Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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31/05/2013 (Nº 44) ATIVIDADE AGRÍCOLA E A MATA CILIAR DO RIO MATO GROSSO NA CHAPADA DIAMANTINA DA BAHIA
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ATIVIDADE AGRÍCOLA E A MATA CILIAR DO RIO MATO GROSSO NA CHAPADA DIAMANTINA DA BAHIA

 

 

Jules Ramon Brito Teixeira. Enfermeiro. Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem e Saúde da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - PPGES/UESB. Membro do Grupo de Pesquisa Saúde e Qualidade de Vida - SQV/CNPq/UESB. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia – FAPESB. E-mail: julesramon@gmail.com

 

Ramon Missias Moreira. Educador Físico. Mestre pelo PPGES/UESB. Professor auxiliar do Departamento e Saúde da UESB. Membro do Grupo de Pesquisa SQV/CNPq/UESB. E-mail: ramonefisica@hotmail.com

 

 

Endereço para correspondência:

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e Saúde.

Av. José Moreira Sobrinho, s/n – Bairro Jequiezinho.

CEP: 45206-190 - Jequié (BA), Bahia, Brasil.

Fone: (73) 3528-9738.

 

RESUMO

 

Este estudo objetivou analisar a expansão da atividade agrícola nas margens do Rio Mato Grosso na Chapada Diamantina da Bahia e sua relação com a mata ciliar. Pesquisa descritivo-exploratória, que adota uma abordagem quanti-qualitativa, realizada na comunidade de Laranjeiras, mais precisamente no “Morro do Ouro”, no Município de Ituaçu-BA. Teve como informantes 10 agricultores, tendo sido realizada uma entrevista semi-estruturada para coletar os dados. Foram utilizadas como técnicas de análise dos dados: Análise Estatística Descritiva e Análise de Conteúdo Temático Categorial. A análise estatística evidenciou que 50% cultivam suas plantações há mais de 20 anos e 100% utilizam a região ribeirinha como área de cultivo comercial, praticando a monocultura. Na análise de conteúdo emergiram 2 categorias: Categoria 1 – Percepção e Categoria 2 – Devastação e Descaso. Considera-se fundamental a intensificação de ações na área da educação ambiental, visando sensibilizar as pessoas sobre os benefícios da conservação das áreas ciliares.

 

Palavras-chave: Atividade Agrícola; Mata Ciliar; Desmatamento; Rios.

 

            1 INTRODUÇÃO

 

A mata ciliar trata-se da formação vegetal localizada nas margens de nascentes, córregos, rios, lagos, represas e também é conhecida como mata de galeria, mata de várzea, vegetação ou floresta ripária. É considerada pelo Código Florestal Federal como área de preservação permanente, com diversas funções ambientais, devendo ser respeitada uma extensão específica de acordo com a largura do rio, lago, represa ou nascente.

Nessa perspectiva, a mata ciliar é de extrema importância para a preservação da natureza e manutenção da vida sobre a terra, servindo de proteção aos rios, igarapés, córregos, lagos, represas e nascentes, as quais são áreas protegidas por lei, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, paisagens, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar, qualidade de vida e saúde das populações humanas.

Segundo Silva et al (2011) o uso das áreas naturais e do solo para a agricultura, pecuária, loteamentos e construção de hidrelétricas contribuíram para a redução da vegetação original, chegando em muitos casos na ausência da mata ciliar. Em contrapartida, a falta da mata ciliar faz com que a água da chuva escoe sobre a superfície, não permitindo sua infiltração e armazenamento no lençol freático. Com isso, reduzem-se as nascentes, os córregos, os rios e os riachos.

Além disso, a destruição da mata ciliar gera a erosão, poluição (BELMIRO et al, 2012) e assoreamento, visto que a erosão das margens leva terra para dentro do rio, tornando-o barrento e dificultando a entrada da luz solar. Pode provocar ainda o aparecimento de pragas e doenças na lavoura e outros prejuízos econômicos às propriedades rurais (SÁBER, 2003).

A ação do homem se constitui como fator principal no processo de degradação ambiental, especialmente no desenvolvimento da agropecuária, onde utilizam áreas de mata ciliar, que são naturalmente úmidas e favorecem o desenvolvimento dessas atividades.

