Resíduos sólidos: o desafio da educação ambiental na comunidade rural de Uruçú – Gurinhém/PB
José Amilton Santos Júnior1; Genival Barros Júnior2; Robi Tabolka dos Santos3; Jullyana Karolina Santos Lima4; Elka Taiusky Ferreira Santos Brito5.
1Engenheiro Agrícola, Doutorando em Engenharia Agrícola, DEAg/CTRN/UFCG.
Av. Aprígio Veloso, 882. Bairro Universitário, Bloco CM. Fone (**83)3310-1056.
Caixa Postal: 10.078. CEP: 58429-140. Campina Grande/PB
E-mail: eng.amiltonjr@hotmail.com
2Engenheiro Agrônomo, Doutor em Engenharia Agrícola, Prof. Adjunto da UAST/UFRPE.
E-mail: barrosjnior@yahoo.com.br
3Engenheiro Florestal, Doutorando em Engª Agrícola, DEAg/CTRN/UFCG, Extensionista rural da EMATER/PB - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural da Paraíba.
E-mail: robytabolka@yahoo.com.br
4Licenciada em Letras pelo CH/UEPB
E-mail: jullyana_karolina@hotmail.com
5Licenciada em Letras pelo CH/UEPB, Especialista em Educação pelo CCHSA/UFPB.
E-mail: elka_noemy@hotmail.com
E-MAIL DE CONTATO: eng.amiltonjr@hotmail.com
SEÇÃO: Relatos e Práticas de Educação Ambiental
RESUMO
A poluição do planeta com resíduos das atividades humanas, que há pouco tempo era uma questão eminentemente urbana, também passou a ser um problema da área rural em função do aumento no consumo de produtos advindos da indústria. Neste contexto o presente trabalho se propôs a abordar as ações desenvolvidas pela extensão universitária na comunidade rural de Uruçú entre Maio e Novembro de 2008, envolvendo a geração e destinação dos resíduos sólidos. Com base numa pesquisa-ação possibilitou-se estimular os indivíduos da localidade a se identificarem com o meio em que estão inseridos, a tomarem consciência de que fazem parte dele e que precisam mudar hábitos de consumo. Extensionistas da UFCG em parceria com a escola local utilizaram, num processo participativo de diagnóstico e de construção do conhecimento, encontros e palestras no enfrentamento ao problema da destinação final dos resíduos sólidos, resultando na inclusão de temas com enfoques ambientais de forma transversal no conteúdo das disciplinas do parâmetro curricular obrigatório pela escola local, na formação de um grupo de mulheres e jovens para fabricação artesanal de bijuterias a partir de material reaproveitável advindo dos resíduos sólidos e na redução das doenças de veiculação hídrica pelo acúmulo e/ou queima de lixo.
Palavras-chave: ambiente; resíduos sólidos; zona rural.
Solid waste: the challenge of environmental education in the rural community of Uruçú – Gurinhém/PB.
ABSTRACT
The pollution of the planet with waste from human activities, which recently was very much an international city, also became a problem in the rural area due to the increase in consumption of products coming from the industry. In this context, this study proposed to address the actions developed by the university extension in the rural community of Urucu between May and November 2008 involving the generation and disposal of solid waste. Based on an action research allowed to stimulate individuals in the locality to identify with the environment in which they fit, to acknowledge that part of it and they need to change consumption habits. Extensionistic UFCG in partnership with local school used in a participatory process of diagnosis and knowledge building, meetings and lectures in facing the problem of disposal of solid waste, resulting in the inclusion of environmental issues with focus transversely on the content of disciplines of parameter binding by the local school curriculum, training a group of women and girls for making handmade jewelry from material arising reusable solid waste and reducing water-borne diseases by accumulation and / or burning trash.
Keywords: environment, solid waste, rural zone.
1. INTRODUÇÃO
A sensibilidade no trato com as questões que envolvem o meio ambiente tem se tornado uma necessidade a todos os seres humanos que habitam, consomem e, invariavelmente, poluem o planeta com resíduos provenientes de suas atividades. O que há pouco tempo era uma questão eminentemente urbana, também passou a ser um problema da área rural em função do forte apelo consumista por produtos advindo da indústria, fato que tem proporcionado ao longo dos anos uma relação do homem com o meio ambiente extremamente desleal, tirando da natureza seu sustento, explorando os recursos hídricos, acumulando riquezas e, em troca deixando um rastro de destruição e degradação.
