revista educação ambiental em ação 32

Educação Ambiental na APARU (Área De Proteção Ambiental  Recuperação Urbana) do Manguezal do Jequiá – Rio de Janeiro

 

Rosa Maria Lopes Ferreira Robertson  Educadora, Esp. Educação Ambiental PUC-Rio

Celso Sánchez

Biólogo, MSc. Ecologia Social e Dr. Educação

celso.sanchez@hotmail.com

 

Rua Antonio Basílio n.162/COB Tijuca, Rio de Janeiro – RJ

CEP-20511- 190 Tel-021-7852-2725

 

Resumo:

Este tem como objetivo analisar a importância da educação ambiental no contexto do Centro de Educação Ambiental (CEA) de uma unidade de conservação urbana da cidade do Rio de Janeiro: a Área de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana (APARU) do Manguezal do Jequiá, localizado no bairro da Ilha do Governador. A partir de pesquisa bibliográfica e com suporte de pesquisa de campo de caráter qualitativo, buscou-se recolher subsídios que permitissem a compreensão da participação do CEA e sua programação de educação ambiental para a recuperação ambiental de uma área degradada de manguezal onde está situada a primeira colônia de pescadores do país, uma comunidade que sofre as conseqüências da perda da qualidade ambiental e que através de mobilização social vêm procurando implementar ações de educação ambiental contextualizadas as demandas locais.

 

1. INTRODUÇÃO

 

            A Lei nº 6938/81 dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente os seus fins e mecanismos de formulação e aplicação. No Art. 2º, declara em seu décimo princípio: “Educação Ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para a participação ativa na defesa do meio ambiente”. O histórico de unidades de conservação nos faz reconhecer a sempre presente dicotomia sociedade x natureza que ao ser importada para o Brasil se manteve e formou um paradigma transportado para o sistema de gestão das mesmas, dificultando o próprio processo de conservação e agravando a exclusão social (DIEGUES, 2004).

O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), em sua proposta de 1992, refletia mais uma vez uma visão conservadora estando aquém do que estava em debate em outros países para resolver o caso das populações tradicionais residindo no entorno ou em áreas de proteção (DIEGUES, 2004, p.118).

 “O fato de atribuir significado a remanescentes das áreas naturais, como é o caso de Unidades de Conservação, pela oposição da natureza à cultura, fez com que permanecesse por muito tempo ausente na gestão dessas unidades territoriais temas como cidadania, participação. É preciso superarmos esta dicotomia e buscarmos a sustentabilidade e a democracia nos processos de conservação da natureza.” (LOUREIRO, 2004).

O Decreto nº 5758 aprovado em 2006, instituiu o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP), visa a implantação do SNUC, trazendo outra perspectiva sobre a questão sociedade x natureza, uma mais integradora. Como exemplo de uma das diretrizes do plano:

“XX – promoção da participação, da inclusão social e do exercício da cidadania na gestão das áreas protegidas, buscando permanentemente o desenvolvimento social, especialmente para as populações do interior e do entorno das áreas protegidas”.

Observa-se que a legislação brasileira apresenta os direitos aos cidadãos, mas não é o suficiente para garantir estes direitos. Existe uma série de fatores que interferem em sua implementação. Na prática, a Educação Ambiental (EA) sofre de dificuldades como a falta de profissionais, o apoio financeiro, a falta de trabalhos que fazendo a análise do que está sendo realizado permitam a sistematização do processo no caminho de uma produção contínua e em busca de aprimoramento (PEDRINI, 2006). A busca é pela transformação para que as Políticas Públicas brasileiras sejam efetivos instrumentos de inclusão social.

O presente trabalho procura analisar as atividades de EA encontradas na Área de Preservação Ambiental e Recuperação Urbana do Jequiá – APARU do Jequiá, seus agentes (educadores ambientais) e seus produtos, desde sua criação. Assim, o objetivo deste trabalho é procurar compreender as possibilidades e desafios a implementação da EA em uma unidade de conservação urbana no município do Rio de Janeiro.

Vale ressaltar que esta unidade de conservação conta desde 1999, com um Centro de Educação Ambiental (CEA) que procura desenvolver atividades educativas com programação regular para a comunidade do entorno, bem como para as escolas da região e das redondezas. Neste sentido, este trabalho também procura analisar as práticas educativas realizadas neste espaço a fim de recolher subsídios para entender a importância dos CEAs na consolidação de programas de EA voltados a recuperação ambiental.

