Percepção de professores do ensino básico de uma região semi-árida sobre qualidade de água

Concepções prévias de professores do ensino básico de uma região semiárida sobre qualidade de água 

Magnólia Fernandes Florêncio de Araújo1; Cirleide Marques Dantas2; Aline de Souza Amorim3; Mariana Leite da Silveira4 e Maria Luisa Quinino de Medeiros5

1  Doutora em Ecologia, professora titular do Departamento de Microbiologia e Parasitologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Lagoa Nova/ Natal/RN, CEP. 59072-970, telefone: (84) 32153437, e-mail: mag@cb.ufrn.br.  

2Mestre em desenvolvimento e Meio ambiente pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e-mail: cirleidemarques@gmail.com.

3Mestre e Doutoranda em desenvolvimento e Meio ambiente pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e-mail: alineamor@gmail.com.

4 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática, e-mail: malesil@hotmail.com

5 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em desenvolvimento e Meio ambiente pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e-mail: luisarn_77@hotmail.com.

 

RESUMO

Este estudo foi realizado com professores de escolas públicas dos municípios de Caicó e Parelhas (Estado do Rio Grande do Norte), e teve como objetivo analisar a concepção desses profissionais sobre os temas: qualidade de água, poluição das águas e esgotos, doenças de veiculação hídrica, importância do ambiente aquático e pesquisa e sensibilização ambiental. Como instrumentos para essa análise foram aplicados questionários nos meses de novembro e dezembro/2009. O estudo mostrou que os professores reconhecem a existência de problemas relacionados à qualidade da água dos seus municípios e que há a necessidade de implementação de atividades de educação ambiental e de educação em saúde para uma maior sensibilização desses profissionais de ensino e, consequentemente, de seus alunos, para as questões que envolvem o tema qualidade da água.

 

Palavras-chave: Questionário, Educação ambiental, Educação em saúde.

 

1 - INTRODUÇÃO

 

A água é um recurso de infinita importância e de múltiplas utilidades para a população. Suas características são ainda mais relevantes em regiões que sofrem com a sua má distribuição e com problemas de escassez, como é o caso do semiárido brasileiro, que depende da construção de reservatórios para que toda a comunidade tenha acesso a esse bem natural.

            No contexto de modificações sociais e econômicas que o semi-árido vem passando a Educação Ambiental (EA) no contexto escolar torna-se uma ferramenta de grande utilidade pelo papel que a escola tem de sistematizar e socializar o conhecimento, bem como de possibilitar a formação de cidadãos suficientemente informados, conscientes e atuantes, para que as questões ambientais possam ser não apenas discutidas, mas para que se busquem soluções para elas (LUCATTO & TALAMONI, 2007).

            A Educação Ambiental, assim como as questões ambientais de ordem global, começaram a ganhar destaque a partir das décadas de 60 e 70 quando, com o desenfreado avanço tecnológico, o homem começou a exceder os limites de uso dos recursos naturais, preocupando cientistas e as organizações ambientalistas (SILVA et al. 2009)

            Para Sorrentino et al. (2005), a EA nasce como um processo educativo que conduz a um saber ambiental materializado nos valores éticos e nas regras políticas de convívio social e de mercado, que implica a questão distributiva entre benefícios e prejuízos da apropriação e do uso da natureza. Ou seja, a Educação Ambiental age como um transformador da sociedade, uma vez que ela passa a ser mais solidária com as questões ambientais.

            Oliveira et al. (2008) afirmam que a EA alicerçada na educação em valores humanos proporciona o resgate do sagrado, da unidade e da vivência da espiritualidade humana, levando a pessoa a se conhecer, a ter consciência dos processos mais diretos do seu próprio desenvolvimento. Incorpora ao processo educacional a natureza física, psíquica, emocional, afetiva, energética e vibracional do ser humano, entendido na complexidade de suas várias dimensões. Desta forma, consideramos que o processo educacional abre espaço para o resgate das emoções e para a convivência humana.

            Devido ao caráter modificador da Educação Ambiental, ela se destaca por apresentar como objetivos o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos; o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social; o incentivo à participação individual e coletiva na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania (BERGMANN & PEDROZA, 2008).

