EDUCAÇÃO AMBIENTAL E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA: CONTEXTOS, MARCO LEGAL E ORIENTAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

 

 

Jangirglédia de Oliveira (jg.jangir@gmail.com),

Mestranda em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB).

 

Antônio Roberto Xavier (roberto@unilab.edu.br),

Professor Permanente do Mestrado Acadêmico em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis (MASTS) da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB); Doutor em Educação (UFC).

 

Juan Carlos Alvarado Alcócer (jcalcocer@unilab.edu.br),

Professor Permanente do Mestrado Acadêmico em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis (MASTS) da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB); Doutor em Engenharia Elétrica (UNICAMP).

                                                                                    

Lisimére Cordeiro do Vale Xavier (lisirobert@yahoo.com.br),

Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC);

 

Rui Martinho Rodrigues (rui.martinho@terra.com.br),

Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC); Doutor em História (UFPE) e Bacharel em Direito (UNIFOR).

 

RESUMO

 

Este artigo objetiva debater sobre o processo de ensino-aprendizagem no âmbito da educação básica, buscando demonstrar a educação ambiental como direito constitucional e exercício de cidadania indispensável à formação do ser humano desde seus primeiros anos escolares.

 

Palavras-chave: Educação Ambiental; Legislação Nacional; Educação Básica; Interdisciplinaridade.

 

ABSTRACT

 

This article has as main objective to discuss about the teaching-learning process in the scope of basic education seeking to demonstrate environmental education as a constitutional right and an exercise of citizenship indispensable to the formation of the human being from his first school years.

 

Keywords: Environmental Education; National Legislation; Basic Education; Interdisciplinarity.

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

A sociedade contemporânea enfrenta inúmeros problemas de cunho ambiental, tendo em vista uma série de fatores, alguns de ordem natural, e outros não. Contudo, a maioria das dificuldades vivenciadas nesse aspecto tem como causa principal a ação humana, de forma direta ou indireta, seja em decorrência da atitude em si, seja em decorrência da omissão dela. O consumismo exacerbado e o aumento considerável da utilização de materiais descartáveis são provas de que, apesar de muito se falar, a reflexão ainda é pouca e de que aquilo que se tem feito é insuficiente para mudar essa realidade.

Acredita-se que a educação, no sentido de aquisição do conhecimento que possibilita a compreensão de causa e efeito dos fatos, bem como a reflexão de práticas adotadas, pode se configurar como um mecanismo de mudança de atitude em relação aos cuidados que se deve ter com o ambiente em que vivemos. Nesse aspecto, é imprescindível instruir as pessoas sobre a escassez e as limitações dos recursos naturais, bem como sensibilizá-las de que é responsabilidade de cada um a manutenção de um meio ambiente equilibrado para esta e as futuras gerações.

A educação ambiental, entendida como “práxis educativa e social” (LOUREIRO, 2011), pode ser trabalhada tanto de maneira formal quanto de maneira informal. No aspecto formal, temos a escola, um espaço por excelência para se vivenciar essa prática, pois, além de ser um ambiente propício ao ensino e à aprendizagem, já dispõe de um público que pode atuar como multiplicador de ideias e ações ecologicamente corretas. Nesse sentido, é imprescindível trabalhar essa temática em toda a educação básica, desde a educação infantil.

Contudo, no ensino médio, deve ser potencializado, visto que estaremos diante de muitos adolescentes e jovens protagonistas, futuros profissionais, que atuarão em inúmeras áreas, nas quais poderão não apenas adotar práticas sustentáveis, mas também contribuir com a difusão das mesmas. Dada a relevância dessa temática, a própria legislação brasileira já prevê a educação ambiental, seja na Constituição Federal, seja na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/1996), bem como nos instrumentos que norteiam o fazer pedagógico na escola, tais como os Parâmetros Curriculares Nacionais, as Diretrizes Curriculares Nacionais, os Planos de Educação e o próprio Projeto Político-Pedagógico da escola, visando à garantia do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos.

Em face do exposto, esta escrita objetiva analisar, em caráter geral, as previsões legais da legislação nacional, normatizações e diversos documentos destinados à educação ambiental para a educação básica. De modo específico, esta escrita busca demonstrar a educação ambiental como direito constitucional indispensável à formação do ser humano desde seus primeiros anos escolares.