A APARU do Jequiá, foi criada pelo Decreto Municipal nº 12250 de 31/08/1993, possui 145,34 ha, está situada na Ilha do Governador. Apesar de não ser dos maiores da Baía de Guanabara, o manguezal do Jequiá deve sua importância a dois fatores: a grande riqueza de biodiversidade e a comunidade que o cerca. A área de estudo é formada pelo estuário do Rio Jequiá e sua microbacia, o complexo florestal do Morro do Matoso e as áreas ocupadas pela colônia de pesca Z-10, pela marinha e seu entorno. A área de 4200 metros quadrados de manguezal é local de trabalho de pescadores, a primeira colônia de pesca a ser fundada no Brasil, em 1920, tem hoje uma comunidade de aproximadamente quatro mil pessoas, além de fazer fronteira com uma área de Mata Atlântica e abrigar espécies de mangue e outras. Ali está localizado o Centro de Educação Ambiental da APARU do Jequiá - CEA Jequiá que foi criado pela Secretaria de Meio Ambiente do Rio de Janeiro – SMAC.

            A área sofreu vários impactos ambientais como lançamento de esgoto e de lixo, aterro de algumas áreas, atingindo o ecossistema e prejudicando a atividade de pesca da comunidade. Tendo em vista a problemática local questiona-se: houve a participação da comunidade de pescadores na criação da área de preservação ambiental? Qual o principal público alvo das práticas de EA ali realizadas: visitantes ou a comunidade? Quais as características das atividades de EA que eram praticadas? Como o CEA colabora com a recuperação ambiental de uma unidade de conservação urbana?

Tomazello (2000) ressalta em seu trabalho as dificuldades encontradas por diversos autores em determinar quais as repercussões causadas por atividades de EA por serem os processos educativos bastante diversos e pela abrangência de temas e objetivos. Assim sendo, a importância deste trabalho está em ao analisar as atividades de EA especificamente na APARU do Jequiá buscando relacionar os produtos ditos de EA, com questões como as ligadas às comunidades do entorno e sua inclusão, o uso das áreas pelos visitantes, no sentido de constituir um programa consistente de recuperação ambiental através da EA.

Neste sentido, vale ressaltar que PEDRINI (2006) comenta como são escassos os trabalhos de análise e/ ou avaliação de práticas de EA ligados a unidades de conservação e recuperação ambiental. Conforme o autor: “esta idéia naturalista falha por não provocar a mudança de opiniões, hábitos e condutas nos visitantes de modo geral” (PEDRINI, 2006, p.13).

 

2. Área de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana - APARU DO JEQUIÁ

APARU é categoria exclusiva do Município do Rio de Janeiro, criada pela Lei Complementar 16/92 (Plano Diretor da Cidade). A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC), é o órgão central do Sistema Municipal de Gestão Ambiental. À SMAC estão vinculadas as Fundações RIO ZOO e Parques e Jardins. A APARU do Jequiá está situada na Ilha do Governador, sendo constituída pelo manguezal e estuário do Rio Jequiá e sua microbacia, o complexo florestal do Morro do Matoso e as áreas ocupadas pela colônia de pesca Z-10 e pela Marinha do Brasil. Apesar de não ser dos maiores da Baía de Guanabara, o manguezal do Jequiá deve sua importância a dois fatores: a grande riqueza de biodiversidade e a comunidade que o cerca. A colônia de pescadores Z-10 é a primeira a ser fundada no Brasil, em 1920, tem hoje uma comunidade de cerca de quatro mil pessoas.

            No século XVIII a Ilha do Governador passou a ser assim chamada por servir como refúgio para o Governador Geral da província. Com matas, fauna abundante e grande piscosidade, era um local privilegiado para a prática da caça e belas praias até os anos 70 do século XX. Tinha valor econômico, idealizado pelas classes médias e altas como um bairro nobre do Rio de Janeiro. Estas características foram preservadas por mais tempo porque não havia ponte ligando a Ilha ao continente. A presença das bases da marinha e aeronáutica, do aeroporto antes Galeão, hoje Tom Jobim, mantém importantes características como áreas protegidas. Atualmente é representante de uma ocupação complexa: convivem num mesmo espaço militares, comunidades carentes, pescadores, funcionários públicos (BORGES, 2007).

