dificuldades para implementação de programas de educação ambiental foram a falta de professores capacitados na área específica, a inexistência de recursos pedagógicos especialmente desenvolvidos e as limitações de recursos e apoios para condução de atividades práticas e vivências de campo. Além disso, identificou-se a necessidade de se desenvolver material didático e paradidático adequado as características socioambientais da região.  Como ação prioritária para uma campanha motivadora entre a população, que não tem qualquer militância ambientalista, identificou-se a necessidade de criar áreas verdes urbanas. Nas escolas, defende-se o uso das áreas livres para implantação e condução de jardins e hortas como uma sugestão praticamente consensual entre os entrevistados e a realização de atividades extra-classe, valorizando os aspectos locais e incentivando a participação dos professores e estudantes na análise e enfrentamento dos problemas.

 

 

 

 

 

 

 

1. INTRODUÇÃO

            Os municípios de Palmares e Catende integram a Microrregião da Mata Meridional, na Mesorregião da Mata Pernambucana. Apresentam uma paisagem fortemente marcada pela agroindústria açucareira pois é na Mata Meridional  onde se encontra a maior extensão de áreas com cana-de-açúcar, cabendo a Palmares a classificação de “centro urbano característico da área canavieira de Pernambuco”, com a maior população da microrregião (CONDEPE, 2001),

            Em todos os aspectos, a colonização e o povoamento da Mata Meridional foram governados pela agroindústria açucareira, que determinou as características étnicas, socioculturais, econômicas e ambientais.

            Desde o início do povoamento da Zona da Mata pernambucana, a monocultura da cana-de-açúcar se desenvolveu às custas de grandes desmatamentos. Na evolução do processo de produção do açúcar, a passagem dos engenhos bangüês às usinas, no final do século XIX e início do XX, correspondeu a um avanço ainda mais intenso sobre as formações florestais nativas, já que a maior capacidade de produção exigia maior fornecimento de cana. Deste período data também o desenvolvimento do transporte ferroviário que não só promoveu novos desmatamentos para dar lugar às ferrovias como exigiu o fornecimento de madeira para dormentes e para a geração de energia.

            Esse histórico de devastação reduziu a área de cobertura florestal natural a extremos que hoje comprometem a biodiversidade, o abastecimento hídrico e a segurança das populações: as enchentes de 2000, embora tenham sido causadas por eventos meteorológicos de grandeza inesperada, tiveram seus efeitos ampliados pelo uso inadequado do solo e pelo desmatamento das margens dos rios.

            Em Palmares contabilizaram-se 12.000 desabrigados e cerca de 60% da foi população atingida. O comércio foi duramente penalizado, com grandes prejuízos para 80% dos estabelecimentos. Em Catende foram 7 mil desabrigados, 12 bairros foram atingidos e também ficaram sob as águas nove engenhos e a sede da Usina Catende.

            Catende e Palmares apresentam expressiva parcela de suas edificações localizada em regiões de várzeas ou ocupando a própria calha dos rios. Nas margens do Panelas, na zona urbana de Catende, a ocupação é invasiva em locais com margens revestidas sobre as quais se sustentam habitações. Esta também é a situação das margens do Una na zona urbana de Palmares (Fotos 1 e 2)

 

 

 

 

 

 


Foto 1 - Margens do rio Panelas, na zona urbana de Catende

 

 

 


Foto 2 - Margens do rio Una, na zona urbana de Palmares.

 

 

            A ação humana na formação de cheias também está presente de outras formas.  Nos rios Una e Pirangi ocorre retirada de areia dos leitos para fins comerciais. Esta atividade, quando realizada de forma não controlada, pode alterar a calha do rio causando desestabilização dos taludes naturais com conseqüente assoreamento da calha.

            A retirada da vegetação ao longo das margens dos rios também é outro fator potencializador das enchentes, ocasionando desmoronamentos e assoreamento.

            Estes fatores socioambientais formadores de enchentes só podem ser controlados com planejamento rural e urbano que preveja o zoneamento das áreas inundáveis, dedicando seu uso às áreas verdes, de lazer e esportes, juntamente ao controle ambiental efetivo, com medidas coibitivas à deposição de lixo e esgotos nos rios, além de constantes programas de informação e educação ambiental.

            Como os engenhos situavam-se sempre junto a um rio ou riacho, de cujas águas dependia todo o processo agroindustrial da produção do açúcar e do álcool, foram nesses locais que se desenvolveram os povoados que deram origem às atuais cidades.