Nesse sentido, o Rio Mato Grosso abastece a cidade de Ituaçu-BA, a qual  está situada geograficamente na Serra Geral, na entrada sul para a Chapada Diamantina, distante 470 km da capital baiana, onde a manutenção de suas águas vem se transformando em preocupação central para o abastecimento urbano e o desenvolvimento rural sustentável.

Entretanto, observa-se empiricamente que o município supracitado possui como atividade principal, especialmente na região da nascente, a cafeicultura, onde se desenvolvem a agricultura familiar através do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), que funciona como subsistência e mantém as famílias em suas propriedades. Por outro lado é necessário se preservar, manter o rio vivo, culminando o equilíbrio ecológico.

Este estudo foi desenvolvido na comunidade de Laranjeiras, mais precisamente no “Morro do Ouro”, região foco da atividade de pesquisas estudo, foram realizadas entrevistas para investigar as evidentes agreções ao meio ambiente.

Assim, nota-se a grande relevância deste estudo, pois além de proporcionar clareza no conhecimento da expansão da atividade agrícola na região já mencionada, o mesmo dará subsídios para identificar a realidade no que concerne ao desmatamento da mata ciliar local. A identificação desse diagnóstico situacional poderá contribuir para sensibilizar não apenas os agricultores, em especial os do Morro do Ouro, mas também a comunidade ituaçuense, o gestor municipal e a esfera estadual e federal, os quais exercem corresponsabilidade na gênese destes acontecimentos.

Nesse sentido, este estudo apresenta como máxime objetivo analisar a expansão da atividade agrícola nas margens do Rio Mato Grosso da Chapada Diamantina na Bahia e sua relação com a mata ciliar.

 

2 REFERENCIAL TEÓRICO

 

2.1 Mata Ciliar: Conceitos e Definições

 

A mata ciliar, também chamada de vegetação ribeirinha, vegetação ripária ou vegetação ripícola refere-se à vegetação que ocorre nas margens de rios e mananciais. Assim é denominada pelo fato de que ela pode ser tomada como uma espécie de "cílio", que protege os cursos de água da erosão e assoreamento (ALVARENGA, 2004).

Nessa perspectiva, para facilitar o cultivo de lavouras e aumentar as áreas de plantio o processo de eliminação das florestas resultou num conjunto de problemas ambientais, como a extinção de várias espécies da fauna e flora, mudanças climáticas locais, erosão dos solos, eutrofização e assoreamento dos cursos d'água.

Não sendo exceção, as matas ciliares não escaparam dessa destruição e tornaram-se alvo de todo tipo de degradação. Como prova disso, tem-se o fato de que muitas cidades foram formadas às margens dos rios, eliminando todo tipo de vegetação ciliar, e muitas sofrem hoje com constantes inundações, poluição, doenças e modificação da paisagem, os quais são efeitos negativos desses atos depredatórios (FERREIRA; DIAS, 2004).

Ainda segundo Sáber (2003), a mata ciliar constitui-se de uma floresta que se mantém verde durante o ano todo (não perde as folhas durante a estação seca) que acompanha os córregos e riachos da região Centro-Oeste do Brasil. Apresentam árvores com altura entre 20 e 30 metros. Esta fisionomia é comumente associada a solos hidromórficos, com excesso de umidade na maior parte do ano devido ao lençol freático superficial e grande quantidade de material orgânico acumulado, propiciando e decomposição que confere a cor preta característica desses solos (tipo de Cerrado).

A mata ciliar pode ser encontrada ao longo do curso dos rios e tem uma especificidade diferenciando-a dos diversos biomas existentes, mesmo não estando diretamente ligada a eles. Sendo assim, esse tipo de mata também influencia na fauna e flora que existe na região onde a mesma predomina. Para entender melhor sobre esses aspectos deve-se observar algumas características do solo, da bacia hidrográfica e de outros elementos existentes durante o curso das águas, que influenciam diretamente nas características das espécies arbóricas e rasteiras existentes nestes locais.

