Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES: O CURSO DE PEDAGOGIA EM FOCO
Daniel Fernando Bovolenta Ovigli Mestrando em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e professor efetivo junto à Prefeitura Municipal de Botucatu/SP. E-mail: danielovigli@yahoo.com.br.
Fabiana Maria Ovigli Especialista em Educação Ambiental (USP/São Carlos). Professora efetiva junto à Prefeitura Municipal de Botucatu e à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. fabianaovigli@yahoo.com.br.
Andréa Bogatti Guimarães Tomazela Doutora em Agronomia (Unesp/Botucatu). andreatomazela@gmail.com
Resumo: A Educação Ambiental (EA) enquanto campo de pesquisa e prática tem se ampliado consideravelmente, tanto em nível nacional como mundial. Nesse contexto, entram em cena os trabalhos que abordam a temática ambiental na formação inicial do professor. Este trabalho vai ao encontro dessa constatação, ao assumir como meta global o levantamento e análise das percepções de licenciandos em pedagogia sobre EA e a formação que tiveram durante o curso para trabalhar com a referida temática. A amostra foi composta por alunos matriculados no segundo e oitavo semestres do curso de uma instituição privada do município de Botucatu/SP. Utilizou-se um questionário como instrumento de coleta de dados. A análise dos dados é balizada pelas quatro correntes do pensamento ambientalista descritas por Lago e Pádua (1989). Dentre os principais resultados obtidos, destaca-se uma visão de EA ainda bastante vinculada à Ecologia Social, particularmente dentre os sujeitos matriculados no segundo semestre. Quanto aos problemas ambientais mais evidenciados, percebe-se que são desligados de uma reflexão mais ampla que contemple as relações do ser humano com o meio ambiente, considerado uma trama holística e integrada que abarca não apenas determinantes concretos (lixo, desmatamento, poluição), mas também componentes econômicos e políticos. Algumas recomendações incluem a consolidação de espaços formativos externos à instituição de ensino superior, uma vez que estes podem permitir a vivência de outras experiências que potencializam a formação cidadã e ambiental.
Palavras-chave: educação ambiental, formação inicial, pedagogia.
1. INTRODUÇÃO
1.1 Trajetórias da Educação Ambiental (EA) nos diferentes níveis de ensino
A inserção da questão ambiental em todos os níveis de ensino surge como uma possibilidade produtiva de articulação entre professores e alunos em situações de ensino-aprendizagem, nas quais a problematização pode ser desenvolvida mais facilmente, por envolver, de diferentes formas, questões que perpassam o cotidiano individual e social (OLIVEIRA et al., 2000). Por meio da portaria 678, aprovada em 1991, o então Ministério da Educação e Cultura (MEC) regulamentava que todos os níveis de ensino deveriam abordar conceitos relativos à Educação Ambiental. Um ano depois, em 1992, são instituídos os Núcleos Estaduais de EA, que objetivavam o desenvolvimento de atividades nessa área em âmbito formal e não formal bem como a definição das necessidades e regulamentações da EA em nível estadual (FAGIONATO-RUFFINO, 2003). Segundo a Política Nacional de Educação Ambiental, a criação de disciplinas voltadas aos aspectos metodológicos da Educação Ambiental (EA) no ensino superior é facultada, o que tem permitido experiências formativas em algumas Instituições de Ensino Superior - IES (FREITAS et al, 2006). Nesse contexto, o âmbito mais restrito pelo qual pode ocorrer a inserção da dimensão ambiental é a intervenção em uma disciplina, podendo se estender para toda a grade curricular de um determinado curso de graduação. Para Zuin e Freitas (2006, p. 1)
Também pode passar pelos projetos de pesquisa e extensão e atingir toda a instituição, desde a normatização já existente até a gestão dos espaços nos quais estejam incidindo atividades relacionadas às questões sócio-ambientais ou mesmo dos espaços informais de convivência universitária.
