Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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O PAPEL DO ASSISTENTE SOCIAL NA RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA FAMÍLIA E COMUNIDADE Brenda Gomes Farias1 Marina Patrício de Arruda2
RESUMO A experiência aqui relatada diz respeito a uma pesquisa realizada junto ao Programa de Pós-graduação Residência Multiprofissional em Saúde da Família e Comunidade (RMSFC), tendo como propósito identificar a percepção dos preceptores, tutores e coordenadores sobre a atuação do assistente social, de um município do interior de SC. De abordagem qualitativa a pesquisa teve como alvo os preceptores, tutores, e coordenadores da equipe da RMSFC, a coleta de dados se deu por meio de entrevista semiestruturada aplicada aos profissionais de diferentes unidades municipais de saúde. As reflexões acerca do papel do assistente social na RMSFC permitiram-nos ampliar as discussões sobre os desafios do trabalho multiprofissional. Esperamos que os registros desse estudo mostrem a importância do Programa de Residência Multiprofissional frente a necessidade de se reconstruir práticas profissionais articuladas e capazes de consolidar ações de prevenção e promoção de saúde. Palavras chaves: Residência Multiprofissional, Serviço Social, Formação profissional
INTRODUÇÃO A experiência aqui relatada diz respeito a uma pesquisa realizada junto ao Programa de Pós-graduação Residência Multiprofissional em Saúde da Família e Comunidade (RMSFC), tendo por objetivo identificar a percepção dos preceptores, tutores e coordenadores sobre a atuação do assistente social no referido programa, no município de Lages, SC. O interesse de se pesquisar sobre este tema emergiu da experiência profissional do assistente social inserido no contexto da RMSFC onde várias profissões são escolhidas para compor a equipe multiprofissional. A necessidade de se refletir sobre o papel do assistente social neste contexto diz respeito à possibilidade de se identificar fragilidades e potencialidades da profissão, reflexão importante para o fortalecimento desse processo de formação. A RMSFC tem seu espaço de atuação nas Unidades Básicas de Saúde dos municípios e se destacam no Sistema Único de Saúde (SUS) como unidades de referência como Unidade Escola, em virtude da parceria com o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação, interligada com a Secretaria Municipal de Saúde juntamente com a Universidade; fundamentando o tripé ensino, pesquisa e extensão. A RMSFC, naquele momento, era integrada por diversos profissionais de saúde: assistente social, dentistas, enfermeiros e psicólogos. Neste âmbito, o profissional de serviço social se inseriu como profissional da área da saúde, por meio da Resolução n. 218, de 06 de março de 1997, do Conselho Nacional de Saúde. Os profissionais residentes, assim chamados, atuavam nas unidades de saúde, desenvolvendo de forma multiprofissional a promoção e a prevenção de saúde, com intuito de construir e reconstruir o SUS. Esse processo se dava por meio de atendimentos coletivos, educação em saúde, visitas domiciliares, práticas integrativas complementares, grupos, entre outras atividades que realizadas de acordo com a demanda do território. Todo o trabalho se desenvolvia juntamente com a equipe de ESF – Estratégia de Saúde da Família, NASF – Núcleo de Apoio a Saúde da Família visando responder às demandas dos usuários em relação à assistência à saúde de forma crítica e propositiva, com intuito de romper com o modelo de saúde centralizado na doença. Essa articulação visava atender a saúde de forma integra, nesse sentido, a Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, art. 3º, dispõe que, a saúde está ligada ao biopsicossocial, superando a visão focada apenas na doença, percebendo saúde e sua ligação com meio ambiente, renda, alimentação, educação, lazer entre outros condicionantes. A pesquisa aqui apresentada se desenvolveu com o propósito de contribuir para a reflexão dos profissionais residentes, preceptores, tutores e coordenação sobre a atuação do assistente social no âmbito da RMFSC. O desenvolvimento deste estudo foi de extrema importância para o aprendizado técnico científico e para as reflexões práticas sobre a atuação do assistente social neste âmbito contribuindo, inclusive para desmistificação de pré-conceitos sobre a atuação do assistente social.