            Aliada à EA com todos os seus conceitos e paradigmas associa-se a educação em saúde, ambas com o objetivo de promover melhor qualidade de vida para a sociedade. A ausência da integração entre os educadores e membros da comunidade, a falta de abordagens multidisciplinares, o ceticismo dos profissionais em trabalhar de forma participativa com a comunidade e a falta de qualificação desses profissionais são entraves para a promoção da saúde (DINIZ et al., 2010).

            Do mesmo modo que a Educação Ambiental vem sendo incorporada aos currículos escolares, ainda, para Diniz et al. (2010) a educação em saúde também deve ser assim incluída, devendo ser tratada ano a ano, com níveis crescentes de informação e integração a outros conteúdos.

Diante da importância que tem uma educação que preza pela qualidade de vida e pelo papel transformador que tem a Educação Ambiental e a educação em saúde, o objetivo deste trabalho foi analisar a concepção que os professores do ensino público dos municípios de Parelhas e Caicó (RN) têm sobre qualidade de água e avaliar a impressão deles sobre a importância da educação ambiental nos currículos escolares. 

 

2 - PERCURSO METODOLÓGICO

 

2.1 - Locais onde foram desenvolvidos os trabalhos

 

            Os municípios de Parelhas e Caicó (figura 1) estão inseridos na microrregião Seridó Oriental do Rio Grande do Norte.

Figura 1 – Mapa do Rio Grande do Norte com destaque dos municípios de Parelhas (azul) e Caicó (vermelho), RN). Fonte: IBGE

 

No município de Parelhas situa-se importante reservatório, denominado Boqueirão de Parelhas, que está situado a 2,5Km da cidade e é utilizado como fonte de abastecimento de água para o município (CAERN, 2010; SEMARH, 2010). No município Caicó há o reservatório Itans, que está situado a 4 km da cidade. Esse reservatório faz parte da Bacia Hidrográfica Piranhas-Assu que é de grande importância econômica para o estado do Rio Grande do Norte, ocupando uma superfície de 17.498,5 km2, que corresponde a cerca de 30% do território estadual e contribuindo com 79% do total de água acumulado no estado do Rio Grande do Norte (SEMARH)

O instrumento utilizado para a investigação das concepções espontâneas de professores consistiu em um questionário cuja temática geral aborda a relevância da qualidade de água, e temas afins, e suas implicações na sociedade. As questões foram elaboradas com base nos trabalhos desenvolvidos por Almeida e Kurtz dos Santos (1999), Sodré-Neto & Araújo (2008) e Petrovich & Araújo (2009).

Foram distribuídos 71 questionários em profissionais de ensino de escolas das redes estadual e municipal das cidades de Parelhas e de Caicó (RN), compreendendo professores de artes, biologia, ciências, ensino religioso, física, geografia, história, língua estrangeira, multisseriada, polivalentes, química e do apoio pedagógico das escolas.  O questionário possuía 37 questões fechadas (objetivas, com respostas gerais, tais como “sim, não e não sei”) e três questões abertas.

O questionário foi aplicado nas próprias escolas onde os professores trabalham durante os meses de novembro e de dezembro de 2009.

Apesar de limitar a expressão das opiniões dos participantes, as questões fechadas facilitam a aplicação dos questionários e a posterior análise dos resultados. Já as questões abertas demoram mais tempo para serem interpretadas, porém permitem ao pesquisador explorar, com maior riqueza de detalhes, assuntos relacionados ao tema em questão, pois esse tipo de questionário oferece respostas mais representativas e fiéis da opinião do questionado e permite recolher variadas informações (BONI & QUARESMA, 2005).

            Os principais temas do questionário se relacionam diretamente com a qualidade da água, abordando, de modo geral, sua importância para a sociedade, além de outros temas correlatos, os quais foram categorizados nos seguintes eixos temáticos:

  1. Qualidade da água;
  2. Poluição das águas e esgotos (formas de tratamento, quem produz, se sabem o destino do esgoto);
  3. Doenças de veiculação hídrica;
  4. Importância (econômica e ambiental) do ambiente aquático;
  5. Pesquisa e sensibilização ambiental.

 

Estabelecidas estas categorias temáticas, foram destacados alguns pontos de maior ênfase, os quais passaremos a apresentar e discutir.