Quanto à Educação Básica a legislação vigente não permite a criação de disciplinas de EA, havendo recomendação de que a mesma seja incorporada transversalmente ao currículo, e é desta maneira que a temática foi contemplada na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN. Esse documento apresenta como definição para tema transversal uma problemática social que não chega a constituir nova área, mas um tema que aparece permeando “a concepção, os objetivos, os conteúdos e as orientações didáticas de cada área, no decorrer de toda a escolaridade obrigatória” (BRASIL, 1998, p. 48). Mesmo considerando as críticas realizadas ao processo que resultou na redação e posterior distribuição dos Parâmetros para as escolas de Educação Básica, alguns fatores positivos para a EA no país vieram à tona. Por um lado, deu-se visibilidade para experiências que já vinham acontecendo; por outro, houve a emergência de diversas iniciativas de inclusão da temática ambiental na escola básica, gerando um aumento na demanda por formação em EA, em grande medida na formação continuada ou, de forma mais incipiente, na formação inicial de professores (SORRENTINO, 2000).
1.2 A dimensão ambiental na formação inicial do pedagogo
Como finalidades e propósitos de trabalho com o tema transversal “Meio Ambiente” para as séries iniciais destaca-se
(...) sua contribuição para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e atuarem na realidade sócio-ambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da sociedade, local e global. Para isso é necessário que, mais do que informações e conceitos, a escola se proponha a trabalhar com atitudes, com formação de valores, com o ensino e a aprendizagem de habilidades e procedimentos. E esse é um grande desafio para a educação. Comportamentos “ambientalmente corretos” serão aprendidos na prática do dia-a-dia na escola: gestos de solidariedade, hábitos de higiene pessoal e dos diversos ambientes, participação em pequenas negociações podem ser exemplos disso (BRASIL, 1998, p. 20).
Como entraves apontados à efetivação de mudanças na prática escolar Oliveira e colaboradores destacam (2000, p. 1): (i) a idéia de que EA é tema somente para aulas de Ciências e Biologia, (ii) ausência de recursos didáticos e elevado número de alunos por sala, (iii) ênfase à transmissão de informações, e (iv) políticas institucionais que não confluem para ações educativas centradas na mudança de atitudes e valores frente à realidade. Diante desse panorama a EA aparece como possibilidade para participação de docentes e estudantes em situações de ensino-aprendizagem em que sejam discutidas questões ambientais, por estarem vinculadas ao cotidiano e terem grande relevância social: “Esses aspectos, aliados à recente incorporação da temática como tema transversal nos Parâmetros Curriculares Nacionais, impõem e tornam um desafio a busca de alternativas formativas para profissionais atuarem na área” (OLIVEIRA et al., 2000, p. 1). A esse respeito, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o curso de Pedagogia (2006), enfatizam que a formação do licenciado nessa área deve proporcionar meios de investigação bem a como aplicação de diferentes campos de conhecimento, tais como “o filosófico, histórico, antropológico, ambiental-ecológico, psicológico, lingüístico, sociológico, político, econômico, cultural” (p. 6, grifo nosso). O objetivo de estudos empreendidos nessas áreas diz respeito a nortear a observação, análise, execução e avaliação do processo de ensino-aprendizagem e de suas repercussões, assim como na orientação “de práticas e gestão de processos educativos escolares e não-escolares, além da organização, funcionamento e avaliação de sistemas e de estabelecimentos de ensino” (p. 6). No mesmo documento, no tópico “Organização Curricular do curso de Pedagogia”, é destacada a “preservação do meio ambiente articuladamente à da saúde e da vida, além de outras questões de relevância local, regional, nacional e até mesmo internacional” (p. 10). Nesse sentido, o perfil do licenciado em Pedagogia proposto pelas DCN ressalta que “os processos de ensinar e de aprender dão-se em meios ambiental-ecológicos, em duplo sentido, isto é, tanto professoras(es) como alunas(os) ensinam e aprendem, uns com os outros” (p. 8, grifo nosso). Portanto, uma perspectiva que tem sido ampliada nos documentos oficiais para o curso de Pedagogia diz respeito à importância da inserção da dimensão ambiental ainda durante a formação inicial. A Educação Ambiental no âmbito da formação inicial de professores tem exigido uma ampla reflexão sobre os cursos universitários e uma profunda análise do processo de inserção da dimensão ambiental nas práticas pedagógicas dos futuros professores. Diante desse panorama algumas investigações têm mostrado que
(...) os professores das séries iniciais do Ensino Fundamental têm apresentado uma formação, em geral, deficiente em conteúdos específicos. Apesar da dedicação desses profissionais, carecem de estudos sobre a presença de atividades, projetos e ações sobre o tema meio ambiente em suas práticas, bem como sobre a origem das informações utilizadas por esses professores em sua atividade docente (MANZANO, 2003, p. 10).
