Revista Educação Ambiental em Ação 36

a educação ambiental na preservação dos corpos hídricos no estado do rio de janeiro

Nome: Teresa Cristina de Oliveira Nunes

Instituição: Fundação Getúlio Vargas

Cargo: Professora convidada

Endereço: Rua Clovis Bevilaqua, 56 ap 401. Tijuca. Rio de Janeiro. Cep 20520-160

e-mail: teresa.nunes@fgv.br

Formação acadêmica: Doutora em Administração pela EBAPE – Fundação Getúlio Vargas-RJ

Nome: Marilene Ramos M. Santos

Instituição: Fundação Getúlio Vargas

Cargo: Professora da EBAPE

Endereço: EBAPE – Fundação Getúlio Vargas. Praia de Botafogo, 190, sala 505, Botafogo, Rio de Janeiro, RJ, Cep 22.253-900

e-mail: mramos@fgv.br

Formação acadêmica: Doutora em Engenharia Ambiental COPPE-UFRJ

 

 

Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar as principais ações desenvolvidas pelos órgãos públicos ambientais do Estado do Rio para a implementação da educação ambiental dentro da gestão de recursos hídricos. Além disso, apresentam-se alguns obstáculos que essa política pública enfrenta para alcançar seus objetivos. As fontes de dados deste trabalho são os Projetos da Secretaria de Ambiente do Estado do Rio de Janeiro e do Instituto Estadual de Ambiente e o Programa de Despoluição da Baía da Guanabara (PDBG), o Sistema de Informação de Gestão Estratégica do Governo do Estado do Rio de Janeiro (SigeRio), e entrevistas com os coordenadores dos programas de educação ambiental na gestão de recursos hídricos. A Educação Ambiental se mostra fundamental na criação de agentes transformadores, que participem ativamente da busca e construção de alternativas para a redução de impactos ambientais e para o controle social do uso dos recursos naturais, como os recursos hídricos.

 

1- Introdução

A água é um recurso natural finito sem substituto para os seres humanos. Compatibilizar as atividades humanas e, ao mesmo tempo, preservar os ecossistemas é um dos objetivos da gestão dos recursos hídricos, que reúne a sociedade civil e os governos na tomada de decisão sobre o destino dos corpos hídricos. Nos centros urbanos, os mananciais de água doce para abastecimento humano estão cada vez mais escassos e distantes, como conseqüência da falta de saneamento básico e do lixo.

O saneamento básico depende de intensivos investimentos públicos e da fiscalização de órgãos de mais de uma esfera de governo. A grande carga de lixo nos corpos d’água é conseqüência da ocupação desordenada do solo aliada à ineficiência dos serviços públicos de coleta. O lixo depositado nos terrenos baldios ou mal acondicionado é constantemente levado pelas chuvas para os fundos dos vales, contaminando os corpos d’água e entupindo a rede de drenagem urbana, resultando no agravamento das enchentes. Esta situação decorre em parte de fatores culturais e da falta de consciência sobre o necessário cuidado com o que é coletivo, levando grande parte da população a considerar os cursos d’água como depósitos de lixo (Databrasil, 1998). Dados do Censo Demográfico de 2000 do IBGE (2002b) indicam que 0,77% (974.156) dos domicílios no município do Rio de Janeiro dispõem o lixo nos rios e terrenos baldios. Sensibilizar a população sobre os impactos do descaso com o meio ambiente e a criação de uma consciência ambiental impõem-se como um alvo permanente das políticas públicas.

O objetivo deste trabalho é apresentar as principais ações desenvolvidas pelos órgãos públicos ambientais do Estado do Rio para a implementação da educação ambiental dentro da gestão de recursos hídricos. Além disso, apresentam-se alguns obstáculos que essa política pública enfrenta para alcançar seus objetivos.

As fontes de dados deste trabalho são os Projetos da Secretaria de Ambiente do Estado do Rio de Janeiro e do Instituto Estadual de Ambiente e o Programa de Despoluição da Baía da Guanabara (PDBG), o Sistema de Informação de Gestão Estratégica do Governo do Estado do Rio de Janeiro (SigeRio), e entrevistas com os coordenadores dos programas de educação ambiental na gestão de recursos hídricos.

