A influência da graduação no processo de formação de Engenheiros Civis em relação a prÁtica sustentável ambiental



Leandro Costa Fávaro1, Letícia Rodrigues da Fonseca2, Pacielle Dias de Rezende3, Sérgio Ricardo Magalhães4

Mestrando do Curso de Sustentabilidade em Recursos Hídricos da Universidade Vale do Rio Verde (UninCor), Três Corações, MG, Brasil. E-mail: leandrofavaro@bol.com.br

2Docente do Curso de Mestrado em Sustentabilidade em Recursos hídricos da Universidade Vale do Rio Verde (UninCor), Três Corações, MG, Brasil. E-mail: leticia.rodrigues.vga@gmail.com

3Mestranda do Curso de Sustentabilidade em Recursos Hídricos da Universidade Vale do Rio (UninCor), Três Corações, MG, Brasil. E-mail: pacelli.dias@bol.com.br

4Docente do Curso de Mestrado em Sustentabilidade em Recursos hídricos da Universidade Vale do Rio Verde (UninCor), Três Corações, MG, Brasil. E-mail: sergio.magalhaes@unincor.edu.br



Resumo: Este artigo deriva de pesquisa referente a abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, utilizando como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada. Objetivou-se nesse levantamento, compreender a influência exercida pelo processo de formação acadêmica, no nível de graduação, sobre o exercício da profissão de Engenharia Civil, no âmbito ambiental. Especificamente pretende-se (i) conhecer a concepção de sustentabilidade na visão de engenheiros civis; (ii) identificar os direcionamentos fornecidos ao longo da graduação que contribuíram para a formação de um profissional com o comportamento ambiental sustentável e (iii) verificar outras influências, que contribuem para a formação de um profissional com comportamento sutentável. A reflexão torna-se relevante mediante o cenário planetário em que se evidencia a escassez acentuada de recursos naturais, criando novas demandas e necessidades para os envolvidos diretamente no setor construtor. Os resultados obtidos a partir do estudo feito neste artigo nos indica , em princípio, que a influência acadêmica exercida ao longo da graduação de Engenheiros Civis a respeito da temática Sustentabilidade Ambiental é pouco efetiva, o que permite afirmar que a temática necessita de outros novos estudos.



Palavras-chave: Sustentabilidade Ambiental, Engenharia Civil, Formação profissional.



Abstract: This article derives from a qualitative research, of the case study type, using as a data collection instrument the semi-structured interview. The objective of this survey was to understand the influence exerted by the academic formation process, at the undergraduate level, on the exercise of the Civil Engineering profession, in the environmental scope. Specifically, it is intended to (i) know the concept of sustainability in the view of civil engineers; (ii) identify the directions provided during the graduation that contributed to the formation of a professional with sustainable environmental behavior and (iii) verify other influences, which contribute to the formation of a professional with sustainable behavior. Reflection becomes relevant through the planetary scenario in which there is a marked scarcity of natural resources, creating new demands and needs for those directly involved in the construction sector. The results obtained from the study made in this article indicate, in principle, that the academic influence exerted during the graduation of Civil Engineers regarding the subject Environmental Sustainability is not very effective, what allows to affirm that the theme needs of other new studies .



Keywords: Environmental Sustainability, Civil Engineering, Professional Training.







  1. Introdução



De acordo com Mikhailova (2004) a sustentabilidade passa a fazer parte efetiva das discussões e reflexões globais em meados de 1970, e desde então, vem sofrendo grandes mudanças, passando a ser compreendida, de forma consensual, na perspectiva transdisciplinar, referindo-se a relação equilibrada entre as dimensões econômicas, sociais e ambientais. Esta perspectiva, por sua vez, reflete o conceito do Tripé da Sustentabilidade desenvolvida por John Elkington, que foi amplamente aceita e incorporada por todos os setores da sociedade.

A efetivação dessas discussões e reflexões, proporcionou o aparecimento de novos desafios e a necessidade de adaptações às mais variadas atividades humanas, inclusive ao setor da construção representado pela área da Engenharia Civil.

