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vergonha de ser lixeiro ou orgulho de ser agente ambiental: percepÇÕES
SÓCIO-AMBIENTAIS DOS membros DA ASSOCIAÇÃO COMUNITARIA RECICLANDO PARA A VIDA. Francisco
Souto de Sousa Júnior¹*, Fabiana Roberta Gonçalves e Silva², Luiz Di Souza³, e
Alzineide Maria Pereira de Lima3. Resumo: Os
membros da Associação Comunitária Reciclando para a Vida - ACREVI de Mossoró
(RN) são exemplos de cidadão que buscam um mecanismo de inclusão social com a
atividade de reciclagem de resíduos sólidos. Esta associação foi marcada por
momentos de grandes incertezas, angústias e, principalmente, receio dos
associados de estarem se inserindo na atividade de catadores/recicladores. No
entanto, têm-se observado transformações na vida dos associados que estão
conseguindo crescer no enfrentamento às adversidades a partir de um processo de
organização social. Deste modo, neste trabalho, analisaram-se as transformações
sócio-ambientais ocorridas na vida dos trabalhadores catadores/recicladores da
ACREVI, na tentativa de que eles percebam essas melhorias e construam sua
própria identidade ocupacional ou “profissional”, livres de preconceitos
sociais.
INTRODUÇÃO Em todo o
mundo o crescimento da quantidade de resíduos sólidos tem suscitado debates
técnicos e políticos, com tentativas diversas de minimização do problema
(MARTINS, 2005). Surgem mediante esta problemática e contexto social vigente em
nosso país, iniciativas por parte de pessoas (catadores de lixo), grupos
associados, cooperativas e também empresas que buscam enfocar suas ações
trabalhistas no processo de coleta, separação, reutilização, reciclagem e
comercialização de produtos capazes de gerar trabalho e renda (Magda &
Wiebeck, 2004; Zanin & Donnini, 2004). Assim, seja
por razões sócio-ambientais, seja por razões
econômicas ou políticas, a tendência histórica de descaso e negligência em
relação aos resíduos industriais e domésticos tem dado lugar a um maior cuidado
no tratamento desses resíduos, possibilitando a criação de nichos de trabalho e
de geração de renda para pessoas dos setores
mais pobres da população urbana (BROWN, 2002). No Brasil, a
intervenção do estado enquanto gestor ambiental tornou-se mais estruturada e
enfática a partir da década de 80, quando novos instrumentos de monitoramento e
controle ambiental começaram a ser implantados, em função do ativismo ecológico
e da pressão de agências internacionais financiadoras de projetos no país
(AVRITZER, 1999). Os municípios assumiram responsabilidade das tarefas de
planejamento e gestão ambiental (BARBOSA, 1993), em atendimento a determinações
contidas na constituição de 1988 e na lei Orgânica do Município, apesar de
muitos municípios não disporem da estrutura adequada para o cumprimento dessas
funções (ABREU, 2001). Deste modo, a questão da destinação final do lixo
é entendida como um dos grandes desafios para as gestões locais (MACHADO et
al.; 2002). .
