CANTINHO DO
FOLCLORE
[Fotografia:
http://www.ecologia.info/pipridae-melastomataceae.htm]
A LENDA DO
TANGARÁ DANÇARINO
“Todas as
lendas têm a sua origem na vida real e são um reflexo do nosso espírito. As
florestas estão cheias de abusões e fantasmagorias, criados pela idéia sempre
inventiva dos nossos caboclos. Até as danças serviram de pretexto à invenção de
umas das lendas mais interessantes do Paraná. Floriu na marinha. Em
Guaraquessaba.
Certa vez,
um viajante foi até aquela vila. Sol a pino. Desembarcando da frágil canoa, o
canoeiro seguiu abrindo caminho na floresta, por um carreiro ziguezagueante.
Reinava em tudo um grande silêncio, o silêncio modorrento da canícula.
O viajante
ia atrás admirando a paisagem e a pletora da floresta cerrada. Iam silenciosos,
quando de repente o canoeiro parou e fez sinal de cautela ao companheiro, para
que pisasse sem ruído. Que seria? Pé ante pé, o excursionista veio vindo, veio
vindo, e nove passarinhos de cor azulada e crista vermelha trinavam e bailavam
nos galhos de uma árvore quase desfolhada. Um dos pássaros, - o chefe, estava
pousado no ramo superior, e executava, harmoniosamente, um canto suave, com as
penas encrespadas pela volúpia da modulação, a cabecinha esticada, o bico
entreaberto.
Quanto
terminou este solo, romperam os outros em coro.
Houve, depois, um descanso rápido, em que os orquestrantes começaram a
saltitar, de dois em dois, numa espécie de quadrilha. A um apelo do chefe,
retomaram os seus lugares.
Recomeçou o chilreio, pondo-se o chefe a bailar, indo e vindo de um galho para
outro. Enquanto isto, os bailarinos voavam, cantando, uns por cima dos outros,
revezando-se, de modo que os primeiros ficavam atrás dos últimos, e estes atrás
dos primeiros. Era um encanto vê-los!...
Curioso, o viajante quis ver de mais perto a dança. Mas fez ruído. E com isso
os pássaros fugiram, de súbito.
- Que passarinhos são estes? – indagou o romeiro, apontando para o rumo
em que eles desapareceram.
- O povo
chama de Tangarás – informou o canoeiro – mas pro sinhô eu vô contá: São
os fios do Chico Santos.
O viajante não entendeu o significado daquela revelação, e inquiriu:
- Filhos
de quem?
- Eu lhe conto o causo – disse o caboclo, acendendo o seu cachimbo
– Não vê
que havia dantes nestes matos uma família de dançadores. Eram os fios do Chico
Santos. Que gente prá gostá de dança! Dançavam por nada. Fandangueavam até nas
roça, interrompendo o trabaio. Batiam os tamanco no chão quasi todas noite. Uma
veis, meu sinhô, távamo na Semana Santa! Pois não é que a rapazaiada inventô de
fazê um fandango? E feis. Dançaram inté de manhã. Mas Deus, que vê tudo,
castigô os dançarinos. E sabe o que feis?
- Deu a bexiga nos fios dos Chico Santos. E cada um que ia morrendo, ia
virando passarinho. E agora andam por aí cumprindo o seu fado... O meu avô
sabia dessa história, por isso nóis nunca dançamos na quaresma.
E concluiu, num longo suspiro de piedade:
- Quem
mandô eles dançarem na Semana Santa?"
[FONTE: LEITE, Ofir in CASCUDO,
Luís da Câmara. Geografia dos Mitos do Brasil.]
Extraído da página: http://ifolk.vilabol.uol.com.br/lendas/index.htm, acesso:
08 de dezembro, 2005.
Para quem desejar saber mais sobre o
Tangará Dançarino ou Tangará Dançador:
SÉRIE DE VÍDEOS GLOBO ECOLOGIA Nº
20: “ Professor Tangará (7min 18seg). Documentação do
ritual de acasalamento dos tangarás, pássaros dançarinos, em viveiro com
miniatura de mata e água irrigada para formar lago e chuva artificial , num
bairro da zona sul de São Paulo. Adaptação em câmera de vídeo para facilitar
filmagens e registro do esquema da dança.”
[Colaboração: Sol Guimarães,
dez/2005]