DESIGN E SISTEMAS PRODUTIVOS: DO CAPITALISMO INDUSTRIAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Maria Teresa Miceli1; Maria Geralda de Miranda2; Katia Eliane S. Avelar4

1 Mestranda pelo Programa de Mestrado Profissional Multidisciplinar em Desenvolvimento Local do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: maria.teresa.miceli@gmail.com

2 Pós-doutora em Políticas Públicas e Formação Humana, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, (UERJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Professora Titular e Pesquisadora do Programa de Mestrado Profissional Multidisciplinar em Desenvolvimento Local do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: mariamiranda@globo.com

3 Doutora em Ciências pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Professora Titular e Pesquisadora do Programa de Mestrado Profissional Multidisciplinar em Desenvolvimento Local do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: katia.avelar@gmail.com.

Resumo

Para compreender a atuação do design na atualidade, é necessário conhecer sua trajetória histórica, que é influenciada por diversos contextos decorrentes de evoluções técnico cientificas e alterações socioculturais e econômicas. Atualmente, a sociedade passa por uma mudança paradigmática decorrente da complexidade antagônica entre o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental. Os pilares para sustentabilidade originaram novas demandas para o escopo de atuação de design, antes centrado em projetos de produtos físicos, agora direcionado para projetos interdisciplinares visando o desenvolvimento de produtos sustentáveis, racionalizando o uso da matéria prima, aprimorando os modos de produção e reduzindo as emissões de poluentes e geração de resíduos. Podemos destacar, o papel do design como agente impulsionador em projetos para valorização de recursos locais. Portanto, este artigo propõe uma reflexão sobre o percurso histórico do design, entrelaçando e considerando fatores e fenômenos que influenciaram na finalidade de atuação desta área na contemporaneidade.

Palavras-chave: Design, Sistemas Produtivos, Desenvolvimento Sustentável.

Abstract

In order to understand the actuation of the design in the actuality, it is necessary to know its historical trajectory, that is influenced by diverse contexts resulting from scientific technical evolutions and socio-cultural and economic changes. Today, society undergoes a paradigm shift due to the antagonistic complexity between economic development and environmental preservation. The pillars for sustainability have given rise to new demands for the scope of design activity, which initially focused on physical product projects, is now directed to interdisciplinary projects aimed at developing sustainable products, rationalizing the use of raw materials, improving production methods and reducing pollutant emissions and waste generation. We can also highlight the role of design as a driving force in related projects for the valorization of local resources. Therefore, this article proposes to make a reflection on the history of design, interlacing and considering factors and phenomena that influenced the purpose of this area in contemporary times.

Keywords: Design, Productive Systems, Sustainable Development.

Introdução

Embora a Revolução Industrial do início do século XIX e o advento da globalização no século XX tenham impulsionado a evolução das ciências e das tecnologias, observa-se impactos negativos nos ecossistemas naturais. Desde então, a humanidade convive com o antagonismo entre o desenvolvimento de uma sociedade técnico científica e a preservação do meio ambiente.

A Revolução Industrial tornou mais perceptível a capacidade do homem de alterar o ambiente. As consequências da exploração em larga escala de matérias primas naturais em benefício do desenvolvimento da sociedade, podem ser caracterizadas pela poluição, esgotamento de recursos não renováveis e a degradação do meio ambiente. Todos esses fatos constituem uma ameaça à qualidade de vida das atuais e futuras gerações, bem como para a própria sobrevivência da humanidade e do próprio planeta.

Este conflito entre o homem e o meio ambiente tem ganhado importância nas últimas décadas, envolvendo aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos. O desenvolvimento sustentável apresenta-se como uma solução de integração entre os interesses sociais e econômicos e as questões de cunho ambiental, que constituem a tríade da sustentabilidade, que são inerentemente interdependentes.

Para esta integração é necessário romper paradigmas, repensar no modelo de vida da atual sociedade do século XXI. A este respeito, Leff (2010) afirma que a sustentabilidade é uma maneira de repensar a produção e o processo econômico.

Sob esta perspectiva, é essencial a participação de diversos segmentos sociais, e podemos ressaltar o papel do design no desenvolvimento de produtos sustentáveis, com elaboração de estratégias que compreendem a racionalização do uso da matéria prima e formas de produção, amenizando as emissões de poluentes e geração de resíduos.