Além desta introdução, este artigo conta com outras quatro partes. A próxima apresenta a política estadual de educação ambiental e os principais projetos dos órgãos ambientais do Estado do Rio. A terceira parte apresenta os projetos de educação ambiental voltados para a preservação dos corpos hídricos. A quarta parte apresenta o projeto da Ecobarreira e suas ações de educação ambiental. Na quinta são apresentadas as conclusões deste estudo.

2 – A Política Estadual de Educação Ambiental e os Projetos do Sistema Estadual de Meio Ambiente

No Estado do Rio de Janeiro, a Lei Nº 3325, de 17 de dezembro de 1999, instituiu a Política Estadual de Educação Ambiental, criou o Programa estadual de Educação Ambiental e complementou a Lei Nº 9.795, de 27 de abril de 1999, que definiu os parâmetros gerais da Política Nacional de Educação Ambiental.

A educação ambiental é definida no Art. 1º da Lei Nº 9.795/99 como “os processos através dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, atitudes, habilidades, interesse ativo e competência voltados para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade”.

Na Lei Nº 3325/99 foram definidos princípios e objetivos e foi estabelecida uma articulação entre o Sistema Estadual de Meio Ambiente e o Sistema de Educação. A referida lei caracteriza-se pelo seu alto nível de detalhe e por envolver uma enorme quantidade de atores na educação ambiental, desde escolas públicas, privadas a universidades, organizações públicas governamentais e não governamentais, outros entes federativos e meios de comunicação.

Em relação às atividades a serem desenvolvidas, a Política Estadual de Educação Ambiental tem também linhas de atuação inter-relacionadas e de grande abrangência, definidas no seu Art. 9º:

“I - Educação ambiental no ensino formal;

II - Educação ambiental não-formal;

III - Capacitação de recursos humanos;

IV - Desenvolvimento de estudos, pesquisas e experimentações;

V - Produção e divulgação de material educativo;

VI - Mobilização social;

VII - Gestão da informação ambiental;

VIII - Monitoramento, supervisão e avaliação das ações.”

Cabe ressaltar que a coordenação da Política Estadual de Educação Ambiental, de acordo com a lei, efetiva-se de forma conjunta pelo Sistema Estadual de Meio Ambiente e pelo Sistema Estadual de Educação. Essa coordenação é complexa, pois envolve diversos órgãos e agrava-se com a falta de sanções ou de mecanismos que garantam o cumprimento da Lei e a efetivação da Política Estadual de Meio Ambiente.

Em termos de recursos financeiros, é assegurada à Educação Ambiental fontes dos projetos do Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (FECAM). Os recursos do Fecam são oriundos dos royalties do petróleo, multas e condenações judiciais por irregularidade constatadas pelos órgãos fiscalizadores do meio ambiente do Estado do Rio (SEA, 2009). Todos os projetos aprovados pelo FECAM devem aplicar 2% do valor solicitado em educação ambiental.

Os recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos originados da cobrança de água bruta também podem ser utilizados para programas e projetos de educação ambiental. Para isso, os Comitês de Bacia devem apresentar esses projetos ao órgão gestor de recursos hídricos do Estado.

A Secretaria de Ambiente do Estado do Rio de Janeiro (SEA), como entidade do Sistema Estadual de Meio Ambiente desenvolve uma série de ações de Educação Ambiental. Sua Superintendência de Educação Ambiental tem como objetivo o enraizamento e o fortalecimento da educação ambiental no estado.

A superintendência está estruturada em três coordenadorias, a de educação, voltada para as ações que envolvem o sistema de ensino (escolas, centros profissionalizantes, universidades etc.), a de projetos socioambientais, no eixo de educação ambiental não formal, e a coordenadoria de educomunicação, que envolve educação e comunicação ambiental em todas as mídias. Os profissionais dessa superintendência são altamente capacitados.