Para Sobral (2009), o atual modelo de desenvolvimento, baseado no consumo acentuado, é predatório e coloca em segundo plano a preservação dos recursos naturais. Assim, a problemática ambiental vem ganhando cada vez mais destaque como um dos grandes problemas a ser enfrentado. O estímulo ao consumo é cada vez mais reforçado, aumentando assim a necessidade de captação de matéria prima. Esta ao alcançar o final da cadeia produtiva transforma-se em resíduo, que na maioria das vezes, é descartado de forma irresponsável, caracterizando assim um dos problemas ambientais para a população mundial. Torna-se, portanto, emergente a necessidade de ações que visem reverter essa situação.
Soares (2009) afirma que diante da situação atual que se encontra a degradação do meio ambiente em todo o mundo, torna-se necessário a compreensão dos educadores, políticos e a sociedade organizada, uma conscientização para com os problemas ambientais, aquisição de conhecimentos, valores e atitudes voltadas à melhoria dos ecossistemas. Ainda segundo este autor, a questão ambiental representa uma síntese dos impasses que o atual modelo de civilização acarreta. Considera-se que aquilo o que se assiste no inicio do século XXI, não é uma crise ambiental, mas uma crise de educação. É que a superação dos problemas exigirá mudanças profundas na concepção de mundo, de natureza, de poder, de bem estar, tendo com bases novos valores individuais e sociais.
De acordo com Boff (2003) para que haja uma mudança na relação do homem com o ambiente; “é necessário ter uma visão mais integral da ecologia, que toma o ambiente natural em que estamos metidos, isto é o ar que respiramos, o chão que pisamos, o alimento que comemos, a água que bebemos”. Já Soares et al. (2007) afirmam que a educação ambiental é o principal instrumento de transformação, sendo fundamental para o desenvolvimento de uma consciência crítica em relação ao meio ambiente, gerando comprometimento e responsabilidade da população nas ações de saneamento e saúde. Tem sido utilizada como instrumento para resolver os problemas associados aos resíduos sólidos, desde a geração, coleta, transporte até a disposição no destino final.
Dentro deste contexto, o Projeto Universidades Cidadãs cujo objetivo é contribuir para o desenvolvimento econômico, social e ambiental de comunidades de agricultores familiares do Nordeste através de processos de capacitação, em parceria com a comunidade rural de Urucu, Gurinhém/PB e a escola local (Escola Municipal de Ensino Fundamental “Anália Arruda da Silva”) passaram a trabalhar junto com as pessoas da comunidade e estudantes da escola local, conteúdos e práticas de sensibilização relacionadas às questões sanitárias e ambientais ligadas diretamente a deposição de lixo em locais indevidos da comunidade.
O referido projeto possui atuações efetivas nos Estados da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Alagoas, Sergipe, Piauí e Ceará. Na Paraíba a UFCG desenvolve ações no Pólo de Juarez Távora, região agreste do Estado, sendo realizadas atividades de capacitação direcionadas a grupos de jovens e mulheres em comunidades de agricultores familiares.
2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Caracterização da comunidade
Uruçu fica localizada no município de Gurinhém, a uma distância de aproximadamente 80 km de Campina Grande, tendo acesso pela BR-230 em direção a capital do Estado, com núcleo habitacional principal bastante concentrado e uma população de mais 14 de 1.000 habitantes, distribuída entre 203 famílias, tendo como uma de suas principais características a organização coletiva, existindo uma associação comunitária atuante desde 2001 denominada de Associação Comunitária dos Produtores Rurais de Uruçu, composta atualmente por 66 (sessenta e seis) associados. Grande parte destas famílias associadas trabalha em propriedades de terceiros e apenas duas possuem terras próprias (OLIVEIRA et al., 2006).
As atividades produtivas desenvolvidas pela população local são baseadas na agricultura familiar de subsistência através do cultivo do milho, fava, feijão, batata doce, além do algodão que é comercializado numa escala maior na própria região. Totalmente cercada por fazendas, esta comunidade vem passando por grandes dificuldades para ter acesso a terras para o cultivo, tendo que alugá-las em troca de serviço, ou seja, o uso da terra é permitido em contrapartida ao desmatamento e limpa das áreas que ocuparão ou pelo pagamento de um foro no valor R$ 100,00 por ha na ocupação e outra parcela de igual valor na devolução da área ao proprietário. O período de aluguel da terra geralmente é de um ano; após este tempo os fazendeiros/proprietários retomam as áreas para plantio de capim e criação de gado.