A relação entre Design e Sistema de Produção

É complexo definir um conceito para o design. A história do design é influenciada por diversos contextos históricos decorrentes de evoluções técnico cientificas e alterações socioculturais e econômicas. Portanto, a história do design, só pode ser compreendida se associada ao processo de industrialização e urbanização.

As relações de produção, de organização do trabalho e de mercado, enquadram a atividade de design numa relação de interdependência. De acordo com Ono (2006), design envolve planejamento e seleção de pensamentos e valores, já o designer, é corresponsável em estabelecer as relações entre os artefatos e as pessoas e suas implicações na sociedade.

O design é uma área que tem origem no surgimento da indústria. É no momento histórico da Revolução Industrial no início do século XVIII, com a implantação de processos de fabricação mecânica, que se concretiza a transição da manufatura artesanal, elaborado e processado por uma pessoa, para um processo de fabricação envolvendo mais de um indivíduo (CARDOSO, 2008).

A Revolução Industrial apresentava como base o conceito de progresso. As novas formas de produção, aliada à propagação da ideologia de progresso juntamente ao desenvolvimento técnico e científico, estabeleceram um padrão para os produtos, em que a forma deve estar em concordância com a função a qual se destina. Esse conceito é a definição clássica do funcionalismo em design.

O final do século XIX até meados do século XX foram períodos que o mundo vivenciou uma série de avanços na tecnologia. As pesquisas científicas propiciaram avanços tecnológicos para aperfeiçoamento industrial. Entre elas, a proposta de gestão científica da empresa moderna apresentada por Frederyk Taylor em 1880, metodologia de produção onde o trabalhador seria treinado para desempenhar uma determinada tarefa no menor tempo possível durante o processo produtivo. Com a criação da linha de montagem, o tempo de produção reduz drasticamente, tornando possível uma produção em massa (TENÓRIO, 2011).

Rapidamente esta lógica contagia outros setores produtivos e, devido à necessidade de um projeto que otimizasse a produção nas etapas de execução, identifica-se a atuação de um profissional de design.

O design tem sido fundamentalmente, desde o século XVIII, relacionado à criação e desenvolvimento de um produto, estando, portanto, pertinente ao sistema de produção e consumo em massa e, consequentemente, ao crescimento da economia capitalista.

No século XX, depois da Segunda Guerra Mundial, ocorre a Terceira Revolução Industrial, responsável pela integração entre a ciência, tecnologia e produção. Todos os conhecimentos gerados em pesquisas científicas e tecnológicas são aplicados no sistema de produção industrial.

Durante os séculos XIX e XX os sistemas de produção foram se alterando conforme a tecnologia foi evoluindo, adequando-se ao surgimento de novas matérias primas, novas fontes de energia.

As novas condições desenvolvem-se a um ritmo impactante, operando mudanças socioculturais e econômicas profundas na sociedade vigente, surgindo novos interesses e valores, originando a cultura do consumo, acentuada pela globalização no século XX, onde as distâncias e obstáculos, que antes separavam países e regiões, não representam mais os mesmos desafios de outrora. É o mundo e a sociedade interconectados.

Para atender aos novos hábitos da população, recursos materiais eram explorados descomedidamente. Nesse contexto, Ono (2006) afirma que o processo de globalização, destituído de postura ética e moral, tem promovido o desequilíbrio da natureza e o surgimento de problemas sociais, culturais e econômicos.

As falhas e omissões dos sistemas de produção e suas consequências devastadoras em relação aos problemas ocorridos no meio ambiente, despertaram críticas a este sistema e à mentalidade consumista. Destas críticas, uma nova consciência social surge, inicialmente voltada para a questão ambiental e mais tarde ampliada para questões como justiça e equidade social. De acordo com Leff (2008), a persistência em relação a este sistema aos poucos vem cedendo lugar a uma nova ordem, ditada pela sustentabilidade, que busca o equilíbrio entre eficiência econômica, justiça social e atenção ecológica.

Esta nova consciência social estabelecida reflete sobre a prática profissional da área de design, sobre as possibilidades e limites de uma intervenção projetual para a redução dos problemas ambientais existentes. O design, no século XXI, deve desempenhar um papel que está além do campo de atuação em um sistema de produção, contribuindo em estratégias que reduzem as emissões de poluentes e geração de resíduos, além de limitar o emprego de matérias primas.