Os principais projetos são o curso de formação em educação ambiental e agenda 21 escolar à distancia e o projeto Nas Ondas do Ambiente, em parceria com as Secretarias de Estado do Ambiente (SEA), de Educação (SEEDUC), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Viva Rio e financiado pelo FECAM. Nas Ondas do Ambiente tornou-se um programa de política pública de educomunicação socioambiental, que oferece a oportunidade de acesso democrático à produção e difusão de informações, utilizando de forma criativa os meios de comunicação, pela comunidade escolar e local, de maneira a produzir informação sobre temas ambientais e incentivar a busca de soluções dos problemas socioambientais que os afetam direta e /ou indiretamente (SEA, 2009).

O Instituto Estadual de Ambiente (INEA), instalado em 12 de janeiro de 2009 e resultado da fusão de três órgãos ambientais (Feema, Serla e IEF), ainda está estruturando a sua Gerência de Educação Ambiental. Entretanto, o INEA apóia as ações da SEA nos projetos de educação ambiental e cuida de uma série de cursos de formação na área de meio ambiente que eram ministrados pela extinta Feema. Ressalte-se que o INEA não possui em seu setor de educação ambiental, profissionais graduados em educação, nem foram previstas vagas no concurso para o órgão nessa área.

3- Projetos de Educação Ambiental na Gestão de Recursos Hídricos

No Estado do Rio, após a Lei Federal nº 9433/97, a chamada Lei das Águas, foi estabelecido o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos - SEGRH, com a promulgação da Lei Estadual nº 3239, de 2 de agosto de 1999. Essa lei institui a Política Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Rio de Janeiro, de maneira muito semelhante à lei federal, com os mesmos princípios e instrumentos de gestão.

Para fins de gestão dos recursos hídricos, o Estado do Rio encontra-se subdividido em 10 (dez) Regiões Hidrográficas (RH’s) Janeiro. Essas regiões coincidem com a área de atuação dos Comitês de Bacias Hidrográficas. Os Comitês são entidades colegiadas, com atribuições normativa, deliberativa e consultiva, reconhecidos e qualificados por ato do Poder Executivo, mediante proposta do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERHI).

Aos Comitês, cabe a coordenação das atividades dos agentes públicos e privados relacionadas aos recursos hídricos e ambientais, compatibilizando as metas e diretrizes do Plano Estadual de Recursos Hídricos (PERHI) com as peculiaridades de sua área de atuação. A partir dos Comitês, os problemas e possíveis soluções ambientais de cada bacia são discutidos de maneira democrática e descentralizada. Eles devem apontar onde os recursos provenientes da cobrança precisam ser aplicados, através de seus planos de bacia devidamente homologados pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos.

O órgão gestor estadual de recursos hídricos, responsável pela gestão e execução da política estadual de recursos hídricos, é o Instituto Estadual de Ambiente (INEA) em substituição à antiga Serla (Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas). Na antiga Serla e agora INEA são realizados eventos, como o Dia de Limpeza de Rios, que sempre envolvem as escolas públicas do Estado; além disso, existem em andamento dois projetos que envolvem educação ambiental de forma mais consistente:

O projeto Agenda Água na Escola é um projeto que visa formar jovens gestores ambientais com o desenvolvimento de atividades de monitoramento da qualidade da água e apoio ao controle da ocupação e conservação da faixa marginal de proteção do trecho de rio próximo a cada escola participante em 22 municípios do Estado do Rio de Janeiro (SigeRio, 2009). De maneira simplificada, faixa marginal de proteção é uma faixa de terra na margem do rio para preservação da mata ciliar.

O trabalho se desenvolve com a capacitação de professores e alunos da rede Municipal e estadual de ensino, representantes dos Comitês de bacias hidrográficas dos três segmentos: poder público, usuários e sociedade civil organizada e lideranças locais e está inserido dentro da estratégia do Governo do Estado para a sustentabilidade ambiental, ao promover a conscientização das populações nas comunidades próximas às escolas, rios e córregos em relação à necessidade de preservação dos rios e seu entorno.

O programa visa implantar o programa em 110 escolas municipais e estaduais. A primeira fase do projeto consiste na mobilização das prefeituras, secretarias municipais de educação e meio ambiente, bem como escolas e parceiros locais. São contratadas equipes de apoio regionais para a execução do projeto.