 

3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

3.1 - Perfil dos profissionais da educação participantes da pesquisa

 

            Dos 71 questionários distribuídos, obtivemos 45 respondidos por professores cuja idade variou de 27 a 60 anos. Destes professores, 34 são do sexo feminino e apenas 11 são do sexo masculino. Em relação à formação acadêmica, a maioria dos participantes possui nível superior completo, dois não responderam a esta pergunta e apenas um não concluiu o Ensino Superior, mas se encontrava cursando o sexto período de Pedagogia. Do total de respondentes, 30 são professores do Ensino Fundamental, e apenas 7 atuam no Ensino Médio. Os demais entrevistados atuam na área de apoio pedagógico das escolas.

 

3.2 - Análise dos questionários: questões fechadas

 

3.2.1 - Eixo temático 1: Qualidade da água                         

 

A primeira questão desse eixo temático perguntava ao professor o que uma água de boa qualidade não poderia conter, informando a possibilidade de marcar mais de uma das seguintes alternativas: cheiro, cor, esgoto, bichos, gosto e outros (solicitando que informasse o que seria). 

Por questões didáticas, as respostas desta questão foram organizadas em grupos, de acordo com as respostas dadas, sendo eles: grupo 1 - todas as alternativas; grupo 2 - cor, gosto, cheiro e outras opções; grupo 3 – Outras combinações; e o grupo 4 – não marcou nenhuma das opções sugeridas (figura 2).

O grupo mais apontado foi o 2, em que os respondentes marcaram a resposta que é apontada pela maioria dos livros didáticos, abordando como as características organolépticas da água: não tem cheiro, gosto e nem cor. Nesse sentido, consideramos que uma abordagem mais relacionada ao cotidiano dos alunos permitiria a capacidade de discussão mais adequada à realidade. Se em resposta a essa questão, os professores reproduzem as idéias dos livros de maneira literal, provavelmente não poderão discutir da maneira mais adequada com seus alunos a situação real, nesse caso, de um corpo d`água.

 

Figura 2 – Características que uma água de boa qualidade não deve apresentar, de acordo com os professores participantes.

 

Uma observação interessante nesta questão é que 36% dos questionados consideram que uma água de boa qualidade não tem bichos, ou seja, é uma água que não tem animais aquáticos, o que não necessariamente é verdade. Se considerarmos que essa água é de um rio ou outro ambiente aquático, mesmo com a presença de animais ela pode e deve ser de boa qualidade.

A questão 2 teve como objetivo questionar aos respondentes se uma água de aparência limpa tem sempre boa qualidade. Apenas cinco professores afirmaram que sim, o que caracteriza que a maioria dos professores (aproximadamente 90%) demonstra saber que mesmo uma água incolor pode estar contaminada. Essa compreensão é fundamental para subsidiar o estudo dos microrganismos, seres que exercem vários papéis no ambiente aquático.

A terceira questão analisada neste eixo temático buscava saber se, na opinião dos professores, quando a água do açude está com cheiro desagradável é sinal de que ela está contaminada. Responderam afirmativamente a esta questão 76% dos professores, os outros 24% responderam que não ou que não sabiam.

Por fim, a quarta questão investigou se, para os professores, uma água de boa qualidade não tem organismos que causam doenças. Dos participantes, 78% responderam que sim e o restante respondeu negativamente.

 

3.2.2 - Eixo temático 2: Poluição das águas e esgotos

 

Este eixo temático corresponde às questões de números 05 a 08 e trata da poluição das águas por esgotos e de quem é responsável por sua produção. A primeira questão desse eixo temático (figura 3) perguntava aos professores quais eram os principais agentes de poluição/contaminação das águas. As alternativas de resposta eram: lixo industrial, lixo residencial, despejo de esgotos, lixo hospitalar, produtos químicos e outros, podendo ser marcada mais de uma resposta. Um pouco mais da metade dos professores (56%) indicou que todas as formas de poluição poderiam afetar os ambientes, demonstrando ter conhecimento a respeito das fontes de origem de cada tipo de poluição que contamina as águas. Isso significa que 44% deles, aproximadamente, não conseguiu relacionar essas formas de poluição à água. Tal fato é compartilhado por Vargas (2002) quando, em uma pesquisa semelhante, constatou que mais de 65% dos entrevistados consideraram não possuir informações suficientes em relação aos problemas de poluição dos rios em sua própria cidade. As respostas obtidas neste trabalho levam a crer que aproximadamente a metade dos sujeitos envolvidos também demonstrou não possuir o conhecimento de que o excesso de cargas de poluição doméstica, pluvial e industrial contamina os mananciais, especialmente nas regiões urbanas (TUCCI; HESPANHOL; NETTO, 2000).