O nome Jequiá tem origem Tupi e quer dizer “armadilha para peixe”. A nascente do rio Jequiá é no interior da Ilha numa área de nome Guarabu e desemboca no saco do Jequiá. É o rio mais expressivo da Ilha e auxiliava na drenagem das águas na época das chuvas das regiões mais baixas. Ao longo dos anos seu leito foi refeito com laje de concreto em alguns pontos e, canalizado de forma fechada em vários outros. A partir de 1999 a APARU do Jequiá conta com um Centro de Educação Ambiental criado por decreto pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro.

 

2.2 CENTRO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL (CEA)

Pode-se afirmar que ainda são escassos os trabalhos com referência temática sobre os Centros de Educação Ambiental (CEAs) no Brasil. As primeiras publicações oficiais seriam do Ministério de Educação e Cultura sobre as propostas de fundamentação e as diretrizes para a implantação de CEAs no Brasil:

            Os centros de educação ambiental não seriam escolas ecológicas, mas sim centros geradores ou captadores de idéias e propostas. (...) A proposta é (...) utilizar o ensino formal que já temos, não criar nenhuma disciplina com uma abordagem inter ou multidisciplinar e abrir a porta da escola (...) para envolver a comunidade (...) Nesse sentido, a idéia dessa proposta pedagógica do Centro de Educação Ambiental seria utilizar o programa curricular oficial e transcender o banco escolar, quer dizer, envolver o saber popular e  complementar com a proposta curricular. Envolvendo o saber popular e o saber científico, o centro seria catalisador e difusor  desses conhecimentos” ( BRASIL, 1992, p.92, apud SILVA, 2004, p.15).

            Esse texto destaca uma concepção marcadamente formal da EA e praticamente desconsidera as experiências educação não formal no campo da EA. Em trabalho da Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, intitulado “Programas Núcleos Regionais de Educação Ambiental” (1998), os concebe:

“como fóruns de integração e participação (...)  para otimização dos recursos materiais, humanos e financeiros, tendo em vista o desenvolvimento de projetos e ações de EA que estimulem o exercício da cidadania, configurando-se, portanto, como um instrumento de ação e mecanismo para o fluxo de informações ambientais”  (SÃO PAULO, 1998, p. 4 apud SILVA, p. 15).

            Em seu trabalho SILVA (op.cit) utilizou trabalhos e projetos de CEAs da Espanha para defini-los. De um documento intitulado de Estratégia Andaluzia de CEA ele destaca o trecho que sintetiza as características destes espaços:

“Sob o termo CEA’s se englobam todas aquelas iniciativas que, contando com instalações próprias ou cedidas e equipes pedagógicas especializadas, desenvolvem programas específicos de educação ambiental relacionados com o entorno onde se localizam” (2003, p. 73, apud SILVA p.16).

O autor chega a uma concepção de CEA como sendo composta de quatro dimensões importantes: espaço e equipamentos do entorno; equipe educativa; projeto político pedagógico e estratégia de sustentabilidade. A primeira refere-se às instalações físicas, a possibilidade de ter salas para vídeos, apresentações e a área do entorno que pode ser uma área natural preservada, uma área degradada ou “mesmo distante de uma área natural seja capaz de perceber um espaço em seu entorno rico do ponto de vista pedagógico e “vivo” do ponto de vista socioambiental”.

            A segunda no caso de um projeto deve antever como deve ser formada a equipe, se multidisciplinar, com quantos elementos, com que autonomia, se há a necessidade de um chefe. A terceira o Projeto político Pedagógico deveria ser mais do que um documento norteador com planejamento e informações sobre o CEA deveria ser encarado como um processo em permanente construção. A quarta e talvez a mais complexa seja a estratégia da sustentabilidade por se relacionar com diversos campos do conhecimento: conceitual, administrativo (gestão e planejamento), social e político. Deve explicitar ainda as estratégias que vai utilizar para que os seus objetivos sejam alcançados nas suas diferentes dimensões: ecológica, econômica, política, social e cultural.

            Viola (1992) apud SILVA (2004, p. 26) subdivide o ambientalismo no Brasil em duas fases. A primeira denominada Fase Fundacional que vai de 1971 a 1986, caracterizada pela denúncia e criação de consciência pública sobre os problemas de deterioração socioambiental. A segunda seria a Fase Recente indo de 1988 a 1991, caracterizada pela ação multissetorial, pelo processo de institucionalização dos grupos ambientalistas, e pelos esforços em articular a problemática da proteção ambiental com a do desenvolvimento econômico.