Nessa perspectiva, o design amplifica sua atuação, contribuindo no desenvolvimento de uma sociedade orientada e reeducada para novas formas de viver, equalizando as injustiças sociais e respeitando os limites dos recursos do planeta.

Design e Sustentabilidade

O conceito de desenvolvimento sustentável foi definido em 1987 pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento formada pela ONU (Organização das Nações Unidas). Sob a direção da médica Gro Harlem Brundtland, a comissão elaborou o relatório intitulado “Nosso Futuro Comum”, que traz o conceito de desenvolvimento sustentável como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades atuais sem comprometer a capacidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades (ONU,1987).

Como consequência às recomendações feitas pela Comissão, a ONU instituiu a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que colocou o assunto diretamente na agenda pública. Em 1992, a “Cúpula da Terra”, como ficou conhecida, realizada no Rio de Janeiro, adotou a “Agenda 21’, um diagrama para a proteção do nosso planeta e seu desenvolvimento sustentável. Na Agenda 21, os governos delinearam um programa de ações direcionadas à proteção e renovação dos recursos ambientais. As áreas de ação incluíam combater o desmatamento, prevenir a poluição da água e do ar e promover uma gestão segura dos resíduos tóxicos, entre outras (ONU, 1992).

Vinte anos depois, em 2012, é realizada, novamente no Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, gerando o documento “O futuro que queremos”, que assinala a erradicação da pobreza como o maior problema a ser enfrentado e a prioridade de promover o desenvolvimento social equitativo e inclusivo, definindo os três pilares para o desenvolvimento sustentável.

Nesse sentido, se torna necessário incorporar ainda mais o desenvolvimento sustentável em todos os níveis, integrando seus aspectos econômicos, sociais e ambientais e reconhecendo os vínculos que existem entre eles, a fim de para alcançar um desenvolvimento sustentável em todas as suas dimensões.” (ONU, 2012, p.1)

A partir dos pilares para um desenvolvimento sustentável, evidencia-se novos paradigmas de consumo e comportamento, mudanças culturais imprescindíveis que precisam ocorrer a curto, médio e longo prazo para que se alcance a integração entre os interesses sociais e econômicos e as questões ambientais.

A sustentabilidade deve estar presente ao longo do sistema, em todos os níveis e percorrer pelas mais diversas áreas do saber, em uma visão totalizadora e não mais compartimentada, de acordo com proposto pelo sociólogo e filósofo Morin (2000, p.46).

Não se trata de abandonar o conhecimento das partes pelo conhecimento das totalidades, nem da análise pela síntese; é preciso conjugá-las. Existem desafios da complexidade com os quais os desenvolvimentos próprios de nossa era planetária nos confrontam inelutavelmente.

A necessidade de buscar padrões de produção e consumo sustentáveis, exigem capacidade de abstração, inovação e flexibilidade nos projetos de design. Design é uma atividade interdisciplinar, que combina conhecimento de diversos campos e disciplinas para obter resultados específicos, contribuindo para o desenvolvimento de soluções para múltiplas questões atuais ou futuras.

Diante deste cenário, o desafio para o design no mundo contemporâneo, segundo Krucken (2008), está no desenvolvimento de soluções para questões complexas e a busca de novas perspectivas para responder as necessidades da sociedade contemporânea, considerando a sustentabilidade para o sistema de produção e de consumo, de forma conjunta e sustentável.

Sob esse enfoque, a atuação dos designers pressupõe-se uma transformação contínua na elaboração do próprio conhecimento.

Cabe ao designer intervir na realidade com atos projetuais, superando as dificuldades e não se contentando apenas com uma postura crítica frente à realidade e persistindo nessa posição. Afinal, projetar, introduzindo as mudanças necessárias, significar ter a predisposição de mudar a realidade sem se distanciar dela (BONSIEPE, 2011, p. 37)

O designer, neste amplo campo interdisciplinar, tem a função em promover ações que podem favorecer a diminuição do impacto causado pelos processos produtivos com a implantação de métodos sustentáveis; estimular a adoção de um comportamento mais adequado às questões ambientais por parte da sociedade, pois cabe a este profissional, também, o convencimento do cliente e do mercado a favor da sustentabilidade; colaborar em projetos relacionados a valorização local, aprimorando processos produtivos, criando condições de trabalho e geração de renda, diminuindo desigualdades e revalorizando as pessoas.