METODOLOGIA DO ESTUDO O estudo se desenvolveu por meio de um estudo de caso, pesquisa bibliográfica e exploratória de abordagem qualitativa que, segundo Minayo (2001) responde a questões subjetivas e particulares, no qual um nível de realidade é dinâmico e individual, assim não podendo ser pode ser quantificado. O público alvo da pesquisa foram os preceptores, tutores e coordenadores da turma (2018) , em torno de 10 participantes que responderam entrevistas semiestruturadas individuais. Os dados obtidos foram analisados por meio de análise de conteúdo. Segundo Bardin (2006, p. 38) “[...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Sendo assim, a análise de conteúdo trata-se de um método de análise de diversas concepções da realidade de maneira qualitativa, sem serem alterados os dados coletados. O sigilo foi garantido e os sujeitos identificados apenas por letras alfabéticas. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa – CEP pelo parecer de número 2.898.530.
RESULTADOS E DISCUSSÃO A percepção dos preceptores no que se refere à compreensão da prática do assistente social na RMSFC Apresentaremos nesse item a percepção dos preceptores dentistas, enfermeiros e psicólogos no que se refere à compreensão da prática do assistente social na RMFSC. Nesse contexto, identificamos o preceptor “A” (dentista) descrevendo a percepção biopsicossocial e a contribuição do serviço social de forma associada à percepção do preceptor “C” (enfermeiro), baseados na perspectiva trata-se de um conceito de saúde que integra o físico, mental e social. Os preceptores “B” e “D” (psicólogos) citam a prática do assistente social associada a ações coletivas em prol da promoção, prevenção e educação em saúde, visita domiciliar e acolhimento. Destacaram atribuições específicas do serviço social como sendo um profissional “transformador” diferente do olhar de saúde dos demais profissionais por intervir nas demandas das questões sociais emergentes. A partir desses depoimentos, compreendemos que os preceptores associam a prática do assistente social a ações coletivas de perspectivas biopsicossociais que envolvem a integralidade do sujeito. Mota et al (2009) corrobora que o profissional realiza a articulação entre profissionais e serviços, para contribuir no conhecimento dos determinantes do processo saúde-doença, por considerar o indivíduo como um todo, parte de um território globalizado. Nessa perspectiva, é que os profissionais buscam atender algumas demandas individuais e grupais, superando o olhar de saúde vinculado somente à doença por reconhecerem o indivíduo como sujeito de direito, pertencente a um contexto social que é influenciado por aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais. Vale destacar que a Residência Multiprofissional está inserida na Atenção Primária a saúde, e que esse se constitui um espaço de atuação do Assistente Social através do NASF(Núcleo de Apoio à Saúde da Família), criado em 2008. Instituição que é composta por equipe multiprofissional de profissionais graduados na área da saúde, médico, assistente social, nutricionista, psicólogo, entre outros. (BRASIL, 2012). Dessa forma, a participação do Assistente Social no âmbito da RMFSC é baseada na perspectiva do Caderno de Atenção Básica nº 27, o profissional do Serviço Social é fundamental para o que prevê a Portaria nº 154, que regulamenta a criação dos NASF. Diante disso, a atuação do profissional tem suas particularidade e especificidades, como corrobora Netto e Carvalho (2012) descrevendo que o profissional de serviço social não atua sobre uma única necessidade, de forma pontual (tal como o dentista, enfermeiro, médico), por isso sua especificidade está no olhar integral e na compreensão das múltiplas questões sociais que contextualizam todas as necessidades humanas. Sobretudo, uma intervenção profissional deve articular a realidade concreta com a realidade subjetiva, de forma crítica, propositiva e reflexiva. As ações de serviço social no âmbito da saúde estão vinculadas a espaços de acesso a cidadania, assim como, de produção de estratégias que promovam e fortaleçam redes de suporte social, proporcionando maior integração entre serviços sociais e outros equipamentos públicos e os serviços de saúde nos territórios, contribuindo para o desenvolvimento de ações intersetoriais que visem ao fortalecimento da cidadania (CFESS, Brasília, 2010). Vale também ressaltar que o contexto político, econômico social, é dinâmico e assume novas formas e expressões, tais como: a vulnerabilidade do trabalho e a penalização da classe trabalhadora, o desemprego, fragilidade no sistema de saúde, violência, habitação precária, a alimentação insuficiente, entre outros. O desafio da profissão está em compreender a realidade social do sujeito no seu contexto integral de saúde, identificar suas fragilidade e potencialidades, bem como, criar alternativas e possibilidades para a atuação no cenário atual e formular propostas para enfrentar as expressões da questão social. Entendemos que essas propostas devem promover a autonomia e a cidadania do sujeito. “Essa discussão é parte dos rumos perseguidos pelo trabalho profissional contemporâneo” (IAMAMOTO, apud SANTOS, 2008).