O projeto está em andamento em cinco regiões hidrográficas do Estado e já existem 42 escolas de 14 municípios com a primeira fase concluída. A equipe Regional BNG2 atingiu 4 municípios, desenvolvendo o trabalho em 10 escolas, com 125 professores e líderes locais treinados. A equipe regional GEMA já trabalhou 10 municípios, em 32 escolas, com a capacitação de 330 professores e líderes locais.

Ao término de cada capacitação de professores iniciaram-se as apresentações e atividades do programa junto aos alunos para seleção das duas equipes por escola de Jovens Gestores Ambientais.

O Projeto Rio Ama os Rios / Ecobarreiras tem por objetivo implantar um programa de redução de lixo nos corpos hídricos. Esse projeto foi iniciado em 2004, com a implantação da Ecobarreira piloto da bacia do rio Irajá. O programa está evoluindo e até o final do ano de 2009 serão 18 ecobarreiras instaladas no Estado do Rio. Atualmente, existem 11 ecobarreiras instaladas: Arroio Fundo, Marapendi, Itanhangá, Canal do Cunha, Irajá, Mangue/Docas, Meriti, Ceasa, Volta Redonda, Macaé, Cidade de Deus (desativada em abril) e Sernambetiba (implantada em maio) (SigeRio, 2009). A operação das Ecobarreiras é realizada pela FEBRACOM (Federação de Cooperativas de Materiais Recicláveis), a partir de convênio estabelecido com o INEA e outros parceiros.

Na bacia piloto do rio Irajá foram realizadas diversas ações de educação ambiental durante a implantação do projeto. No rio Meriti, onde se localiza uma das ecobarreiras com maior volume de lixo, os trabalhos de educação ambiental nas comunidades próximas foram intensificados nos primeiros(??) meses. Entretanto, mesmo com campanhas de sensibilização das comunidades, trabalhos realizados nas escolas e do alcance do projeto na mídia, os resultados em termos de redução do aporte de lixo não têm sido alcançados (SigeRio, 2009).

Na Ecobarreira do Arroio Fundo, situada no Sistema Lagunar da Barra da Tijuca, se observa grande aporte de lixo, com uma presença enorme de resíduos de grande porte, como fogões, sofás, etc., bem como uma grande quantidade de madeira. O volume de resíduos é tão grande, que, sendo uma preocupação constante da FEBRACOM (Federação de Cooperativas de Materiais Recicláveis) e do INEA, foi instalado um ecoponto na Cidade de Deus, esperando que a coleta seletiva interiorizada possa contribuir para diminuir o volume de resíduos que chegam à Ecobarreira.

De acordo com informações obtidas junto à comunidade, há na Cidade de Deus 80 mil habitantes, cerca de 200 pessoas envolvidas em atividades de catação de recicláveis, presença de 3 sucateiros e de 6 pontos de coleta de lixo. A Cidade de Deus conta com 14 escolas e 5 creches, frequentadas por 7.600 crianças, dados estes importantes para as ações de Educação Ambiental que se pretende promover.

Para constatar a importância da educação ambiental nas comunidades próximas às Ecobarreiras, pode-se comparar o volume de lixo retirado da Ecobarreira de Arroio Fundo, 298.200 kg nos primeiros três meses do ano de 2009, com o volume de lixo da Ecobarrreira do Canal de Marapendi, 3.712kg no mesmo período. Atribui-se essa diferença a um conjunto de fatores entre eles, ao maior nível educacional dos moradores das margens do canal, a distância entre o canal e as residências, a pouca circulação de transeuntes pelas margens do canal e a qualidade dos serviços de coleta ordinária oferecida pela empresa municipal de coleta, COMLURB (SigeRio, 2009).

As diversas dimensões do projeto Ecobarreira e suas motivações são apresentadas a seguir, com o detalhamento do projeto de pesquisa que evoluiu para o Projeto Rio Ama os Rios / Ecobarreiras.

4- O Projeto Ecobarreira

Lidar com lixo é um dos maiores desafios que as cidades e, em especial, as grandes metrópoles têm que enfrentar. Fato é que, inevitavelmente, parte deste lixo acaba nos corpos hídricos que cortam as cidades, seja por ter sido mal armazenado, carregado pelas chuvas ou mesmo por descarte direto nos rios.