Os moradores mais antigos da região de Uruçu relatam que, quando a mata nativa que rodeava as áreas onde hoje se localiza a comunidade ainda existia, a principal nascente existente na região, “a chorona”, alimentava um riacho que ofertava suas águas durante o ano todo, atendendo as necessidades da população local, além de possibilitar outras atividades, entre elas a pesca. Com o passar dos anos os proprietários das terras foram desmatando as suas áreas com dois objetivos principais: a venda da madeira para a fabricação de carvão e o plantio do sisal. Além disso, os próprios moradores necessitavam da madeira da floresta para construção das suas casas e como fonte de energia para alimentar os seus fogões de lenha.
Com o passar dos anos e o aumento gradual e progressivo do desmatamento, inclusive das matas ciliares, o riacho da comunidade reduziu a oferta de água e tornou-se temporário, apresentando vazão apenas nos períodos chuvosos do ano. Com a escassez cada vez maior de terras para o cultivo, cerca de 50 famílias passaram a cultivar milho e feijão no alto das serras, uma vez que todas as terras de baixadas, os chamados aluviões, possíveis de serem arrendadas, foram sendo intensamente ocupadas. Esta situação contribuiu e contribui para o desaparecimento da mata nativa e das matas ciliares, tendo, pois, reflexo direto na oferta de água para a comunidade.
Atualmente, a água para suprimento da população e dos animais vem de 40 cisternas individuais, de um açude de porte razoável pertencente a um fazendeiro da região (que permite o acesso da população ao manancial), de um poço artesiano com água salobra e de caminhões pipas fornecido pelos governos municipal e federal quando a situação torna-se critica durante os períodos de prolongadas estiagens (Figura 1).
Figura 1. Açude que atualmente abastece a comunidade, agosto de 2007.
Os primeiros registros relacionados ao ensino na comunidade remota a meados do século XX. O município de Gurinhém ainda não era emancipado e pertencia a comarca de Pilar, de modo que a primeira “escola” funcionava nos domicílios e as primeiras professoras que se têm registros foram Antônia Silva e suas irmãs Maria das Dores (Dôra) e Maria (Mariinha) que davam aulas gratuitamente para os moradores da região. Com a mudança destas para outra localidade, a “escola” acabou fechando (SANTOS JÚNIOR, 2009).
Após alguns anos o poder municipal acabou fundando uma escola, que tinha como professora Maria da Penha Silva. Na década de 60, depois da emancipação do município de Gurinhém, foi criada a Escola Municipal Rural Mista de Uruçu, que também era domiciliar, e mais tarde, em 1973, passou a ser o Grupo Escolar Municipal Anália Arruda da Silva, que atualmente denomina-se Escola Municipal de Ensino Fundamental Anália Arruda da Silva (Figura 2).
As primeiras professoras desta escola foram Maria Bernadete da Silva e Maria de Lourdes Silva. Esta escola conta hoje com um corpo docente formado de 11 professores, dos quais um possui nível fundamental, três possuem nível médio, seis são estudantes de pedagogia (superior incompleto) e uma é formada em pedagogia (nível superior).
A escola municipal oferece ensino até o 9º ano do ensino fundamental. Após este nível, os alunos são transferidos para a cidade em transporte fornecido pela prefeitura. Além da escola municipal, há também uma escola particular para crianças, regida pela professora Ana Claúdia da Silva.
Figura 2. Escola Municipal de Ensino Fundamental “Anália Arruda da Silva em 1983 e atualmente, agosto de 2007.
Existe ainda na comunidade um posto médico que recebe visitas das equipes do Programa da Saúde da Família duas vezes por semana, sendo que os atendimentos de urgência são feitos na sede do município, com deslocamento por carros particulares fretados pela Prefeitura.
No que se refere ao transporte, tem-se o registro de apenas uma linha de ônibus que faz o trajeto da Comunidade à Cidade de Gurinhém apenas nos dias da feira (sábado), com os custos sendo bancados pela Prefeitura do Município (SANTOS JÚNIOR, 2009).