            Utilizando o trabalho citado e dialogando com outras informações ele subdivide o histórico dos CEA’s no Brasil em quatro fases. A primeira indo de 1976 a 1987 seria a Fase Fundacional, seguida da Fase de “Oficialização” de 1988 a 1992. A terceira de 1993 a 1997 seria a Fase de Efetivação, seguida da Fase Atual de 1998 a 2003.

            A Fase Fundacional coincide com a fase em que no Brasil está ocorrendo o “surgimento de um campo ambiental” como descreve Carvalho ao comentar sobre o ambiente político da EA na época (CARVALHO, 2001, p.146).

            A Fase de “Oficialização” inicia com o parecer 226/87 do MEC citado no início deste trabalho, com a Nova Constituição, com o Primeiro Encontro Nacional de Centros de Educação Ambiental promovido pelo MEC em Foz do Iguaçu no Paraná em 1992, e os desdobramentos advindos da ECO-92.

Nos documentos as propostas de oficialização dos CEAs aparecem referindo-se a projetos pilotos e Silva utiliza-se de uma citação de PEDRINI na qual este questiona que o MEC ao apresentar suas propostas de EA (política de ação), estas estavam centradas na instituição de CEAs a nível nacional e que oito destes eram distantes das grandes cidades a dificuldade, qual seria a EA que fariam? A provocação colocada por PEDRINI encontra respaldo por não se encontrar na literatura referências a esses projetos pilotos (SILVA, 2004, p.41).

            O autor cita novamente o trabalho de Viola para quem existia uma dicotomia, um bissetorialismo, entre o setor público e o civil representado pelas ONGs e Associações. Na Fase de “Efetivação” surgem as cobranças de outros setores da sociedade civil como o empresarial e o industrial (multissetorialismo) no final da década de 80 e início da de 90. Servem como marcos dessa fase a formalização dos projetos piloto de CEAs em 1993, propostos no ano anterior (provavelmente um dos desdobramentos da ECO-92), a primeira versão do Programa Nacional de Educação Ambiental (PRONEA) em 1994, o III e IV Fórum de EA em 1994 e 1997 respectivamente.

            A Fase Atual começa a ser delineada com a instituição e lançamento do Programa de Núcleos Regionais de EA (NREAs) do estado de São Paulo em 1998.  Iniciando realmente com as discussões a cerca da aprovação de uma Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA 9795/99) no Congresso Nacional.  Verifica-se uma explosão de novas iniciativas de CEAs. As mudanças a nível temático não são muito mencionadas, porém as de nível organizacional e prático. Os CEAs passam a ser um importante elo nas redes de EA regionais e estaduais.(SILVA, 2004, p.45 – 47).

 No histórico dos CEAs, o ambientalismo caminhou junto com o campo da EA, como aconteceu na evolução da EA no Brasil. O principal aporte que pode ser considerado foi no campo dos embates e denúncias de degradadores ambientais até alcançar a dimensão da luta política, partidária ou não, e da articulação social com viés emancipatório.

 

3. METODOLOGIA

A metodologia escolhida por este trabalho segue a opção por uma pesquisa qualitativa dentro da pesquisa social cuja abordagem se aprofunda nos significados como definido por MINAYO (2007, p.14). Bogdan e Biklen (1982) apud Lüdke e André (1986) apresentam as características básicas que devem estar contidas na pesquisa qualitativa. A primeira é que a fonte direta de dados é o ambiente natural. A segunda refere-se à coleta de dados que é predominantemente descritiva. A terceira é que o processo é mais importante do que o produto. A quarta fala da importância do “significado” dado às coisas pelas pessoas e a vida são os focos de atenção do pesquisador. E a última seria que a análise dos dados segue um processo indutivo.

O trabalho foi dividido em três etapas conforme orienta MINAYO (2007, p.26). A fase exploratória foi a primeira e consistiu em fazer um levantamento dos conceitos teóricos envolvidos. A fase seguinte foi o trabalho de campo que se constituiu de uma pesquisa sobre notícias, entrevistas encontradas em documentos, que relatassem como foi criada a APARU do Jequiá e os atores envolvidos. Depois quais as práticas de EA que foram realizadas e vem sendo realizadas. A seguir a criação do CEA do Jequiá, qual a finalidade, os projetos e ações realizados. Identificar quais as pessoas, gestores envolvidos. A terceira foi a fase de análise e tratamento de dados procurando relacionar as atividades de EA ao momento vivido pela comunidade; compreender o envolvimento da comunidade procurando analisar a sua participação; quais os reflexos na sua qualidade de vida, na conservação da área; o relacionamento com os visitantes quais as práticas direcionadas para estes.

