CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA: UMA EXPERIÊNCIA INVESTIGATIVA NO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DA HORTA AGROECOLÓGICA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL DA BAHIA
Diego Márcio Ferreira Casemiro¹, Gabriela Silva Lemos², Larissa Rodrigues Mendonça³, Ryk Souza Macedo4 e Alessandra Buonavoglia Costa-Pinto⁵
1 Graduando do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades; Universidade Federal do Sul da Bahia; diegofcasemiro@gmail.com.
2 Graduanda do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades; Universidade Federal do Sul da Bahia; gabilemos1981@gmail.com.
³ Graduanda do Bacharelado Interdisciplinar em Ciências Ambientais; Universidade Federal do Sul da Bahia; larissa@csc.ufsb.edu.br.
4 Graduando do Bacharelado Interdisciplinar em Tecno-Ciências e Inovação; Universidade Federal do Sul da Bahia; ryk7macedo@gmail.com.
⁵ Professora da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Extensão universitárias em Educação Ambiental (NUPEEA/UFSB). Doutora em Ciências Ambientais, com ênfase em Educação Ambiental pela Universidade de São Paulo (PROCAM/USP) e Doutora em Filosofia da Natureza e do Ambiente pela Universidade de Lisboa (UL); alegupc@gmail.com.
Resumo: Este trabalho resultou de pesquisa de campo em torno do processo de implementação da horta agroecológica na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), no campus Sosígenes Costa, localizado no município de Porto Seguro - BA. A horta teve a sua implementação no segundo semestre de 2018, em função da mobilização de estudantes interessado e com recursos financeiros disponibilizados pela universidade via edital de promoção à saúde divulgado pela Pró-Reitoria de Sustentabilidade e Integração Social (PROSIS). Para alcançar nossos objetivos, realizamos entrevistas semi-estruturadas, e nos utilizamos do “olhar etnográfico”, para realizar a coleta de dados. O funcionamento da horta foi analisado à luz das da categorização de linhas de Educação Ambiental trazidas Rosana Louro Ferreira Silva (2007), a saber: crítica, pragmática ou conservadora. Os resultados obtidos indicam que tal atividade vem sendo realizada dentro de uma perspectiva pragmática, pois o processo de manejo e mobilização de estudantes em torno da horta fica circunscrito a aspectos técnicos e não promovem diálogos e reflexões que problematizem assuntos paralelos e correlatos à alimentação saudável em nível local, regional, nacional e global, restringindo assim a construção/aprofundamento de uma percepção crítica do mundo, ou seja a visão sistêmica e diferentes nuances aos diferentes modos de viver e de consumir alimentos.
Palavras-chave: Educação Ambiental; horta agroecológica; educação; Porto Seguro; universidade.
Abstract: This work is based on the field-research ‘Process of implementation of a agroecological vegetable garden in the Federal Universidade Federal do Sul da Bahia’ (UFSB) on the campus Sosígenes Costa, located in the city of Porto Seguro – BA. The agroecological vegetable garden has implemented on the second semester of 2018 held by the mobilization of students and financed by the fund for health and sustainability made by the university . For our goal to be achieved, a series of interviews was made based in the semi-structure model with a ethnographic perspective for the meaning of collect data for the analysis in the environmental education field. As part of the bibliography in the area, Rosana Louro ferreira da Silva (2007) we see the grocological vegetable garden as a contribution on the critical environmental education in view of future responsible citizens with the environmental area. The results was that the agroecological vegetable garden in the university is part of the pragmatic environment education, so in conclusion, is important that the dialogues about the subject matter be improved and see the exercise of the implantation of the agroecological vegetable garden in level local, regional and worldwide so the society can see the importance of the new organic practices.
Keywords: Environment education; Agroecological vegetable garden; Education; Porto Seguro; University.
Apresentação
O mundo é político e por isso possui dois lados claramente bem definidos. O capitalismo, identificado por direita, e o socialismo ou comunismo, identificados por esquerda. A partir disso, tem-se uma polarização de ideias e opiniões para todos os segmentos do conhecimento. Inclusive, e principalmente, àquelas que falam em interesses comuns, como meio ambiente, emprego e dinheiro. No âmbito do meio ambiente, por exemplo, a palavra sustentabilidade torna-se uma ferramenta para maquiagens verdes ou um instrumento para o combate às injustiças sociais (CARVALHO, 2013). E assim como este termo, todos os outros, a depender do seu utilizador, começam a possuir consistência, forma e poder.