2.2. Abordagem técnica - pedagógica
A tomada de consciência é mais do que saber o que se passa ao seu redor, é acima de tudo um processo histórico e neste sentido coloca Freire (1980): “no ato mesmo de responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de vida, o homem se cria, se realiza como sujeito, porque esta resposta exige dele reflexão, crítica, invenção, eleição, decisão, organização, ação,... Todas essas coisas pelas quais se cria a pessoa e que fazem dela um ser não somente adaptado à realidade e aos outros, mas integrado”. É, pois, o homem se descobrindo, interrogando-se e buscando respostas aos seus desejos e observações.
Já Leontiev (1980) é interpreta a tomada de consciência simplesmente como ato de conhecer, quando diz que o trabalhador contratado está sem dúvida “consciente” do produto que produz. Nesta versão, pode-se extrair que a conscientização é o processo de racionalidade estritamente técnico, mas sem dúvidas se esquece seu significado político dentro de uma sociedade como um todo. Entende-se, por esta linha de raciocínio que ao “tomar consciência” o homem passa a ser apenas um executor de normas e não um ser político participativo, conhecedor de seus deveres e obrigações na estrutura social como um todo.
A metodologia utilizada no presente trabalho segue a linha proposta por Freire a qual buscou extrapolar os limites da conscientização do homem e, numa ação de educação ambiental, trabalhar o conceito de sensibilização das pessoas para as necessidades mais urgentes de conservação do meio em que estão inseridas. Desta forma, procurou-se atingir a sensibilização ambiental através de um processo construído pelas próprias pessoas a partir de estímulos que provocaram uma série de reflexões e resultaram em uma atitude de responsabilidade contínua para com o trato do meio em que vivem e trabalham através da compreensão de que o homem faz parte da natureza e que depende da conservação da mesma para sua sobrevivência.
Em termos práticos, neste trabalho, a abordagem inicial para levantamento dos problemas sócio, econômicos e ambientais da comunidade utilizou-se de um recurso da pesquisa – ação, denominado de “lamina provocadora”, o qual, a partir de uma representação gráfica, desenhada, fotografada ou até mesmo descrita, de uma situação vivenciada pela/na comunidade, os seus membros foram estimulados a reconhecê-las e se expressarem sobre ela, de forma que, ao evoluírem em suas próprias análises, “tomaram consciência” num processo de auto análise sobre as questões prioritárias e suas implicações diretas sobre a vida da comunidade (PINTO, 1989).
Num segundo momento, com o diagnostico participativo consolidado, o grupo foi mais uma vez estimulado a ser o próprio guia mentor de suas soluções e elencar, por ordem de prioridade, as questões sócio, econômicas/ambientais mais graves e emergentes, aparecendo, a partir de então, os problemas relacionados aos resíduos sólidos como prioritários, uma vez que os danos ambientais e sociais causados pela destinação indevida e acúmulo de lixo na comunidade e seu entorno eram evidentes.
Definido o tema, os trabalhos relacionados à sensibilização dos envolvidos, bem como ao tratamento e ao monitoramento dos resíduos sólidos ganharam impulso, com as lideranças da comunidade e da escola local mobilizando toda a comunidade partindo de um encontro em que foram definidas as estratégias de trabalho baseadas no conceito da sensibilização-ação (SANTOS JÚNIOR, 2009).
Num momento seguinte os extensionistas da Universidade mobilizaram a comunidade em uma palestra sobre os riscos da exposição, tanto das pessoas quanto dos animais de interesse econômico, ao lixo contaminado. Para este evento, as lideranças da comunidade articularam e trouxeram os representantes do poder público municipal. A partir deste encontro operações básicas como a coleta seletiva do lixo, adoção de práticas de reutilização, além da destinação segura do lixo produzido na comunidade, foram sendo vislumbradas como possíveis de serem executadas pelos moradores presentes.
Das reuniões entre a equipe da UFCG, membros da comunidade e da escola local, foram surgindo iniciativas práticas no sentido de envolver a comunidade no gerenciamento do problema, entre as quais diversas gincanas ecológicas que culminou com a realização de um grande mutirão de coleta do lixo acumulado na área habitada e no entorno da comunidade, conforme pode ser visto na Tabela 01. Além das gincanas, foram realizadas palestras, exposição de vídeos e concursos e desenho e pintura envolvendo as turmas de alunos da escola sempre com o tema ligado ao monitoramento e tratamento dos resíduos sólidos.