As formações ciliares desempenham relevante importância na manutenção da integridade dos ecossistemas locais, representando importantes áreas de preservação de espécies animais e vegetais e conservação dos recursos naturais. Porém, mesmo protegidas por legislação ambiental específica, estas formações foram e continuam sendo alteradas, principalmente por atividades inconsequentes do homem (BATTILANI, SCREMIN-DIAS; SOUZA, 2005).

As atividades agropecuárias associadas ao uso de queimadas e extrativismo florestal são referidas como os principais agentes causadores da fragmentação florestal ciliar e degradação dos ecossistemas associados às bacias hidrográficas.

Como tentativa de reduzir o desgaste e destruição dessa vegetação, tem sido realizados programas de recuperação de matas ciliares a partir do plantio de espécies nativas de diferentes estádios serais, cultivadas em viveiros e transplantadas para campo. Entretanto, o sucesso de reflorestamentos com espécies nativas depende muito mais da capacidade de estabelecer espécies vegetais sob os estresses impostos pelo ambiente, de modo que a mata formada seja capaz de aumentar a matéria orgânica e a atividade biológica do solo, além de promover a ciclagem de nutrientes e, assim, iniciar o processo de sucessão (CARRENHO; TRUFEM; BONONI, 2001).

Além disso, afora a dispersão natural, a diversidade em matas regeneradas dependerá diretamente da capacidade de as espécies arbóreas suportarem os estresses ambientais, nutrirem-se satisfatoriamente, adaptarem-se ao ecossistema regenerado, vivendo em competição ou sinergismo com outras espécies e sobretudo à ação do homem.

 

2.2 Legislação e Descaso

 

A mata ciliar é uma área de preservação permanente, que segundo o Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012) deve-se manter intocada e caso esteja degradada deve-se prever a imediata recuperação (BRASIL, 2012). Tendo em vista garantir a preservação dos recursos hídricos, da estabilidade geológica e da biodiversidade, bem como o bem-estar das populações humanas (ARAÚJO, 2002).

Toda a vegetação natural (arbórea ou não) presente ao longo das margens dos rios, e ao redor de nascentes e de reservatórios, devem ser preservadas.

De acordo com o artigo 4° desta lei, a largura da faixa de mata ciliar a ser preservada está relacionada com a largura do curso d'água. Apresenta-se abaixo as dimensões das faixas de mata ciliar em relação à largura dos rios, lagos, represas e nascentes de acordo com o novo Código Floresta brasileiro (BRASIL, 2012):

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

Nessa perspectiva e conforme supracitado, a intervenção humana em área de mata ciliar, além de ser proibida pela legislação federal, causa uma série de danos ambientais.

Segundo Ferreira e Dias (2004) as matas ciliares atuam como barreira física, regulando os processos de troca entre os ecossistemas terrestres e aquáticos e desenvolvendo condições propícias à infiltração. Sua presença reduz significativamente a possibilidade de contaminação dos cursos d'água por sedimentos, resíduos de adubos e defensivos agrícolas, conduzidos pelo escoamento superficial da água no terreno.

Apesar disto, a erradicação do ecossistema ciliar, principalmente nas regiões mais populosas do Brasil, tem frequentemente ocorrido em desrespeito à legislação vigente e o que se observa é um completo descaso por parte dos órgãos fiscalizadores das esferas de governo municipal, estadual e federal.

 

3 MATERIAIS E MÉTODOS

 

Trata-se de um estudo de perfil descritivo-exploratório, pois este tipo de pesquisa, que adota uma abordagem quanti-qualitativa dos fatos, uma vez que procura aprofundar-se no mundo dos significados das ações e relações humanas, o que não será perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas (MINAYO; DESLANDES; GOMES, 2012).

O estudo foi realizado na comunidade de Laranjeiras, mais precisamente no “Morro do Ouro”, no Município de Ituaçu, localizada da Serra Geral da Chapada Diamantina da Bahia e banhada pelo Rio Mato Grosso.

A população estudada foi composta pelos 10 agricultores que residem e estabelecem plantio na região supracitada e todos aceitaram participar voluntariamente da pesquisa.