Esste setor, por sua vez, foi impactado de tal forma que, em 1997, na Finlândia, apresentou-se o conceito de Construção Sustentável como, como sendo aquela que pode manter moderadamente ou melhorar a qualidade de vida e harmonizar-se com o clima, a tradição, a cultura e o ambiente na região, ao mesmo tempo em que conserva a energia e os recursos, recicla materiais e reduz as substâncias perigosas dentro da capacidade dos ecossistemas locais e globais, ao longo do ciclo de vida do edifício (ARAÚJO, 2002).

De acordo com Yemal, Teixeira e Nääs (2011) a Engenharia Civil é uma das mais importantes atividades para o desenvolvimento econômico e social e por outro lado comporta-se ainda como grande geradora de impactos ambientais, quer seja pelo consumo de recursos naturais, pela modificação da paisagem, quer seja pela geração de resíduos.

Nessa perspectiva, espera-se que o Engenheiro Civil seja um profissional consciente das demandas planetárias tendo tido a oportunidade de vivenciar um processo de formação acadêmica significativo no que condiz com sua estruturação crítica e reflexiva a respeito das interações humanas com o meio ambiente.

Para Montibeller-Filho (2008) é necessário ao longo da formação profissional atual um olhar abrangente, apoiado na multidisciplinaridade e capaz de começar por incluir a relação do ser humano consigo mesmo, com o outro e com seu meio.

Dessa forma, o presente estudo propõe-se a compreender a influência exercida pelo processo de formação acadêmica, no nível de graduação, sobre o exercício da profissão de Engenharia Civil, no âmbito ambiental e de forma específica pretende: (i) conhecer a concepção de sustentabilidade na visão de engenheiros civis; (ii) identificar os direcionamentos fornecidos ao longo da graduação que contribuíram para a formação de um profissional com o comportamento ambiental sustentável e (iii) verificar outras influências, que contribuem para a formação de um profissional com comportamento sutentável. Portanto, o estudo inicia-se a partir do histórico da sustentabilidade, prossegue através de reflexões sobre a Educação Ambiental superior, especificamente na formação do Engenheiro Civil e finaliza-se com a analise e tabulação dos dados obtidos através da entrevistas semi-estruturadas aplicadas a 10 engenheiros civis.





  1. Sustentabilidade



Percebe-se que o conceito de sustentabilidade é algo recente e temseu ponto de partida reflexivo e epistemológico a partir da realização da conferência de Estocolmo (UN Conference on the Human Environment) , ocorrida em 1972, momento em que os participantes explicitaram a necessidade de reaprender a viver utilizando os recursos naturais disponíveis no planeta.

Santos(2016) ressalta que era visível a existência de duas posições de debates durante este momento, uma que vislumbrava os recursos naturais de forma abundante e a outra com uma percepção catastrófica. Evidenciando-se a não concordância social a respeito do tema .

Porém, durante alguns anos, a temática continuou em pauta mantendo-se com o caráter construtor. E somente em 1987, consolidou-se com o termo “desenvolvimento sustentável”, que foi conceituado através do Relatório de Brundtland, como sendo aquele que busca as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender suas próprias necessidades.

A definição proposta, tornou-se a principal referência para fundamentar estudos e pesquisas acerca da sustentabilidade na época. Mas, conforme Mikhailova (2004) afirma, o conceito de sustentabilidade passou a ser interpretado em um sentido excessivamente amplo, fazendo com que muitas vezes, fosse utilizado para justificar qualquer atividade, desde que ela reservasse recursos para as gerações futuras.

Durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) a sustentabilidade foi abordada a partir de uma nova perspectiva, assumindo prioridade em relação as questões ambientais. Nesse momento, já se tinha clareza da importância de dimensionar o efeito de todas as atividades humanas em relação ao impacto ambiental decorrente.