  

Figura 3- Percentual de respostas sobre os principais responsáveis pela poluição/contaminação da água.

 

Alguns professores complementaram suas respostas, quando optavam pela alternativa “outros”, ao dizer que agrotóxicos e o lazer também são responsáveis pela contaminação dos açudes Um exemplo disso, é o fato de um dos professores ter marcado “outros” e ter justificado afirmando que os seres humanos são as maiores fontes de poluição, uma vez que eles são os responsáveis por todas as alternativas disponíveis como respostas.

A questão seis teve como objetivo saber dos professores se a contaminação por esgotos leva a uma diminuição na qualidade da água, ao que todos responderam “sim”. Constata-se aqui a existência de uma preocupação em relação às conseqüências da poluição para a qualidade da água. Esse fato é considerado de grande importância, já que a preservação ambiental e o controle da poluição difusa dos recursos hídricos são grandes desafios atuais no Brasil (TUCCI; HESPANHOL; NETTO, 2000).

A sétima questão, para a qual também era possível marcar mais de uma opção, investigava o conhecimento em relação aos locais de produção dos esgotos. Dentre as alternativas, as escolas foram indicadas por 62%, as indústrias por 82 % e os hospitais por 87% dos professores. Destes, 84% indicou que as residências produzem esgotos, um fato surpreendente, pois 16%, não relacionaram suas casas como sendo produtoras de esgotos. O esperado era que 100% deles dissessem que todos os locais citados produzem esgotos, pois se relacionam com processos que geram resíduos.

Ainda neste eixo temático a questão de número 8 investigou se os professores admitiam que eles próprios fossem produtores de esgoto. Responderam afirmativamente 80% deles, 16% disse que não e 4% deles afirmaram não saber responder a essa indagação. Esse resultado mostra que um percentual preocupante dentre os respondentes não tem conhecimento de que somos todos produtores de esgotos, e isso pode ter uma implicação no modo como tratam esse tema com seus alunos.

 

3.2.3 - Eixo temático 3: Doenças de veiculação hídrica

 

            Este eixo temático abrangeu as questões de números 15 a 18 e tratava sobre as doenças transmitidas pela água. A questão 15 teve por objetivo saber dos professores se a contaminação de açudes, rios e mares pode causar doenças. Os profissionais de ensino demonstram saber que sim, pois todos eles responderam de forma afirmativa essa pergunta.

            As questões 16 e 17 perguntavam, respectivamente, se ao tomar banho em águas contaminadas eles poderiam adquirir alguma doença e se ao ingerir essa água eles também poderiam adquirir alguma doença e, em caso de resposta afirmativa, que doenças seriam essas. A resposta afirmativa foi unânime para as duas perguntas e as patogenias mais citadas foram “amebíase”, “cólera”, “dermatites”, “diarréia aguda”, “esquistossomose”, “febre tifóide”, “giardíase”, “hepatite infecciosa”, “leptospirose” e “micose”. O percentual de respondentes que deram exemplo a estas questões foi de 49%. 

            Contudo, na questão 18 (figura 4), que procurou levantar se os professores conhecem as doenças que podem ser transmitidas pela água contaminada e quais são elas, 22% dos professores disseram não conhecer doenças que podem ser transmitidas por uma água contaminada. Comparando este resultado com aqueles das questões 16 e 17 pode-se perceber que os professores sabem que uma água contaminada traz doenças para a população, mas que muitos deles não consegue identificar exatamente que tipos de doenças essa água contaminada pode causar.

 

Figura 4 -  Gráfico demonstrativo do percentual de respostas da questão 18.

 

Os resultados das questões que tratam sobre as doenças de veiculação hídrica nos mostram a necessidade de se fazerem programas de educação ambiental e em saúde, utilizando o tema água e saúde para que se esclareçam melhor quais doenças podem ser adquiridas pela água contaminada e como preveni-las, especialmente em se tratando de uma região em que há escassez de água de boa qualidade, como é o caso da região semi-árida do Rio Grande do Norte.