Foi utilizada como técnica de coleta de dados a entrevista semi-estruturada. Os participantes foram convidados a participar da pesquisa após a explicação verbal e escrita das informações e esclarecimentos sobre a finalidade e importância de sua colaboração para o andamento da mesma. Os dados foram coletados através de um questionário, no período de 01 a 22 de março de 2013.

Os dados quantitativos foram submetidos à aplicação de cálculos estatísticos através do software Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 17.1.0. Os resultados advindos desse processamento foi apresentado sob a forma de frequências absoluta e relativa e organizados sob a forma de tabelas. As questões subjetivas foram analisadas de acordo com a Técnica de Análise de Conteúdo Temático Categorial segundo Bardin (2011).

Inicialmente realizou-se leitura flutuante dos depoimentos definindo o corpus do trabalho, constituído de 10 entrevistas. Em seguida, procedeu-se a leitura exaustiva dos depoimentos, para estabelecer os objetivos da análise. Foram selecionados elementos como palavras e frases dotadas de significados. Em seguida procedeu-se a codificação das unidades de análise de acordo com a analogia dos significados e abstração das categorias. Os qualitativos resultados foram apresentados por categorias e discutidas tomando-se como princípio de análise a interpretação das unidades de análises temáticas que emergiram do conteúdo das respostas. Ao final de cada recorte realizado nas falas dos sujeitos será indicado entre parênteses uma identificação fictícia dos sujeitos através de codificações alfanuméricas de Agricultor 1 a Agricultor 10.

Em atendimento à Resolução nº 196/1996, do Conselho Nacional de Saúde, por tratar-se de uma pesquisa que envolve seres humanos, este estudo ofereceu ao sujeito um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido informando ao sujeito que sua participação seria inteiramente voluntária e que a qualquer momento ele poderia optar por deixar de participar do estudo caso fosse do seu interesse, sem qualquer tipo de prejuízo à sua pessoa.

 

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

            Iniciou-se a análise por meio do auxílio dos cálculos estatísticos supracitados, através dos quais as variáveis foram testadas e correlacionadas ao objeto em estudo.

A partir de então, estabeleceu-se várias leituras das entrevistas realizadas com os agricultores da região do Morro do Ouro no Município de Ituaçu-BA, buscando desta maneira identificar temáticas relevantes com vistas a categorizá-las.

 

4.1 Características sóciodemográficas dos entrevistados

 

Os participantes desta pesquisa foram caracterizados como sujeitos ou atores sociais, visto que além de serem elementos constituintes do processo investigatório, são responsáveis por validar os resultados, tornando-se agentes ativos em todo o processo e não se confundem com aqueles que simplesmente respondem às questões de uma pesquisa.

Assim, a Tabela 1 apresenta o perfil dos sujeitos respondentes, o qual foi constituído pelas variáveis sóciodemográficas que fizeram parte da ficha de identificação do questionário utilizado na coleta das informações.

 

Tabela 1: Caracterização sóciodemográfica dos agricultores entrevistados.

VARIÁVEL

CONDIÇÃO

FREQÜÊNCIA

(n=10)

%

Sexo

 

Masculino

8

80

Feminino

2

20

Idade

40 – 50

3

30

51 – 60

2

20

> 60

5

50

Estado civil

Solteiro(a)

1

10

Casado(a)

6

60

Viúvo(a)

3

30

Escolaridade

 

Analfabeto

5

50

1ª série

3

30

Até a 4ª série

2

20

Renda mensal

Até 1 salário mínimo

2

20

1 a 2 salários mínimos

4

40

2 a 3 salários mínimos

3

30

> 3 salários mínimos

1

10

 

            Os sujeitos que compuseram a amostra foram em número de 10 agricultores, dentre os quais, a partir dos valores encontrados na Tabela 1, pode-se perceber que a maioria deles é de homens (80%), sendo que a maioria encontra-se na faixa etária acima dos 60 anos (50%).

Quanto ao estado civil, observa-se que a maioria são casados (60%) e se quer foram alfabetizados (50%), tendo alguns (30%) concluído no máximo a 1ª séria do ensino primário.