No
município de Mossoró, RN, a Associação Comunitária Reciclando para a Vida –
ACREVI, com o apoio da prefeitura municipal, tem assumido o papel social da
coleta e reciclagem de resíduos sólidos produzido por grande parte da população
local. Esta Associação tornou-se um exemplo de sucesso no gerenciamento dos
resíduos sólidos com base em princípios de sustentabilidade e da economia
solidária, ou seja, em relações igualitárias de gênero, a qual vem ganhando
apoio e credibilidade junto à sociedade local (SOUTO et al; 2008). Segundo
relato da presidenta da ACREVI, a criação desta associação foi marcada por
momentos de grandes incertezas, angústias e, principalmente, receio por parte
das mulheres de estar se inserindo na atividade de catadoras/recicladoras. No
entanto, têm-se observado transformações sócio-ambientais na vida dos
associados, que estão conseguindo autonomia financeira e aumento da autoestima
a partir do enfrentamento às adversidades via organização em associação
comunitária. Assim,
considerando os pontos supracitados, o objetivo do presente trabalho foi
analisar e resgatar as transformações sócio-ambientais ocorridas na vida dos
trabalhadores (as) da ACREVI, através dos métodos descritivos e quantitativos,
na tentativa de que eles percebam essas mudanças e construam a sua própria
identidade ocupacional ou “profissional”. MATERIAL
E MÉTODOS Este
trabalho foi realizado no período de fevereiro a outubro de 2010, na ACREVI,
associação comunitária situada no bairro Nova Vida, Mossoró-RN. Para a
elaboração do trabalho utilizou-se duas modalidades técnicas: o método
descritivo e o método quantitativo (BOGDA; BIKLEN, 1994), na perspectiva de se
abranger a generalização, através do quantitativo e a profundidade, através do
qualitativo. O método descritivo não se limitou a uma mera coleta de dados,
mas, sim apresentar precisamente as características de uma situação, um grupo
ou um indivíduo específico, como recomenda Selltiz, 1974. No trabalho
de campo, o método descritivo foi aplicado no levantamento de dados sobre os
catadores/recicladores da associação em estudo. Utilizou-se o método
quantitativo, recorrendo-se às entrevistas dirigidas, com questões sobre
perfil, características, origem e trajetória dos trabalhadores (as), como
recomenda Martins, 2005. As
entrevistas dirigidas, apresentadas de maneira padronizada, foram feitas com 42
catadores/recicladores da associação. Nessas entrevistas padronizadas, além de
dados gerais correspondendo à identificação pessoal, foram levantados dados
relativos à situação anterior e posterior à atividade de cada trabalhador da
associação. Foram obtidos, principalmente, informações sobre a antiguidade na
atividade de reciclagem, ao tipo de atividade anterior, à renda média, à
independência financeira, à satisfação com o trabalho, ao engajamento em outros
trabalhos remunerados, sobre o serviço no galpão da associação, e à
participação em capacitações relativos ao trabalho de reciclagem. Em outras
perguntas, os trabalhadores foram questionados a respeito de questões sociais,
culturais e políticas, como acesso a serviços de saúde e saneamento, condições
de moradia e transporte, índice de alfabetização e escolaridade, participação
política em instâncias externas ou internas, nas reuniões da associação, e em
eventos culturais e meios de informações. A questão da
identificação pessoal com o trabalho de catador/reciclador foi um dos temas
recorrentes que perpassaram vários itens da entrevista, desde aquelas
relacionadas aos processos de trabalho e à distribuição dos ganhos no galpão da
associação, até os itens concernentes à questão cultural e ao lazer. Ademais,
tentou-se verificar as expectativas e os desejos que os trabalhadores projetam
para o futuro, no sentido de desvelar o que os mantêm na atividade de
reciclagem e se esta constitui para eles uma proposta continuada e concreta de
vida e de trabalho, ou se é somente mais um ganha-pão precário que se
estabelece em termos provisórios até que possam obter outra fonte de
subsistência. Nas
entrevistas semi-estruturadas, parcialmente assistemáticas, focalizou-se a
atenção em determinados tópicos ou aspectos de uma questão que desejávamos
abranger e aprofundar. Partindo de algumas perguntas abertas, o entrevistador
pode adicionar outras perguntas para clarificar questões ou reconstruir um
determinado contexto. Assim, embora houvesse certa flexibilidade na condução da
entrevista, limitou-se o entrevistado aos problemas e questões que estavam
sendo investigados. Esse
instrumento foi aplicado também a dez informantes-chaves, com o objetivo de
perceber as influências de diversas entidades governamentais e
