Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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10/09/2018 (Nº 38) Educação Ambiental como ferramenta para o manejo de lixo: uma experiência na escola municipal Recanto Feliz
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Educação ambiental como ferramenta para o manejo de lixo: Uma experiência na escola municipal Recanto Feliz

educação Ambiental como ferramenta para o manejo de lixo: uma experiência na escola municipal Recanto Feliz

 

Poliana Brandão Machado1; Vanessa Ribeiro dos Reis2; Aline Santos dos Santos2; Girlene Santos de Souza3*

 

 

1Discente do Curso de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB

2Discente do Curso de Licenciatura em Biologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB

3Professora Adjunto 3 do Centro de Ciências Agrárias, Ambientais Biológicas – CCAAB/ UFRB.Rua C, 247, Cruz das Almas, BA – CEP:44380-000  * E-mail: girlene@ufrb.edu.br

 

RESUMO             

No ano de 1999, foi sancionada a lei n.º 9.795, a qual estabeleceu a Política Nacional de Educação Ambiental no Brasil, permitindo dessa forma a prática da Educação Ambiental nas escolas nacionais. O presente trabalho, vinculado ao Projeto Utilixo: Uma Experiência de Educação Ambiental em Escolas Públicas Municipais de Cruz das Almas – BA, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), tem como objetivo discutir e mostrar as questões relativas à utilização do lixo, visando implementar práticas de Educação Ambiental na Escola Pública Municipal Recanto Feliz, com crianças do Ensino Fundamental. No desenvolvimento do trabalho os alunos foram incentivados a descobrir sua relação com o local em que vive, estudar e ampliar seu relacionamento com o meio ambiente, além de identificar a produção e destino do lixo da sua escola e da cidade de Cruz das Almas, e a partir daí buscar alternativas para solução deste problema, através de práticas de Educação Ambiental como: coleta seletiva, compostagem, redução e reciclagem do lixo, entre outros. Foram desenvolvidos com as turmas oficinas de reciclagens, promovendo por meio de ensino formal a conscientização sobre a questão do lixo na área urbana das escolas, e também foram realizados seminários de sensibilização relacionados às práticas de Educação Ambiental, entre outras atividades. Percebeu-se que com a prática da Educação Ambiental ocorreu mudanças no comportamento e atitudes, e sensibilização dos estudantes, em relação às problemáticas ambientais vivenciadas no âmbito escolar e na sua região.

 

Palavras-chave: Educação Ambiental, Lixo, Meio Ambiente.

 

INTRODUÇÃO

De acordo com os dados do Ministério do Meio Ambiente, o Brasil gera, em média 90 milhões de toneladas de lixo por ano e cada brasileiro produz, aproximadamente, 500 gramas de lixo por dia, podendo chegar a mais de 1 kg. Dentre os resíduos sólidos (lixo) produzidos no país, 76% são jogados nos lixões (amontoamentos de lixo num terreno, sem nenhum tipo de tratamento) e outros 13% nos chamados aterros controlados. Apenas 10% do total coletado têm como destino final os aterros sanitários, onde se diferencia pelo tratamento do chorume. Sendo que algumas cidades brasileiras atiram o lixo nas ruas, terrenos baldios, rios, lagos, lagoas e no mar. A destinação adequada dos resíduos sólidos é um dos grandes problemas enfrentados nas cidades brasileiras, sendo estimulada pelo aumento da produção cada vez mais de dejetos. De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos, cada brasileiro produziu em média 378 quilos de resíduos em 2010, contra os 359 quilos registrados em 2009.  

A gestão dos resíduos sólidos urbanos é responsabilidade dos municípios, pois esse é considerado um serviço de interesse público essencial. Um conjunto de normas gerais definidas na recente Política Nacional de Saneamento Básico (Lei 11.445/2007) reforça o papel dos municípios nessa responsabilidade de gerir os resíduos sólidos urbanos, considerando-os parte do Saneamento Básico. Porém, por conta da escassez de recursos financeiros para investir na coleta, no processamento e disposição final do lixo, a destinação do lixo geralmente é feita de maneira aleatória ou baseada apenas no custo de transporte.

O município de Cruz das Almas, localizado na região do Recôncavo Baiano, a 156 Km da capital Salvador, com uma área territorial de 150,903 Km² e uma população estimada de 58.293 habitantes, apresenta algumas problemáticas em relação ao lixo. O principal problema é a coleta do lixo sendo deficiente, pois na sede do município há vários locais de lixo nas ruas; localização do aterro próximo ao córrego Velame Brito e também perto de residências, a central de podas também apresenta irregularidade, por está recebendo lixo doméstico e não há controle de acesso. Por isso, precisamos de pessoas ambientalmente responsáveis, que tenham sensibilidade suficiente para garantir o resgate da qualidade de vida da população.