Mello e Trivelato (1999, p. 2) também ressaltam a importância dos educadores perceberem “que carregam valores e concepções, e que sua atividade docente expressa das mais diversas maneiras, consciente ou inconscientemente, esses valores e concepções”. Para Manzano (2003) toda ação que se objetive enquadrar como Educação Ambiental deve fundamentar-se na consciência acerca da problemática ambiental resultante do atual modelo de desenvolvimento e que congrega componentes de ordem ética, política, economia, científica, tecnológica e cultural da sociedade. Assim, empreender ações em EA também possibilita a construção da cidadania e da democracia. Reigota (1995, p. 11) apresenta a Educação Ambiental como uma proposta de alteração daquela que hoje conhecemos, não se limitando apenas à transmissão de conhecimentos sobre ecologia e à utilização racional dos recursos naturais, mas principalmente à “participação dos cidadãos nas decisões e discussões sobre a questão ambiental”. Nessa perspectiva de que a EA é uma nova dimensão da Educação, a escola aparece como local privilegiado, ou muito indicado para se discutir tal tema. Penteado (2000) em seu trabalho “Meio Ambiente e Formação de Professores” traz para a discussão das questões ambientais, aspectos sócio-políticos.
Onde promover a conjugação destes dois aspectos: compreensão das questões ambientais enquanto questões sócio-políticas, por intermédio da análise das Ciências Sociais e a formação de uma consciência ambiental? A escola é, sem sombra de dúvida, o local ideal para se promover este processo. As disciplinas escolares são os recursos didáticos através dos quais os conhecimentos científicos de que a sociedade já dispõe são colocados ao alcance dos alunos. As aulas são o espaço ideal de trabalho com os conhecimentos e onde se desencadeiam experiências e vivências formadoras de consciências mais vigorosas porque alimentadas no saber (PENTEADO, 2000, p. 16).
Krasilchik, em trabalho publicado em 1986, destaca que para que a escola formal desenvolva programas de EA algumas medidas devem ser tomadas, dentre elas fazer com que as instituições que formam professores de todas as disciplinas assumam a responsabilidade de preparar futuros docentes para desenvolver programas de EA. Penteado (2000) também destaca a necessidade de o professor ter uma consciência ambiental com “conhecimentos decorrentes de uma abordagem sócio-política da questão”. A autora chama a atenção para a necessidade de se analisar as questões relativas ao meio ambiente também sob a ótica das ciências humanas, que “são capazes de nos aproximar da compreensão específica deste aspecto tão importante quanto desconsiderado na atualidade”. É importante ressaltar que para a inserção da EA na escola, o currículo deverá ser repensado. Está, na base na EA, uma prática interdisciplinar que privilegie as relações tanto quanto os fatos. Mais uma vez é importante destacar que a atividade docente expressa, de diferentes formas, valores e concepções do professor, o que também se estende às suas práticas em EA.