A disposição inadequada dos resíduos sólidos urbanos e industriais é uma das principais fontes de poluição e degradação dos corpos hídricos. Dados da Pesquisa Nacional de Saneamento (IBGE, 2002a) indicam que apenas 36,2% do lixo coletado é disposto em aterros sanitários . No Estado do Rio de Janeiro, 27,7% são depositados em lixões a céu aberto (IBGE, 2002).

Na bacia contribuinte à Baía de Guanabara são geradas quase 13.000 t/dia de lixo, sendo que 4.000 t/dia não chegam a ser coletadas, sendo vazadas em terrenos baldios, rios e canais (Consórcio Ecologus-Agrar, 2005). A mesma fonte cita que do volume coletado (9.000 t/dia) cerca de 8.000 t/dia vão para o Aterro de Gramacho e o restante do lixo é lançado em vazadouros sem controle.

A coleta e disposição inadequadas do lixo causam danos ambientais, tais como: focos de proliferação de doenças; contaminação do solo; poluição das águas superficiais e subterrâneas e obstrução dos sistemas de drenagem. Entre os principais problemas gerados pelo aporte de lixo à Baía da Guanabara, citam-se:

·         Aumento da concentração de resíduos sólidos suspensos e no fundo, aumentando a velocidade de assoreamento;

·         Contaminação microbiana com focos de proliferação de doenças;

·         Redução da flora e fauna marinha;

·         Degradação dos ecossistemas estuarinos e costeiros;

·         Desvalorização do pescado;

·         Geração de odores desagradáveis;

·         Impedimento das atividades recreacionais;

·         Alteração e obstrução do sistema de circulação e de depuração das águas;

·         Degradação da paisagem natural e da beleza estética.

 

Para alterar este quadro é necessária a melhoria dos serviços de coleta e disposição de resíduos na região que depende fundamentalmente do poder público. Entretanto, torna-se necessária, também, a reeducação de hábitos e costumes. A Educação Ambiental funciona, nesse caso, como uma ponte entre o conhecimento técnico-científico e o saber popular. Neste encontram-se as expectativas e as representações de qualidade de vida, as críticas, os conflitos, os paradoxos das relações internas e externas às comunidades, as reivindicações, a criatividade e as soluções sensatas para as mais diversas circunstâncias.

A educação é o caminho que conduz às transformações necessárias para gerar mudanças. Somente ela pode criar uma consciência crítica (Paulo Freire, 1985) capaz de formar cidadãos conscientes de sua condição humana e comprometidos com o planeta (Morin, 2004).

Uma das principais recomendações da Agenda 21 sobre Educação Ambiental é a mudança no ensino formal de maneira a construir uma “consciência ambiental e ética, valores e atitudes, técnicas de comportamentos em consonância com o desenvolvimento sustentável e que favoreçam a participação pública efetiva nas tomadas de decisão” (AGENDA 21 apud Rheinheime, cap. 36).

Diante do grande impacto do lixo nos rios e o seu carreamento para a Baía da Guanabara e para o Complexo Lagunar de Jacarepaguá, o poder público, através da Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA) – órgão gestor de recursos hídricos estadual na época –, considerou relevante e oportuna a proposta do Projeto Rio Ecobarreira concebido por técnicos da Fundação Getulio Vargas – FGV. Para a 1ª fase de implantação foram selecionados cinco rios, entre os sete com pior qualidade de água na Baía de Guanabara, de acordo com dados do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara - PDBG (Consórcio Ecologus-Agrar, 2005).

Como resultado direto da intervenção do Projeto no meio ambiente, espera-se que haja o avanço da cultura do cuidado com a água na bacia hidrográfica, por meio de uma real redução do lixo superficial encontrado nos corpos d´água. Como expectativa qualitativa, o principal resultado esperado é a proteção efetiva dos mananciais locais nas comunidades, bem como a ampliação do apoio comunitário às iniciativas locais e/ou regionais relacionadas à disposição do lixo e outros resíduos, proteção à biodiversidade terrestre e aquática e melhoria do ambiente ao seu redor.