Este trabalho vem com a proposta de aplicar um projeto de Educação Ambiental com crianças do ensino fundamental da escola pública, Recanto Feliz do município de Cruz das Almas – BA, com o intuito de despertar a responsabilidade sócio-ambiental da população. A escola é o local ideal para promover a Educação Ambiental, pois é nela que ocorre a formação de valores.

 

OBJETIVO DO TRABALHO

Esse trabalho teve como objetivos:

  • Colaborar para a melhoria da qualidade de vida da população de Cruz das Almas, promovendo palestras para conscientizar os estudantes sobre os problemas ambientais da sociedade, em especial, sobre o lixo, seu destino e possíveis formas de reaproveitamento.
  • Identificar de início, a produção e destino do lixo na Escola Municipal Recanto Feliz.
  • Incentivar os professores a utilização da temática lixo, de forma transversal, promovendo assim a junção com os conhecimentos diversos.
  • Organizar palestras sobre doenças causadas pelo lixo, classificação, redução, reciclagem, reutilização, difundindo a ideia sustentável de que o lixo é fonte de renda e economia.
  • Intensificar o conhecimento desses temas em atividades práticas, utilizando lixo seco da própria escola ou trazido de casa, visando melhorar as relações entre sociedade e ambiente.
  • Implementar a coleta seletiva nas escolas, relacionando aos hábitos de consumo, permitindo assim a melhoria da qualidade ambiental da comunidade escolar.

 

REFERENCIAL TEÓRICO

Na Idade Média o lixo acumulava-se pelas ruas e imediações das cidades, provocando sérias epidemias e causando a morte de milhões de pessoas. A partir da Revolução Industrial iniciou-se o processo de urbanização, provocando um êxodo do homem do campo para as cidades. Observou-se assim um vertiginoso crescimento populacional, favorecido também pelo avanço da medicina e consequentemente aumento da expectativa de vida. A partir de então, os impactos ambientais passaram a ter um grau de magnitude alto, devido aos mais diversos tipos de poluição, dentre eles a poluição gerada pelo lixo.

O fato é que o lixo passou a ser encarado como um problema, o qual deveria ser combatido e escondido da população. A solução para o lixo naquele momento não foi encarada como algo complexo, pois bastava simplesmente afastá-lo, descartando-o em áreas mais distantes dos centros urbanos, denominados lixões (FADINI et al., 2001). A produção de lixo no Brasil cresceu 6,8% em 2010, quando comparada aos anos anteriores.

Segundo Fadini et al., (2001) dos resíduos que são descartados no país 76% é abandonado a céu aberto em locais inadequados, gerando assim a vetores os quais serão proliferadores de doenças. A disposição final dos resíduos orgânicos em lugares inadequados pode afetar também a saúde dos seres humanos, por causa dos gases que são emitidos pelo processo de decomposição como: metano, dióxido de carbono, sulfídrico, amônia e outros ácidos orgânicos voláteis.

Atualmente a luta pela preservação do meio ambiente e a própria sobrevivência do homem no planeta, está diretamente relacionada com a questão do lixo urbano. A sociedade em que vivemos tem como hábito extrair da natureza a matéria-prima e, depois de utilizada, descartá-la em lixões, caracterizando uma relação depredatória com o seu habitat. Assim, grande quantidade de produtos recicláveis que poderiam ser reaproveitados a partir dos resíduos, são inutilizados na sua forma de destino final. Isso implica em uma grande perda ambiental, devido ao potencial altamente poluidor do mau gerenciamento dos resíduos gerados, comprometendo a qualidade do ar, solo e, principalmente as águas superficiais e subterrâneas (AZEVEDO, 1996).

Compreender as questões ambientais para além de suas dimensões biológicas, químicas e físicas, enquanto questões sócio-políticas exigem a formação de uma “consciência ambiental” e a preparação para o “pleno exercício da cidadania”. (PENTEADO, 2007). A escola é, sem sombra de dúvida, o local ideal para se promover este processo. As disciplinas escolares são os recursos didáticos através dos quais os conhecimentos científicos de que a sociedade já dispõe são colocados ao alcance dos alunos. As aulas são o espaço ideal de trabalho com os conhecimentos e onde se desencadeiam experiências e vivências formadoras de consciências mais vigorosas porque alimentadas no saber (PENTEADO, 2007).