Ainda de acordo com a tabela acima, constata-se que grande parte dos entrevistados (40%) sobrevivem com uma renda de até 2 salários mínimos, sendo esta advinda única e exclusivamente do cultivo de suas plantações.

 

4.2 Caracterização da prática agrícola nas margens do Rio Mato Grosso

            A Tabela 2 refere-se ao tempo em que os agricultores entrevistados cultivam suas plantações às margens do Rio Mato Grosso, mais precisamente na comunidade do Morro do Ouro, localizado no povoado Laranjeiras em Ituaçu-BA.

 

Tabela 2: Tempo de cultivo dos agricultores entrevistados.

VARIÁVEL

CONDIÇÃO

FREQUÊNCIA

N

%

Tempo de Cultivo

5 a 10 anos

1

10

10 a 15 anos

2

20

15 a 20 anos

2

20

> 20 anos

5

50

FONTE: Dados gerados pela pesquisa de campo (2013).

 

A maioria dos entrevistados (50%) cultiva suas plantações há mais de 20 anos na região ribeirinha do Rio Mato Grosso. Tal cultura pode ter contribuído enormemente para a devastação e mudança da flora e fauna local, o que pode acarretar em prejuízos irreparáveis e incalculáveis e quiçá na completa destruição do vale do rio cenário deste estudo.

Quando se retira a mata ciliar de um determinado rio, o solo das margens fica exposto à chuvas e ação do vento, os quais carregam os sedimentos e a matéria encontrados no local para as margens e para o fundo do rio. Ao longo do tempo, estes sedimentos vão se acumulando e descaracterizando o rio. Dessa maneira, a conservação da mata ciliar torna-se importante também para a conservação das características naturais dos rios e região onde se encontram (ACIESP, 1997).

Segundo Alvarenga (2004) distúrbios provocados por atividades humanas têm, na maioria das vezes, maior intensidade do que os naturais, comprometendo a sucessão secundária na área afetada. Quanto maior é o tempo em que uma área explorada pelo ser humano maiores são as chances de degradação das matas ciliares daquele local.

As principais causas dessa degradação são o desmatamento para extensão da área cultivada nas propriedades rurais e consequentemente para expansão da zona de plantio, expansão de áreas urbanas e obtenção de madeira, os incêndios, a extração de areia nos rios, os empreendimentos turísticos mal planejados, dentre outros.

Com relação ao tipo de cultivo, a Tabela 3 demonstra dados da realidade local.

 

 

Tabela 3: Tipo de cultura praticada pelos agricultores entrevistados.

VARIÁVEL

CONDIÇÃO

FREQUÊNCIA

N

%

Tipo de Cultura

Subsistência

-

-

Comercial

10

100

FONTE: Dados gerados pela pesquisa de campo (2013).

 

De acordo com a Tabela 3, os agricultores (100%) utilizam a região ribeirinha como área de cultivo comercial. A maioria deles relatou que de início a cultura era de subsistência, mas com o passar o tempo a necessidade de sobrevivência mudou e houve a necessidade da expansão da atividade agrícola e para reduzir os custos com irrigação e adubação passou-se a semear as plantações nas proximidades da margem do Rio Mato Grosso, degradando consequentemente a mata ciliar local.

Segundo Martins (2001) à medida que o homem evoluiu abdicando da vida nômade, nas áreas por ele cultivadas, a água sempre foi um fator limitante e as matas ciliares não valorizadas como elementos de qualidade dos recursos hídricos não escaparam da destruição, sendo alvo de degradação.

Segundo Alvarenga (2004) em muitas áreas ciliares, o processo de degradação é antigo, tendo iniciado com o desmatamento para transformação da área em campo de cultivo ou em pastagem. Com o passar do tempo e, dependendo da intensidade de uso, a degradação pode ser agravada através da redução da fertilidade do solo pela exportação de nutrientes pelas culturas e, ou, pela prática da queima de restos vegetais e de pastagens, da compactação e da erosão do solo pelo pisoteio do gado e pelo trânsito de máquinas agrícolas.