            O despejo de efluentes industriais não tratados, associados aos das aglomerações humanas sem condições sanitárias básicas, aos desmatamentos de nascentes e margens de rios e à ocupação desordenada das margens levaram às más condições dos cursos d’água da região,  muitas vezes transformados em canais de despejo.     Atualmente, o uso da água na bacia do Una se dá para o abastecimento público e para a recepção de efluentes domésticos gerados pelos 28 municípios e dos efluentes agroindustrial e industrial (CPRH, 2001)

            Este conjunto de fatores apontam para a evidente degradação ambiental, com seus efeitos diretos na redução da qualidade de vida das populações. Por outro lado, para que medidas efetivas sejam tomadas no sentido de se prevenir e recuperar danos ambientais, é necessário que se conte com a participação das comunidades envolvidas e com elas se estabeleçam prioridades para as ações.       Neste contexto, o presente trabalho procurou avaliar a percepção ambiental dos moradores dos dois municípios de forma a nortear a tomada de decisões no campo da gestão ambiental, com ênfase às proposições que possam integrar um programa de educação ambiental e, além disto, procurou identificar as potencialidades para o desenvolvimento de programas de recuperação ambiental.

 

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Localização da área de estudo

            Palmares localiza-se a 125km da capital pernambucana, com acesso pela BR-101 e Catende, sua vizinha, dista 142km de Recife. 

            Os municípios situam-se na bacia do rio Una e apresentam clima tropical quente e úmido, temperaturas elevadas durante todo o ano e chuvas abundantes no outono/inverno, com precipitações pluviométricas que superam 1.500mm anuais.

            A floresta ombrófila densa, genericamente denominada Mata Atlântica ou Floresta Atlântica, era a vegetação original predominante, hoje representada por poucos remanescentes em diferentes estádios sucessionais.

            Palmares e Catende têm a maioria de sua população concentrada na área urbana, pois aí localiza-se a oferta dos serviços de saúde e educação e são maiores as oportunidades de emprego. As densidades populacionais foram calculadas, a partir dos dados de 2000, em 148,72 hab/km2, em Palmares, e 194,78hab/km2, em Catende. As populações residentes, por sexo, nas áreas urbanas e rurais dos dois municípios pode ser observada na Tabela 1.

 

 

Tabela 1. Populações nos municípios de Palmares e Catende em 2000.

 

Palmares

Catende

Pessoas residentes

 

 

Homens

26.837

15.185

Mulheres

28.878

16.032

Totais

55.715

31.217

Pessoas residentes na área urbana

 

 

Homens

20.384

11.175

Mulheres

22.985

12.242

Totais

43.369 (77,84%)

23.418 (75,02%)

Pessoas residentes na área rural

 

 

Homens

6.453

4.010

Mulheres

5.893

3.789

Totais

12.346 (22,16%)

7.799 (24,98%)

Fonte: IBGE, 2001

 

 

2.2. Diagnóstico ambiental

            Para estabelecer as prioridades de um programa de educação ambiental e caracterizar as questões mais graves a partir da percepção dos moradores de Catende e Palmares, foram entrevistados 70 estudantes, 30 professores e 30 outros moradores dos dois municípios. Adotaram-se questionários especialmente desenvolvidos para cada segmento do público, com questões fechadas e abertas, focando principalmente os problemas ambientais da cidade e o tipo de trabalho realizado pela escola ou pela comunidade para a análise e enfrentamento das questões ambientais.

A amostra trabalhada envolveu estudantes, professores e demais moradores, considerando cada segmento como um estrato objeto de amostragem independente. Os alunos foram selecionados entre estudantes de escolas públicas e particulares, principalmente do ensino fundamental.

 

 

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Caracterização da amostra de entrevistados

  Os estudantes integrantes da amostra foram crianças e jovens de 7 a 19 anos, moradores de bairros do centro, da periferia e da zona rural dos dois municípios. Entre os professores de escolas públicas e particulares, as idades variaram de 22 a 55 anos, sendo 90% da amostra constituída por mulheres. Os professores de Palmares apresentaram bom nível de qualificação, com graduações em Biologia, Geografia, Letras, História a Matemática. É importante salientar que o município conta com a Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul (FAMASUL), que, sem dúvida, representa um facilitador à qualificação dos professores do município e vizinhanças.