Foram feitas visitas ao local procurando observar a realização de algumas das atividades. Utilizou-se o sistema de diário de atividades, anotando as observações feitas nas visitas. Essas informações colhidas sobre o funcionamento da APARU do Jequiá, sobre as dificuldades para o seu funcionamento serviram de fio condutor entre os objetivos pretendidos.

As visitas foram acompanhadas das exposições de cada um dos participantes da APARU, sem uma formulação premeditada de questões para entrevista. Apenas o tema era provocado e deixado que discorressem sobre ele da forma desejada. Acrescentando alguma questão para adquirir alguma informação mais específica que não havia sido comentada.

A busca e seleção das informações tiveram por base os trabalhos ditos de EA, procurando identificar se o foco era a conservação ambiental e em quais deles ocorria a preocupação com a comunidade local e quando  esta iniciou.

 

4. ANÁLISES

4.1. CONHECENDO A APARU DO JEQUIÁ

Desde 1993, a SMAC vem desenvolvendo ações importantes visando sua recuperação ambiental, tais como o Mutirão Reflorestamento, Sinalização Ecológica, EA e recuperação da ponte que liga o mangue à colônia Z-10, entre outras. No Jequiá, também foram plantadas 100 mil mudas de mangue e foi construído um inédito muro de pneus para evitar o progressivo assoreamento do local. Uma das maneiras encontradas pela própria comunidade para frear a destruição e proteger seu patrimônio natural foi a criação, em 1995, da primeira estufa para produção de mudas de mangue.

O sucesso do projeto realizado pela Associação Amigos do Manguezal do Jequiá com apoio da Estação Rádio da Marinha do Brasil e da ONG Mundo da Lama, levou à sua própria ampliação. O resultado foi a inauguração, em agosto de 2001, de uma nova e mais completa estufa, considerada atualmente a maior da América Latina dirigida à recuperação de áreas de manguezais.

Em 2002 a Comissão Gestora do Fundo de Conservação Ambiental da SMAC (67ª reunião) se reuniu para decidir entre outros itens se o programa de EA da APARU do Jequiá seria mantido ou seria extinto, pois, o contrato com o patrocinador que mantinha o programa a título de medida compensatória estava expirando. A proposta levantada foi a de consultar a empresa para a possibilidade de prorrogação do contrato e, assim dar continuidade ao trabalho.

No trabalho de BORGES (2007), destaca-se que o início das obras para a construção do CEA foi em 1999 e que não houve a preocupação com a cultura do local para a escolha do lugar onde deveria ser construído e nem a consulta para que a construção tivesse arquitetura parecida com as das residências existentes. Houve conflito para a desocupação das casas existentes e depois de inaugurado nenhum trabalho foi realizado na comunidade. Então a prefeitura permitiu que a associação de moradores utilizasse o espaço como forma de conservá-lo. Desta forma quando a SMAC resolveu terceirizar o trabalho do CEA através de licitação pública exigindo que os trabalhos começassem em dezembro daquele ano, o que não seria possível sendo adiada a inauguração.

As implicações contratuais e exigências eram muitas, sessões de vídeos, exposições, visitas orientadas, seria necessário atrair as pessoas para um lugar que por ser pobre era considerado inseguro. Aos poucos foram surgindo às parcerias, trabalhos com a Escola Cuba, a escola pública mais próxima. Na quadra da associação ocorria um trabalho com apoio da prefeitura era o MEL – Movimento Esporte e Lazer, por não haver outras atividades lúdicas na colônia, foi proposto que o coordenador do projeto levasse as crianças até o CEA para ver filmes, e participar de outras atividades. Outros projetos ganharam corpo e novas parcerias com a UFRJ, UERJ, ONGs entre outros foram ocorrendo. Aos poucos as dificuldades encontradas para levar para as escolas públicas da Ilha do Governador a possibilidade de utilizar o espaço como um acréscimo às aulas foi sendo superado.