não-governamentais no que diz respeito o funcionamento da associação, os quais
são definidos como pessoas detentoras de informações válidas, relevantes e
utilizáveis acerca do objeto selecionado para a pesquisa, a saber: quatro
funcionarias da Fundação Mulheres em Ação, três funcionários de uma Escola
Estadual do bairro onde está a associação e três funcionários da Prefeitura
Municipal de Mossoró, já que esta exerce grande influência sobre a organização
dos catadores/recicladores da ACREVI, tendo vínculos indiretos com a mesma. Após a
coleta de dados através das técnicas utilizadas, foi realizada a análise das
informações recolhidas, articulando-as com os referenciais teóricos pretendidos
no trabalho e com outros elementos teóricos selecionados a partir de leituras
de textos específicos. Alguns dados quantitativos foram tabulados e
classificados de acordo com as técnicas estatísticas de análise, enquanto os
dados qualitativos foram analisados após as transcrições das fitas relativas às
entrevistas dirigidas. E para
construir a própria identidade ocupacional ou “profissional” dos
catadores/recicladores, iniciou varias oficinas que foi realizada no Centro
Social do Conjunto Nova Vida, bairro onde a ACREVI está instalada. Para
elaborar as oficinas foi realizada uma pesquisa bibliográfica sobre Educação
Ambiental e a problemática do lixo. As oficinas contemplaram os associados da
ACREVI e interessados que residem no bairro. Foi trabalhado com eles a
problemática do lixo da atualidade e como a Educação Ambiental pode ser usada
como ferramenta educativa para minimizar tais problemas. Nesta mesma
oportunidade repassamos para os mesmos, o que cada um pode fazer para melhorar
esta situação, enfocando principalmente o trabalho que já é realizado pela
ACREVI, e como esse tem sido usado como modelo alternativo para o gerenciamento
adequado dos resíduos sólidos da cidade de Mossoró. As oficinas realizadas
posteriormente tinham como objetivo, um aprofundamento teórico sobre a Educação
Ambiental, assim como sistematizar os conhecimentos que eles já tinham e como
usar estes no contexto onde a Associação está inserida, principalmente no
âmbito escolar, já que a mesma é muito visitada pelas inúmeras escolas da
cidade. RESULTADOS E
DISCUSSÃO Na
declaração de Josefa, fundadora da associação: a ACREVI surgiu por uma
necessidade de geração de emprego e renda e educação ambiental na comunidade
Nova Vida. “(...)Sempre eu gostei de
desenvolver atividades devido à comunidade ser carente; eu e Maldemir -
conhecido como Cristo. Cristo disse: Zefa, vamos trabalhar com lixo, material
reciclável e educativo. Vamos envolver os vizinho! Primeiro a gente chegar nas
casas deles e diz a eles: se é de jogar o lixo pro carro pegar e ir pro lixão,
é melhor juntar e a gente vai pegar. Hoje a associação tem nove anos de lutas
que a gente tá vendo alguns resultados já, né?”(trecho transcrito na íntegra da
entrevista com Josefa presidenta da ACREVI). No início, a
associação não tinha local adequado para armazenar o lixo coletado e o mesmo
era levado para a casa de Josefa, depois a Prefeitura Municipal de Mossoró
alugou um pequeno galpão e disponibilizou alguns equipamentos para o serviço.
Depois, firmou-se parcerias com organizações sociais como a Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte, o Programa de Desenvolvimento de Área (PDA),
chamado Margarida Alves, e o Centro Feminista 8 de Março, que foram
significativas para a consolidação da associação e a ampliação de sua base de
sustentação política e social. O trabalho
no galpão é organizado de maneira simples, tendo-se a recepção do material
coletado como a primeira etapa da rotina. O lixo trazido pelos caminhões da
prefeitura Municipal de Mossoró é descarregado por associados e colocado em
grandes sesto-depósitos, posicionado em uma das laterais internas do galpão, o
que dá início ao processo de triagem: os sacos são, então, abertos, e o lixo
passa a ser separado em esteiras (Figura 1). Ao lado dos trabalhadores que
separa os materiais, estão dispostas grandes “bombonas” (tonéis), em que os
materiais são colocados de acordo com uma classificação usual – garrafas
plásticas do tipo PET, polipropilenos ou outros, vidros, etc. Na etapa
seguinte, os materiais são segregados e colocados em “grandes sacolas”, onde é armazenado
para posterior pesagem, procedimento que já os deixam pronto para a
comercialização. Outras tarefas usuais são aquelas de limpeza e varrição dos
espaços internos e externos do galpão, pequenas compras e reparos e atividades
concernentes à supervisão, à administração e à contabilidade, além de contatos
com os compradores e empresas parceiras da associação.