Metodologicamente, este estudo é uma revisão de literatura com abordagem qualitativa procedida através de método interpretacional e técnica de análise de conteúdo em fontes secundárias. Após acurada análise em livros, normatizações e documentos oficiais, é possível apontar que existe a necessidade de se trabalhar a educação ambiental em todos os anos no decurso da educação básica.

 

 

 

 

 

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL: CONTEXTO E MARCO LEGAL

 

 A ciência de que os problemas ambientais afetam não apenas em âmbito local e regional, mas também em âmbito global, levou muitos países a se unirem em prol de soluções conjuntas com vistas à mitigação dessa problemática.

Nesse sentido, merecem destaque alguns movimentos e compromissos assumidos internacionalmente, dentre os quais podemos citar o documento resultante da Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental de Tbilisi, ocorrida no município da Geórgia (ex-União Soviética), em outubro de 1977, cuja organização foi fruto de uma parceria entre a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Na ocasião, formularam-se objetivos, definições, princípios e estratégias para a educação ambiental, os quais são adotados em todo o mundo. Apesar da relevância desse evento, o Brasil não esteve presente oficialmente, já que não mantinha relações diplomáticas com o bloco soviético, conforme informações de representante da Secretaria Especial do Meio Ambiente do Governo Federal da época.

A Constituição Federal de 1988 apresenta, em seu artigo 23, inciso VI, que é competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. Nossa Carta Magna também versa sobre o assunto no artigo 225, segundo o qual “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para a presente e as futuras gerações” (BRASIL, 1988). O parágrafo 1º desse mesmo artigo dispõe sobre as incumbências do Poder Público, para que a efetividade desse direito seja assegurada, dentre as quais está a de: “[...] promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente” (BRASIL, 1988).

Sob esse prisma, a educação ambiental contribui para a execução dessa responsabilidade do poder público, à medida que se configura como forma de sensibilizar as pessoas para a necessidade de um meio ambiente equilibrado e saudável para todos.

Dentre os mecanismos legais que versam sobre a educação ambiental, merece destaque a Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, a qual institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Logo no primeiro capítulo da referida lei, os artigos 2º e 3º tratam da necessidade da existência da educação ambiental em todos os níveis e modalidades do processo educativo, bem como asseguram a todos esse direito, conforme se observa a seguir:

 

Art. 2º A educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal. Art. 3º Como parte do processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental, incumbindo: I – ao Poder Público, nos termos dos arts. 205 e 225 da Constituição Federal, definir políticas públicas que incorporem a dimensão ambiental, promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e o engajamento da sociedade na conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente; II – às instituições educativas, promover a educação ambiental de maneira integrada aos programas educacionais que desenvolvem; [...]. VI – à sociedade como um todo, manter atenção permanente à formação de valores, atitudes e habilidades que propiciem a atuação individual e coletiva voltada para a prevenção, a identificação e a solução de problemas ambientais.

 

Igualmente relevante também é o Decreto nº 4.281, de 25 de junho de 2002, que regulamenta a Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, a qual instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental. Em seu artigo 1º, observa-se a inclusão das instituições educacionais como uma das entidades responsáveis pela execução da política nacional de educação ambiental.

 

Art. 1º A Política Nacional de Educação Ambiental será executada pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, pelas instituições educacionais públicas e privadas dos sistemas de ensino, pelos órgãos públicos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, envolvendo entidades não governamentais, entidades de classe, meios de comunicação e demais segmentos da sociedade. (BRASIL, 2002).

 

Já nos artigos 5º e 6º do mesmo decreto, explicita-se que todos os níveis de ensino deverão ser contemplados com a educação ambiental:

 

Art. 5º Na inclusão da Educação Ambiental em todos os níveis e modalidades de ensino, recomenda-se como referência os Parâmetros e as Diretrizes Curriculares Nacionais, observando-se: I – a integração da educação ambiental às disciplinas de modo transversal, contínuo e permanente; II – a adequação dos programas já vigentes de formação continuada de educadores. Art. 6º Para o cumprimento do estabelecido neste Decreto, deverão ser criados, mantidos e implementados, sem prejuízo de outras ações, programas de educação ambiental integrados: I – a todos os níveis e modalidades de ensino. (BRASIL, 2002).