Nessa perspectiva, aproveita-se a área na região ribeirinha antes utilizada para o plantio do arroz, feijão, milho, etc., para o consumo próprio e passa-se a utilizar esta área para a monocultura com fins comerciais, e para isso há a necessidade de se aumentar a área para cultivo e como resultado aumenta-se também a degradação da mata ciliar, a qual muitas vezes se dar de modo inconsequente e irreparável.

A monocultura utilizada pelos agricultores entrevistados e de café, sendo realizada muito mais com fins comerciais e do que para de consumo. Segundo ACIESP (1997) este tipo de cultura acarreta sérios problemas para o solo, como o desgaste e o empobrecimento dos nutrientes pela absorção que o cafeeiro faz durante o seu crescimento e a falta de manutenção correta no plantio e replantio. A falta de diversidade de espécies também contribui para a disseminação de pragas e alguns insetos, que acabam por devorar a plantação, ou parte dela, facilitando o uso de defensivos agrícolas, que podem contaminar as plantas e o solo, se não forem usados corretamente.

 

4.3 Expansão da atividade agrícola e sua relação com a mata ciliar

 

A partir deste momento passa-se à análise dos conteúdos abstraídos, e, para facilitar a compreensão acerca dessas informações e do significado das representações dos sujeitos deste estudo acerca da sua percepção sobre a expansão da atividade agrícola e sua relação com a mata ciliar no cenário estudado, as 40 unidades de análise emergidas foram organizadas e classificadas por categorias temáticas.

 

4.3.1 Categoria 1: Percepção

 

A categoria Percepção reúne as unidades de análise temáticas em que os sujeitos relatam o seu conhecimento acerca da mata ciliar. A sustentação para esta categoria está disposta nos recortes a seguir, os quais referem-se à percepção dos agricultores de como era a mata ciliar antes e após a expansão da atividade agrícola nas margens do Rio Mato Grosso.

 

É um mato que fica na beirada do rio. (Agricultor 1)

Ela serve para a proteção do rio, das nascentes. (Agricultor 3)

Para não dar erosão, sem a mata a terra vai parar dentro do rio e vai acabando tudo. (Agricultor 5)

Fica na margem do rio, mas só faz atrapalhar a gente, porque nós precisamos de mais espaço para cultivar. (Agricultor 7)

 

Percebe-se que os entrevistados demonstram de fato saber o que vem a ser a mata ciliar, mesmo com conhecimento restrito, e da sua importância na preservação dos rios e suas nascentes.

Segundo Leandro e Viveiros (2003) as matas ciliares, quando preservadas pelo homem, possuem basicamente cinco funções: servir de abrigo para inúmeras espécies, fornecer alimentos à fauna, proteger os cursos d’água, evitar erosões nos solos e preservar a biodiversidade, pois não há floresta sem água, nem água sem floresta. Em outras palavras a mata ciliar dá proteção aos rios, nascentes, lagos e lagoas, garantindo a sua sobrevida.

Nota-se ainda que apesar do conhecimento a respeito da mata ciliar e sua importância, parte dos agricultores acreditam que seja desnecessária a sua presença e praticam o desmatamento para ampliar a área de cultivo, não levando em consideração as graves consequências advindas desse ato.

 

4.3.2 Categoria 2: Devastação e Descaso

 

Esta categoria compreende o conjunto unidades de análise temáticas referentes às manifestações dos sujeitos quanto à devastação da mata ciliar causada por eles mesmos.

 

Essa mata toda na beira do rio só faz atrapalhar, não serve de nada. (Agricultor 2)

Eu tenho que queimar tudo pra tirar o mato que fica atrapalhando. (Agricultor 4)

Sei que é bom para não deixar o rio acabar e para os bichos não morrer, mas tenho de tirar se não nem vou ter onde plantar. (Agricultor 6)

O povo fala que não pode tirar, mas a gente aqui faz queimada ou joga veneno. (Agricultor 8)

Nós capinamos tudo, não faz falta para o rio não. (Agricultor 9)

O rio seca por causa do calor e da falta de chuva e nem nunca teve fiscalização para ninguém aqui. (Agricultor 10)

 

De acordo com a análise das falas dos agricultores entrevistados, observa-se que essas unidades traduzem a percepção dos agricultores como sendo a mata ciliar desnecessária para a preservação da fauna e flora local, e, principalmente para a manutenção do curso do Rio Mato Grosso.

