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       "Educar é crescer. E crescer é viver. Educação é, assim, vida no sentido mais autêntico da palavra. " (Anísio Teixeira) 
      ISSN 1678-0701 · Volume IX, Número 34 · Dezembro/2010-Fevereiro/2011 
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 O que é Sustentabilidade Fritjof Capra Neste texto o físico Fritjof Capra 
mostra que sustentabilidade é a consequência de um complexo padrão de 
organização que apresenta cinco características básicas: interdependência, 
reciclagem, parceria, flexibilidade e diversidade. Ele sugere que, se estas 
características, encontradas em ecossistemas, forem 'aplicadas' às sociedades 
humanas, essas sociedades também poderão alcançar a sustentabilidade. Portanto, 
segundo a visão de Capra, "sustentável" não se refere apenas ao tipo de 
interação humana com o mundo que preserva ou conserva o meio ambiente para não 
comprometer os recursos naturais das gerações futuras, ou que visa unicamente a 
manutenção prolongada de entes ou processos econômicos, sociais, culturais, 
políticos, institucionais ou físico-territoriais, mas uma função complexa, que 
combina de uma maneira particular cinco variáveis de estado relacionadas às 
características acima. O texto - adaptado por Augusto de Franco para a revista 
Século XXI (número 3, setembro de 1999) do Instituto de Política - foi tirado, 
com autorização dos editores brasileiros, do epílogo do livro 'A Teia da Vida: 
uma nova compreensão dos sistemas vivos' (Cultrix - Amana-Key, São Paulo, 1997) 
intitulado 'Alfabetização Ecológica'.   Introdução 1. 'Reconectar-se com a teia da vida 
significa construir, nutrir e educar comunidades sustentáveis, nas quais podemos 
satisfazer nossas aspirações e nossas necessidades sem diminuir as chances das 
gerações futuras. Para realizar essa tarefa, podemos aprender valiosas lições 
extraídas do estudo de ecossistemas, que são comunidades sustentáveis de 
plantas, de animais e de microorganismos. Para compreender essas lições, 
precisamos aprender os princípios básicos da ecologia. Precisamos nos tornar, 
por assim dizer, ecologicamente alfabetizados (Bateson, Gregory. 'Mind and 
Nature: A Necessary Unity', Dutton, Nova York, 1979). Ser ecologicamente 
alfabetizado, ou 'eco-alfabetizado', significa entender os princípios de 
organização das comunidades ecológicas (ecossistemas) e usar esses princípios 
para criar comunidades humanas sustentáveis. Precisamos revitalizar nossas 
comunidades - inclusive nossas comunidades educativas, comerciais e políticas - 
de modo que os princípios da ecologia se manifestem nelas como princípios de 
educação, de administração e de política (idem). 2. A teoria dos sistemas vivos discutida 
aqui fornece um arcabouço conceitual para o elo entre comunidades ecológicas e 
comunidades humanas. Ambas são sistemas vivos que exibem os mesmos princípios 
básicos de organização. São redes que organizacionalmente fechadas, mas abertas 
aos fluxos de energia e de recursos; suas estruturas são determinadas por suas 
histórias de mudanças estruturais; são inteligentes devido às dimensões 
cognitivas inerentes aos processos da vida. 3. Naturalmente, há muitas diferenças 
entre ecossistemas e comunidades humanas. Nos ecossistemas não existe 
autopercepção, nem linguagem, nem consciência e nem cultura; portanto, neles não 
há justiça nem democracia; mas também não há cobiça nem desonestidade. Não 
podemos aprender algo sobre valores e fraquezas humanas a partir de 
ecossistemas. Mas o que podemos aprender, e devemos aprender com eles, é como 
viver de maneira sustentável. Durante mais de três bilhões de anos de evolução, 
os ecossistemas do planeta têm se organizado de maneiras sutis e complexas, a 
fim de maximizar a sustentabilidade. Essa sabedoria da natureza é a essência da 
eco-alfabetização. 4. Baseando-nos no entendimento dos 
ecossistemas como redes autopoiéticas [Maturana e Varela] e como estruturas 
dissipativas [Prigogine], podemos formular um conjunto de princípios de 
organização que podem ser identificados como os princípios básicos da ecologia e 
utilizá-los como diretrizes para construir comunidades humanas sustentáveis. Interdependência 5. O primeiro desses princípios e a 
interdependência. Todos os membros de uma comunidade ecológica estão 
interligados numa vasta e intrincada rede de relações, a teia da vida. Eles 
derivam suas propriedades essenciais, e, na verdade, sua própria existência, de 
suas relações com outras coisas. A interdependência - a dependência mútua de 
todos os processos vitais dos organismos - é a natureza de todas as relações 
ecológicas. O comportamento de cada membro vivo do ecossistema depende do 
comportamento de muitos outros. O sucesso da comunidade toda depende do sucesso 
de cada um de seus membros, enquanto o sucesso de cada membro depende do sucesso 
da comunidade como um todo. 6. Entender a interdependência ecológica 
significa entender relações. Isso determina as mudanças de percepção que são 
características do pensamento sistêmico - das partes para o todo, de objetos 