 

Além do marco legal previsto na legislação nacional, existe uma gama de outros documentos oficiais de governo que buscam regulamentar e fomentar a práxis da educação ambiental no sistema de ensino brasileiro.

Posteriormente a essa Conferência, a Unesco e o Pnuma iniciam a estruturação do Programa Internacional de Educação Ambiental (Piea), desenvolvendo uma série de atividades em diversos países.

Em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad), ocorrida no Brasil e conhecida como Rio-92 ou Eco-92, elabora-se o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, um importante documento internacional. De acordo com a Proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental, elaborada pela Coordenação-Geral de Educação Ambiental (CGEA) e encaminhada ao Conselho Nacional de Educação (CNE):

 

Este documento, além de firmar com forte ênfase o caráter crítico e emancipatório da Educação Ambiental, entendendo-a como um instrumento de transformação social, política, ideologicamente comprometido com a mudança social (o que já aparecia timidamente em Tbilisi), desponta também como elemento que ganha destaque em função da alteração de foco do ideário desenvolvimentista para a noção de sociedades sustentáveis construídas a partir de princípios democráticos, em propostas participativas de gestão ambiental e de responsabilidade global. (BRASIL, 2010, grifo nosso).

 

Vale destacar que nesse período o Brasil já havia reconhecido a necessidade de inclusão da educação ambiental em todos os níveis e modalidades de ensino, visando à conscientização pública para a conservação do meio ambiente.

No âmbito conceitual, é interessante revisitar alguns autores e instrumentos legais que versam sobre o assunto, senão vejamos: a Lei nº 9.795/1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, a qual, em seu artigo 1º, apresenta a educação ambiental como:

 

[...] os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. (BRASIL, 1999).

 

Diante desse conceito, observa-se a extrema relevância da temática, bem como a necessidade do engajamento de toda a sociedade nesse processo, por tratar de questão de amplo interesse público. E, nesse sentido, dada sua abrangência, a educação ambiental pode ser trabalhada tanto de maneira formal quanto informal.

Sobre a educação ambiental no ensino formal, a Lei nº 9.795/1999 explicita:

 

Art. 9º Entende-se por educação ambiental na educação escolar a desenvolvida no âmbito dos currículos das instituições de ensino públicas e privadas, englobando: I – educação básica: a) educação infantil; b) ensino fundamental e c) ensino médio; II – educação superior; III – educação especial; IV – educação profissional; V – educação de jovens e adultos. (BRASIL, 1999).

 

A lei supracitada prevê a existência de educação ambiental nas diversas etapas, modalidades e níveis de ensino, evidenciando que a questão ambiental deve ser preocupação de todas as instituições educacionais, quer públicas ou privadas.

Aspectos relevantes sobre educação ambiental são encontrados na definição a seguir:

 

É um processo permanente. Trabalha com conhecimentos, atitudes e valores, e não apenas através da transmissão de informações. Envolve a participação individual em processos coletivos, trabalhando desde a perspectiva local até a global. Consegue mudar a visão da pessoa em relação ao local onde vive. Não deve se limitar a um ambiente fechado. Envolve a família e a coletividade. É obrigatória em todos os níveis de ensino, mas não é uma disciplina. Estimula o senso crítico e a compreensão da complexidade dos aspectos que envolvem a realidade em torno de si. Não tem uma proposta fechada de metodologia ou prática. E, na verdade, ainda está em implantação. (BRASIL, 1998, p. 17).

 

A educação ambiental, sob esse viés, não se restringe a questões pontuais, mas aponta para a necessidade da continuidade das ações, as quais precisam ser permeadas de responsabilidade individual e conjunta, com vistas ao alcance do maior número de pessoas possíveis e de resultados cada vez mais eficazes. De acordo com Nikokavouras et al. (2012, p. 206-207):

 

A Educação Ambiental (EA) pode ser dividida em duas grandes tendências: a conservadora, com uma perspectiva tecnocrata e comportamental, valorizando a educação como um agente difusor dos conhecimentos sobre o meio ambiente e indutora de mudanças de hábitos e comportamentos considerados predatórios, tendo, na verdade, a pretensão de defender o sistema vigente. E a transformadora/crítica, que tenta reconhecer o meio ambiente como um espaço de relações socioambientais historicamente configuradas, visando a transformação da sociedade.