Mas foi em 2002, durante o evento denominado Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, ocorrido em Joanesburgo, na África do Sul, que evidenciou-se o conceito de sustentabilidade aceito até os dias atuais. Passou-se a compreender desenvolvimento sustentável como sendo a procura pela melhoria da qualidade de vida de todos os habitantes do mundo sem aumentar o uso de recursos naturais além da capacidade da Terra.

Para Mikhailova (2004) o conceito apresentado trata-se da definição mais concreta do objetivo de desenvolvimento atual, por ressaltar a existência de fatores que limitam tal desenvolvimento e podem prejudicar as gerações futuras.

Em 2011, o pesquisador John Elkington, divulga para comunidade cientifica a teoria denominada Tripé da Sustentabilidade, fruto de estudos iniciados em 1994, através da publicação do artigo intitulado “The triple bottom line: What is it and how does it work?“. O qual reiterou o conceito de sustentabilidade, apresentando-a a partir de três pilares: econômico, ambiental e social.

Ainda segundo o mesmo autor , o pilar Econômico visa a criação de empreendimentos viáveis, atraentes para os investidores; o Ambiental, busca compreender as relações de processos com o meio ambiente impedindo a inadequada utilização dos recursos naturais; e o Social , preza pela manutenção de condições de sobrevivência para toda a sociedade.

Oliveira, et al. (2012) afirma que estes três pilares se relacionam de tal forma que a interseção entre dois pilares resulta em viável, justo e vivível, e dos três, resultaria no alcance da sustentabilidade, conforme mostrado na Figura 1.



F igura 1 - Sustentabilidade e as suas dimensões



















Fonte: Adaptado de Alledi Filho et al. (2003).





Mediante estas considerações, Pereira (2007) define sustentabilidade organizacional como aquela que gera riquezas e patrimônio para os acionistas preservando o ambiente e preocupando-se com a vida de todos aqueles que interagem socialmente com ela.

Assim sendo, torna-se evidente que o conceito de sustentabilidade passou por inúmeras transformações, mas sempre levando em consideração suas características transdisciplinares e a preocupação de se estabelecer adequadas relações entre o homem e o meio ambiente.





  1. Sustentabilidade e Engenharia Civil



De acordo com Marques et al (2017) a construção civil enfrenta grandes desafios, sendo um deles a busca por maiores níveis de qualidade e eficiência em seus processos produtivos e no consumo dos recursos naturais. Isso em decorrência do alto impacto ambiental que pode ser desencadeado a partir de suas demandas.

Ajayi et al (2017) destaca que a indústria da construção civil está entre os setores-alvo com maior necessidade de comprometer-se com as questões relacionadas a sustentabilidade.

Araújo (2009) chama a atenção para que a sustentabilidade esteja presente em todas as etapas do ciclo de vida de um empreendimento, desde sua concepção, projeto, construção e manutenção até sua demolição, considerando sempre os três pilares da sustentabilidade: econômico, social e ambiental.

Diante disso, , surge o conceito de construção sustentável, definido por Idhea (2003) como um sistema construtivo que promove alterações conscientes no entorno, de forma a atender as necessidades de edificação e uso do homem moderno, preservando o meio ambiente e os recursos naturais, garantindo qualidade de vida para as gerações atuais e futuras.





  1. Educação Ambiental no Ensino Superior



A expressão Educação Ambiental apresenta-se de forma evidente nas últimas décadas e se refere ao conjunto de situações pedagógicas que visam a formação do ser humano em prol da harmonização das relações entre homem e meio ambiente. Dornfeld (2016) afirma que Educação Ambiental é o nome que historicamente se convencionou dar às práticas educativas relacionadas à questão ambiental.

A concepção de Educação Ambiental foi sendo construída gradativamente se misturando aos debates e reflexões destinados a compreensão dos problemas ambientais, de tal forma, que ao se compreender o seu histórico, depara-se com as principais conferências e eventos ocorridos mundialmente. Dornfeld (2016) confirma essa percepção afirmando que a história da Educação Ambiental é entrelaçada com a história do Movimento Ambientalista Mundial. Observe o quadro 1 adaptado de Dornfeld (2016).