Design Sustentável

Design e sustentabilidade são temas da sociedade contemporânea e, portanto, inseridos no capitalismo. Entretanto, o design sustentável não está em oposição a este tipo de sistema econômico. O design sustentável é uma vertente responsável com o presente e com o futuro, promovendo assim, uma produção industrial ligada ao mercado, mas também ligada à vida.

Segundo Kazazian (2005) esta vertente compreende os aspectos ambientais, sociais e econômicos com o objetivo de suavizar as deteriorações geradas pelo crescimento econômico. Assim, um projeto para ser intitulado sustentável precisa ser ecologicamente correto, ser economicamente viável, e culturalmente aceito, ou seja, os três princípios da sustentabilidade.

Observa-se, portanto, uma transformação na finalidade do design, com forte tendência para desenvolvimento de projetos e nos modos de organizar e de conduzir processos de forma conjunta e sustentável.

A sustentabilidade é um assunto abrangente e demanda a participação de diversos profissionais e integração de diversas áreas do conhecimento. O design sustentável é uma área que requer uma investigação profunda sobre materiais e processos. É essencial dar prioridade às matérias primas de fontes renováveis e ter uma visão sistêmica do percurso que os materiais ou produtos percorrerão visando à redução de impactos que possam transgredir o conceito de sustentabilidade. É importante observar que projetos sustentáveis nem sempre alcançam o nível de impacto zero na natureza, entretanto, podem ao menos, reduzir os índices de agressão.

Na atividade do design, a procura por soluções sustentáveis, inicialmente, foi focada na minimização do impacto ambiental de materiais e processos, e posteriormente, no projeto de ciclo de vida do produto, evoluindo para uma forma mais ampla, integrada ao design para sustentabilidade ambiental, como apontam Manzini e Vezzoli (2008).

Uma das questões em relação ao desenvolvimento de produtos sustentáveis é quanto à durabilidade, desde a sua concepção até o seu descarte, incluindo, também, a gestão de todo o processo. Ainda de acordo com Kazazian (2005), a durabilidade compreende uma gestão da obsolescência, que pode ser objetiva, motivada pelos avanços tecnológicos ou subjetiva, motivada pela tendência do mercado, ditada pela ‘moda’. Ampliar a duração da vida de um produto, com qualidade, é uma estratégia positiva para uma empresa.

A estratégia sistêmica para associar design e sustentabilidade por meio da análise de ciclo de vida dos produtos (Lyfe Cicle Design), deve considerar os comprometimentos ambientais vinculados a todas as fases de produção que vão desde a pré-produção, produção, distribuição, fase de uso e descarte. Este desenvolvimento de projeto de produto exige intercâmbio do designer com outros profissionais em todas as etapas do ciclo de vida do produto ou serviço. Segundo Manzini e Vezzoli (2008), este processo apresenta diversos aspectos que incorpora:

  1. Redução de recursos – minimizar o uso de materiais, evitando sobras de material; utilização de sistema com menor gasto de energia.

  2. Materiais de baixo impacto ambiental – utilização de materiais menos poluentes, não tóxicos ou de produção sustentável

  3. Otimização da vida dos produtos – desenvolvimento de produtos que durem mais tempo; facilitar a reparação e reutilização; minimizar o número de partes e componentes a fim de gerar resíduos em menor escala.

  4. Reutilização/ reaproveitamento – produção de objetos feitos a partir da reutilização ou reaproveitamento de outros objetos, fazendo com que ele possa sobreviver ao seu ciclo de vida.

  5. Modulariedade – criação de objetos em peças evitando a substituição integral do produto, gerando menos resíduo.

Para Kazazian (2005), neste sistema de produção, o meio ambiente é tão importante quanto à execução técnica, visto que, além de buscar a redução das consequências negativas ao meio ambiente, procura conservar as qualidades de uso do produto, como por exemplo, funcionalidade e desempenho.