 

Para Silva Junior (2008), a educação ambiental deve se constituir em uma ação educativa permanente por intermédio da qual a comunidade tem a tomada de consciência de sua realidade global, do tipo de relações que os homens estabelecem entre si e com a natureza, dos problemas derivados e de ditas relações e suas causas profundas. O autor defende ainda que a execução desse processo deve ocorrer através de práticas que levem à transformação da realidade atual, nas searas sociais e naturais, mediante o desenvolvimento do educando, das habilidades e das atitudes necessárias para tal transformação.

A Proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental do Ministério da Educação postula que:

 

[...] em sua práxis pedagógica, a Educação Ambiental envolve o entendimento de uma educação cidadã, responsável, crítica, participativa, onde cada sujeito aprende com conhecimentos científicos e com o reconhecimento dos saberes tradicionais, possibilitando a tomada de decisões transformadoras a partir do meio ambiente natural ou construído no qual as pessoas se inserem. A Educação Ambiental avança na construção de uma cidadania responsável, estimulando interações mais justas entre os seres humanos e os demais seres que habitam o Planeta, para a construção de um presente e um futuro sustentável, sadio e socialmente justo. (BRASIL, 2010, p. 2).

 

É mister perceber que a educação ambiental visa a despertar valores e responsabilidades que superem ideologias e produzam implicações práticas de mudança de atitude. Segundo Reigota (2010), um dos principais aspectos pedagógicos da educação ambiental é justamente o diálogo entre indivíduos em posições diferenciadas no processo e abertos ao “outro”, ao diferente, aos seus co­nhecimentos, representações, questionamentos e possibilidades.

Nessa esteira, vale acrescentar que a educação ambiental objetiva formar agentes multiplicadores que contribuam ativamente com a socialização, a sensibilização e o ensino, demonstrando a real necessidade dos esforços conjuntos para o alcance de um meio ambiente saudável e sustentável.

 

LEGISLAÇÃO E DOCUMENTOS NORMATIZADORES DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

 

De acordo com a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), em seu artigo 9º, inciso IV, a União se incumbirá de:

 

[...] estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum. (BRASIL, 1996).

 

Nesse sentido, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio tratam sobre a questão da educação ambiental. Contudo, apesar de a vigente LDBEN não tratar especificamente da educação ambiental, a mesma prevê que, na formação básica do cidadão, seja assegurada a compreensão do ambiente natural e social, bem como que os currículos do ensino fundamental e médio devem abranger o conhecimento do mundo físico e natural. Além disso, orienta que a educação superior deve desenvolver o entendimento do ser humano e do meio em que vive; e ainda que a educação tem, como uma de suas finalidades, a preparação para o exercício da cidadania. Todos esses aspectos tratados perpassam pela educação ambiental. Vale lembrar ainda os artigos 26 e 27 da LDBEN, os quais postulam que:

 

Art. 26 Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. § 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil. Art. 27 Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes: I – a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática. (BRASIL, 1996).

 

Desse modo, ao se trabalhar o conhecimento do mundo físico e natural, é plenamente viável apresentar a escassez dos recursos naturais e promover a reflexão sobre as atitudes humanas em relação ao meio ambiente. Além disso, sendo o ambiente um bem comum e o equilíbrio deste um direito de todos, pode-se afirmar que, ao se difundir valores humanos e trabalhar a educação ambiental, concomitantemente se estabelece respeito ao bem comum e à ordem democrática.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais apontam que o currículo, como instrumentação da cidadania democrática, deve contemplar conteúdos e estratégias de aprendizagem que capacitem o ser humano para a realização de atividades nos três domínios da ação humana: a vida em sociedade, a atividade produtiva e a experiência subjetiva, visando à integração de homens e mulheres no tríplice universo das relações políticas, do trabalho e da simbolização subjetiva.

Dentre outros aspectos, os Parâmetros Curriculares Nacionais tratam ainda das quatro premissas apontadas pela Unesco como eixos estruturais da educação na sociedade contemporânea: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver e aprender a ser. A educação ambiental, quando trabalhada de forma efetiva, abrange esses quatro alicerces.