Quadro 1 - Histórico das principais Conferências Internacionais referentes às questões Ambientais e à Educação Ambiental.

Ano

Cidade/País / Conferências

Enfoque



1972

Estocolmo/ Suécia

Conferência de Estocolmo

- Políticas de gerenciamento do ambiente - reconhecimento da Educação Ambiental como elemento crítico para combater a crise ambiental



1974

Haia/ Holanda

I Congresso Internacional da Ecologia

- uso indiscriminado dos Clorofluorcarbonos – CFCs




1975

Belgrado/ Iugoslávia

Conferência de Belgrado

- princípios e orientações para o Programa Internacional de Educação Ambiental – PIEA



1977

Tbilisi/ Geórgia

Conferência de Tbilisi

- conceito de meio ambiente - conceito de Educação Ambiental




1992

Rio de Janeiro/ Brasil

Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD)- Rio-92

- combate ao analfabetismo ambiental - reconhecimento da insustentabilidade do modelo econômico vigente



1997

Thessaloniki/ Grécia

Conferência da Tessalônica

- papel crítico da educação - conscientização para se alcançar a sustentabilidade



2002

Johannesburgo/ África do Sul

Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável ou Rio+10


-balanço de dez anos da Agenda 21 - reafirmação da insustentabilidade do modelo econômico vigente - problemas associados à globalização




2012

Rio de Janeiro/Brasil

Rio + 20

-a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável

Fonte : Educação Ambiental: reflexões e desafios no Ensino Superior



Tais informações levam a acreditar que todas as discussões relacionadas a Educação Ambiental inicia-se de forma mais efetiva e estruturada a partir da conferência de 1972, em Estocolmo.

Porém, foi em 1977, durante a realização da Conferência de Tbilisi, ocorrida na cidade de Tblisi, na Georgia, que se definiu o conceito de Educação Ambiental. Santos (2017) confirma que este evento concentrou a discussão dos problemas do meio ambiente imbricada ao processo educativo e interdisciplinar como instrumento de conscientização, tendo em vista a participação ativa e responsável de toda a sociedade.

Na Declaração da Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental (1977) ficou explicitado que a



Educação Ambiental tem por finalidade criar uma consciência, comportamentos e valores com vistas a conservar a biosfera, melhorar a qualidade de vida em todas as partes e salvaguardar os valores éticos, assim como o patrimônio cultural e natural, compreendendo os sítios históricos, as obras de arte, os monumentos e lugares de interesse artístico e arqueológico, o meio natural e humano, incluindo sua fauna e flora, e, os assentamentos humanos”.



Mas conforme os debates ambientalistas foram prosseguindo e evoluindo, o conceito de Educação Ambiental também foi sendo adaptado e modificado, abrindo possibilidades para a concretização de ações a partir de diferentes abordagens pedagógicas.

Em 1999, o governo brasileiro cria o “Programa Nacional de Educação Ambiental” (PRONEAM) (BRASIL, 1999). Santos (2017) percebe que se trata de um documento pautado em uma perspectiva crítica e emancipatória, passando a vislumbrar a Educação Ambiental como sendo o principal instrumento de gestão ambiental de nosso país.

Neste momento oficializa-se o debate acadêmico fazendo com que as instituições de ensino passassem a ser compreendidas como corresponsáveis pelo processo de formação críitica do sujeito em prol da adequada relação com o meio ambiente. Cabe ressaltar que essa percepção se torna relativa a todos os níveis de ensino, inclusive no ensino superior.

Dessa forma, em 2002, o Conselho de Educação e a Câmara de Educação Superior instituem as diretrizes curriculares nacionais do curso de Graduação em Engenharia , resolução CNE/CES 11, de 11 de março, apresentando no artigo 4º , “avaliar o impacto das atividades da engenharia no contexto social e ambiental” como sendo um dos objetivos de formação do engenheiro. Para isso, apresenta dentro das temáticas obrigatórias o tópico referente a Ciências do Ambiente.