Esta estratégia adotada por empresas não se justifica somente pela preocupação com o meio ambiente, é uma questão também econômica. As empresas precisam criar uma estrutura para o seu crescimento e expansão sem comprometer o meio ambiente, pois o setor empresarial tem que considerar as consequências apontadas pelo declínio da disponibilidade de recursos ambientais. Os recursos naturais não podem ser empregados de forma irracional e, sob este aspecto, é necessário que as indústrias encarem a crise ambiental como uma questão real, que poderá afetar sua capacidade de produção e sobrevivência. Conforme Manzini e Vezzoli (2008), é um fator relevante para o equilíbrio econômico das empresas.

Baseado neste foco, torna-se cada vez mais importante que o setor empresarial adote uma gestão sustentável ou ambiental. Entretanto, cabe lembrar também que, para esta modalidade de gestão, é indispensável a implantação de uma complexa infraestrutura material e processual. É fundamental reorganizar o processo produtivo, com desenvolvimento e inovação de produtos, racionalização quanto ao uso de recursos materiais e energéticos. Sob o ponto de vista econômico, estes procedimentos geram redução de custos e probabilidades de melhores perspectivas de mercado interno e externo.

A gestão sustentável ou ambiental requer, igualmente, estratégias administrativas quanto à demanda do mercado consumidor, legislação ambiental e certificações ambientais. Certamente, estes procedimentos evidenciará a empresa dos demais concorrentes, estabelecendo um diferencial competitivo.

O conceito de desenvolvimento sustentável demanda uma mudança de paradigma. Neste aspecto, percebe-se que as empresas, do ponto de vista empresarial globalizado, estão considerando a importância da questão ambiental, propiciando novos modelos de produção, rompendo com a concepção de incompatibilidade entre meio ambiente e desenvolvimento. De acordo com Leff (2001), a sustentabilidade surge como uma necessidade de restaurar a natureza na teoria econômica e nas práticas do desenvolvimento, com práticas ecológicas de produção que assegurem o futuro e a sobrevivência da humanidade.

Atualmente, a sociedade, que é ao mesmo tempo consumidora, está cada vez mais ciente das repercussões causadas no meio ambiente, tornando-se mais atenta às ações promovidas pelas indústrias. Este atual comportamento da sociedade, sinaliza a definição de novo perfil de consumo e de novos parâmetros ligados à cultura consumista. Este novo perfil de consumidor que desponta, é o consumidor consciente. O consumidor consciente é aquele que leva em conta o meio ambiente, a saúde humana e animal, as relações justas de trabalho, ao escolher os produtos que compra.

Além disso, o consumidor consciente valoriza as iniciativas de responsabilidade socioambiental das empresas, dando preferência às companhias que mais se empenham na construção da sustentabilidade em seu sistema de produção, caracterizando-se mais um fator de competitividade entre as empresas.

O profissional de design não é somente responsável pela na implantação de um sistema de produção e elaboração de um produto ecologicamente viável em uma empresa. Faz parte de seu escopo de atuação, também, a criação de uma identidade visual e material promocional. Esse ponto de vista é reforçado por Kazazian (2005, p. 55) ao alegar que “[...] cada vez mais, para convencer, um produto deve ter uma história a contar, informar sobre seu uso, satisfazer uma necessidade real e garantir que não será poluidor no futuro”.

É neste campo que se materializa a função de transformador de opiniões, concebendo propostas sociais e influenciando atitudes para promover a conscientização em relação às questões ambientais. Para Manzini e Vezzoli (2008), não se trata somente de informar a importância do problema ambiental. Trata-se, sim, de transmitir com clareza mensagens à sociedade para que, deste modo, possa ampliar sua capacidade de reconhecer os efeitos de suas escolhas e praticar as alternativas.

Neste contexto, o design pode influenciar as escolhas do consumidor, divulgando e informando princípios de sustentabilidade, promovendo o consumo consciente. Sob essa perspectiva, o design passa a ser coparticipante em disseminar informações e ideias mais sustentáveis.