Já em Catende, a maioria das professoras entrevistadas  estava cursando o terceiro grau, grande parte ligada ao curso de Pedagogia.

          A renda familiar dos professores de Catende variou de 1 a 4 salários mínimos. Já em Palmares, este intervalo foi de 3 a 12 salários mínimos. Em ambos os municípios, a maioria dos professores entrevistados era de pessoas nascidas no local ou moradoras há vários anos, com grande experiência de ensino. As médias de tempo de magistério foram quase 12 anos, em Palmares, e 10 anos em Catende.

          Os moradores entrevistados foram comerciantes, donas de casa, comerciários, serventes e aposentados, se encontrando também pessoas com outras ocupações como trabalhadores rurais, político, cozinheira e funcionário público. As idades variaram de 22 a 75 anos e 53,3% declaram possuir apenas o primeiro grau de ensino.

          Cerca de um terço dos entrevistados, entre estudantes, professores e moradores, tiveram as casas atingidas pelas cheias de 2000.

 

3.2. Rápida caracterização ambiental

            Alguns itens dos questionários aplicados visaram obter informações ambientais sobre os municípios estudados, principalmente em relação a coleta de lixo, abastecimento de água, esgotamento sanitário, qualidade de ar e da água e espaços livres. Como não houve diferença nas respostas dos três estratos pesquisados (estudantes, professores e moradores), pôde-se analisá-los conjuntamente e chegar a conclusões válidas para os dois municípios. Às opiniões e informações prestadas foram associados os resultados das observações de campo. 

            Catende e Palmares contam com coleta domiciliar regular de lixo na área urbana, com deposição em “lixões”, abastecimento de água encanada promovido pela SAAE (Sociedade Autônoma de Água e Esgotos) e esgoto encanado ligado diretamente a rede fluvial, com algumas fossas (cujos sumidouros dirigem-se também a rede fluvial).

   O ar das duas cidades foi considerado poluído pela maioria da amostra da população, sendo esta constatação mais notável em Catende, onde a localização da Usina Catende, em plena área urbana, representava, até a moagem de 2001, uma fonte de poluição atmosférica importante.

Os rios que cortam as cidades (Una, em Palmares, e Pirangi e Panelas, em Catende) foram considerados poluídos por 91% dos entrevistados, que responsabilizaram usinas, comércio,  matadouros, hospitais e residências pela contaminação das águas. Mesmo assim, são comuns as pescarias e os banhos nos rios, especialmente no Pirangi e Panelas, sendo mencionada a ocorrência de piaba, acari, carito, traíra, tilápia, piranha, chupa-pedra, pilato, dourado e pescado entre os peixes encontrados nos rios.           

O centro de Palmares apresenta-se congestionado de veículos, com trânsito lento e grande disputa por vagas para estacionamento, o que fez parte dos entrevistados queixarem-se da poluição dos carros.

Por outro lado, não há áreas verdes urbanas expressivas, representadas por parques ou grandes praças com significativa cobertura vegetal. Principalmente em Palmares, as praças apresentam componentes artificiais marcantes, com largas extensões impermeabilizadas, como na Praça Paulo Paranhos, ou excessiva simetria de canteiros e podas geométricas nas árvores, na Praça Ismael Gouveia.

Cerca de dois terços dos entrevistados dos dois municípios disseram usar as praças de sua cidade e a mesma proporção gostaria que houvesse mais praças. As praças citadas como mais visitadas foram a Paulo Paranhos, em Palmares, e Coração Eucarístico em Catende, ambas caracterizadas pela localização central e grande afluência de pessoas. Apesar de “espaços livres” não edificáveis, as principais praças dos dois municípios não se constituem em áreas verdes, por não se encontrar a vegetação como o componente predominante (Foto 3)

 


Foto 3 - Praça Paulo Paranhos, em Palmares.

 

 

A arborização de calçadas em ambos os municípios é irregular e altamente agredida por mutilações realizadas na tentativa de se compatibilizar o desenvolvimento vegetal com a fiação aérea baixa e desordenada, as calçadas estreitas e, nos centros comerciais, a proximidade de fachadas comerciais. São problemas típicos de centros urbanos, onde as ocupações são feitas sem planejamento, disciplinamento e integração.