  1. Metodologia



Considerando os objetivos propostos neste artigo, optou-se por realizar uma pesquisa de abordagem qualitativa. Tal abordagem, apresentou-se como a mais adequada devido a necessidade de apresentar-se um enfoque exploratório e descritivo (GODOY, 1995)

Para Berg (2001), a pesquisa qualitativa responde perguntas pela investigação de ambientes sociais. Ela possibilita ao pesquisador compartilhar das compreensões e percepções dos indivíduos que habitam esses ambientes, como interpretar o comportamento das pessoas e o significado que elas atribuem às situações vivenciadas.

O recorte empírico do estudo foi constituído por 10 Engenheiros Civis pertencentes a cidade de Varginha seguindo o critério da aleatoriedade. A escolha dos engenheiros foi realizada a partir do sorteio, utilizando-se nomes de profissionais vinculados ao CREA. A seguir o quadro 2 traz algumas características dos entrevistados.



Quadro 2 – Características dos entrevistados



Identificação do Engenheiro Civil

Idade

Ano de Formação

Instituição de Ensino

A

60

1981

Pública

B

59

1982

Pública

C

62

1982

Particular

D

57

1986

Particular

E

50

1991

Particular

F

42

1998

Particular

G

41

1999

Particular

H

31

2014

Particular

I

30

2015

Publica

J

26

2016

Publica

L

25

2016

Particular

Fonte : Os autores.



Adotou-se como método de coleta de dados a entrevista semi-estruturada, definida por Queiroz(1988) como sendo uma técnica que supõe uma conversa continuada entre informante e pesquisador e que deve ser dirigida por este de acordo com seus objetivos. Para manter uma estrutura básica em todas as entrevistas, optou-se por uma perspectiva baseada em 4 perguntas que são: Como você compreende e avalia o seu processo de formação acadêmica referente a graduação? Ao longo de sua graduação percebe a existência de debates e reflexões relacionadas a sustentabilidade? Como você entende ou conceitua sustentabilidade? Qual ou quais os fatores influenciaram na sua concepção sobre sustentabilidade?

As entrevistas foram realizadas a partir de ligações telefônicas, gravadas por aplicativo específico, call recorde entre os dias 1 a 15 de novembro de 2017 . A sequencia de procedimentos utilizados pelo pesquisador foi: (i) entrou em contato com o entrevistando se apresentando e esclarecendo tratar-se de um processo de investigação cientifica; (ii) verificou o aceite de participação do entrevistado; (iii) informou que a conversa seria gravada; (iiii) direcionou as perguntas baseadas em uma lista prévia de 10 questões e (iiiii) finalizou agradecendo a participação do entrevistado e explicitando qual seria seu objetivo mediante as respostas obtidas. Posteriormente os dados foram transcritos, pelo próprio autor, o qual utilizou-se de um editor de texto, word.

Dessa forma, pode-se realizar uma leitura cuidadosa das transcrições com o intuito de identificar trechos que respondam indiretamente aos objetivos propostos pela pesquisa.





  1. Apresentação e discussão dos resultados



Buscou-se compreender a influência exercida pelo processo de formação acadêmica, no nível de graduação, sobre o exercício da profissão de Engenharia Civil, especificamente em relação às questões de sustentabilidade voltadas para a esfera ambiental.

A seguir, para melhor organização da pesquisa, cada categoria analisada será comentadas separadamente.



6.1 Processo de formação acadêmica de Engenheiros Civis



Os engenheiro civis entrevistados para este estudo têm entre 25 e 60 anos de idade. Desses, 70% estão no mercado de trabalho a mais de 18 anos e os outros 30% foram absorvidos pelo mercado de trabalho nos últimos 3 anos. Porém, mesmo existindo essa variação quanto a idade, ao período de formação e empregabilidade, todos os engenheiros civis avaliaram o processo de formação acadêmico vivenciado, durante a graduação, de forma positiva e consideravelmente satisfatório, afirmando que a graduação possibilitou o adequado exercício profissional. Como argumento comprobatório, apresentam o fato de terem inserido-se no mercado de trabalho logo após a finalização da graduação. Sendo que essa percepção corresponde a todos os entrevistados independente da formação ter sido efetivada em instituição educacional publica ou privada.