para relações, de conteúdo para padrão. Uma comunidade humana sustentável está 
ciente das múltiplas relações entre seus membros. Nutrir a comunidade significa 
nutrir essas relações. 7. O fato de que o padrão básico da vida 
é um padrão de rede significa que as relações entre os membros de uma comunidade 
ecológica são não-lineares, envolvendo múltiplos laços de realimentação. Cadeias 
lineares de causa e efeito existem muito raramente nos ecossistemas. Desse modo, 
uma perturbação não estará limitada a um único efeito, mas tem probabilidade de 
se espalhar em padrões cada vez mais amplos. Ela pode até mesmo ser amplificada 
por laços de realimentação interdependentes, capazes de obscurecer a fonte 
original da perturbação. Reciclagem 8. A natureza cíclica dos processos 
ecológicos é um importante princípio da ecologia. Os laços de realimentação dos 
ecossistemas são as vias ao longo das quais os nutrientes são continuamente 
reciclados. Sendo sistemas abertos, todos os organismos de um ecossistema 
produzem resíduos. Mas o que é resíduo para uma espécie é alimento para outra, 
de modo que o ecossistema como um todo permanece livre de resíduos. As 
comunidades de organismos têm evoluído dessa maneira ao longo de bilhões de 
anos, usando e reciclando continuamente as mesmas moléculas de minerais, de água 
e de ar. 9. Aqui, a lição para as comunidades 
humanas é óbvia. Um dos principais desacordos entre a economia e a ecologia 
deriva do fato de que a natureza é cíclica, enquanto nossos sistemas industriais 
são lineares. Nossas atividades comerciais extraem recursos, transformam-nos em 
produtos e em resíduos, e vendem os produtos para os consumidores, que descartam 
ainda mais resíduos depois de ter consumido os produtos. Os padrões sustentáveis 
de produção e de consumo precisam ser cíclicos, imitando os processos cíclicos 
da natureza. Para conseguir esses padrões cíclicos, precisamos replanejar num 
nível fundamental nossas atividades comerciais e nossa economia. 10. Os ecossistemas diferem dos 
organismos individuais pelo fato de que são, em grande medida (mas não 
completamente), sistemas fechados com relação ao fluxo de matéria, embora sejam 
abertos com relação ao fluxo de energia. A fonte básica desse fluxo de energia é 
o Sol. A energia solar, transformada em energia química pela fotossíntese das 
plantas verdes, aciona a maioria dos ciclos ecológicos. (...) Parceria 11. A parceria é uma característica 
essencial das comunidades sustentáveis. Num ecossistema, os intercâmbios 
cíclicos de energia e de recursos são sustentados por uma cooperação 
generalizada. Na verdade, vimos que, desde a criação das primeiras células 
nucleadas há mais de dois bilhões de anos, a vida na Terra tem prosseguido por 
intermédio de arranjos cada vez mais intrincados de cooperação e de coevolução. 
A parceria - a tendência para formar associações, para estabelecer ligações, 
para viver dentro de outro organismo e para cooperar - é um dos 'certificados de 
qualidade' da vida. 12. Nas comunidades humanas, parceria 
significa democracia e poder pessoal, pois cada membro da comunidade desempenha 
um papel importante. Combinando o princípio da parceria com a dinâmica da 
mudança e do desenvolvimento, também podemos utilizar o termo 'coevolução' de 
maneira metafórica nas comunidades humanas. À medida que uma parceria se 
processa, cada parceiro passa a entender melhor as necessidades dos outros. Numa 
parceria verdadeira, confiante, ambos os parceiros aprendem e mudam - eles 
coevoluem. Aqui, mais uma vez, notamos a tensão básica entre o desafio da 
sustentabilidade ecológica e a maneira pela qual nossas sociedades atuais são 
estruturadas - a tensão entre economia e a ecologia. A economia enfatiza a 
competição, a expansão e a dominação; ecologia enfatiza a cooperação, a 
conservação e a parceria. 13. Os princípios da ecologia 
mencionados até agora - a interdependência, o fluxo cíclico de recursos, a 
cooperação ou a parceria - são, todos eles, diferentes aspectos do mesmo padrão 
de organização. É desse modo que os ecossistemas se organizam para maximizar a 
sustentabilidade. Uma vez que entendemos esse padrão, podemos fazer perguntas 
mais detalhadas. Por exemplo, qual é a elasticidade dessas comunidades 
ecológicas? Como reagem a perturbações externas? Essas questões nos levam a mais 
dois princípios da ecologia - flexibilidade e diversidade - que permitem que os 
ecossistemas sobrevivam a perturbações e se adaptem a condições mutáveis. Flexibilidade 14. A flexibilidade de um ecossistema é 
uma conseqüência de seus múltiplos laços de realimentação, que tendem a levar o 
sistema de volta ao equilíbrio sempre que houver um desvio com relação à norma, 
devido a condições ambientais mutáveis. Por exemplo, se um verão inusitadamente 
quente resultar num aumento de crescimento de algas num lago, algumas espécies 
de peixes que se alimentam dessas algas podem prosperar e se proliferar mais, de 
modo que seu número aumente e eles comecem a exaurir a população das algas. 