Nesse contexto de análises sociopolíticas de termos comuns, nomeadamente científicos, uma grande vertente da Gestão Ambiental Pública, a Educação Ambiental (EA), pode ser subdividida em categorias. Silva (2007), com o intuito de estabelecer demarcadores conceituais para cada tipo determinado de atividade procedimentalizações a apresenta três categorias, a saber/; Conservadora, Pragmática e Crítica.
O primeiro conceito, ou Conservadora, tem uma visão mais restrita sobre a natureza. Ela dicotomiza homem e meio ambiente como se um fosse distante do outro, assim como apresenta uma percepção mais arcaica, baseada nas noções de retorno à natureza primitiva. A ciência, nesta concepção, aparece enquanto portadora da verdade absoluta e da razão. Além disso, possui padrões de comportamento maniqueístas, e não considera cenários políticos e sociais para abordagens em questões ambientais.
Se de um lado nós temos essa concepção muito limitada, de outro nós temos uma mais dinâmica, ao mesmo tempo que muito mecanizada. Estamos falando da Educação Ambiental Pragmática. Ela tem raízes antropocêntricas e acredita que o homem pode ser capaz de utilizar os recursos naturais sem destruir totalmente a natureza. Possui ênfase na mudança dos comportamentos individuais por meio de normas predeterminadas, seja por imposição do Estado ou por valorizações éticas e morais. Este tipo de Educação Ambiental debate relações sociais conflitantes nas temáticas acerca do meio ambiente, entretanto, não aprofunda-se nas complexidades das causas de tais problemas
Para contrapor essas categorias anteriores, a última concepção assume ideias libertárias, semelhante à corrente de educação transformista e respeitosa às subjetividades individuais de Paulo Freire (1997). A Educação Ambiental Crítica possui características relacionadas às vivências individuais e coletivas, ligadas à percepção de estruturas sociais. E por esse motivo se tornou um dos instrumentos-chave para este trabalho. Ela é determinada a entender processos complexos na relação homem-ambiente, partindo de visões interdisciplinares tanto para soluções quanto para respostas. Nela são apresentados os problemas de injustiças ambientais, unindo entendimento às questões de igualdade, isonomia e autonomia. A criticidade deste modo de EA se materializa na discussão dos contextos sociais, históricos, econômicos e políticos, procurando compreender a influência deles na correlação ao meio ambiente, pois assume que a relação do ser humano com a natureza é construída sócio-historicamente.
O tema deste trabalho é a investigação da horta agroecológica implementada na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Nosso objetivo é analisar se as práticas adotadas para esta atividade ambiental estão próximas às concepções de Educação Ambiental Conservadora, Pragmática ou Crítica. Cabe ressaltar que o projeto da horta foi proposto no Edital Prosis 12/2018, promovido pela Pró-Reitoria de Sustentabilidade e Integração Social da UFSB, intitulado Estimulando a alimentação saudável na UFSB. No referido projeto, as intenções indicadas dizem respeito ao desenvolvimento de uma horta agroecológica pelos discentes da UFSB que fazem parte do ECOtime – grupo responsável em manter as práticas de sustentabilidade no campus. Além disso, o projeto possui como principal objetivo provocar a reflexão sobre o consumo de alimentos industrializados, de modo a incentivar na comunidade acadêmica uma alimentação sadia feita com produtos naturais.
Metodologia
Esta pesquisa é exploratória e se utilizou de instrumentos qualitativos para coleta e análise de dados. Faz parte de uma pesquisa educacional que, necessariamente, precisa ser observada sob influências da realidade histórica, não ignorando os fenômenos sociais (LUDKE et al, 1986). Nesse sentido, para alcançar nossos objetivos são utilizadas categorias de educação ambiental trazidas pela Profa. Dra. Rosana Louro Ferreira Silva da Universidade de São Paulo - Silva, 2007. Uma das vozes ambientalistas do Brasil, que teorizou mecanismos para compreensão da EA em seu artigo intitulado O Meio Ambiente Por Trás da Tela: Concepções de Educação Ambiental dos Filmes da TV Escola.
Contou-se com o uso de uma Matriz Geral para a realização do estudo qualitativo que busca compreender se o projeto está sendo realizado em conformidade com as políticas públicas da área (Política Nacional de Educação Ambiental, Política Estadual de Educação Ambiental da Bahia e Política Municipal de Educação Ambiental de Porto Seguro) do modo como a horta agroecológica implementada na UFSB se apresenta segundo as concepções de EA. À vista disso, foram realizadas duas visitas de campo a fim de coletar informações para a relatoria. Também foram utilizados métodos inspirados na etnografia em pesquisa qualitativa “olhar etnográfico”.