O design como agente de transformações pode contribuir, igualmente, em projetos relacionados a valorização local, aprimorando processos produtivos, criando condições de trabalho e geração de renda, diminuindo desigualdades e revalorizando as pessoas. Esta linha de ação é vinculada ao design social. A proposta do design social é humanizar a atividade projetual, associando aspirações, necessidades, habilidades, recursos locais e a conexão entre pessoas. De acordo com Ono (2006), o design pode estabelecer uma prática emancipatória, participando no desenvolvimento de produtos que promovam o aperfeiçoamento, a auto expressão e a soberania dos indivíduos e das sociedades, inclusive daqueles que vivem em condições de pobreza e à margem dos mercados econômicos.

Design Social

Um exemplo de projetos de design com foco no social ocorre em comunidades onde a produção artesanal é uma alternativa para aqueles que se encontram à margem da sociedade, empregando e gerando renda para várias famílias.

O artesanato é considerado como uma atividade com potencial para a inclusão social e o desenvolvimento sustentável local. Mediante a esta constatação, órgãos governamentais e não governamentais propiciam a formação de cooperativas populares de artesãos com objetivo de promover a inclusão social. O objetivo é favorecer, por intermédio da fabricação de produtos, o desenvolvimento local, observando-se o potencial de valorização cultural e da identidade, geração de renda e diminuição dos impactos sociais provocados pelo desemprego.

Neste complexo processo, a colaboração de um designer possibilita criar uma nova perspectiva aos produtos, agregando valor ao objeto artesanal com um design mais competitivo e mais adequação ao mercado. A finalidade de um profissional de design na produção artesanal é desenvolver e aprimorar os processos produtivos, estimulando a elaboração de produtos de qualidade, a otimização da manufatura e viabilização de distribuição e venda da produção, tornando a atividade mais rentável.

O sistema de produção artesanal é constituído por etapas e procedimentos executados pelo artesão que vão desde a extração da matéria prima ao acabamento final do produto. Intervenções neste sistema produtivo buscam melhorar a qualidade dos produtos, trazer melhorias as condições de trabalho e tornar mais eficiente os procedimentos executados. Outro foco abordado nas intervenções é a orientação para uma produção artesanal por intermédio de manejo sustentável dos recursos naturais, preservando, assim, o meio ambiente.

Existem diversas estratégias no desenvolvimento de projeto com o objetivo de inclusão social. Entre elas, há a realização de estudos sobre identidade local, em que o designer procura por referências histórico culturais da comunidade para incorporar ao projeto do objeto que será produzido.

Desenvolver novos produtos artesanais de referência cultural significa valer-se de elementos que reportem o produto ao seu lugar de origem, seja por meio do uso de certos materiais e insumos, ou técnicas de produção típicas da região, seja pelo uso de elementos simbólicos que façam explícita menção às origens de seus produtores ou de seus antepassados. Um produto deve vir acompanhado de algo que o contextualize, que o localize no tempo e no espaço, agregando, assim, valor cultural e histórico.

A qualidade de um produto artesanal está diretamente relacionada à forma de produção e ao tipo de matéria prima utilizada. Geralmente os processos produtivos são primitivos e requerem uma análise de atualização, porém, deve-se respeitar e preservar a técnica, pois ela representa a tradição e a cultura da comunidade local.

Para aprimorar os processos produtivos, estimulando a elaboração de produtos de qualidade, são elaboradas oficinas de capacitação para as pessoas envolvidas no processo, com foco quanto ao cuidado da extração da matéria prima, sua transformação, armazenamento e no desenvolvimento de uma ideia que transformará esta matéria prima em um produto.

Para Bonsiepe (2011), a pesquisa em design consiste em poder fornecer subsídios que melhorem a prática projetual. Assim, as experiências, construídas a partir do aprendizado e da troca de conhecimentos junto a grupos produtivos podem estimular a capacidade do designer em buscar novas soluções projetuais, contribuindo com alternativas inovadoras que beneficiem a sociedade como um todo.

A estrutura de um projeto de que envolve design social, compreende uma visão multidisciplinar e colaborativa, na qual a autoria do produto não é apenas do designer, mas sim de todos os envolvidos no processo de produção. Nesse processo de interferência, o artesão deve ser visto como protagonista e não coadjuvante e, sendo um processo coletivo e colaborativo, não há, portanto, liderança e sim uma parceria ou co-design.