Tabela 01. Detalhamento das fases de trabalho envolvendo os extensionistas da UFCG e membros da comunidade no processo de tratamento dos resíduos sólidos em Uruçú – Gurinhém/PB.
ATIVIDADE |
DESCRIÇÃO |
DATA / PERÍODO |
Planejamento |
Reuniões prévias entre a equipe da UFCG, moderadores da comunidade e entre os moderadores e membros da comunidade para tratar sobre o planejamento e a organização do processo de sensibilização (debates e palestras) e ações prática (mutirão, coleta seletiva e reciclagem). |
Início de Junho/2008 até a realização do mutirão de limpeza da comunidade e entorno. |
Realização do mutirão de limpeza |
Numa atividade planejada e coordenada por suas lideranças a comunidade partiu para ação e recolheu todo o lixo acumulado na comunidade e entorno. |
25 de Julho de 2008 |
Articulação com o poder público municipal |
A comunidade mobilizada conquista espaços e compromissos do poder público gerando avanços como: coleta seletiva do lixo e deposição final dos resíduos sólidos não reaproveitáveis ou recicláveis em local adequado. |
Junho e Julho de 2008 |
Aquisição e distribuição de tambores para coleta seletiva |
A comunidade mobilizada conquista espaços e compromissos do poder público gerando avanços como: coleta seletiva do lixo e deposição final dos resíduos sólidos não reaproveitáveis ou recicláveis em local adequado. |
Junho e Julho de 2008 |
Coleta seletiva e dos resíduos sólidos emprestáveis |
Uma viatura da Prefeitura Municipal passa a coletar de forma sistemática e permanente todo o material destinado a reciclagem, encaminhados para a sede do Município e para um aterro controlado o material contaminado ou imprestável para tal fim. |
Julho e Agosto de 2008 |
Recomposição da flora de áreas degradadas pelo deposito de lixo |
Aquisição e formação de um banco de mudas de essências florestais nativas para recomposição da cobertura vegetal e ocupação das áreas antes utilizada pela população para destinação indevida do lixo, organizado e coordenado pelos jovens e mulheres da comunidade |
Agosto de 2008 |
Capacitações dos comunitários |
Buscando o aproveitamento de parte dos resíduos reaproveitáveis ou recicláveis, foram ministrados pela equipe da UFCG cursos de fabricação de bijuterias com mescla de sementes nativas, envolvendo principalmente jovens e mulheres, integrando-se nestas oficinas discussões sobre a organização do trabalho coletivo e a relação de gênero na produção de renda. |
22 de Setembro a 03 de Novembro de 2008 |
Feira periódica e itinerante de produtos artesanais produzidos a partir do material reciclado |
Fechando o ciclo inicial das ações de tratamento adequado dos resíduos sólidos os grupos envolvidos com a fabricação das peças artesanais passaram a realização eventos para divulgação e comercialização dos produtos originados do trabalhos coletivo utilizando material prima reutilizável. |
A partir de 10 de Novembro de 2008 |
Marco na deflagração definitiva do enfrentamento da questão o mutirão contou com a participação de voluntários de toda a comunidade, uniformizados e utilizando equipamentos de proteção individual (EPI´s), os quais transportaram todos os resíduos retirados da comunidade para os caminhões basculantes fornecidos pela prefeitura (Figura 3).
Figura 3. Mutirão para a coleta de resíduos sólidos na comunidade rural de Uruçú, Gurinhém-PB, Julho de 2008.
Neste processo de reuso dos resíduos sólidos previu-se ainda a separação dos resíduos orgânicos, os quais passaram a ser utilizados na agricultura, mais especificamente na prática da compostagem, dando sustentação inclusive ao substrato produzido para confecção das mudas e plantio das espécies nativas utilizadas na recuperação da cobertura vegetal das áreas antes degradadas pelo acúmulo e queima do lixo.