Para a etapa de entrevistas, realizou-se um questionário com uma pergunta subjetiva e outra objetiva. A primeira “Você se considerou ativo e participativo no trabalho coletivo com a horta?”. A segunda “A partir do seu envolvimento com a horta, houve alguma reflexão sobre os seus hábitos alimentares?”. Essas duas perguntas colheram informações sobre dois objetivos principais que têm sido estímulo para a construção da horta agroecológica: a exploração dos sentimentos individuais e coletivos e as pretensões em modificar os hábitos alimentares das pessoas que integram a equipe da horta.
1. O PROJETO DA HORTA AGROECOLÓGICA UNIVERSITÁRIA
A motivação para a escolha desta atividade de Educação Ambiental foi o diálogo que a horta agroecológica faz com os princípios de sustentabilidade (CAPORAL E COSTABEBER, 2002) e com o apoio de uma participação social, coletiva, contínua e universitária.
A horta agroecológica está registrada no projeto intitulado Estimulando a Alimentação Saudável na UFSB/CSC, aprovado pelo Edital 12/2018 da Pró-Reitoria de Sustentabilidade e Integração Social. Com isso, a aprovação deste projeto gerou financiamento de mil reais destinados a compra de equipamentos e materiais. Segundo um dos autores da proposta, a vontade em submeter algo emergiu pelo envolvimento e anseio da equipe do ECOtime-UFSB, atribuindo-os o total reconhecimento.
O objetivo geral da horta, conforme seu projeto, é “Instalar uma horta comunitária para a produção de hortaliças no campus Sosígenes Costa - CSC da Universidade Federal do Sul da Bahia - UFSB, de modo que esta possa ser utilizada como instrumento educacional envolvendo a importância da alimentação sadia e não industrializada, bem como valores de uma alimentação in natura, e consequentemente promover a saúde no CSC.”. Enquanto os objetivos específicos foram:
Estimular o desenvolvimento de habilidades pessoais e coletivas por meio da participação social em todas as etapas da instalação e manutenção de uma horta, na perspectiva da Promoção da Saúde e Sustentabilidade;
Realizar uma oficina sobre “horta agroecológica” para estimular as práticas de um sistema de produção com uma base ecológica;
Efetuar o plantio e cultivo das seguintes hortaliças na horta comunitária: cenoura, couve, alface, beterraba, tomate cereja e rúcula no intuito de ofertar a comunidade da universidade a promoção à saúde de forma contínua;
Realizar uma mesa redonda sobre a importância dos alimentos saudáveis e seus reflexos na saúde e promover o debate sobre como os alimentos podem interferir nas emoções;
Apresentar o blog “https://ufsbmaissaudavel.blospot.com/” que terá algumas sugestões de pratos práticos e saudáveis.
O tempo destinado para o exercício das atividades foi de três meses de duração. Os primeiros encontros aconteceram em setembro para organização. O mês subsequente, novembro, consistiu em realização de três tarefas: a primeira delas foi aprender sobre práticas de plantio, cultivo e manutenção de hortas agroecológicas, por meio de minicurso ministrado por um profissional da área; a segunda atividade foi a execução do plantio de hortaliças, com semeadura direta e indireta, a fim de coletar métodos para análises científicas; a terceira, e última atividade, culminou em evento científico intitulado “Mesa Redonda: Alimentos Saudáveis e Seus Reflexos na Saúde”, com intuito de produzir reflexões sobre a importância de uma alimentação saudável.
A primeira visita aconteceu em 22 de novembro de 2018, e a programação para este dia era a semeadura da horta agroecológica. Em campo, recebemos indicações da professora orientadora do projeto, e realizamos o plantio direto de sementes e o transplantio (que consiste em semear uma planta num recipiente antes dela ter o contato direto com o solo). Para esta parte do trabalho, os integrantes da horta já haviam semeado suas hortaliças em casa, dentro de copinhos descartáveis ou vasos específicos para plantas.
Diante das duas opções anteriormente apresentadas, o plantio direto seria a maneira mais adequada para a planta germinar, porém, com o início da germinação, a planta poderia sofrer por diversos fatores, como o releamento, excesso de sementes e a quebra do sistema radicular da planta, tornando-a mais frágil. Portanto, a opção pelo transplantio foi uma saída para possíveis problemas.