A percepção dos preceptores acerca das situações do cotidiano profissional e a importância do assistente social Apresentaremos neste item, a percepção dos preceptores dentistas, enfermeiros e psicólogos acerca das situações do cotidiano profissional e a importância do assistente social. De acordo com o questionamento, identificamos que no que tange os preceptores “A” (dentista), “B” (psicólogo) e “C” (enfermeiro) existe uma concordância sobre a importância do profissional assistente social em intervenções multiprofissionais (visita domiciliar, acolhimento, grupos, matriciamento), cuidados ampliados em saúde e viabilizações de informações aos usuários. Nesse sentido, podemos compreender que as intervenções multiprofissionais, bem como a clínica ampliada em saúde, e a viabilização de informações aos usuários considerando a interdisciplinaridade, são ações comuns para todos profissionais, e a articulação de especificidades. No âmbito da residência multiprofissional, a interdisciplinaridade torna-se fundamental ao intercambio de experiências e saberes em caráter de respeito à diversidade, contribui para práticas transformadoras, em parcerias na construção de projetos e exercício permanente do diálogo (UNIFESP, 2006). Assim, podemos destacar a interdisciplinaridade como contexto das situações do cotidiano profissional no qual os preceptores percebem a importância do assistente social na prática cotidiana. É por meio da interdisciplinaridade que as demandas se articulam e podem ser analisadas, desenvolvidas colocando os profissionais em diálogo horizontal no qual cada saber possui sua importância e especificidade para atendimento da demanda estudada. É o diálogo interdisciplinar que mantem a individualidade das disciplinas, contudo, integra conhecimentos de diversas perspectivas sobre a mesma realidade (BRASIL, 1999). A importância do profissional do serviço social no contexto da interdisciplinaridade, se destaca no cotidiano do trabalho multiprofissional. E, de um modo geral, as especificidades de cada profissão são valorizadas por sua atuação individual, e quando compreendidas em conjunto, proporcionam a integração de saberes, superando a fragmentação disciplinar da prática, contudo sem interferir na autonomia de cada uma. O preceptor (psicólogo) “D” menciona “vulnerabilidades sociais”, e o preceptor “B” (psicólogo) interliga a compreensão referindo-se à importância vinculada em intervenções de demandas que envolvem violações de direitos, temática de especificidade de intervenção do assistente social, ambos demonstram que o profissional possui a capacidade de perceber diferentes demandas que determinam a doença. Mota, et. al. (2009) descreve o atendimento das necessidades de saúde superando o olhar particularizado à doença, no qual se destacam também alimentação, saneamento básico, habitação, aos cuidados primários de saúde e educação. Por esses depoimentos também vamos compreendendo que as violações de direitos, bem como, as vulnerabilidades sociais são as expressões das questões sociais, “[...] o Serviço Social tem na questão social a base de fundação como especialização do trabalho” (IAMAMOTO, 2003, p. 27), que compreende a conjuntura do sujeito e seu contexto social de maneira crítica e com um olhar de totalidade. O preceptor “C” (enfermeiro), por sua vez, cita a importância do assistente social na composição do olhar integral para o “acesso as políticas públicas”. A intervenção do profissional de serviço social envolve toda, como corrobora Mourão, et. al. (2006), um trabalho conjunto com as equipes, estabelecendo sua prática vinculada à consolidação da cidadania, ampliando o cuidado de saúde firmado em aportes teóricos sobre o processo saúde-doença que contribuam para a interdisciplinaridade. E, no que tange o caráter de a viabilização e o acesso as políticas públicas a atuação do assistente social se concretiza nas estratégias que permitem aos usuários usufruírem de seus direitos à saúde, seja na prestação de serviços, direitos a população como viabilização do acesso a consultas, exames, internações e tratamentos, ou seja, no âmbito do planejamento, gestão, mobilização e participação social (LANZA; CAMPANUCCI; BALDOW, 2012). O Assistente Social é o profissional citado pelos entrevistados como aquele que alcança a compreensão da conjuntura do sujeito em diversos contextos. O preceptor “D” (psicólogo) ainda cita que a importância dessa atuação está vinculada as demandas de “vulnerabilidade social, empoderamento do sujeito, auto cuidado e mediação”. Esse depoimento indica a percepção sobre a importância da atuação profissional relacionada a múltiplas demandas, assim como a conjuntura história do sujeito e seus condicionantes, que refletem na realidade do sujeito e de todo o no seu contexto familiar, que fazem parte do processo saúde-doença (VYGOTSKY, 1987).