Fiz um curso com duração de 5 anos com dois períodos de estudos a partir do 3º ano. Foi um curso muito bom, com professores atuantes na área e matérias bem direcionadas a aplicabilidade no campo. (Engenheiro Civil F)

As questões teóricas abordadas na universidade me deu condições para exercer a profissão plenamente. Gostei da minha graduação. (Engenheiro Civil L)



Entretanto, o grupo com maior experiência de atuação no mercado compreende a gradução como uma etapa significativa de um processo de formação mais amplo e complexo. Afirmam ter sentido a necessidade de buscar continuidade nos estudos mesmo já estando exercendo a profissão.



Depois que me graduei, fiz uma pós-graduação, mas entrei no mercado de trabalho antes, quando fiz a pós já exercia a profissão. Eu considero que o curso me deu condições plenas de exercer a atividade. (Engenheiro Civil G)

A graduação é apenas uma ferramenta para ir ao mercado, mas depois é necessário um aprofundamento. A gradução é importante mas necessita de complementação , tanto é que fiz outros cursos de complementação. Ela deu abertura mas não é suficiente. (Engenheiro Civil E)



Tais afirmações possibilitaram verificar que a existência de um distanciamento temporal, relacionado a finalização da graduação, associado as demandas sociais apresentadas no contexto real do exercício profissional fazem com que o engenheiro civil sinta a necessidade de retomar a sua formação acadêmica. Percebe-se que ao logo da formação vivenciada, os desafios apresentados no universo acadêmico representam demandas sociais de um determinado momento histórico, que não são efetivamente os desafios que o profissional encontrará no futuro.



Nós formamos em uma época muito difícil. Era um período em que não tínhamos tecnologia, nossos recursos eram muito limitados. O máximo que tínhamos era uma calculadora HP com programado. A gente tinha que estudar a engenharia de uma forma quase que empírica e tradicional, era tudo feito a mão, um projeto estrutural era feito a mão. Levava seis meses para realizar um projeto que hoje se faz em dois dias . A gente fazia calculo de estrutura metálica, cada nó da estrutura era quase um dia de cálculo, sem falar das outras. Hoje é diferente, você usa os softwares. (Engenheiro Civil C)





6.2 A sustentabilidade Ambiental no processo de formação acadêmica de Engenheiros Civis



Identificou-se que 100% dos Engenheiros entrevistados reconhecem não terem tido contato significativo com temáticas relacionadas as discussões Ambientais, sendo indiferente o período destinado a conclusão do curso. Quando afirmam ter vivenciado essas reflexões, descrevem processos pontuais e limitados, sempre associados a discussões realizadas a partir de outras disciplinas compreendidas como técnicas, assumindo um papel meramente de plano de fundo, ou como cursos de extensões desvinculados do contexto maior de formação.



Não existinha nada sobre sustententabilidade. Eu entrei em 96 e formei em 99, ao longo dessse período esse tema foi falado muito superficialmente e não houve nenhuma disciplina que falasse disso a fundo. Nenhuma disciplina especifica, tratava de meio ambiente quando falava de barragem em geologia, quando se estudava alagamento de uma grande área , mas nada profundo. (Engenheiro Civil G)

Não existia debate sobre sustentabilidade na minha graduação. O que foi moderno na nossa época parte de computação, mas quanto a questão de meio ambiente, sustentabilidade não mesmo. (Engenheiro Civil A)

Não tivemos abordagem sobre sustentabilidade, não foi algo que víamos muito não. Não não teve nenhuma disciplina com essa abordagem . tínhamos algumas palestras na semana da engenharia. Ai tínhamos algumas oficinas, mas como matéria e discussão, poderia ate ser ofertada como optativa, mas realmente não teve. (Engenheiro Civil J)