3. 2. Opiniões dos estudantes de Palmares e Catende

          A maioria dos estudantes de Catende (80%) e de Palmares (77%) informou que os professores “falam ou realizam trabalhos sobre o meio ambiente e a necessidade de conhecê-lo e preservá-lo”, principalmente através de atividades em sala de aula, seguindo o material didático. Poucos alunos em Palmares citaram outros métodos de abordagem das questões ambientais, como pesquisas, apresentações e redações (23%), e menor número (11%) afirmou ter participado de atividades práticas. Em Catende, além do trabalho com o material didático e atividades como leituras, debates, colagem e pesquisas em livros, foram citadas as participações em feiras de ciências, visita a uma horta, plantio de árvores, coleta de flores e frutos e reciclagem de lixo.

As principais fontes de informação  sobre o meio ambiente foram os livros da escola (77%), a televisão (69%), revistas (36%) e outros livros (34%), havendo raras menções a informação através do cinema, grupos de jovens ou na própria família. Assim, 84% dos estudantes dos dois municípios disseram “saber o que pode fazer para conservar a natureza e ter um ambiente melhor”.

          A maioria dos estudantes de ambos os municípios informou saber o significado do termo poluição, freqüentemente associado ao lixo, aos rios sujos, à destruição do meio ambiente e à fumaça dos carros e das usinas. Definições gerais e evasivas como “coisa ruim que causa problemas”, “problema para a saúde”, “algo errado”, “destruir (maltratar, prejudicar) a natureza” foram comuns nas respostas. Apesar da maioria ignorar o destino final do lixo recolhido de sua escola, um grande número de alunos disse observar a situação do lixo no caminho da casa até escola, onde é encontrado quase sempre espalhado nas ruas, em terrenos ou “ladeira abaixo”.

          Os problemas ambientais mais citados em Palmares foram a poluição do rio, o lixo nas ruas, as queimadas, a poluição do ar e os desmatamentos. A deposição de lixo e despejos de esgotos nos rios foram as causas apontadas da poluição hídrica e à poluição do ar foram associadas as usinas, as indústrias e os carros. Em Catende, a poluição dos rios, relacionada ao lixo lançado e aos esgotos também foi o problema ambiental mais conhecido, seguido pelo lixo em terrenos e ruas, destruição das matas, fumaça da usina e queimadas.

          “Não jogar lixo, esgoto, sangue e produtos químicos nos rios” foi a solução apontada pela maioria para a solução dos problemas dos rios da região. Além dessa, houve sugestões de desvio de esgotos, construção de fossas, retirada do lixo e realização de campanhas contra a poluição.

          Quase todos os estudantes entrevistados informaram contar com área livre em suas escolas, onde gostariam de brincar, praticar esportes e realizar atividades como debates, gincanas, peças teatrais, festas e atividades didáticas ao ar livre. Para isso gostariam de contar com jardins e árvores. Perguntados sobre o interesse em ter uma horta e árvores na escola, a quase totalidade respondeu positivamente, apresentando também intenção de cuidar das plantas.

          Mais de 90% dos estudantes se mostraram interessados em participar de atividades extra-classe, sugerindo passeios na mata, visitas a zoológico e a praias, visitas a usinas, fazendas, jardins e sítios, sendo ainda mencionadas diversas excursões, acampamento, projeto de reciclagem e mutirão para a limpeza dos rios.

 3.3. Opiniões de professores e demais moradores

Dois terços dos professores entrevistados em Catende e metade dos de Palmares informaram que suas escolas trabalhavam com práticas de educação ambiental. Em Catende foram citadas a realização de trabalhos, pesquisa de campo, entrevistas, debates, vídeos, passeios, explanações orais, campanhas de conscientização e reaproveitamento de resíduos para atividades de arte. Já em Palmares, os professores afirmaram trabalhar apenas as atividades inseridas nos conteúdos programáticos.

Para se informar sobre o meio ambiente, os professores de Catende disseram usar os livros didáticos, o acervo da biblioteca da escola, os meios de comunicação e os livros particulares. Os livros didáticos foram ainda mais citados como fontes de informações ambientais em Palmares, seguidos dos meios de comunicação e dos livros particulares. Apenas um professor em cada cidade mencionou ter participado de algum curso de capacitação sobre temas ambientais. Entre os meios de comunicação, a TV foi a mais importante fonte de informação, seguida pelos jornais e revistas.