A percepção dos preceptores sobre a relação do serviço social com as demais profissões: No que tange a percepção da relação do serviço social com as demais profissões de forma específica, o preceptor “A” (dentista) e “D” (psicólogo) descrevem que a odontologia, a psicologia e o serviço social ”se complementam nos cuidados de saúde”. Já o preceptor “B” (psicólogo) destaca que o serviço social e a psicologia estão relacionados nas demandas que envolvem as “vulnerabilidades sociais”, e que, nesse sentido, as profissões se apoiam. O preceptor “C” (enfermeiro) mencionou que o serviço social e a enfermagem se relacionam a partir do “olhar de integralidade”, contudo salientou que não conhecer as atribuições específicas do serviço social. Acerca da relação do serviço social com as demais profissões, podemos destacar falas similares ao usarem expressões como “complementam” e “profissões se apoiam” sinalizando que são interligadas ações multiprofissionais desenvolvidas no cotidiano. Nesse contexto, observamos o profissional de serviço social integrado à equipe multiprofissional como aquele que “[...] trabalha permanentemente na relação da estrutura, conjuntura e cotidiano, contribuindo com as equipes na apreensão e na ação em face do cotidiano, no qual as determinações conjunturais se expressam e a prática se realiza” (BRASIL, 2009, p. 99). Dessa forma, também podemos afirmar que além de complemento e apoio as profissões se articulam na composição do olhar integral, ou seja, o assistente social corrobora para ao olhar a totalidade do processo saúde-doença, com intuito de compartilhar saberes a fim de oferecer novas estratégias para a efetivação da saúde. Nessa reflexão Rodrigues, et. al. (2011) contribui ao descrever que em uma equipe multiprofissional o assistente social compartilha seu conhecimento específico, contudo sem deixar suas particularidades. O Assistente Social se articula a outras profissões por meio do trabalho multiprofissional e do olhar integral, ampliando a reflexão crítica junto à equipe fortalecendo aproximações com a rede e com a população usuária na defesa e efetivação de direitos à saúde que consolidem a cidadania. Considera portanto o projeto coletivo de saúde preconizado tendo em vista o projeto ético-político e o código de ética do assistente social.
Percepção do preceptor assistente social quanto à sua prática profissional e trabalho multiprofissional; potencialidades e fragilidades. Apresentamos neste item, a percepção dos assistentes sociais preceptores quanto à sua prática profissional. De acordo com os depoimentos colhidos, identificou-se como potencialidade, citada pelo preceptor “X”, o auxílio à compreensão das questões sociais, que engloba o trabalho do assistente social como um todo e amplia o olhar das demais categorias para o cuidado em saúde. Conforme Mota et al. (2009), a questão social engloba diversas expressões das desigualdades sociais, econômicas, políticas e culturais, vinculadas a sociedade capitalista sem intermediação do Estado. Sendo assim, o profissional de serviço social depara-se com diferentes desafios no âmbito da saúde: renda, alimentação, saneamento básico, desigualdades sociais, violências, entre outras expressões que afetam diretamente o estado de saúde do sujeito, seja físico, mental ou social, percebendo o indivíduo como parte de um contexto cultural e histórico. Por esse olhar de totalidade, a contribuição do serviço social no âmbito da Residência Multiprofissional é imprescindível, o que também vem ao encontro da percepção do preceptor “Y” que descreve como potencialidade a efetivação do trabalho multiprofissional ligada às demandas da atenção primária. Contudo, conforme a citação das preceptoras, ainda há fragilidades na compreensão das demais profissões acerca da atuação do assistente social, dentre elas foram citadas percepções equivocadas como ideias vinculadas à filantropia, e ao exercício profissional. Entretanto, entendemos que: "O assistente social, ao participar de trabalho em equipe na saúde, dispõe de ângulos particulares de observação na interpretação das condições de saúde do usuário e uma competência também distinta para o encaminhamento das ações" (CFESS, 2010, p. 46). Por meio dessas reflexões, convém destacar que o assistente social superou a visão assistencialista ao se inserir na Política