1.3 Correntes do pensamento ambientalista
A esse respeito convém mencionar que a EA congrega diferentes conceitos atrelados a diversas concepções filosóficas sobre questões relativas ao meio ambiente expressando-se como distintas correntes do pensamento ambientalista. Tais correntes influenciaram e influenciam as práticas em EA, bem como os conteúdos a serem selecionados e a abordagem dos mesmos no que tange às questões ambientais. Essas correntes denominam-se Ecologia Natural, Ecologia Social, Conservacionismo e Ecologismo (LAGO e PÁDUA, 1989). Um quadro-síntese sobre tais pensamentos é mostrado abaixo:
Tabela 1: SARIEGO, 1995, p. 45
As problemáticas que vem sendo tecidas até aqui são constantemente apresentadas quando do estudo de questões relacionadas à EA e à formação docente para o desenvolvimento do tema. No Brasil, há mais de 20 anos trabalhos, teorias e práticas vem se desenvolvendo, porém os problemas continuam, seja nos grandes centros urbanos ou nas cidades do interior. Diante desse panorama é que nos propusemos a investigar como tem ocorrido a formação do pedagogo para lidar com questões ambientais (particularmente no município de Botucatu/SP) bem como suas visões acerca dessa problemática e a inclusão da mesma nas séries iniciais da Educação Básica.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho teve como objetivo geral o levantamento e análise das percepções de licenciandos em pedagogia sobre a educação ambiental em sua formação inicial. Dentre os objetivos específicos, destacam-se:
- a compreensão dos sujeitos investigados acerca da inserção da questão ambiental nas séries em que irão atuar; - a formação que tiveram para trabalhar com a questão ambiental; - as percepções que os sujeitos apresentam sobre a temática em questão.
Seu desenvolvimento se deu junto a uma instituição privada de ensino superior localizada no interior do estado de São Paulo. O curso de Pedagogia, objeto da investigação aqui apresentada, foi criado em 1963, e reconhecido pelo Decreto Federal nº. 61.107, de 28/07/67, sendo responsável por parcela significativa dos recursos humanos dessa área formados para atuar junto às escolas de educação básica da região considerada, nas funções de docência, gestão ou supervisão. Em 2006 houve uma reestruturação curricular do curso de Pedagogia, de modo a adequar-se às diretrizes propostas pelo Ministério da Educação.
Sendo a docência a base da formação oferecida, seus egressos recebem o grau de Licenciados(as) em Pedagogia com o qual fazem jus a atuar como docentes na Educação Infantil, nos anos iniciais do Ensino Fundamental e em disciplinas dos cursos de nível médio na modalidade Normal e de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e outras em que disciplinas pedagógicas estejam previstas, no planejamento, execução e avaliação de programas e projetos pedagógicos e sistemas em unidades de ensino e em ambientes não escolares (BRASIL, 2006, p. 10).
Os dados foram coletados por meio de um questionário, obedecendo a critérios descritos por Gil (2008). Quatro partes compuseram o instrumento de coleta de dados, a saber: levantamento do perfil pessoal e profissional dos sujeitos investigados (primeira parte), a compreensão dos licenciandos sobre a questão ambiental e suas percepções sobre as questões ambientais de seu entorno, no caso, o município no qual o curso é ofertado (segunda e terceira partes, respectivamente). A quarta e última parte abarca as percepções dos sujeitos sobre a formação que tiveram para trabalhar educação ambiental nas séries em que irão atuar. O mecanismo de aplicação do questionário envolveu o contato direto do pesquisador com o informante (RICHARDSON, 2008).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre os 20 alunos que compõem a turma matriculada no segundo semestre, 16 encontravam-se presentes quando da aplicação do instrumento de coleta de dados. De modo geral, mostraram-se bastante receptivos e dispostos a responder às questões. O oitavo semestre possui 25 alunos regularmente matriculados, dos quais 23 estavam presentes no dia da aplicação. Notou-se maior atenção desta turma na leitura do enunciado das questões, considerando o reduzido número de respostas deixadas em branco.
3.1 Breve caracterização dos sujeitos
Dentre os sujeitos que trabalham, verifica-se que a modalidade Ensino Médio tradicional é mais ocorrente (18 sujeitos) e o magistério foi cursado por quatro sujeitos do 8º semestre. EJA e ensino técnico-profissionalizante aparecem em menor quantidade (dois e três sujeitos, respectivamente). A totalidade dos sujeitos que não trabalha é do sexo feminino e reside na cidade de Botucatu, têm entre 18 e 20 anos (quatro sujeitos do 2º semestre) e mais de 27 anos (dois estudantes do 2º semestre e dois do oitavo) e completaram o Ensino Médio na modalidade tradicional (cinco estudantes), magistério (um) e EJA (dois). As profissões citadas foram prioritariamente auxiliares de cozinha, escritório, auxiliar de classe, balconista, carteiro e, inclusive, professor eventual. Destaca-se o fato de que parte significativa dos alunos do oitavo semestre (12 sujeitos) estão atuando em funções pedagógicas, como auxiliar de classe, professor(a) e instrutor de projeto Lego Education1, demonstrando a inserção dos estudantes dessa turma na área educacional.