Figura 1. Material
sendo separado em esteiras no galpão da associação ACREVI. Na porta
central do galpão, normalmente, posiciona um contêiner, onde é colocado o
rejeito – o material que não é aproveitado para a reciclagem é posteriormente
levado pelo serviço de limpeza urbana da Prefeitura Municipal de Mossoró para o
aterro Sanitário da Cidade, localizado a margem direita da BR – 110, Km – 49,
no sentido Mossoró – Areia Branca. O rejeito, em geral, consiste em materiais
muito misturados e sujos por resíduos orgânicos ou em alguns itens de material
seco que ainda não apresentam viabilidade econômica para a reciclagem. Com as
parcerias, observaram-se mudanças econômicas e socioambientais da coleta de
resíduos sólidos e seu reaproveitamento, tanto para os associados, quanto para
a comunidade que foi sensibilizada sobre a questão dos problemas ambientais
causados pelo destino inadequado do lixo. Nos
relatos sobre as trajetórias de formação e de organização da ACREVI,
percebe-se, efetivamente, que a consciência de pertencer a um grupo, isto é, a
determinação de sua identidade como uma nova categoria ocupacional ou
“profissional” leva em consideração não apenas os ganhos materiais relativos às
atividades de reciclagem, mas também os aspectos de “resgate” social dos
trabalhadores e/ou de vínculo com o tipo de trabalho que estão executando, pela
importância que representa como um serviço de cuidado com o meio ambiente. Nesse sentido, questionados sobre sua principal
motivação para o trabalho na reciclagem, os recicladores deram respostas
variadas, ligadas a fatores de renda e à necessidade de se ter um trabalho;
respostas que mencionam o orgulho ou a importância de se trabalhar com o meio
ambiente; e respostas neutras, que não especificam identidade com o trabalho ou
razões econômicas para o engajamento na ocupação de reciclador. “Eu
já trabalhei nas casas dos outros [em casa de família], trabalhei em duas
fábricas de castanha, mas eu acredito no trabalho em que todo mundo seja
patrão. Não sei por que as pessoas não pensam nessa metodologia que é muito
importante, onde você não vai ter patrão e sim cumprir regras dentro da
associação. Tenho muito orgulho de trabalhar para o meio ambiente e o que ganho
dar para fazer a feira” (trecho transcrito na íntegra da entrevista com Maria
José, secretária da ACREVI) Observou-se
que 21% das respostas englobam expressões simples do tipo é por necessidade,
pelo sustento, pela oportunidade de trabalho, é lucrativo, até outras mais
elaboradas que remetem ao acesso a cursos e palestra na associação. 60% das
respostas reuni afirmações breves, relativas à “proteção ambiental” e à
reciclagem, havendo alguns catadores que indicam motivo de orgulho, outros,
cuja percepção sobre o trabalho é de que reciclando limpa a cidade. Respostas
indiferenciadas quanto à identidade e a consciência ambiental contabilizam 19%. Uma
pergunta, colocada aos catadores/recicladores da ACREVI, refere-se sobre a
identidade no trabalho, solicitados a assinalar a ordem de prioridade de quatro
itens: segurança, respeito, renda e cuidado com o meio ambiente – em relação às
atividades desenvolvidas no galpão da associação, 60% dos trabalhadores da
associação priorizaram o cuidado com o meio ambiente; 27%, o respeito no
trabalho; em quanto segurança e renda ficaram com 6,5% das respostas para cada
um desses itens. Sobre as expectativas concernentes à trajetória no trabalho “profissional”, os recicladores forneceram respostas relativas a perspectivas de “investimento” e de continuidade no trabalho de reciclagem, inclusive com metas a serem atingidas pelo grupo como um todo. Observa-se também descontentamento e de provisoriedade nesse tipo de trabalho, havendo alguns casos de pessoas que estão prestes a sair para buscar outras atividades. Algumas pessoas não souberam responder (Quadro 1).
Quadro 1: Distribuição dos
entrevistados, segundo tipos de expectativa “profissional”, 2009. Para
verificar a relação dos recicladores com a atividade de triagem de resíduos e a
consciência do que isso representa para o meio ambiente, foi-lhes questionado
se procediam à separação do seu próprio lixo doméstico e o que faziam com o
lixo orgânico. Todos os associados responderam que separa seu lixo doméstico,
sendo que 3% deles utilizam o resíduo orgânico como alimento para os animais
domésticos e os demais coloca na coleta regular de lixo (97%). Além da
questão de como os recicladores vêem seu próprio trabalho, é de igual interesse
observar suas percepções sobre como são vistos pelos “outros”, ou seja, como
crêem que seu trabalho é contemplado na sociedade em geral e, especialmente, na
comunidade em que vivem. Para tanto, suas respostas foram classificadas desde
as percepções mais favoráveis, de que seu trabalho é visto como uma atividade
relevante, interessante, sendo amplamente reconhecida na comunidade, até as que
apontam a predominância, entre as pessoas de fora do galpão, de visões
preconceituosas em relação ao trabalho na reciclagem do lixo. O percentual
de percepções favoráveis é de 70% dos entrevistados. Alguns apontam a
importância da mídia local na divulgação e no reconhecimento social do seu
trabalho: “(...)