O Projeto de Pesquisa RIO ECOBARREIRA

O Rio Ecobarreira é um projeto de pesquisa aplicada na área de desenvolvimento sustentável. O projeto envolve a análise da sustentabilidade sócio-econômica e ambiental de técnicas de redução do aporte de lixo flutuante em bacias hidrográficas. Este projeto foi conduzido, inicialmente, pela SERLA, agora INEA, em parceria com a FGV, com recursos do Fundo Estadual de Meio Ambiente (FECAM). Para alcançar a meta de redução do lixo nos rios, lagoas e baías, o Rio Ecobarreira atua tanto na remediação do problema, quanto na prevenção. Barreiras flutuantes - Ecobarreiras - instaladas nos rios permitem a remoção direta do lixo flutuante. Ações voltadas para a conscientização e educação da população sobre os impactos causados pelo lixo lançado nos corpos hídricos e para a viabilização da reciclagem nas comunidades buscam reduzir o problema em sua origem. Em sua vertente social, o Rio Ecobarreira tem sua atividade orientada de forma a gerar emprego e renda para as comunidades locais através da reciclagem do lixo coletado.

A Ecobarreira Piloto do Rio Irajá entrou em operação no mês de setembro de 2004. As ecobarreiras sempre contaram com o apoio de Cooperativas de Catadores e parceiros locais.

Elementos Chaves do Projeto Ecobarreira

            Ecobarreiras: são estruturas flutuantes instaladas transversalmente nas calhas de rios em trechos próximos à foz para retenção do lixo flutuante. A concepção de projeto utilizou materiais reciclados para flutuação, como garrafas PET e bombonas plásticas, além de madeira e aço, de maneira a tornar a estrutura mais econômica e de fácil manutenção.

            Ecopontos: Unidades de recepção, separação, pesagem e prensagem de lixo para reciclagem (Fig. 2). Destinam-se também à compra de lixo reciclável separado por moradores das áreas de entorno, tornando-se um ponto de referência para esta atividade em toda a comunidade. Com este incentivo, a tendência é que a comunidade reduza o lançamento de lixo em locais inadequados e também proteja o Ecoponto e suas instalações.

            Ecobarcos: Embarcações que percorrem diariamente as áreas costeiras e dão apoio à operação das Ecobarreiras, coletando lixo flutuante e sedimentado nas margens – áreas não atendidas pelos serviços de limpeza municipais, áreas de manguezais, etc. Os materiais recolhidos são transportados até os Ecopontos, onde são separados e destinados à reciclagem.

            Ecogaris: A operação da infraestrutura para coleta e reciclagem é feita por Cooperativas de Reciclagem que fornecem os equipamentos e materiais necessários para a reciclagem e se encarregam da comercialização do lixo. A fração do lixo não reciclável é coletada pelos órgãos competentes dos Municípios. Parte do pessoal de operação é constituída por Ecogaris. Os jovens selecionados pelo programa recebem treinamento para atuarem na coleta e reciclagem de lixo. Estes jovens são cooperativados e recebem uma parcela da receita obtida com a reciclagem, além da bolsa paga pelo programa.

            Ecoagentes: Jovens selecionados nas comunidades próximas e preparados para se tornarem multiplicadores das informações sobre a coleta e reciclagem do lixo e sua importância para a preservação do meio ambiente e saúde com atuação nas comunidades próximas.

A Ecobarreira Piloto

A Ecobarreira Piloto foi instalada na foz do Rio Irajá, em setembro de 2004. Este local conta com um Ecoponto e um Ecobarco apóia a operação. O Ecoponto recebe o lixo coletado na Ecobarreira Piloto, dos barcos e das comunidades próximas. Nesta fase piloto foram feitos os ajustes no protótipo da Ecobarreira e no processo de coleta e reciclagem a fim de se proceder à implantação do projeto nos demais rios.

Durante todo o primeiro ano de duração do projeto, os resultados foram monitorados de forma a promover ajustes no processo e avaliar as condições para sua continuidade e replicação para outros corpos d’água.

Desde setembro de 2004, a Ecobarreira Piloto gerou cerca de 11 empregos. Além destes empregos diretos, houve mobilização nas comunidades para a organização de sistemas de coleta seletiva, gerando uma fonte de renda adicional para os moradores.