Reuniões internas entre os moderadores da UFCG para elaboração de roteiros pedagógicos e avaliação dos conteúdos precederam todos os eventos. Essa metodologia subsidiou os trabalhos em campo otimizando o tempo e facilitando a aprendizagem dos participantes. Periodicamente foram realizadas ainda reuniões de trabalho visando reavaliar as atividades já desenvolvidas e planejar os momentos seguintes.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A interação criada pelas ações da extensão universitária entre os técnicos da UFCG e os grupos de afinidade da comunidade rural de Uruçú, principalmente via escola local, proporcionou a realização exitosa das atividades planejadas no trato da destinação dos resíduos sólidos produzidos pela população local, enfatizando-se a participação da escola como “facilitadora” dessas ações cujos resultados abrangem toda a comunidade e com fortes indicativos de, através dos estudantes, chegarem às gerações futuras. O processo de sensibilização para as questões relacionadas ao meio ambiente, para ser mais eficiente, necessita passar pela escola, em função de que as pessoas que fazem parte do meio, desde a tenra idade, precisam sentir-se parte integrante deste ambiente cuja responsabilidade de conservação também repousa sobre os seus ombros.
A escola em todos os seus atores (professores, estudantes e funcionários) se constituiu em um agente de desenvolvimento comunitário poderosíssimo, dinamizando o trabalho da equipe de extensionistas e tornando-se não apenas um aliado, mas um ambiente multiplicador de conhecimentos e um sensor de monitoramento dos problemas relacionados ao meio ambiente. De acordo com Ovigli et al, (2009), no que diz respeito à Educação Básica, a legislação vigente não permite a criação de disciplinas de Educação Ambiental, havendo recomendação de que a mesma seja incorporada transversalmente ao currículo e é desta maneira que a temática foi contemplada na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN. Foi este o caminho, após as reuniões iniciais entre participantes do projeto, comunidade e escola, adotado em Uruçú, de modo que os estudantes, incentivados pelos professores, passaram a atuar diretamente nas atividades de sensibilização e práticas promovidas pela parceria escola – comunidade – universidade.
Durante as discussões, os grupos comunitários mais diretamente focados (jovens e mulheres) demonstravam ter a percepção de que vários materiais que eram destinados ao lixo poderiam ser reutilizados, principalmente na fabricação de bijuterias (Figura 4) dada a sua boa aceitação e procura no mercado local e externo, entre outras atividades artesanais e, conseqüentemente, gerar renda para a comunidade.
Estes fatos reforçam a nossa teoria e traz a certeza de que, apesar da concentração de terras e de renda e com todas as dificuldades por que passa a população das comunidades rurais de pequenos agricultores familiares, é imprescindível apostar na sua capacidade de resistência e na busca de alternativas direcionadas para a construção de sua autonomia financeira. Situação semelhante é tratada por Thomaz Júnior (2006) em estudos que se reportam as diversas formas de recriação do trabalho camponês.
De acordo com Mucelin et al. (2008) a vivência cotidiana nos estimula pragmaticamente à elaboração mental de idéias das coisas que percebemos. Objetos e fatos observados e percebidos forçam a construção por associações de idéias que estimulam a mediação, orientando as ações e determinando as condutas, modo de ação. É nesse processo dinâmico, dialógico e interativo que desenvolvemos as crenças responsáveis pelos hábitos, que edificam o nosso modo de viver. Muitas vezes estes hábitos são condenáveis, como por exemplo, a disposição inadequada do lixo, em ambientes também inadequados.
Figura 4. Fabricação de bijuterias a partir de materiais reutilizáveis Uruçú - Gurinhém/PB, Outubro de 2008.
A parceria articulada com a prefeitura municipal, já no planejamento do mutirão, revelou e fortaleceu a força da mobilização popular, fazendo com que o poder público custeasse parte das ações do mutirão, e o mais importante, passasse a fornecer coletores, que foram distribuídos em seis pontos estratégicos da comunidade para receber o lixo produzido de forma seletiva, além de estabelecer um serviço permanente de coleta do lixo acumulado, uma vez a cada quinze dias, numa iniciativa inédita na zona rural do município. Nas quatro toneladas de lixo coletadas no mutirão e retiradas da comunidade, foram encontrados plásticos, papéis, metais, embalagens tóxicas e material orgânico, o que possibilita fazer uma análise da necessidade de consumo desta comunidade.
Buscando aumentar a motivação para o mutirão também foi lançado um concurso junto aos estudantes do ensino fundamental para escolha de um logotipo para o evento, o qual foi estampado em cartazes e espalhados por toda a comunidade (Figura 5). A participação dos filhos dos agricultores neste concurso chamou a atenção dos pais, aonde, mesmo os mais “incrédulos” vieram prestigiar os filhos, envolvendo assim a grande maioria da comunidade na procura de solução para a questão.