Pública de Saúde desde 1997 conforme a Resolução 208 do Conselho Nacional e Saúde, a qual se diferencia dos demais profissionais. Isso em virtude de suas particularidades na interpretação das condições de saúde diante da conjuntura do sujeito, e por seu olhar crítico e propositivo diante da perspectiva ideológica de saúde. Nas relações do serviço social com as demais profissões, o preceptor “X” relacionou as contribuições através das práticas coletivas de saúde. E o preceptor “Y”, com as reflexões em equipe e a possibilidade de rompimento com visões ligadas ao senso comum. Neste sentido, o assistente social no âmbito multiprofissional tem atuado “na cena contemporânea como profissão analítica e interventiva, com uma série de atribuições e competências fundadas na garantia de direitos sociais e na construção de uma sociedade verdadeiramente democrática, sem preconceitos e iniquidades sociais”. (LANZA; CAMPANUCCI; BALDOW, 2012 p. 216). Atuação que se articula a seu Código de Ética (1993) que fundamenta a “defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e autoritarismo”.
A percepção dos demais profissionais acerca do trabalho multiprofissional dos assistentes sociais Neste item apresentamos a percepção dos preceptores assistentes sociais sobre a compreensão dos demais profissionais: coordenadores, preceptores e tutores acerca do papel do assistente social no trabalho multiprofissional. Nos depoimentos os preceptores “X e Y” descrevem que os demais colegas preceptores compreendem o papel do profissional no trabalho multiprofissional. Essa compreensão fez parte de um processo, ou seja, se deu em meio a uma desconstrução gradativa de visões errôneas do serviço social. Na percepção da coordenação da RMSFC, embora tivesse ocorrido mudanças na coordenação recentemente a coordenadora, profissional de fisioterapia, descreveu que a prática do assistente social na RMSFC vinculada aos trabalhos comunitários e assistenciais, é uma visão superada. Por outro lado, a percepção dos tutores sobre a prática do assistente social na RMFSC, de acordo com que os tutores “K” (psicólogo) e H (enfermeiro) a prática do assistente social envolvia a integralidade do ensino para a efetivação do cuidado a saúde. O preceptor “J” (enfermeiro) descreveu que a prática do profissional está relacionada ao olhar ampliado de saúde. Nesse sentido, os tutores tinham alguns objetivos específicos da Residência Multiprofissional, os quais visavam preparar os profissionais para trabalhar em equipe multiprofissional baseados nos princípios do SUS, articulando a integração do ensino-serviço através de práticas interdisciplinares que promovam a integralidade (PROJETO PEDAGÓGICO DE RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA FAMÍLIA E COMUNIDADE, 2012). Dessa forma, a percepção da atuação do assistente social vinha relacionada a ações coletivas que envolvem a integralidade das ações de caráter multiprofissional, que contribuem para efetivação do SUS por meio da qualidade dos serviços prestados, orientados pela universalidade ao acesso aos serviços de saúde. Na percepção dos tutores, identificamos que o tutor “K” (psicólogo) e o tutor “J” (enfermeiro) disseram que a importância do assistente social na RMFSC estava vinculada a compreensão do processo saúde-doença, superando o olhar biomédico, ainda muito presente na sociedade contemporânea no que tange a compreensão da relação saúde-doença. Destacaram ainda as ideologias fragmentadas, centradas na figura do médico, que não consideram os conceitos das ciências sociais (UNA-SUS, 2016). Desta maneira, a importância da atuação do assistente social na RMFSC esteve vinculada a percepção diferenciada do aspecto de saúde, tornando-se um profissional diferenciado por proporcionar conhecimentos na área social, permitindo assim, aos demais profissionais reconhecerem outras dimensões (sociais) que comprometem a saúde do sujeito e que constam nas diretrizes previstas no SUS efetivando a integralidade do atendimento do sujeito. A partir de esse olhar de totalidade, pode-se reconhecer o usuário como um sujeito de direitos, como cita o preceptor “H” (enfermeiro) e dessa forma “potencializar a orientação social com vistas à ampliação do acesso dos indivíduos e das coletividades aos direitos sociais”. (CFESS, 2010, p. 43-44), para que seja efetivado a garantido a