Sob a perspectiva da sustentabilidade, este compromisso de inclusão social, capacitação e valorização do artesanato local, promovido através da utilização equilibrada do design na valorização dos produtos, aproximando o artesão com o mundo globalizado. Esta mediação estabelecida é importante para que as comunidades artesãs adquiram confiança em executar o trabalho artesanal e possam dar seguimento num novo trabalho, possibilitando independência financeira, credibilidade e a consciência dos valores.

Considerações Finais

Não se pode negar que a trajetória do design sempre esteve associada à história da civilização e ao desenvolvimento econômico, principalmente quanto ao processo de industrialização e urbanização. As relações de produção, organização do trabalho e de mercado, enquadram a atividade de design numa relação de interdependência. Verifica-se que o design tem seu escopo de atuação adequando-se de acordo com os preceitos e necessidades de um modelo de desenvolvimento vigente.

Entretanto, o design, no século XXI, deve desempenhar um papel que está além do campo de atuação em um sistema de produção. O atual desafio para o design no mundo contemporâneo está no desenvolvimento de soluções para questões complexas e a busca de novas perspectivas para responder as necessidades da sociedade contemporânea, onde a questão da sustentabilidade é um fator de extrema importância para assegurar a qualidade de vida para as gerações futuras.

A partir do reconhecimento que para um desenvolvimento sustentável é necessário a integração dos aspectos econômicos, sociais e ambientais, evidencia-se novos paradigmas de produção, consumo e comportamento. Tais mudanças culturais são imprescindíveis, que precisam ocorrer a curto, médio e longo prazo.

A necessidade de buscar padrões de produção e consumo sustentáveis, exigem capacidade de abstração, inovação e flexibilidade nos projetos de design. Design é uma atividade interdisciplinar, que combina conhecimento de diversos campos e disciplinas para obter resultados específicos, contribuindo para o desenvolvimento de soluções para múltiplas questões atuais ou futuras.

Define-se, portanto, para o design o papel de mediador entre o consumo e a produção, procurando soluções que garantam a reorientação do consumo, na busca de uma redução material e energética efetiva, mas ao mesmo tempo garantindo a sustentabilidade social gerada pela produção, preterida por muito tempo pela lógica econômica.

Nesse sentido, o design é visto como um grande colaborador nesse processo rumo à sustentabilidade, pois esse pode atuar tanto para as empresas, quanto para a mudança de mentalidade dos consumidores. Nas empresas, o design poderá contribuir significativamente para o aumento da competitividade por meio do desenvolvimento de produtos que levem em consideração as várias etapas do ciclo de vida, gerando economia energética, de matérias-primas, entre outros. Em relação aos consumidores, o design poderá estimular novos conceitos de qualidade de vida, influenciando diretamente os padrões de consumo por meio do desenvolvimento de projetos de produtos mais conscientes. No entanto, as mudanças em direção à sustentabilidade somente poderão ocorrer por meio do encontro entre a percepção da sociedade sobre a crise ecológica e a reflexão crítica sobre a sociedade industrial e de consumo

O consumo consciente é uma das etapas do processo para se atingir um desenvolvimento mais sustentável. É possível perceber o envolvimento de no mínimo três setores no consumo responsável: a indústria, o usuário e o design. A participação da indústria se dá principalmente em suas ações que devem ser refletidas, não só em relação aos aspectos ambientais, mas também nos sociais. Além disso, podem contribuir para tornar o usuário mais consciente, através do exemplo de suas próprias atitudes.

O usuário se apresenta com a responsabilidade de pensar no seu ato de compra, e suas consequências para a sociedade como um todo. Já o designer tem a responsabilidade de projetar produtos e/ou serviços que atendam a expectativa do usuário causando o menor impacto possível. Portanto, o conjunto desses fatores torna o ato de consumo mais consciente e responsável diminuindo os efeitos nocivos do mesmo para o planeta.

Ainda sob a perspectiva da sustentabilidade, incluímos o compromisso com inclusão social, onde o design pode contribuir, igualmente, em projetos relacionados a valorização local, aprimorando processos produtivos, criando condições de trabalho e geração de renda, diminuindo desigualdades e revalorizando as pessoas.

No mundo globalizado do século XXI, compete ao design combinar os elementos existentes de forma original e trazer soluções inovadoras, desenhando não só novos produtos, mas também novos contextos e novas modelos de vida.

Referências

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