O desmatamento das matas ciliares resulta no assoreamento do rio. Como a mata ciliar tem por principal função proteger o solo contra erosões, a ausência desta deixa o solo desprotegido, ficando sujeito a erosões. Com a chuva, a terra é desgastada, indo para o rio, o qual fica assoreado, tendendo a ficar cada vez mais raso. Isso também diminui a qualidade da água, afetando os ecossistemas que habitam o rio, acarretando no desequilíbrio das relações ecológicas da região (MARTINS, 2001).

Ainda nessa perspectiva, muitos agricultores se utilizam de queimadas, agrotóxicos e outros meios para destruir a mata ciliar. Além disso, os agricultores informam que nunca houve nenhum tipo de fiscalização dos órgãos do governo no sentido até mesmo de orientá-los acerca da necessidade do reflorestamento e restabelecimento da mata ciliar local.

É necessário que o Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA) e o Instituto do Meio Ambiente (IMA), autoridades responsáveis pela conservação e fiscalização ambiental, adotem uma postura rígida no sentido de preservarem as florestas ciliares que ainda restam, e que os produtores rurais e a população em geral sejam conscientizadas sobre a importância da conservação dessa vegetação (MARTINS, 2001).

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Com a realização deste estudo evidenciou-se que os agricultores do vale do Morro do Ouro na comunidade de Laranjeiras, nas proximidades do Rio Mato Grosso, até possuem algum conhecimento do que vem a ser a mata ciliar e da importância da sua preservação.

Entretanto, observou-se que o discurso é totalmente inverso ao que esses agricultores colocam em prática. A maioria deles considera a mata ciliar desnecessária para a preservação do rio e consequentemente da fauna e flora local, e, além disso, afirmam que o rio sofre a erosão e assoreamento por conta da ação do calor solar e falta de chuvas.

Este estudo possibilitou demonstrar para esses agricultores que a mata ciliar é importante, não apenas para manter o rio “vivo”, mas como também para equilibrar todo o ecossistema que o circunda.

Considera-se fundamental a intensificação de ações na área da educação ambiental, visando conscientizar tanto as crianças quanto os adultos, bem como os órgãos de fiscalização e preservação ambiental, sobre os benefícios da conservação das áreas ciliares nos arredores do Rio Mato Grosso. Espera-se que, a partir daí, este estudo ofereça subsídios para a preservação dessa vegetação em todo o estado da Bahia, do Brasil e do mundo.

 

6 REFERÊNCIAS

 

ACIESP. Academia de Ciências do Estado de São Paulo. Glossário de Ecologia. São Paulo: ACIESP, n.103, 1997.

ALVARENGA, A. P. Avaliação inicial da recuperação de mata ciliar em nascentes. Dissertação (Mestrado em Engenharia Florestal), Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2004.

ARAÚJO, S. M. V. G. de A. As áreas de preservação permanente e a questão urbana. Brasília: Consultoria Legislativa, 2002. Disponível em: http://www.mp.ba.gov.br/atuacao/ceama/material/doutrinas/arborizacao/as_areas_de_preservacao_permanente_questao_urbana.pdf, acesso em 02 de maio de 2011.

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2011.

BATTILANI, J. L.; SCREMIN-DIAS, E.; SOUZA, A. L. T. Fitossociologia de um trecho da mata ciliar do rio da Prata, Jardim, MS, Brasil. Acta Botânica Brasileira. Jardim, 19(3):597-608, 2005.

BELMIRO, A. et al. Área verde benefícios para a humanidade, saúde pública e qualidade de vida. Revista Educação Ambiental em Ação, 2013. [on-line] Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1441&class=21, acesso em 02 de maio de 2013.

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CARRENHO, R.; TRUFEM, S. F. B.; BONONI, V. L. R. Fungos micorrízicos arbusculares em rizosferas de três espécies de fitobiontes instaladas em área de mata ciliar revegetada. Acta Botânica Brasileira. São Paulo: 15(1):115-124, 2001.

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Ilustrações: Silvana Santos