acesso a saúde. A partir desses depoimentos, vale ressaltar que as ações desenvolvidas pelos Assistentes Sociais no âmbito da RMSFC buscaram ter uma direção pautada na “[...] reflexão às condições sócias históricas a que estão submetidos os usuários [...](CFESS, 2010, p. 43-44). Neste item, a percepção dos preceptores quanto à relação do serviço social e da sua profissão, identificamos que os tutores descreveram a relação de suas profissões com o serviço social como um “complemento” na atuação da saúde no âmbito integral e biopsicossocial. A tutoria envolvendo o âmbito teórico da RMFSC, permite relacionar o serviço social e as demais profissões no âmbito da pluridisciplinaridade, que possibilita uma relação entre as disciplinas, de áreas afins. Assim sendo, a saúde pode ser pensada dentro dos preceitos de Zabala (2002) sobre a relação complementar das disciplinas, contribuições mútuas de diferentes perspectivas, exemplo da ciência, arte, literatura entre outras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo buscou compreender o entendimento dos preceptores, tutores e coordenadores sobre a atuação do assistente social na equipe da Residência Multiprofissional em Saúde da Família – RMSFC de um município do interior de Santa Catarina. Identificamos que a compreensão dos preceptores e tutores sobre a atuação do assistente social era similar, e estavam vinculadas as contribuições biopsicossociais que integravam fatores que influenciam no processo saúde-doença. Portanto, evidenciaram a importância do olhar integral para as ações de educação em saúde e demandas específicas do serviço social na atenção primária. No que diz respeito às situações do cotidiano multiprofissional, a maioria dos depoimentos trata da importância do assistente social, pois destacaram situações que envolvem demandas do seu conhecimento específico, como por exemplo, violação de direitos, bem como a análise diferenciada sobre a realidade do sujeito, a viabilização das informações e acesso as políticas públicas para efetivação da cidadania, ações que contribuem para a efetivação da interdisciplinaridade. Em consonância, os tutores descrevem que percebem a importância do serviço social na superação do olhar biomédico para reconhecer o sujeito na sua totalidade, dono de uma construção histórica. No questionamento sobre a relação do serviço social com as demais profissões, foram descritos de forma geral pelos preceptores, tutores e coordenadores que as profissões se complementam e se apoiam. Nesse sentido, os profissionais se viam em um patamar horizontal, no qual nenhuma profissão se sobrepõe a outra, destacando as contribuições do serviço social para compreensão dos aspectos de saúde no âmbito multiprofissional. Para as preceptoras específicas do serviço social, a profissão possui como potencialidade nesse contexto por auxiliar na compreensão das questões sociais que envolvem a área da saúde. E ainda destacaram que o profissional é um articulador que fortalece o trabalho multiprofissional, contudo relataram algumas fragilidades na compreensão da atuação do profissional muitas vezes associada a práticas filantrópicas e assistencialistas, entretanto, reconhecem que isso faz parte de um processo gradativo que os assistentes sociais terão que desmistificar. Destaca-se por fim, que os preceptores, coordenadores e tutores consideraram relevante ter o Assistente Social como parte integrante da equipe multiprofissional devido à sua suas especificidades de compreensão da conjuntura de saúde, assim como, de reconhecimento sobre a realidade do sujeito no seu contexto histórico e cultural. Nessa medida, ele contribui para mudanças na perspectiva do processo saúde-doença, fomentando reflexões de maneira crítica e, colaborando para intervenções reflexivas. A Residência Multiprofissional como uma modalidade diferenciada de formação, favorece a articulação de saberes teóricos e práticos e, sobretudo, a articulação entre a Universidade e os serviços. Desta maneira, o Assistente Social se destaca no âmbito multiprofissional como um profissional diferenciado por viabilizar conhecimentos na área social, desmistificando visões distorcidas de saúde, auxiliando a equipe no atendimento integral ao sujeito de forma coletiva sem deixar de lado suas particularidades.
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