Foram adicionados às margens da horta algumas plantas protetoras, que são utilizadas estrategicamente para manutenção de pestes pois, uma vez plantadas, elas repelem todo tipo de insetos que eventualmente podem afetar, de maneira danosa, a germinação das sementes.
Os alunos, até aqui, receberam orientações técnicas sobre como implementar uma horta agroecológica, captando informações sobre como plantar, regar, colher e manter a qualidade do solo sem o uso de agrotóxicos.
Todo esse processo anteriormente dito começou por volta das sete horas da manhã e findou ao meio dia. Às uma hora da tarde, houve convocação para experimentação científica que seria acompanhada periodicamente por um dos integrantes do ECOtime. A experimentação resumia-se em analisar a porcentagem de germinação das sementes plantadas em laboratório, e dessa forma a orientadora explicou sobre manejo de sementes em laboratório, além de instruções sobre a coleta de dados.
A medida em que participamos das atividades da horta, abordamos algumas pessoas da equipe com o intuito de verificar a conformidade da prática com os objetivos descritos no texto do projeto. No total entrevistamos nove pessoas, questionando-as sobre as seguintes questões: participação e mudança nos hábitos alimentares.
A seguir, apresentamos um quadro (figura 1) com os resultados da primeira pergunta: “Você se considerou ativo e participativo no trabalho coletivo da horta?”.
Figura 1 -- Nome dos entrevistas e respostas
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
É unânime a participação das pessoas, como podemos observar pela tabela. Consequentemente, o objetivo de interação e participação estudantil está sendo alcançado segundo os próprios participantes do projeto, no entanto, é interessante ressaltar que a equipe da horta é composta por muito mais alunos do que esses entrevistados. Esse recorte no número de pessoas foi feito apenas por motivos de viabilidade, no total, a equipe da horta deve contar com um número em torno dos vinte e quatro participantes.
A segunda pergunta é de caráter pessoal. Ela não possui modelos de resposta (sim ou não), portanto é aberta às respostas subjetivas. A pergunta foi: “A partir do seu envolvimento com a horta, houve alguma reflexão sobre seus hábitos alimentares?”.
Abaixo, apresentamos os resultados (figura 2):
Figura 2 -- Nome dos entrevistados e respostas
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
A maioria das respostas obtidas por meio da entrevista dizem respeito a uma alteração em relação aos hábitos alimentares. Desse modo, podemos concluir que a implementação da horta agroecológica da UFSB tem sido um instrumento não só de união e cooperatividade, como também um espaço para que as pessoas descubram na prática a necessidade de uma alimentação saudável, baseada no consumo de alimentos livre de agrotóxicos e totalmente orgânicos.
A segunda visita, diferente da primeira, não aconteceu no espaço da horta. Ela foi realizada no auditório da UFSB, sob o formato de um evento científico. O evento se chamou Mesa Redonda: Alimentos Saudáveis e os seus Reflexos na Saúde (figura 3), e objetivou explanar discussões e reflexões acerca de uma alimentação saudável.
Figura 3 -- Cartaz de divulgação
Fonte: UFSB, 2018.
A mesa estava composta por cinco pessoas, sendo cada uma delas responsável por apresentar um conteúdo diferente sobre o mesmo assunto: alimentação saudável (figura 4). A primeira abordagem relacionava a escolha dos alimentos à manutenção da saúde, apresentando os alimentos vilões industrializados e como se dava o processamento deles. Em toda a exposição do conteúdo, poucas intervenções aconteceram, mas o público parecia atento ao que se era falado.
Figura 4 -- Composição da Mesa
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Foi notado que, durante a apresentação, em alguns instantes emergia a crítica às indústrias alimentícias, apontando os enfrentamentos de uma boa alimentação dentro de um sistema ditador dos costumes alimentares, onde o fast food ganha destaque e as comidas orgânicas, ricas em nutrientes não.
No segundo momento de exposições, trouxeram a pirâmide alimentar para promover uma atenção voltada à função dos alimentos (figura 5). Dessa forma, discutiram sobre o papel dos alimentos no organismo e pediram para que, nós, ouvintes, preenchêssemos a pirâmide alimentar. A tarefa não foi muito difícil pois alguns discentes já haviam tido o contato com ela, por isso estavam mais do que familiarizados. Ainda assim, podemos dizer que alguns alimentos marcados estavam errados, percebemos isso durante a explicação da palestrante.