 

3.2.4 - Eixo temático 4: Importância (econômica e ambiental) do ambiente aquático

 

Esse eixo temático é composto pelas questões 26, 31 e 33. Na questão 26 (figura 5), os participantes são indagados se conseguem imaginar a sua cidade sem o açude, 58% respondem que não, reafirmando a importância que estes reservatórios têm para a população. De acordo com Vargas (2002), não existe independência absoluta entre as atitudes das pessoas e o ambiente, seja ele natural ou construído. O autor também enfatiza que a satisfação, ou não, do homem em relação ao meio ambiente é afetada por juízos de valor, por expectativas e aspirações geradas dentro de um contexto cultural. A partir dessa observação, é possível concluir que o açude, por sua importância cultural e econômica, influencia a percepção que as pessoas apresentam ao seu respeito.

            A questão 31 perguntava de quem é o dever de evitar que os recursos hídricos sejam contaminados: da “população”, do “governo da cidade” ou de “todos”. Em relação a essa pergunta, 2% dos professores disseram que a responsabilidade é da população, 9% afirmaram ser do Governo do Estado e 89% reconheceram que é um dever de todos garantir a qualidade de água de sua região.

Narvai (2000) propõe que se um bem ou serviço qualquer implicar risco ou representar algum fator de proteção para a saúde pública, além do controle do produtor sobre o processo, distribuição e consumo, deverá ocorrer, também, um controle por parte das instituições do Estado. Com isso o resultado obtido corrobora com a afirmação do autor, em que não é somente o responsável pela ação prejudicial a um determinado ambiente que deve se preocupar em preservar os recursos ali existentes, mas sim que esse deve ser um esforço conjunto entre população e governo. Ainda assim, considera-se um percentual elevado o de pessoas que não vêem a ação do estado como sendo de fundamental importância para preservação dos recursos hídricos.

A questão 33 procurou saber se os professores reconhecem qual a importância do açude para as suas respectivas cidades. Apesar de ser uma questão fechada ela dava a possibilidade de se marcar mais de uma opção. Conforme pode ser observado na figura 5, todos os professores marcaram a opção para consumo porque a água do açude serve para abastecer as cidades, principalmente no caso de Parelhas. Contudo, 84% marcaram também as opções lazer e turismo e pesca, demonstrando o quanto essas atividades são frequentes nesses ambientes. Apenas 11% marcaram outros citando a agricultura, a irrigação e fins domésticos como formas de uso da água do açude. Em especial para a cidade de Parelhas, isso pode ter ocorrido porque os açudes próximos ao município são pouco utilizados para agricultura por serem rodeados por formações rochosas, diferentemente de outros reservatórios da região que permitem a prática da agricultura.

 

Figura 5 – Percentual de respostas sobre a água do açude da minha cidade é utilizada para.

 

Enumerar todas as utilidades econômicas e sociais que competem pela apropriação ou utilização dos recursos hídricos é uma tarefa muito difícil, porém, ainda assim, é possível estabelecer algumas categorias de utilização da água (VARGAS, 1999), como é o caso da irrigação, pesca e lazer, produção industrial e geração de energia, por exemplo. Esse foi um dos objetivos desse eixo temático, em que se buscou descobrir qual a visão que os professores têm a respeito do açude localizado em sua região (Boqueirão de Parelhas, no município de Parelhas; e Itans, localizado no município de Caicó).

 

3.2.5 - Eixo temático 5: Pesquisa e sensibilização ambiental

 

            Este eixo temático, representado pelas questões 34 a 36, teve por objetivo investigar se os professores trabalham na perspectiva da Educação Ambiental em suas aulas. A questão de número 34 questionava se as escolas em que os professores trabalham realizam atividades de Educação Ambiental, e todos responderam que sim. Destes, 78% afirmaram que participam de pelo menos 1 dessas atividades, 9% que a escola desenvolve mas ele não participa, e 13% marcou que a escola não realiza atividades de Educação Ambiental.

A questão 35 perguntava se eles conhecem as leis que existem sobre o uso e a qualidade de água e obteve como respostas afirmativas 47%, contra 53% que afirmaram não conhecer essa legislação (figura 6).

Figura 6 - Gráfico demonstrativo do percentual de respostas da questão 35.

 

            Finalizando este eixo temático, a questão 36 procurou saber se, na opinião dos professores, a consciência ambiental diminui os problemas da água. Mais uma vez a resposta afirmativa foi unânime, o que nos mostra que os professores têm consciência de que as atividades de educação ambiental, usando o tema qualidade de água, são fundamentais para preservação e uso consciente desse bem tão precioso para a população mundial.