3.2. Apontamentos acerca das idéias sobre ambiente expressas pelos sujeitos
A questão 1 da Parte 2 objetivou o levantamento de idéias sobre meio ambiente dos graduandos em Pedagogia considerando as quatro correntes do pensamento ambientalista descritas por Lago e Pádua (1989), conforme mostra a Figura 1.
Figura 1: Correntes do pensamento ambientalista
Verifica-se que grande parte dos sujeitos assinalou a opção 2, denominada Ecologia Social. Segundo Lago e Pádua (1989), essa corrente orienta-se por uma concepção materialista e progressista. Para estes autores nessa corrente predomina a idéia de que o desenvolvimento científico e tecnológico possibilitará um domínio consciente e sustentado do ambiente natural. Nesse contexto, a Educação Ambiental pautada nos conceitos de Ecologia Social pode ser relacionada à pedagogia crítico-social dos conteúdos (LIBÂNEO, 1986), que focaliza a teoria vinculada à prática refletida do sujeito da aprendizagem sobre seu entorno social. Nessa componente do pensamento ambiental a EA, além de descrever a natureza, também se ocupa da denúncia às ações humanas onerosas ao ambiente, incluindo alterações globais provocadas pela ação humana (alguns exemplos incluem efeito estufa e redução da camada de ozônio). Em menor proporção, a corrente 3, denominada Conservacionismo, tem por pressupostos o não embasamento científico para sua ação, tem como finalidade a “conservação da natureza tal como o homem a encontrou ao surgir na Terra” (SARIEGO, 1995).
“No nosso século essa visão é reforçada pelas contradições geradas ante o esgotamento da crença positivista no progresso da Ciência como fator redentor da humanidade. Mais do que nunca, os avanços tecnológicos (energia nuclear, agrotóxicos, engenharia genética) representam uma séria ameaça ao bem estar e sobrevivência da humanidade” (SARIEGO, 1995, p.12).
A concepção pedagógica inerente à corrente conservacionista é de cunho libertário (LIBÂNEO, 1986). Essa vertente considera secundários os conteúdos formais, cabendo ao professor um papel de orientador de aprendizagens. Outra vertente pedagógica do conservacionismo se apresenta na tendência renovada não-diretiva. Para Sariego (1995) essa pedagogia
(...) reflete o descrédito pelo saber científico por privilegiar a formação nos aspectos psicológicos, o meio ambiente interno e mental. Tal como na tendência libertária, os conteúdos formais, tão caros às tendências tradicionalista e tecnicista, também são considerados secundários e de valor apenas instrumental, já que o principal é levar os alunos a procurarem os conhecimentos por si mesmos. Também abarca as pedagogias ditas "alternativas" de cunho humanista, como o método logosófico e a pedagogia Waldorf. Em termos metodológicos, essa tendência pedagógica utiliza as técnicas de sensibilização, para o qual o contato e vivência com os ambientes conservados desempenham importante papel. Do ponto de vista prático são privilegiados os estudos do meio e excursões, realizados principalmente em ambientes naturais preservados (p. 37).
3.3 Problemas ambientais mais recorrentes no município
A terceira parte do questionário objetivou, em linhas gerais, o levantamento dos principais problemas ambientais do município bem como algumas ações que poderiam ser empreendidas minoração dos problemas ambientais mais citados (questão 2).