Estudei sustentabilidade voltada para o meio ambiente quanto tivemos disciplinas como hidrologia, saneamento e área ambiental. (Engenheiro Civil E)

A sustentabilidade não era uma disciplina presente. O que se tinha nessa área era saneamento básico e hidrologia , e que mais. Era isso que tínhamos na faculdade. Não tínhamos curso de extensão, nada que abordasse o meio ambiente mais a miúdo. (Engenheiro Civil C)



Porém, todos admitiram a importância do debate para o processo de formação do engenheiro civil e descreveram situações vivenciais que demonstraram o engajamento em situações que necessitam dessa reflexão, ou seja, verificou-se a existência da demanda social sobre a temática.



Eu fui abordar o meio ambiente de forma diferenciada, como te falei quando trabalhei com empresas que solicitaram o acompanhamento da rede de esgoto. Aí tomei conhecimento do tratamento aeróbio, que é o tratamentomento feito por retenção de objetos, agregação de química, essas coisas. Já no ano de 2000. (Engenheiro Civil C)

O pessoal ta mudando muito, essas demandas , algumas pessoas nos procura solicitando isso, percebo que já existem clientes com essa demanda. Mas o profissional da engenharia civil como já não ve muita coisa na graduação, não sai com a cabeça focada nisso. (Engenheiro Civil I)



Outro aspecto relevante, é que muitas vezes as ações desenvolvidas possuem aspectos legalistas e não refletem um processo de conscientização e mobilização ambiental de fato.



Nada se faz sem se pensar no meio ambiente, minha dinâmica é essa, eu já participei de enésimos projetos. Só para ter uma ideia, eu tive um caso de projeto meio grande que era referente a uma usina de biodisil, aqui na região. A gente passa por um processo, como é que vou te explicar? Um empreendedor quer economizar da maneira que der. Ele não quer ser empactado por esse pessoal do meio ambiente . as vezes o cara quer fazer as coisas , ou não quer por economia, mas esquece que está dando um tiro no pé, entendeu. O meio ambiente é a célula mater , é onde a gente vive . (Engenheiro Civil C)

A minha percepção em relação a sustentabilidade foi feita a partir da concepção que tenho do dia-a-dia . Eu trabalhei em uma cimenteira, então a cimenteira tem muita preocupação, não uma preocupação legitima, mas medo de ser multada. Legitima que eu digo é preocupação de não degradar. Mas ela tem preocupação de não ser altuada multada. Então ela procura seguir a legislação para não ser multada. (Engenheiro Civil F)





6.3 O conceito de Sustentabilidade por parte dos Engenheiros Civis



Percebe-se que o conceito de sustentabilidade entre os engenheiros civis, não se refere a algo consensual, sendo possível identificar duas categorias distintas. Uma, composta por 40% dos profissionais, que considera importante visualizar a sustentabilidade dentro de uma dimensão macro e complexa, afirmando tratra-se de dimensões interelacionadas.



Sustentabilidade, quando você fala é algo bem amplo, pode ser na área hidríca, na florestal, e na área urbana. Precisamos falar de sustentabilidade relacionada a uma determinada área. A sustentabilidade não associa-se apenas a aspectos ambientais. Podemos pensar a sustentabilidade em diferentes dimensões. (Engenheiro Civil E)



Enquantoo segundo grupo percebe a sustentabilidade voltada para os aspectos ambientais, não desconsiderando a possibilidade de existência de outras dimensões. Mas, atribuindo relativo valor as questões relacionadas aos recursos naturais.



6.4 FATORES DE INFLUêNCIA NA formação do conceito de sustentabilidade por parte dos engenheiros Civis



Nota-se que 100% dos engenheiros civis tenha atribuído a formulação do conceito de sustentabilidade a situações diversas não estando relacionadas diretamente ao universo acadêmico.



realmente a discussão sobre sustentabilidade era bem obscuro . Percebo , vendo os estudantes atuais que essa discussão ocorre. Mas acho que ainda não é suficiente para preparar o profissional para atuar de forma sustentável. (Engenheiro Civil D).