Figura 5 -- Dinâmica da pirâmide alimentar
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Após ter sido apresentado os alimentos, a mesa trouxe outra discussão interessante pertinente a água. O facilitador responsável por dialogar sobre este assunto adentrou em questões ligadas ao consumo de água, como segurança alimentar e nutricional, soberania alimentar e marcos regulatórios.
Durante a apresentação foi possível perceber alguns aspectos que problematizavam o contexto histórico, social e cultural da água no Brasil, relatando sobre a importância da sociedade civil organizada na mobilização social para a conquista do direito à água segura e de qualidade para o consumo no país. Também foi abordado o mau uso da água por parte das grandes indústrias brasileiras, que corroboram para o caminho da escassez da água potável no país.
O palestrante trouxe essas reflexões no intuito de pedir para que os ouvintes dessem mais valor à água e que, coletivamente e sensibilizados, todos fizessem o bom uso dela, evitando desperdícios. Neste momento, houve uma intervenção muito importante que relembrava o agronegócio enquanto principal consumidor da água potável do nosso país, o que gerou discussões relevantes para os componentes da mesa.
O último momento do evento trouxe a relação entre a depressão e a nutrição, intensificando a ideia de que uma alimentação saudável se faz necessário para todo mundo. Assim sendo, a palestrante comentou sobre as propriedades químicas dos alimentos e utilizou nozes e castanhas para exemplificar e oferecer para o público como degustação, trazendo uma animação para a plateia.
O projeto da horta agroecológica se materializa enquanto uma atividade de educação ambiental pelos seguintes motivos: i. responsabilidade e participação coletiva e individual (OLIVEIRA E SILVA, 2009); ii. reflexão sobre déficits alimentares causados pelas grandes indústrias (ALTIERI, 2012); iii. disposição de soluções técnicas para o manejo de recursos orgânicos.
A partir dessas considerações iniciais, avaliamos, mais abaixo, o projeto da horta pela Matriz Geral de análises dos projetos de educação ambiental no Município de Porto Seguro - BA, com o intuito de verificar a conformidade das ações desta atividade com as políticas públicas de EA.
No que concerne às características do projeto, faz-se oportuno dizer que ele é interdisciplinar por abranger as áreas das ciências, saúde e humanidades. As áreas das ciências pelas produções técnicas diretamente ligadas ao manejo da horta. As áreas da saúde e das humanidades pelas reflexões dentro desses espaços do conhecimento (saúde mental, sistemas de produção, nutrição etc).
Considerando o tempo de duração da horta, podemos dizer que não possui um prazo determinado para o término de suas atividades. Atualmente, por exemplo, ela possui mais de cinco meses de existência, o que já revela uma boa durabilidade. Além disso, segundo os seus proponentes, ela dispõe de objetivos bem definidos que precisam de continuidade para a sua total realização. Ou seja, existe a previsão de que dure por cerca de um ano ou mais.
Um dos objetivos é a não utilização de agrotóxicos e a reutilização de materiais descartáveis para o uso na demarcação de canteiros; isto é, os processos de implementação da horta contam com soluções técnicas, já predefinidas, relativas à superar as dificuldades encontradas no modelo de sociedade atual, não objetivando propor observações sobre este modelo, e nem em como modificá-lo.
No que diz respeito às concepções de educação ambiental de Rosana Silva (2007), o que se pode perceber é que a horta busca o foco na ação e na proposição de normas a serem seguidas, além de relacionar diretamente o conhecimento com a mudança de comportamento individual (SILVA, 2007). Dessa forma, ela é caracterizada pela solução tecnicista dos problemas. O que, em outras palavras, significa que é um projeto que visa relacionar a ciência e a sociedade de uma maneira útil, configurando uma Educação Ambiental Pragmática.
Sob tais constatações, podemos dizer que o público-alvo observado no projeto é de caráter específico: a comunidade acadêmica da UFSB. Felizmente, notou-se positividade, uma vez que possibilitou a formação de grupos organizados e bem articulados dentro da universidade. Essa união das pessoas formou meios de divulgação bem densos, presente, com maior ênfase, nos espaços virtuais – Facebook, Instagram, Blogger entre outros.
Além disso, detectou-se também que o grupo possui avaliações das atividades que realizam, da seguinte maneira, a cada modificação realizada na horta, pelo Whatsapp, os integrantes constroem diálogos e discutem sobre possíveis erros, melhorias e dicas.