“São os terrenos vazios que acumulam lixos e provocam doenças”. (aluna do 2º semestre) “Usina de reciclagem do lixo, esclarecimento para a população de locais para depósito de pilhas e outros objetos de uso doméstico”. (aluna do 8º semestre) “Mais limpeza nas ruas e nas praças”. (aluna do 2º semestre)
A concepção ambientalista voltada à Ecologia Social faz-se presente mais uma vez, revelando por vezes a dissociação do ser humano como sendo integrante do ambiente, considerando uma trama holística e integrada que abarca não apenas determinantes concretos (lixo, desmatamento, poluição), mas também componentes econômicos e políticos e a intervenção humana. Uma hipótese para a freqüente ocorrência dessas respostas reside na realidade imediata dos sujeitos investigados, considerando que as problemáticas indicadas em suas considerações circulam freqüentemente na mídia impressa e eletrônica e também por observações que realizam cotidianamente. Nesse sentido, questionar problemas ambientais também passa por questionar o atual modelo de produção adotado, implícito nas falas dos respondentes. Um grande número de sujeitos cita a limpeza da cidade como principal problema, conforme elencado na análise acima descrita. Percebe-se, no entanto, uma tendência a certo deslocamento das respostas focadas predominantemente nas questões relativas ao lixo para outras mais amplas, como a conscientização da população. 3.4 Mapeando a formação ambiental dos licenciandos A quarta parte do questionário contempla informações referentes ao modo como os licenciandos pretendem abordar EA em sua futura prática pedagógica. O recorte aqui apresentado leva em consideração o tema apontado como mais relevante para abordagem na futura prática pedagógica do licenciando.
Figura 3: Problemas ambientais na prática pedagógica em EA
As respostas obtidas junto a alunos do oitavo semestre centram-se nos temas “água”, “desmatamento” e “lixo”. Os estudantes do segundo semestre apontaram, além dos dois primeiros temas citados por seus colegas do oitavo semestre, a “preservação do meio ambiente”, destacando todas as problemáticas elencadas na questão. Nas respostas de estudantes do oitavo semestre percebe-se uma tendência a enfocar os métodos de abordagem da temática ambiental que lançarão mão em sua futura prática docente, conforme explicitado nos excertos selecionados. Mais uma vez, destaca-se o fato de que doze sujeitos já atuam na área educacional.
Tabela 6: Respostas à questão 1
Na questão 2 buscou-se verificar as disciplinas nas quais conteúdos referentes à educação ambiental seriam/foram abordados. Há que se ressaltar o oferecimento de uma disciplina intitulada “Educação Ambiental” no sexto semestre do curso, apontada apenas pelos alunos do oitavo semestre. A referida disciplina não é mencionada pelos estudantes do segundo semestre, talvez por desconhecerem a grade curricular do curso.
Tabela 7: Abordagem de EA nas disciplinas do curso – 2º semestre (n=16)
Nas tabelas 7 e 8 verifica-se que a somatória da porcentagem de respostas ultrapassa 100% considerando que nessas questões lhes era facultado assinalar mais de uma alternativa.
Tabela 8: Abordagem de EA nas disciplinas do curso – 8º semestre (n=23)
A importância da EA na formação do pedagogo pode ser expressa por algumas respostas, abaixo transcritas:
“Sim, pois estamos em uma época de exploração da natureza e não nos conscientizamos que isso acarretará problemas futuros”. (estudante do 2º semestre) “Sim, porque o pedagogo deve abordar a parte ambiental como uma disciplina a ser dada”. (estudante do 2º semestre)
“Sim, pois o educador deve ser o mais completo possível, devido às exigências atuais da sociedade”. (estudante do 8º semestre)
“Sim, é muito importante, porque o professor precisa incentivar e conscientizar seus alunos e saber o que é e precisar seu meio ambiente”. (estudante 8º semestre)