Outro importante aparato legal foi a Resolução nº 2, de 15 de junho de 2012, expedida pelo Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP), que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental a serem observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de educação básica e de educação superior, orientando a implementação do determinado pela Constituição Federal e pela Lei nº 9.795, de 1999, a qual dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental (Pnea). Essas diretrizes estão em consonância com o disposto na alínea “c” do parágrafo 1º e na alínea “c” do parágrafo 2º do artigo 9º da Lei nº 4.024/1961, segundo a redação dada pela Lei nº 9.131/1995, e com os artigos 22 ao 57 da Lei nº 9.394/1996, fundamentados no Parecer do Conselho Nacional de Educação nº 14/2012.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental registram que:

 

[...] o atributo ‘ambiental’ na tradição da Educação Ambiental brasileira e latino-americana não é empregado para especificar um tipo de educação, mas se constitui em elemento estruturante que demarca um campo político de valores e práticas, mobilizando atores sociais comprometidos com a prática político-pedagógica transformadora e emancipatória capaz de promover a ética e a cidadania ambiental; O reconhecimento do papel transformador e emancipatório da Educação Ambiental torna-se cada vez mais visível diante do atual contexto nacional e mundial em que a preocupação com as mudanças climáticas, a degradação da natureza, a redução da biodiversidade, os riscos socioambientais locais e globais, as necessidades planetárias, evidencia-se na prática social. (BRASIL, 2012c).

 

Esse documento norteador, em seu artigo 2º, confere à educação ambiental um sentido amplo, ao considerá-la como uma dimensão da educação e como atividade intencional da prática social, que deve imprimir ao desenvolvimento individual um caráter social em sua relação com a natureza e com os outros seres humanos, visando a potencializar essa atividade humana com a finalidade de torná-la plena de prática social e de ética ambiental. Nos artigos 3º ao 5º, especifica que a educação ambiental:

 

Art. 3º [...] visa à construção de conhecimentos, ao desenvolvimento de habilidades, atitudes e valores sociais, ao cuidado com a comunidade de vida, a justiça e a equidade socioambiental, e a proteção do meio ambiente natural e construído; Art. 4º [...] é construída com responsabilidade cidadã, na reciprocidade das relações dos seres humanos entre si e com a natureza; Art. 5º [...] não é atividade neutra, pois envolve valores, interesses, visões de mundo e, desse modo, deve assumir na prática educativa, de forma articulada e interdependente, as suas dimensões política e pedagógica. (BRASIL, 2012c).

 

O artigo 6º dessas diretrizes complementa que a educação ambiental deve adotar uma abordagem que considere a interface entre a natureza, a sociocultura, a produção, o trabalho e o consumo, superando a visão despolitizada, acrítica, ingênua e naturalista ainda muito presente na prática pedagógica das instituições de ensino. Dentre os objetivos das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental, vale destacar o que preceitua o artigo 1º da Resolução nº 2/2012 do Governo Federal:

II – estimular a reflexão crítica e propositiva da inserção da Educação Ambiental na formulação, execução e avaliação dos projetos institucionais e pedagógicos das instituições de ensino, para que a concepção de Educação Ambiental como integrante do currículo supere a mera distribuição do tema pelos demais componentes; III – orientar os cursos de formação de docentes para a Educação Básica; e IV – orientar os sistemas educativos dos diferentes entes federados. (BRASIL, 2012c).

 

Nesse sentido, a concepção de educação ambiental deve compor o currículo escolar e ocorrer na escola de forma integrada e interdisciplinar. Ainda sobre essa questão, cabe considerar o que trazem os artigos 7º e 8º dessa resolução:

 

Art. 7º Em conformidade com a Lei nº 9.795, de 1999, reafirma-se que a Educação Ambiental é componente integrante, essencial e permanente da Educação Nacional, devendo estar presente, de forma articulada, nos níveis e modalidades da Educação Básica e da Educação Superior, para isso devendo as instituições de ensino promovê-la integradamente nos seus projetos institucionais e pedagógicos. Art. 8º A Educação Ambiental, respeitando a autonomia da dinâmica escolar e acadêmica, deve ser desenvolvida como uma prática educativa integrada e interdisciplinar, contínua e permanente em todas as fases, etapas, níveis e modalidades, não devendo, como regra, ser implantada como disciplina ou componente curricular específico. (BRASIL, 2012c).