            Vargas (2002) afirma que a noção de co-responsabilização dos usuários da água é um processo que passa pela informação, educação e pela mobilização dos usuários. Essa percepção é compartilhada pelos professores, os quais assumiram que a sensibilização dos problemas ambientais auxilia na preservação dos recursos hídricos. Assim, a educação e a mobilização, particularmente dos usuários domésticos de água, devem ser acompanhadas de um conhecimento profundo de suas atitudes e práticas em relação a esse recurso.

            Tucci, Hespanhol e Netto (2000) apontam a necessidade da existência de uma  capacidade gerencial, assim como programas de apoio para que a população busque melhorias e condições para o desenvolvimento sustentável. Tal fato deve partir do desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental que busquem formas de preservação do meio ambiente. O reconhecimento dessa necessidade se revela quando aproximadamente 80% dos professores disseram participar de atividades de EA em suas escolas.

            Os resultados deste eixo temático, embora levando à confirmação da existência de ações em educação ambiental nas propostas pedagógicas das escolas, demonstram também que estas podem ser melhor trabalhadas e de maneira mais satisfatória, uma vez que muitas das respostas apresentadas em outros eixos temáticos, pelos professores, não condizem com uma prática desejável da Educação Ambiental, reforçando mais uma vez a necessidade de intervenções contínuas na sua formação, nesse campo, e de acordo com a realidade local.

           

3.2.6 - Análise das questões abertas

 

            A primeira questão aberta procurava saber que características a água deve possuir para ser identificada como uma água de boa qualidade. A maioria dos professores (75%) respondeu que a água não deveria ter cor, cheiro ou sabor (figura 7).  Esse mesmo aspecto foi pesquisado em trabalhos semelhantes desenvolvidos por Sodré-Neto e Araújo (2008) e Petrovich e Araújo (2009), obtendo-se o mesmo tipo de  respostas e um percentual de 27% e 32%, respectivamente. Para Sodré-Neto e Araújo (2008), a elevada citação dessas características organolépticas da água, provavelmente é oriunda dos livros didáticos e se confundem com o conceito de qualidade de água, revelando uma confusão entre esses conceitos por falta de esclarecimento do que de fato seja uma água de boa qualidade.

 

Figura 7 – resposta de um dos professores à questão aberta de número 01

 

As respostas para esta questão estiveram relacionadas com aquelas dadas à primeira questão fechada do questionário e provavelmente foi influenciada por ela, pois eles se apoiaram em termos ali encontrados para respondê-la. Por outro lado, comparando as respostas para as duas questões, nota-se que, nesta segunda, nenhum dos professores fez referência ao fato de que uma água de boa qualidade não pode conter despejo de esgotos, fato citado por 44% deles na questão objetiva.

Para Petrovich & Araújo (2009) o tema qualidade de água é essencial para a educação sanitária, que é uma das medidas de grande importância para o controle das doenças de veiculação hídrica especialmente em regiões onde há escassez de água, indicando assim a necessidade de atividades voltadas para a temática da educação sanitária e em saúde nessas regiões. Geralmente estudado nas aulas de ciências, identifica-se a necessidade de se tratar esse tema de maneira mais integradora, dentro do contexto do semi-árido.

A segunda questão aberta indagava sobre a possibilidade de que atividades de educação ambiental pudessem contribuir para a conscientização de que os problemas ambientais (como lançamento de esgotos nos açudes, por exemplo) pudessem ser minimizados com a colaboração da comunidade.  Todos responderam que sim e 50% deles afirmaram que por meio das atividades de educação ambiental as pessoas podem se sentir responsáveis pelos problemas ambientais percebendo que contribuem para a contaminação do meio ambiente, mas que também podem ser responsáveis pela solução ou diminuição desses problemas.  Foi ressaltado por 17% dos professores que as atividades de educação ambiental são importantes porque proporcionam um desenvolvimento sustentável. Para Godoi et. al. (2010) apud Tundisi (2001), a participação da comunidade no gerenciamento da bacia hidrográfica pode ser considerada como uma eficiente ferramenta de administração regional, além de contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população devido à valoração do seu meio ambiente.

Em referência à terceira questão aberta que perguntava se os professores acham que atividades lúdicas (como jogos e brincadeiras) podem auxiliar na redução dos problemas ambientais relacionados à água para a preservação de açudes e manutenção da qualidade da água, um percentual de 84% dos professores considerou que atividades lúdicas podem ser importantes para minimizar esses problemas ambientais. Destes, 22% citam as crianças como principal foco das atividades lúdicas, mas também as acham atrativas para os jovens e adultos.