O Programa de Educação Ambiental da Ecobarreira Piloto

O Programa de Educação Ambiental do Projeto Ecobarreira atingiu, numa primeira instância, representantes da sociedade civil, técnicos, professores e alunos do Segundo Ciclo do Ensino Fundamental que se localizavam no entorno das ECOBARREIRAS. Para esses atores foi uma oportunidade de aprender e compartilhar conhecimentos sobre a bacia, as políticas de gestão de recursos hídricos, bem como de participar de um exercício de trabalho de forma criativa, integrada e articulada aplicado aos interesses locais em consonância com os da Baía de Guanabara como um todo.

A metodologia proposta visou à implementação e ao acompanhamento do Projeto de Educação Ambiental nas comunidades do entorno das ECOBARREIRAS e ECOPONTOS. A metodologia dividiu o trabalho em quatro etapas, ajustáveis em função do desempenho da comunidade (Serla, 2005):

§   Etapa 1: Planejamento e Mobilização Institucional

§   Etapa 2: Curso de Educação Ambiental para a Água e o Lixo Reciclável com os objetivos de desenvolver as competências, habilidades e conhecimentos dos ECOAGENTES/ECOGARIS na área de reaproveitamento e reciclagem do lixo; sensibilizá-los para o uso criativo dos materiais e suas possibilidades de utilização; capacitá-los para a produção de objetos utilitários ou estéticos com o objetivo de gerar renda para suas comunidades; promover e incentivar sua autoestima e autoconfiança através do processo do “fazer” artístico; despertar o desejo de seguir aprendendo e criando por si próprios, com autonomia; enfatizar a necessidade e o valor de um senso de responsabilidade com relação a si mesmo, a comunidade e o meio ambiente.

§   Etapa 3: Campanha de Educação Ambiental para Coleta Seletiva

Essa etapa teve como objetivo a mobilização e o engajamento de beneficiários em torno de um conjunto de ações dedicadas à abordagem intensiva de temáticas relacionadas à qualidade da água e à coleta do lixo reciclável, por meio da transmissão de informações técnicas sobre a coleta e o armazenamento do lixo, conceito de bacia hidrográfica, entre outros.

Durante a execução destas atividades outras atividades foram desenvolvidas, tais como: palestra informativa em cada comunidade ou ECOPONTO; reunião mensal de planejamento e acompanhamento das atividades dos ECOAGENTES Multiplicadores; oficina de brinquedoteca por comunidade / ECOBARREIRA e/ou ECOPONTO; expedições informativas por comunidade / ECOBARREIRA e/ou ECOPONTO.

§   Etapa 4: Construção da Rede de Comunicação e Avaliação Global

A Rede de Comunicação teve como desafio a criação de uma teia de parcerias que permitissem integrar os atores sociais na construção das ações de fortalecimento do trabalho proposto.

As atividades principais desta fase foram: identificação das entidades comunitárias e empresas em geral; reunião para estabelecer parcerias e traçar diretrizes gerais por comunidade / ECOBARREIRA; reunião de avaliação bimensal por comunidade / ECOBARREIRA; realização de um Encontro Geral de Avaliação Geral.

 

O programa de educação ambiental apresentado foi desenvolvido durante a implantação do projeto em 2004 até setembro de 2005, quando se encerrou o projeto em parceria com a FGV.

5- Considerações Finais

A Educação Ambiental se mostra fundamental na criação de agentes transformadores, que participem ativamente da busca e construção de alternativas para a redução de impactos ambientais e para o controle social do uso dos recursos naturais. Seu processo de formação é dinâmico, permanente e participativo para possibilitar uma aprendizagem significativa, que consolide mudanças de valores e atitudes, efetivando uma consciência ambiental planetária (Muggler, PintoSobrinho, Machado, 2006).

O Programa de Educação Ambiental proposto para Ecobarreira piloto teve como objetivo principal a conscientização da população local para a problemática do lixo nos rios e seus impactos, bem como o reconhecimento da importância das atividades de coleta e reciclagem. Utilizou a abordagem pedológica como instrumento de trabalho, o que é ainda recente no Brasil (Muggler, PintoSobrinho, Machado, 2006); entretanto, os resultados imediatos em termos da diminuição do aporte de lixo na Ecobarreira Piloto não foram alcançados, de acordo com os dados dos relatórios de acompanhamento do projeto ecobarreira e relatos dos funcionários da extinta Serla envolvidos no projeto.