 

Fica claro que a presença da educação ambiental nas escolas não se restringe à existência de uma mera disciplina, sendo algo bem mais amplo, pois trata-se de questão ideológica que deve estar arraigada em todas as práticas da escola, inclusive em todas as disciplinas. Para tanto, faz-se necessário que os professores em atividade recebam formação complementar em suas áreas de atuação, com o propósito de atenderem, de forma pertinente, ao cumprimento dos princípios e objetivos da educação ambiental.

Acrescenta-se que, no ano de 2012, o Conselho Nacional de Educação aprovou o Parecer CNE/CP nº 8/2012, que estabelece as Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos, incluindo os direitos ambientais no conjunto dos internacionalmente reconhecidos, e definiu que a educação para a cidadania compreende a dimensão política do cuidado com o meio ambiente local, regional e global.

A Lei nº 9.795/1999, ao tratar da educação ambiental no ensino formal, preceitua que:

 

Art. 10 A educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal. § 1º A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino. § 2º Nos cursos de pós-graduação, extensão e nas áreas voltadas ao aspecto metodológico da educação ambiental, quando se fizer necessário, é facultada a criação de disciplina específica. § 3º Nos cursos de formação e especialização técnico-profissional, em todos os níveis, deve ser incorporado conteúdo que trate da ética ambiental das atividades profissionais a serem desenvolvidas. (BRASIL, 1999).

 

No âmbito dos planos educacionais, a exemplo do Plano Nacional de Educação, instituído através da Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, o qual, ao tratar sobre objetivos e metas tanto do ensino fundamental quanto do ensino médio, explicita que “A educação ambiental, tratada como tema transversal, será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em conformidade com a Lei nº 9.795/99” (BRASIL, 2001).

Em relação ao Plano Estadual de Educação (PEE) e ao Plano Municipal de Educação (PME), a LDBEN, em seu artigo 10, inciso III, incumbe aos estados a responsabilidade de elaborar e executar políticas e planos educacionais em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus municípios. Desse modo, dada a relevância da temática, é interessante que cada estado faça constar em seu PEE, bem como cada município, em seu PME, suas respectivas diretrizes no âmbito da educação ambiental em conformidade com as orientações nacionais.

Outro instrumento importante é o Projeto Político-Pedagógico (PPP). No âmbito institucional, o artigo 12, inciso I, da LDBEN, assegura que os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica. Podemos considerar o PPP sob essa concepção, documento elaborado pelas escolas para nortear, dentre outros aspectos, o fazer pedagógico da instituição. Assim sendo, as diretrizes para a educação ambiental também deverão constar nesse documento como forma de orientar a ação tanto na escola, de modo geral, quanto na sala de aula, de forma específica.

Considerando que o PPP deve ser elaborado e revisado coletivamente com a participação de toda a comunidade escolar, a relevância de se abordar sobre educação ambiental no mesmo se torna ainda maior, uma vez que é uma oportunidade de levantar a discussão e alcançar não só os alunos, mas também seus pais e/ou responsáveis.

Já o artigo 13, inciso I, da LDBEN, versa sobre a participação dos professores na elaboração do mesmo, conforme descrito a seguir: “[...] os docentes incumbir-se-ão de: I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino” (BRASIL, 1999).

Cabe destacar que o PPP vai além da exigência legal, pois é através dele que se definem as normas gerais da escola nos aspectos administrativos e pedagógicos, de modo que toda a comunidade escolar (gestores, docentes, educandos, técnicos educacionais, comunidade e família) especificará como deve ser aquela escola, como se dará sua organização, como será o relacionamento com a comunidade local, além de questões curriculares sobre as disciplinas que serão ofertadas, em conformidade com a legislação vigente, dentre outros aspectos. Ademais, é no PPP que deve estar o direcionamento sobre o processo formativo dos discentes e a avaliação da aprendizagem, bem como questões relacionadas à aprovação ou reprovação dos mesmos. Para Veiga (2004, p. 13):

 

O projeto político-pedagógico busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido explícito, com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é, também, um projeto político, por estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico e com os interesses reais e coletivos da população majoritária. [...] Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo pedagógico, no sentido de se definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade.