Quando sua principal fonte de alimentos for reduzida, os peixes começarão a 
desaparecer. Com a queda da população dos peixes, as algas se recuperarão e 
voltarão a se expandir. Desse modo, a perturbação original gera uma flutuação em 
torno de um laço de realimentação, o qual, finalmente, levará o sistema 
peixes/algas de volta ao equilíbrio. 15. Perturbações desse tipo acontecem o 
tempo todo, pois o meio ambiente está sempre mudando, o que leva a uma 
transformação contínua. Todas as variáveis que podemos observar num ecossistema 
- densidade populacional, disponibilidade de nutrientes, padrões meteorológicos, 
e assim por diante - sempre flutuam. É desse maneira que os ecossistemas se 
mantêm num estado flexível, prontos para se adaptar a novas condições. A teia da 
vida é uma rede flexível e sempre flutuante. Quanto mais variáveis forem 
mantidas em flutuação, mais dinâmico será o sistema, maior será a sua 
flexibilidade e maior será sua capacidade para se adaptar. (...) 16. O princípio da flexibilidade também 
sugere uma estratégia correspondente para a resolução de conflitos. Em toda 
comunidade haverá, invariavelmente, contradições e conflitos, que não podem ser 
resolvidos em favor de um ou outro lado. Por exemplo, a comunidade precisará de 
estabilidade e de mudança, de ordem e de liberdade, de tradição e de inovação. 
Esses conflitos inevitáveis são muito mais bem-resolvidos estabelecendo-se um 
equilíbrio dinâmico, em vez de decisões rígidas. A alfabetização ecológica 
inclui o conhecimento de que ambos os lados de um conflito podem ser 
importantes, dependendo do contexto, e que as contradições no âmbito de uma 
comunidade são sinais de sua diversidade e de sua vitalidade e, desse modo, 
contribuem para a viabilidade do sistema. Diversidade 17. Nos ecossistemas, o papel da 
diversidade está estreitamente ligado à estrutura em rede do sistema. Um 
ecossistema diversificado será flexível, pois contém muitas espécies com funções 
ecológicas sobrepostas que podem, parcialmente, substituir umas às outras. 
Quando uma determinada espécie é destruída por uma perturbação séria, de modo 
que um elo da rede seja quebrado, uma comunidade diversificada será capaz de 
sobreviver e de se reorganizar, pois outros elos da rede podem, pelo menos 
parcialmente, preencher a função da espécie destruída. Em outras palavras, 
quanto mais complexa for a rede, quanto mais complexo for o seu padrão de 
interconexões, mais elástica ela será. 18. Nos ecossistemas, a complexidade da 
rede é uma conseqüência da sua biodiversidade e, desse modo, uma comunidade 
ecológica diversificada é uma comunidade elástica. Nas comunidades humanas, a 
diversidade étnica e cultural pode desempenhar o mesmo papel. Diversidade 
significa muitas relações diferentes, muitas abordagens diferentes do mesmo 
problema. Uma comunidade diversificada é uma comunidade elástica, capaz de se 
adaptar a situações mutáveis. 19. No entanto, a diversidade só será 
uma vantagem estratégica se houver uma comunidade realmente vibrante, sustentada 
por uma teia de relações. Se a comunidade estiver fragmentada em grupos e em 
indivíduos isolados, a diversidade poderá, facilmente, tornar-se uma fonte de 
preconceitos e de atrito. Porém, se a comunidade estiver ciente da 
interdependência de todos os seus membros, a diversidade enriquecerá todas as 
relações e, desse modo, enriquecerá cada um dos seus membros, bem como a 
comunidade como um todo. Nessa comunidade, as informações e as idéias fluem 
livremente por toda a rede, e a diversidade de interpretações e de estilos de 
aprendizagem - até mesmo a diversidade de erros - enriquecerá toda a comunidade.   Epílogo 20. São estes, então, alguns dos 
princípios da ecologia - interdependência, reciclagem, parceria, flexibilidade, 
diversidade e, como conseqüência de todos estes, sustentabilidade. À medida que 
o nosso século se aproxima do seu término, e que nos aproximamos de um novo 
milênio, a sobrevivência da humanidade dependerá de nossa alfabetização 
ecológica, da nossa capacidade para entender esses princípios da ecologia e 
viver em conformidade com eles.'  |