Diferente de uma preocupação com os recursos naturais de maneira crítica, a horta apresenta uma visão de sustentabilidade pautada em soluções técnicas para os problemas socioambientais. Por exemplo, a medida em que as reuniões do grupo acontecem, eles não discutem os problemas do mundo a fim de modificarem o cerne, seja em cenário local ou nacional. O que eles fazem, entretanto, é discutir soluções para o manejo e realização eficaz da horta.
Contudo, mesmo não se posicionando criticamente, ela mostra-se muito educomunicadora socioambiental, pois permite que os seus integrantes se expressem por meio das redes sociais da horta, publicando os seus textos, sejam eles de qualquer gênero ou tipo textual.
Nesse caso, ela aparenta se aproximar da conformidade com a lei baiana que enfatiza o cidadão como produtor de informações socioambientais. Indicamos que, talvez, com mais investimentos psicológicos e motivacionais, eles pudessem estimular, melhor, a comunicação da vivência cotidiana na horta e, assim, a conformidade com a legislação estaria inteiramente mais precisa.
Conforme dito em algumas passagens anteriores, a busca pela solução de problemas restringe-se a esfera técnica. Desse modo, percebemos que eles fazem o uso da ciência na realização de suas atividades, porém não correlacionam com a realidade social vivida na região. Nesse sentido, acreditamos que as dificuldades entre a conexão da ciência e da criticidade está no fato do projeto se preservar em âmbito acadêmico, e não possuir ligações externas a este espaço.
Outra verificação relevante é que o projeto da horta não prioriza a formação de educadores ambientais. Isto é, os seus princípios e objetivos dizem respeito a reflexão e a mudança de comportamentos individuais dos participantes. Distancia-se, portanto, dos ideais da educabilidade, que são a criticidade, a continuidade e a construção de uma autonomia no pensar das outras pessoas.
A propósito de todas essas constatações apresentadas até agora, averiguou-se a somatória dos números identificados nos indicadores da Matriz Geral e, dessa maneira, percebeu-se o resultado de 25 pontos totais obtidos. Esse número, segundo a tabela, significa dizer que o projeto da horta agroecológica que está sendo implementada na UFSB corresponde parcialmente às políticas públicas de EA utilizadas para a análise.
Considerações finais
É claramente visto, com todas as discussões apresentadas neste texto, que a concepção de educação ambiental empregada para esta atividade se configura como Pragmática, uma vez que ela não problematiza contextos históricos e sociais, promove reflexão autônoma dos participantes e nem mesmo faz indagações políticas às instâncias de gestão pública e social do território local ou regional (SILVA, 2007).
Entretanto, é perceptível que a horta está a poucos passos para conseguir se tornar um tanto quanto mais libertária, no sentido de ser mais reflexiva. Isto é, no mesmo momento que ela não problematiza contextos históricos e sociais, ela consegue abrir brechas para que os seus integrantes se motivem, curiosamente, a pesquisarem e a entenderem determinadas situações, por exemplo.
Acreditamos, desse modo, que o que está em evidência são os pontos de criticidade que podem ser construídos de maneira bem simples e não muito complexas. Estamos falando, então, do diálogo. O diálogo mesmo que pouco compreendido por nós, seres humanos, deve ser levado em conta e utilizado como ferramenta de modificação para realidades sociais. Uma pequena discussão, por exemplo, pode se tornar um processo contínuo de sensibilização, visto que ela incentiva a reflexão, a fala e o posicionamento do indivíduo.
Dessa forma, a oralidade, a reflexão e a Educação Ambiental Crítica se tornarão paralelas nas atividades da horta. Uma vez que para Silva (2007) a Educação Ambiental Crítica é a conexão do ser humano com os outros seres humanos e não humanos. E estando esses seres humanos em rede de contatos a mobilização acontece e a mudança em formatos sociais danosos pode ser promovida. Para além disso, o ser humano, quando capaz de conversar com o outro, consegue multiplicar os seus meios de entendimentos, transbordando interpretações interdisciplinares para diversos fatos sociais.
Nesse sentido, para complementar essas ideias, é preciso estimular uma cidadania ativa e participativa, que não espere por soluções dos grandes representantes políticos, e que, de maneira oposta, cobre por direitos e necessidades, por meio de sociedades civis organizadas, articuladas e com espaços para discussão.
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