 

Não se pode esquecer que o PPP configura-se como um importante instrumento de gestão democrática da escola, visto que é elaborado coletivamente, devendo, portanto, expressar os princípios educativos sobre os quais se desenvolverão as ações pedagógicas, bem como as principais estratégias para proporcionar aos alunos uma aprendizagem significativa e contextualizada. Nesse sentido, o artigo 14 da LDBEN dispõe que:

 

Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. (BRASIL, 1996).

 

Observa-se, nesse contexto, que os sistemas de ensino têm autonomia para definir como se dará a gestão democrática na sua respectiva instância, levando em conta as especificidades de cada um, mas considerando, de forma genérica, os princípios predefinidos de participação coletiva.

 

EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO TEMA TRANSVERSAL INTERDISCIPLINAR

 

No que se refere à interdisciplinaridade, a Resolução nº 3, de 26 de junho de 1998, em seu artigo 8º, inciso I, orienta que:

 

I – a Interdisciplinaridade, nas suas mais variadas formas, partirá do princípio de que todo conhecimento mantém um diálogo permanente com outros conhecimentos, que pode ser de questionamento, de negação, de complementação, de ampliação, de iluminação de aspectos não distinguidos. (BRASIL, 1998b).

 

Para Cavalcanti (2002), citado por Nikokavouras et al. (2012), a escola não deve ter simplesmente a função de inculcar em nossas mentes um punhado de conceitos alheios ao nosso cotidiano, tampouco nos preparar para a vida, mas nos dar condições de articular conceitos científicos/escolares com as práticas diárias.

Questões inerentes à interdisciplinaridade estão incluídas entre os princípios da Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, conforme pode ser observado a seguir:

 

Art. 4º São princípios básicos da educação ambiental: I – o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo; II – a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade; III – o pluralismo de idéias [sic] e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade; IV – a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais; V – a garantia de continuidade e permanência do processo educativo; VI – a permanente avaliação crítica do processo educativo; VII – a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; VIII – o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural. (BRASIL, 1999).

 

A Lei nº 9.795/1999, ao tratar sobre a formação inicial de professores, preceitua, em seu artigo 11, que “[...] a dimensão ambiental deve constar dos currículos de formação de professores, em todos os níveis e em todas as disciplinas”. A partir dessa determinação, depreende-se o caráter transversal da educação ambiental, o qual deve perpassar os diversos espaços e tempos das instituições educativas.

Reigota (1994) defende que a educação ambiental não deve ser limitada a um conteúdo ou disciplina específicos, mas precisa transitar entre as diversas áreas do conhecimento, sendo trabalhada independentemente da idade dos educandos e de acordo com o contexto, possibilitando a mediação e a construção do conhecimento de forma coletiva entre alunos e professores.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio, quando da reforma curricular do ensino médio, propôs-se, numa primeira abordagem, a reorganização curricular em áreas de conhecimento, com o objetivo de facilitar o desenvolvimento dos conteúdos, numa perspectiva de interdisciplinaridade e contextualização.

 

CONCLUSÃO

 

É notório que a educação ambiental percorreu uma longa trajetória, a qual, como política pública, vem se consolidando graças ao aparato legal, que é fruto, principalmente, de um processo de mobilização social. Mas, apesar da existência de diversos documentos norteadores, no aspecto formal a efetivação dessa política ainda não ocorre a contento, carecendo, portanto, que sejam potencializadas ações que gerem resultados mais efetivos, de modo a perpetuar a política de educação ambiental em nosso país.

Com base neste estudo, percebe-se que é patente a necessidade de a educação ambiental ser trabalhada em todos os anos da educação básica, a qual vai além da mera repetição, pois é uma forma de os alunos perceberem que a responsabilidade com o meio ambiente deve estar presente nas ações de todos que integram a instituição, os quais, inclusive, devem servir de multiplicadores, fazendo com que essas ações extrapolem os muros da escola.

Além disso, faz-se mister ampla divulgação das ações e experiências exitosas tanto formal quanto informalmente, com vistas ao fortalecimento de uma rede colaborativa que defenda ativamente essa causa, contribuindo, assim, para que não apenas a temática como também essa prática educativa alcancem a todos.

REFERÊNCIAS

 

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