saímos bastante nos jornal”; “(...) as pessoas respeitam, colaboram, elogiam”
(trecho transcrito na íntegra da entrevista com dona Ozelita da ACREVI). Existem também percepções de como o processo evoluiu de visões bem menos
apreciáveis até a situação atual, que consideram de reconhecimento e
valorização, correspondendo a 10% do total: “(...) já houve polêmica e falta de reconhecimento,
mas hoje somos vistos com bons olhos” (trecho transcrito na íntegra da
entrevista com Samuel da ACREVI). Subsistem,
contudo, as percepções de que são encarados com preconceito, representando 20%
dos recicladores. As respostas
dos catadores/recicladores mostram que o reconhecimento de seu papel
sócio-ambiental de “agentes ecológicos” é ainda ambíguo. O cuidado com o meio
ambiente e a relevância da atividade de reciclagem são ressaltados por vários
trabalhadores da associação, porém, a postura é clara no sentido de que estão
desempenhando essas funções, por que foi o que restou para eles. Na associação,
os catadores em sua maioria não escolheram sua ocupação, apesar da importância
social e ambiental que dão a essa atividade. Ambiguamente, vivem do lixo, acham
importante e necessário o que fazem; se sentem importantes e reconhecidos por
isto, mas sonham em realizar outros trabalhos. Isto se deve, provavelmente, ao
pouco retorno econômico que a atividade proporciona. Uma questão
relevante concerne aos desafios enfrentados pelos recicladores, em especial no
que diz respeito aos tipos de situações conflitantes que si colocam no
cotidiano de suas atividades e na sua organização em quanto uma nova categoria,
em torno dos temas relativos ao processo de trabalho na reciclagem e aos
procedimentos decisórios. De maneira freqüente e espontânea, surgem nas falas
dos trabalhadores, referindo-se a questões internas da associação; Um tipo de
conflito interno freqüente é o que diz respeito a problemas individuais de
relacionamento de pessoas que não se acostumam ao trabalho em grupo. Na ACREVI,
a participação constante dos associados em reuniões e as decisões por consenso,
às vezes morosas e árduas, provocam algumas manifestações do tipo: “(…)
reunião é perda de tempo” (trecho transcrito da entrevista com Lucia Aparecida
da ACREVI). Alguns dos
conflitos internos derivam de questões referentes aos valores monetários
partilhados mensalmente. Como esses valores dependem do faturamento mensal da
associação a partir do processamento e da venda dos materiais, a ausência
prolongada dos que faltam ao trabalho, por motivos de doenças ou por questões
pessoais, gera insatisfação e desconfiança por causa da conseqüente redução do
montante a ser dividido para todos. CONCLUSÕES - Revelou-se
desafiante a tentativa de entender a organização dos catadores/recicladores na
atividade de reciclagem dentro do galpão da associação, conforme princípios
associativos ou cooperativos no âmbito do que se define como Economia
Solidária; - No aspecto de
identidade profissional, reconheceu-se a centralidade do trabalho na
constituição das identidades individuais e grupais dos associados, em que o
papel social de trabalhador configura um dos aspectos de maior importância para
o desenvolvimento da personalidade humana; - Suas relações com
diferentes entidades externas levam a configuração e a processos específicos,
tanto na dinâmica do trabalho cotidiano, quanto nos resultados obtidos em
termos de rendimentos e de outros ganhos não materiais, como a construção da
identidade profissional e o empoderamento dos trabalhadores
envolvidos; - Nos aspectos de organização
do trabalho, notou-se que os catadores/recicladores apresentam uma relação
capital/trabalho bastante relevante, sendo a inovação tecnológica um motivo de
constante busca dos trabalhadores da ACREVI, em que a qualificação está em uma
instância relevante que contribui para a construção da identidade pessoal ou
grupal; - Um dos elementos
fundamentais para a construção da identidade desses trabalhadores, enquanto
grupo, se vincula à sua capacidade de lidar com os conflitos internos e de
avançar em processos coletivos de qualificação e de conscientização. REFERÊNCIAS
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