Cabe ressaltar que evidenciou-se uma relação direta entre nível educacional e quantidade de lixo nos rios. Verificou-se, a partir dos volumes de lixo recolhidos nas ecobarreiras, que o maior aporte de lixo nos rios situa-se em locais próximos a comunidades e de ocupação irregular do solo, principalmente onde há ocupação das faixas marginais de proteção.

A mobilização também é maior em locais de maior nível de escolaridade, como o caso da ecobarreira do Itanhangá, no complexo lagunar da Barra da Tijuca, que não pode ser desativada pelo INEA devido ao baixo volume de lixo reciclável, porque os moradores não permitiram (SigeRio, 2009).

O projeto Agenda Água na Escola, que visa à mobilização social e educação ambiental na gestão integrada dos recursos hídricos do Estado, está capacitando um grande número de escolas, seus professores e alunos, além de sensibilizar os líderes comunitários e secretarias de meio ambiente dos municípios, dentro das regiões hidrográficas do Estado. Seus resultados serão percebidos no longo prazo, mas é fundamental que receba o apoio necessário para sua internalização e, assim, garanta a essencial continuidade de suas atividades e das externalidades desejadas.

Vale lembrar que a educação ambiental na preservação dos recursos hídricos está inserida dentro da política de educação ambiental estabelecida no Estado do Rio. Essa política enfrenta questões próprias das administrações públicas estaduais, como recursos insuficientes e falta de continuidade para os projetos de longo prazo e problemas de quantidade e qualidade de pessoal, entraves crônicos das políticas públicas. Apesar de que em eventos, como semana do meio ambiente, dia da limpeza dos rios, campanha contra dengue e outros, haja um um direcionamento maior de recursos, eles são muito pontuais e, por isso, não produzem os efeitos desejados em termos educacionais.

Um dos obstáculos enfrentados pela política de educação ambiental é a pluralidade de atores envolvidos e a falta de um órgão ou agência que se responsabilize exclusivamente por sua execução. Quando se atribui a diversos entes as mesmas atribuições, essas atribuições perdem importância em relação àquelas exclusivas de cada ente e perdem prioridade.

O próprio conceito de educação ambiental envolve múltiplos conceitos e requer interdisciplinaridade, o que teoricamente “esvazia” a robustez do conceito. Dentro das escolas, a educação ambiental precisa evoluir dentro das escolas para uma disciplina e deixar de ser um tema dentro da Biologia e da Geografia, no caso dos recursos hídricos, para que alunos e professores priorizem mais esse conteúdo no aprendizado. Nesse caso, nossos rios agradecem.

6- Referências

AGENDA 21. Conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento. Rio de Janeiro: UNESCO, 1992.

BRASIL. Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e da outras providências Secretaria de Recursos Hídricos. Diário Oficial da União, Brasília, 28 abr. 1999.

Consórcio Ecologus-Agrar. Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara. Relatório Final. Outubro de 2005.

Freire, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 15 ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1985.

Holanda, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 11 ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1977.

IBGE. Pesquisa nacional de saneamento básico 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2002a.

IBGE. Censo Populacional 2000. Rio de Janeiro, [2002b]. Disponível em <http://www.ibge.gov.br> acesso em 13 jun. 2006.

Morin, Edgar. A Cabeça Bem-feita. 10 ed. Rio de Janeiro: Bertran Brasil, 2004.

MUGGLER, Cristine Carole; PINTO SOBRINHO, Fábio de Araújo; MACHADO, Vinícius Azevedo. Educação em solos: princípios, teoria e métodos. Rev. Bras. Ciênc. Solo,  Viçosa ,  v. 30,  n. 4, Aug.  2006 .   Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-. Acesso em 14 Junho 2009.

Oliveira, A.; Rocha, F.; Neto, M.; Gonçalves, S. Uma Alternativa para o lixo flutuante em rios e córregos. Revista ciências do ambiente on-line. v.1, n.1, ago. 2005.

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