Chama a atenção o número de sujeitos (sete, o que corresponde a 18% do total de sujeitos) que responderam não pretender aperfeiçoar-se na área de EA. Mais uma vez, ficou evidente que muitas respostas apresentavam idéias simplistas sobre meio ambiente, conforme já discutido acima, mesmo entre os alunos do oitavo semestre, que já haviam passado por disciplinas que contemplavam a temática ambiental (e muitos deles já atuam na educação básica). Nesse contexto, não basta simplesmente haver uma disciplina específica que aborde a temática ambiental de modo meramente propedêutico. A ausência de um vínculo com questões ambientais mais amplas e a não-reflexão acerca da prática pedagógica que envolve tais temáticas certamente contribui para a visão superficial que os estudantes apresentam. Além disso, a compartimentalização disciplinar do currículo de formação de professores reforça a ausência de diálogo da EA com outras áreas, como a sociologia, a antropologia e a história, disciplinas que também compõem o currículo do curso: a visão fragmentada sobre meio ambiente pode ter como uma das componentes esse modelo de organização curricular, ainda vigente na maioria das instituições de ensino superior.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os problemas ambientais estão presentes na vida da população. Seja por atitudes impensadas ou por incompetência de autoridades, a destruição do meio ambiente vem aumentando consideravelmente nas últimas décadas, no Brasil e no mundo. Tais problemas comprometem a qualidade de vida da sociedade atual e poderão afetar ainda mais seriamente as gerações futuras. A EA aparece como uma possibilidade de melhoria dessa conjuntura visando à divulgação da problemática ambiental em todos os contextos em que aparece bem como a conscientização e mudança de atitudes da população. E o professor da Educação Básica tem um papel fundamental nesse processo. Nesse sentido, a formação do pedagogo não deve prescindir de discussões que contemplem a temática ambiental e sua importância na constituição da cidadania, tão preconizada pelas propostas curriculares estaduais e nacionais. Percebe-se, entretanto, que as visões dos próprios licenciandos apresentam um caráter por vezes simplista visto que, na maioria das respostas, o meio ambiente é considerado como sendo formado apenas por animais e vegetais, também vindo à tona outras questões como lixo, reciclagem e desmatamento. Poucas respostas evidenciam a necessidade de se pensar o meio ambiente (e a EA) como uma inter-relação de todos os componentes envolvidos, sejam eles bióticos ou abióticos. Alguns desdobramentos futuros da investigação aqui apresentada poderiam abordar como se processam, na sala de aula, os discursos dos licenciandos. O professor leva para a sala de aula a visão de mundo que tem e certamente essa visão também se estende às idéias docentes sobre meio ambiente. Entretanto nosso estudo demonstrou que mesmo os espaços curriculares limitados, como a implementação de uma disciplina de EA pode e deve ser aproveitado para a inclusão da perspectiva ambiental na formação do pedagogo, com todos os seus desafios e obstáculos, mas que são perpassados por mudanças, ainda que pequenas, nos licenciandos e licenciandas. Algumas dessas mudanças mais evidentes e explicitadas ao compararmos, por exemplo, as respostas dos alunos matriculados no segundo semestre com a dos alunos matriculados no oitavo, que já experienciaram uma disciplina de EA. Estes apontamentos mostram aproximações com o estudo de Zuin (2007) sobre a inserção da dimensão ambiental no curso de licenciatura em Química de uma IES também situada no estado de São Paulo. Os alunos da disciplina investigada pela autora “revelaram concepções que colocam o homem como dominador da natureza” (p. 4) e, para eles, a Educação Ambiental teria como papel a transmissão de conhecimentos científicos acerca do ambiente. Faz-se necessário considerar alguns movimentos, ainda que incipientes, principalmente por parte dos discentes e alguns docentes que compõem o quadro da instituição investigada em nosso estudo, em direção à inclusão da problemática sócio-ambiental no curso de Pedagogia. Algumas alternativas formativas em Educação Ambiental para as IES incluem a consolidação de espaços de ensino e aprendizagem externos à universidade, uma vez que estes podem permitir a vivência de outras experiências que potencializam a formação cidadã e ambiental. Dessa forma, configura-se uma outra abordagem de currículo de graduação, com a inclusão de outros espaços de formação científica e cidadã, com a gradativa inserção da perspectiva da sustentabilidade.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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NOTAS 1Trata-se de um projeto implementado em escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental que tem como objetivos o “aprender fazendo e o desenvolvimento de competências e habilidades que levem o educando a compreender o mundo e como as coisas funcionam” (Folder do Projeto Lego Education).
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