Figura 5. Cartaz espalhado pela comunidade cujas estampas foram confeccionadas pelos estudantes filhos dos produtores rurais – Uruçú/Gurinhém – PB. Julho de 2008.
Para Gonçalves (2005) o primeiro passo a ser dado para a implantação de um sistema de coleta seletiva é a realização de campanhas junto à população, mostrando a importância da reciclagem e orientando-a para a importância da separação do lixo em sua origem. De acordo com D`Almeida e Vilhena, (2000), o sucesso para a coleta seletiva está diretamente ligado aos investimentos feitos para sensibilização e conscientização da população. Valle (2002) se refere a reciclagem como um conjunto de técnicas que tem por finalidade aproveitar os detritos e reutilizá-los no ciclo de produção de que saíram, sendo assim, a reciclagem permite retomar a origem, na forma de matérias-primas, os materiais que não se degradam, ou seja, materiais que se tornariam lixo, ou estão no lixo e que a natureza levaria anos ou até não teria condições de degradá-los. Esses materiais são então desviados, coletados, separados e processados para então serem usados como matéria prima na produção de novos produtos. No caso especifico da comunidade de Uruçú, a capacitação ofertada pelos extensionistas da UFCG, favoreceu a profissionalização de uma atividade e uma conseqüente geração de renda para a comunidade. Esse fato só foi possível em função da mudança de atitude, visível após cada etapa de trabalho, no sentido da realização da coleta seletiva dos resíduos, que passou a acontecer em todos os pontos da comunidade e de seu entorno (Miguel et al., 2007b).
Com relação aos benefícios acadêmicos o caráter interdisciplinar das atividades realizadas proporcionou aos estudantes (de várias áreas de atuação – ciências humanas, sociais e agrárias), vinculados ao trabalho de extensão, uma vivência “in loco”, uma oportunidade de relacionar os conteúdos abordados no âmbito da academia com a realidade de uma comunidade rural carente em diversas áreas. Para Brasil (2006) a atuação dos estudantes universitários, afirmada na prática das ações de extensão universitária em comunidades rurais, contribui para a produção do conhecimento e de sua apropriação pelo grupo de produtores e pelos próprios acadêmicos como parte integrante de sua formação profissional.
Este autor ainda afirma que os embates, comuns na prática da extensão universitária com comunidades rurais, onde se busca inserir a produção do conhecimento e sua apropriação pelo grupo de agricultores familiares e pelos estudantes acadêmicos como parte integrante de sua formação profissional, contribui muito claramente para enriquecer e fortalecer o processo dialógico entre as partes envolvidas. Por outro lado, a educação ambiental é o principal instrumento de transformação, sendo fundamental para o desenvolvimento de uma consciência crítica em relação ao meio ambiente em que se estar inserido, gerando comprometimento e responsabilidade da população nas ações de saneamento e saúde, sendo utilizada aqui como um dos instrumentos na tentativa de resolver os problemas associados aos resíduos sólidos, desde a geração, coleta, transporte até a disposição no destino final (SOARES et al., 2007).
4. CONCLUSÃO
A metodologia de abordagem utilizada nas ações de extensão junto à população se mostrou eficiente no sentido de que a sensibilizou para o enfrentamento do problema e na adoção de novas posturas de consumo e de destinação dos resíduos sólidos produzidos.
As ações empregadas para o tratamento dos resíduos sólidos desdobraram-se em novas oportunidades de capacitação e geração de renda, através da produção de bens artesanais a partir de materiais reaproveitados do lixo.
Constatou-se uma redução no quadro de doenças de veiculação hídricas em curto prazo pelos Agentes Comunitários de Saúde e que, segundo os mesmos, estava relacionado ao acúmulo de lixo na comunidade.
A parceria com escola local se mostrou extremamente eficiente, principalmente, nos processos de difusão de conhecimentos, reduzindo a distância entre os extensionistas e os atores do processo.
O desdobramento sócio-político da mobilização popular levou ao engajamento do poder público que passou a atender de forma permanente a um grupo de 1000 famílias alocadas fora do centro urbano do município.
5. AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a parceria entre a UFCG e o Comitê de Entidades no Combate à Fome e Pela Vida - COEP, o apoio do CNPq e da FINEP e a comunidade de Uruçú.
6. REFERÊNCIAS
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