Em dezembro de 2003, quando chega para assumir o novo coordenador encontra o prédio lacrado e todo o material havia sido remetido para um depósito. Segundo a BORGES (2007) as políticas públicas mudaram e o secretário do Meio Ambiente relegou para segundo plano o meio ambiente dando prioridade aos preparativos para os Jogos Pan-Americanos. (BORGES, 2007, p.14).

 

4.2. PERSPECTIVAS PARA A EDUCAÇÂO AMBIENTAL NO CEA JEQUIÁ

Pelos levantamentos realizados observa-se que a atenção para a área surgiu com os problemas provenientes pela degradação do ambiente. Foi o assoreamento provocado por aterros, obras e despejo de esgotos, somado ao descarte de lixo, diminuindo muito a pesca e aumentando a proliferação de mosquitos que levou os moradores, suas associações e alguns órgãos públicos ligados a saúde e saneamento a iniciarem campanhas de limpeza do local.

Aos poucos a participação da comunidade foi crescendo em torno da importância da área e chegando a evitar a duplicação planejada da Estrada Rio Jequiá. Com a criação da APARU do Jequiá iniciou-se uma valorização da área, despertando para a importância da mesma devido a sua biodiversidade para a atividade pesqueira, mesmo não sendo considerada “área de beleza cênica”.

A criação da APARU do Jequiá tornou conhecidas iniciativas de reflorestamento do mangue atraindo a atenção de empresas, de entidades do governo, favorecendo parcerias e criando condições para a ampliação dos trabalhos e o início de trabalhos com EA. Os trabalhos neste campo, praticados até então valorizavam a parte de conservação da natureza e sua recuperação e com as diretrizes do SNUC. Com a criação do CEA iniciou-se a preocupação com a cultura da comunidade da colônia de pesca e uma maior integração dos projetos ligando a unidade de conservação e a população vizinha e os visitantes. Trabalhos começaram a serem desenvolvidos buscando a participação da comunidade para que possua informações que a tornem capaz de tomar decisões e fazer opções de forma consciente.

As dificuldades encontradas para a aceitação da CEA advêm de motivos políticos: quando é interessante falar de meio ambiente, este assunto está em alta os projetos recebem apoio. As cobranças burocráticas são diversas sobre a equipe que atua e o número de participantes muitas das vezes é pequeno frente aos trabalhos necessários. Dar continuidade a projetos e parcerias é tarefa árdua e deve ser realizada em paralelo com as atividades do CEA.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atenção inicial para a área da APARU do Jequiá veio com as dificuldades enfrentadas pela degradação ambiental ali ocorrida e de igual forma em outras áreas da Baía por motivos culturais, da colonização, do crescimento populacional e do desenvolvimento econômico. A própria comunidade reunida em associações assumiu posições em defesa da área de forma a minimizar os problemas já existentes. A criação da APARU do Jequiá trouxe a atenção de órgãos do governo e de empresas o que impulsionou alguns trabalhos que vinham iniciando.

Nesse início as propostas de EA estavam voltadas para uma visão mais ecológica, com uma valorização da natureza demonstrando a dicotomia entre o homem e a natureza. Esses trabalhos iniciais foram relevantes para que o ecossistema de mangue fosse reconhecido como importante. Conseguiram envolver grupos escolares importantes e trazer a atenção de parceiros para projetos realizados na área.

A primeira tentativa de implantação do CEA cometeu o erro de ser algo imposto, vindo do governo para a comunidade, não houve a preocupação nem de reconhecer a comunidade moradora nem das atividades de EA e outras que já ocorriam. A construção da sede atual buscou criar elos, laços que garantissem o funcionamento da CEA com a participação da comunidade. O foco voltou para a valorização cultural da comunidade residente, sua história, suas necessidades. A procura por uma integração do CEA com a área protegida e a comunidade residente e que esta reconhecesse seu próprio valor, importância e capacidade de atuar.

Os trabalhos atuais acompanhados demonstram que a EA pretendida é a emancipatória, de tal forma que os moradores da comunidade se reconheçam como cidadãos e cidadãs e, possuindo mais informações sobre seus direitos, possibilidades, alternativas, passem a buscar as soluções mais adequadas para os problemas vivenciados.

O reconhecimento do CEA como ponto de apoio e de atuação confiável pode trazer como resposta a maior participação da comunidade para a sua manutenção e garantindo a sua importância de tal forma que sua existência não esteja tão à mercê das variações políticas ocorridas no governo.

 

BIBLIOGRAFIA

 

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