Os professores de Palmares relacionaram como os principais problemas ambientais do município: falta de saneamento básico, lixo e entulhos (com muriçocas, baratas e ratos), poluição do ar causada pelas usinas, bueiras abertas, galerias entupidas e rios poluídos. Para enfrentar estes problemas, expuseram a necessidade de conscientização da população e do poder público, sugerindo também ações para a melhoria da arborização, despoluição dos rios, mudança no sistema de esgotos e exigência de filtros para as usinas.

Em Catende, a maior preocupação foi com o lixo e a poluição do ar causada pela usina (carvão), além dos rios poluídos, falta de esgotamento sanitário, redes de drenagem e de esgotos entupidas, falta de água e queimadas.

Também apontaram para a oportunidade de campanhas de conscientização, projetos de reciclagem, solução do problema de poluição da usina  e ações em prol da limpeza do município.

Apenas em Catende alguns professores entrevistados (26,7%) disseram ter conhecimento de campanhas ambientais em escolas ou comunidades. Em Palmares isso não ocorreu. A maioria dos professores disse conhecer os efeitos da destruição da vegetação das margens dos rios, associando isso a águas mais poluídas, estabelecimento de construções em áreas ribeirinhas, assoreamento, deslizamentos e desmoronamentos de margens.

Todos os entrevistados sugeriram  iniciativas que gostariam de desenvolver com seus alunos em prol do ambiente do seu município, compondo um bom elenco de  atividades que podem, com algum apoio, se constituir em um diferencial na aprendizagem dos alunos. Deste elenco destacaram-se as proposições dos professores de Catende: realização de exposições de trabalhos com produtos reciclados, passeios ecológicos, palestra sobre o carvão da usina, além de outras palestras com “recursos”, plantios de árvores e condução de horta. Entre os professores de Palmares foi majoritária a opção de conduzir trabalhos de conscientização com estudantes e população em geral, aliados a atividades como reciclagem de lixo, coleta seletiva, instalação e condução de horta, visitas a locais poluídos e apresentações de experiências bem sucedidas.

          Para o sucesso dessas iniciativas, em ambos os municípios, os professores disseram precisar de apoio da escola, da prefeitura e da comunidade, de recursos humanos e materiais didáticos práticos, citando também a necessidade de capacitações, seminários, assistência de pessoal especializado, integração entre instituições e união entre professores, alunos, comunidade e governo. Os apoios reivindicados, desde os mais objetivos (pavilhão próprio para desenvolvimento das atividades e depósitos para coleta seletiva) até os mais genéricos e abrangentes (“todo e rápido apoio”) foram pertinentes e expressaram elevados interesse e envolvimento dos professores com as questões ambientais.

          As análises das respostas dos demais moradores reforçaram a constatação de que não houve identificação de militância ecológica na amostra estudada, nem ao menos de algum nível de organização que permitisse a ação integrada da comunidade para a resolução dos problemas ambientais. Apenas 1 entre os 30 moradores entrevistados nos dois municípios informou já ter participado de alguma campanha ambiental e, segundo a maioria, nunca houve promoção de campanhas de conscientização quanto às questões ambientais nos municípios. Os poucos que se lembraram de iniciativas do gênero relataram campanhas de combate ao mosquito da dengue e de recolhimento de animais domésticos soltos nas ruas.

          A falta de árvores e o lixo foram os problemas ambientais mais citados em Palmares, embora a maioria tenha afirmado que estes não existem ou que não os conhece. Em Catende, o lixo e a falta de esgotamento sanitário (com os conseqüentes mosquitos, moscas e mal-cheiro) foram os problemas ambientais mais lembrados, sendo ainda notada a falta de árvores e de praças. A existência de espécies de vegetais e animais que hoje já não são encontradas foi observada por 57% dos entrevistados.

          Em Palmares, melhorias recentes na paisagem foram associadas às novas praças, plantios de árvores e pavimentação de ruas, enquanto os esgotos a céu aberto, a poluição sonora e dos rios e a destruição da vegetação apareceram como responsáveis pelos prejuízos à paisagem municipal. As melhorias da paisagem de Catende foram relacionadas também à construção de novas praças e casas, plantios de árvores e calçamento de ruas, ao mesmo tempo que incluíram o corte de árvores, o lixo, o carvão da usina, a falta de cuidado da população no trato da vegetação urbana e o desemprego como elementos de deterioração da paisagem.