Foi comum entre os entrevistados, 60%, referir-se a influência exercida pela família no processo de conscientização e mobilização, principalmente nas questões tangíveis a sustentabilidade ambiental. Relatam experiências vivenciadas associando pessoas e sentimentos que consideravam importantes e agradáveis.



a minha relação com a sustentabilidade e meio ambiente é familiar, não tive muita essa discução na universidade. Lembro que na unifersidade uma coisa que me incomodou muito era com relação a madeira que fazia as formas, o que acontecia com elas? A mesma coisa com relação a água, era normal chegar na obra e encontrar tambor de 200 litros, e o pedreiro não tava nem ai , a agua ficava ali derramando, e eu sempre fui preocupada com isso, sabe separar aquela madeira que sobrou , para utiliza-la no fogão de lenha. Meu pai era médico e sempre passava essa questão familiar. (Engenheiro Civil A)



Mas, outro aspecto relevante, com incidência de 30%, foi a demanda mercadológica, o que fez com que Engenheiros Civis sentissem a necessidade de buscar por conhecimentos específicos para resolver situações apresentadas pelos clientes.



mudou , o pessoal ta mudando muito, essas demandas , algumas pessoas nos procura solicitando isso, percebo que já existem clientes com essa demanda. Mas o profissional da engenharia civil como já não vê muita coisa na graduação, não sai com a cabeça focada nisso. (Engenheiro Civil A)



E com menor intensidade, aparece uma pequena parcela, 10%, que relata influência das percepções diárias incentivadas pelos debates sociais.



atribuo minha percepção em relação ao que anda acontecendo no mundo, é ver o que ta acontecendo se não fizermos nada, as coisas irão desandar. (Engenheiro Civil L)





7 Considerações Finais



Mediante o estudo realizado, identificou-se a existência de debates ambientais legítimos que vem sendo ampliados socialmente, por meio de tratados e conferências, apontando a necessidade de um processo educacional específico, denominado Educação Ambiental, que vise a formação de cidadãos críticos e engajados na busca por uma sociedade sustentável.

Porém, o cenário de formação do engenheiro Civil não demonstra a efetiva preocupação do meio acadêmico ao atendimento dessas demandas Ambientais. Percebe-se a temática adentrando no universo acadêmico da engenharia de forma muito tímida e pouco significativa.

É natural, que engenheiros que tenham se formado a mais tempo apresentem menor contato com o debate a respeito da sustentabilidade. Porém, percebe-se que isso não se configura, quando profissionais formados nos últimos três anos relatam desconhecerem ou terem tido poucas informações a respeito do tema.

De forma geral, este estudo aponta indícios para que se entenda que a temática da sustentabilidade ainda não foi incorporada a graduação de engenharia civil com o grau de efetivação e importância necessário ao momento histórico que vivenciamos.

É preocupante perceber que os profissionais se sentem preparados para o pleno exercício da profissão, mesmo reconhecendo a ineficácia de debates relativamente importantes a respeito da sustentabilidade. Isso comprova, que os engenheiros civis estão sendo formados ao longo do período pesquisado a partir de uma concepção tecniscista que manten-se mesmo diante o crescimento do debate a respeito da Educação Ambiental, que visa uma formação humanística com foco nas relações planetárias.

Percebe-se ainda, hierarquicamente, que a família, o mercado de trabalho e os debates social exercem papeis fundamentais, efetivando e possibilitando a construção de uma identidade engajada nos aspectos sutentáveis por parte dos engenheiros civis.

Em suma, a universidade precisa assumir de forma mais efetiva e contundente o seu dever social enquanto corresponsável por essas discussões. Não é possível ausentar-se do debate, ou minimizar o grau de importância destinado a temática ambiental.

Propoem-se a partir dos resultados obtidos a continuação da investigação, buscando compreender a forma com que os docentes do curso de engenharia civil visualizam a incorporação das discussões e reflexões sobre a sustentabilidade no processo de formação do futuro profissional.



8 bibliografia





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