As respostas às três questões abertas mostram que a maioria dos professores compreende como os problemas ambientais ocorrem e que existem formas de evitá-los, a partir da sensibilização de cada um para que possamos diminuir os impactos ambientais que as atividades antrópicas causam ao meio ambiente. Para isso, é necessário que sejam realizadas atividades de sensibilização da comunidade escolar, como forma de inserir cada vez mais a educação ambiental nas propostas pedagógicas das escolas, e em especial, neste caso, de escolas que ficam próximas a reservatórios e rios de região semi-árida, colaborando assim para a uma educação científica mais consolidada, com base nesse tema.

 

4 - CONCLUSÃO E PERSPECTIVAS

 

            Este estudo revelou que os docentes participantes da pesquisa têm conhecimento da existência de problemas relacionados à qualidade da água dos seus municípios e de que eles também se constituem agentes causadores desses problemas. Apesar de reconhecerem a importância de atividades de educação ambiental nas escolas, pode-se perceber que esta prática precisa ser intensificada e adequada, pois a caracterização obtida neste trabalho revelou a falta de um maior conhecimento de alguns problemas ambientais e de doenças possivelmente ligadas a eles, o que é fundamental para que o professor possa orientar atividades que promovam a melhoria de vida das pessoas e a saúde ambiental.

Assim, percebeu-se a necessidade de implementação de atividades de educação ambiental e de educação em saúde para uma maior sensibilização dos professores e, consequentemente, de seus alunos, para as questões que envolvam o tema “qualidade da água”. Para isso, atividades educativas na forma de palestras e jogos sobre a temática “água no semi-árido” deverão ser aplicadas posteriormente nas escolas envolvidas nesta pesquisa. 

 

5 - AGRADECIMENTOS

 

            A CAPES/REUNI pela bolsa de mestrado e ao CNPq/CT-SAÚDE/CT-HIDRO pelo financiamento do projeto.

 

 

6 - REFERÊNCIAS

 

ALMEIDA, M. T.; KURTZ DOS SANTOS, A. C. Um estudo com alunos do ensino fundamental de Rio Grande, sobre problemas sócio-ambientais no entorno da escola, tendo como base a modelagem semiquantitativa: resultados parciais. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, FURG, p. 199-217, 1999.

 

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BERGMANN, M.; PEDROZO, C. S. Explorando a bacia hidrográfica na escola: Contribuições à educação ambiental Ciência & Educação, v. 14, n. 3, p. 537-553, 2008.

BONI, V.; QUARESMA, S. J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências Sociais. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC. v. 2, n. 1, p. 68-80, 2005.

 

DINIZ, M. C. P.; OLIVEIRA, T. C.; SCHALL, V. T. Saúde, como compreensão de vida”: avaliação para inovação na educação em saúde para o ensino fundamental. Ensaio – Pesq. Educ. Ciênc.. v.12, n.1, p- abr. 2010

 

GODOI, E. L.; POLAKIEWICZ, L.; PIRES, M. A. F.; ORTIZ, N. Oficina sobre qualidade de água: uma proposta de Educação Ambiental em uma bacia hidrográfica na região metropolitana de São Paulo, Brasil. Educação Ambiental em Ação. n. 30. ano VIII, dezembro/2009-Fevereiro/2010

 

LUCATTO, L. G.; TALAMONI, J. L. B. A construção coletiva interdisciplinar em educação ambiental no ensino médio: a microbacia hidrográfica do Ribeirão dos Peixes como tema gerador. Ciênc. educ. (Bauru) [online]. v.13, n.3, p. 389-398, 2007.

 

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OLIVEIRA, S. F. O.; PEREIRA, M. V.; VIANA, R. M. EDUCAÇÃO AMBIENTAL: Pertencer e cuidar da teia da vida. Mercator - Revista de Geografia da UFC. Ano 07, n. 13, p. 39-46, 2008.

 

PETROVICH, A. C. I & ARAÚJO, M. F. F. Percepção de Professores e Alunos sobre os usos e a qualidade da água em uma Região Semi-Árida brasileira. Educação Ambiental em Ação. n. 29. ano VIII, set-nov-2009.

 

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