Mais empregos, plantio de árvores, mais limpeza, construção de praças, mais áreas de recreação para as crianças, melhoria da qualidade do ar e despoluição dos rios foram algumas providências apontadas pelos entrevistados de Catende para melhorar a qualidade de vida. Já em Palmares, apenas um entrevistado lembrou de “cultivar mais o verde” como uma necessidade para a melhoria da qualidade de vida, sendo preponderantes as reclamações por mais emprego, principalmente em indústrias, além da necessidade de mais educação, menos violência e menos pessoas desabrigadas.

 

4. CONCLUSÕES

          As entrevistas com professores e estudantes de Palmares e Catende evidenciaram dificuldades para implementação de programas de educação ambiental devido à falta de professores capacitados na área específica, inexistência de recursos pedagógicos especialmente desenvolvidos e dificuldades na condução de atividades práticas e vivências de campo.

          O uso exclusivo do material didático na abordagem das questões ambientais traz como desvantagem a apresentação de teorias dissociadas da prática cotidiana e gera pouco interesse nos estudantes, que podem não compreender a educação ambiental  como auxiliar no desenvolvimento do espírito investigativo frente à Natureza e formadora da ética e cidadania. A informação obtida de livros didáticos e da televisão desconsidera as peculiaridades e necessidades locais.

          Mesmo sem uma estrutura formal de apoio à educação ambiental, os estudantes apresentaram grande interesse pelos temas ambientais e uma percepção clara, embora simplificada, dos problemas que os cercam. Além disto, demonstraram disposição para participar de campanhas e ações de recuperação ambiental.

          As questões relacionadas aos rios foram as que mais chamaram atenção das crianças e jovens dos municípios, cuja gravidade foi confirmada por professores e outros moradores. Os problemas relativos à limpeza urbana, destino do lixo e poluição atmosférica também foram objetos de preocupação, devendo vir a integrar o elenco de temas tratados nos programas de educação ambiental dos municípios.

          O estabelecimento de áreas verdes urbanas, com locais para caminhadas e recreação, é outra necessidade das comunidades que deve ser incorporada às  intervenções ambientais prioritárias, ainda mais porque o desenho urbanístico das cidades não permite ampliação significativa da arborização urbana em calçadas das áreas já urbanizadas.

           O uso das áreas livres das escolas para implantação e condução de jardins, hortas e ambientes para a convivência com os colegas e a prática de esportes foi uma sugestão praticamente consensual, que também deve ser considerada na definição de um  programa de educação ambiental, com as características desejáveis de dinamismo, interdisciplinaridade e incentivo ao protagonismo juvenil.

          Os professores entrevistados apresentaram um elenco de atividades extra-classe capazes de estimular a aprendizagem e torná-la significativa para os estudantes, denotando a experiência e a capacidade de análise e proposição dos docentes. As professoras de Catende, apesar de menos qualificadas e mais mal remuneradas, foram as que apresentaram mas iniciativas criativas e participativas para tratar os temas ambientais. Em Palmares, apesar de se ter entrevistados professores mais jovens e qualificados, ficou mais patente a necessidade de atividades de capacitação, estimulando principalmente a busca de formas de abordagem das questões ambientais mais contextualizadas.  Mesmo assim, como em muitas outras comunidades, os professores apresentaram-se como a vanguarda ambiental, capazes, muito mais do que os demais moradores, de identificar problemas e responsabilidades.

 

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

        CONDEPE Mesorregião da Mata Pernambucana: Microrregiões da Mata Setentrional, da Mata Meridional e de Vitória de Santo Antão. Recife: Instituto de Planejamento de Pernambuco, 2001. 120p.

        CPRH Relatório de monitoramento de bacias hidrográficas do Estado de Pernambuco. Recife: Governo do Estado de Pernambuco/Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente/Companhia Pernambucana de Meio Ambiente, 2000. p.85-92.

IBGE – Relatório de censo populacional 2000. Disponível em <http//www.ibge.gov> em setembro de 2001.



[1] Engenheiros florestais, professores do Departamento de Ciência Florestal da UFRPE , Av. Dom Manoel de Medeiros, s.n,  Dois Irmãos, Recife – PE CEP 52171-030. meunier@hotlink.com.br

2 Engenheiro florestal, mestrando em Ciências Florestais na UFRPE,

3 Zootecnista, mestrando em produção Animal na UFRPE.

Ilustrações: Silvana Santos