Nesta perspectiva, a Educação Ambiental tem uma importância fundamental, pois permite a solução de vários problemas em nossa vida e novas ideias para a comunidade. Em concordância com essa ideia Zuben, (1998), afirma que o projeto de coleta seletiva nas escolas é muito importante, pois incentiva os alunos desde já a separarem o lixo, levando esse hábito para suas casas. Por isso o autor destaca que uma das principais alternativas para diminuir o problema do lixo é a reciclagem. No Brasil apenas 2% dos municípios possuem programas de coleta seletiva. Uma das vantagens dela é o deslocamento e aumento da vida útil dos aterros sanitários e o envolvimento da população, significando uma conscientização ambiental na sociedade.

Dessa forma, a educação ambiental deve ser praticada desde o Ensino Fundamental. Para Penteado (2007), a escola é um local adequado para a construção da consciência ambiental através de um ensino ativo e participativo, superando as dificuldades encontradas nas escolas atualmente, moldadas pelos modos de ensino tradicionais.

 

METODOLOGIA

O trabalho foi realizado na Escola Municipal Recanto Feliz, localizada nas proximidades da Mata de Cazuzinha, município de Cruz das Almas, Bahia, no período de fevereiro a julho de 2011. O público alvo foram os professores e os alunos pertencentes ao segundo, terceiro e quarto ano matutino do ensino fundamental com idades entre 9 e 12 anos. 

A primeira etapa do trabalho foi à aplicação de um questionário direcionada à direção e à coordenação da escola, com o objetivo de conhecer como o tema “Meio Ambiente e Lixo” são abordados na escola. Diante desses questionários foi traçado o perfil ambiental da escola em ralação às questões de Educação Ambiental. A segunda etapa foi à apresentação do projeto para os alunos, utilizando vídeos e imagens, levando também alguns questionamentos aos estudantes, em relação ao meio ambiente e o lixo.             Ao logo de cada encontro, nas salas de aula, foram feitas palestras sobre temas relacionados ao lixo como: destino, classificação, reutilização, redução, reciclagem, tempo de decomposição, dentre outros. Foram empregados também, o uso de atividades práticas, oficinas, com materiais recicláveis, onde se trabalhou com o manejo do lixo. Para consolidarmos o conhecimento sobre a temática lixo, forma elaborados dois folders, um jornal informativo, os quais foram distribuídos na comunidade escolar, incluindo os pais, além da criação um blog do Projeto Utilixo, (http://projetoutilixoufrb.blogspot.com/), buscando dessa forma contribuir com ampliação da participação das pessoas na preservação do meio ambiente, através da dissipação de informações.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados dos questionários aplicados aos diretores e coordenadores da escola, mostraram que existem trabalhos feitos por professores, ligados ao meio ambiente. Porém nem todos os professores discutem ou aplicam, de forma transversal, a Educação Ambiental.   Foram mostrados também pela direção a grande quantidade de alunos nas salas de aula, impossibilitando a realização de atividades, por conta do tempo. De acordo com os questionários constatou-se a ausência de coleta seletiva na escola, apesar de existir nas salas pequenas lixeiras da coleta seletiva.

A partir desse perfil ambiental observado no questionário, deram-se início as palestras bem como os seminários durante as visitas na escola. Também foram desenvolvidas atividades práticas em sala de aula e apresentações de vídeos educativos relacionados ao meio ambiente e ao lixo. Em uma das aulas práticas, foi feito a separação do lixo oriundo da sala de aula e trazido de casa, onde foram utilizadas pequenas lixeiras seletivas nas cores verde (para vidro), azul (para papel), amarela (para metal) e vermelha (para plástico) já existentes na Escola, para os estudantes com o uso de luvas plásticas, pegarem os lixos e colocarem nas lixeiras adequadas (Figura 1). Com papelões e tampinhas de garrafa pet pensamos em construir um jogo da velha, os estudantes também sugeriram o jogo Ponga. Trabalhamos a disciplina matemática na formação desses jogos (Figura 2 e 3).

Figura 1: Alunos na dinâmica: Separação do Lixo

  

  

Figura 2 e 3: Estudantes do Recanto Feliz, na construção do jogo da Ponga.

 

No decorrer do trabalho, foram feitas palestras relacionadas aos seguintes temas: lixo e suas classificações, destino do lixo, poluição urbana, doenças e o lixo, sustentabilidade, os 3R’s, coleta seletiva, tempo de decomposição, dentre outros. Foram levantados questionamentos aos alunos como: “O que vocês entendem como utilixo?”, “Quais as consequências do lixo jogado na natureza e para o homem?”, “O que significa coleta seletiva?”, “Para onde o lixo da sua casa e da escola é levado?”, “O que vocês entendem por decomposição?”, “Vocês sabem o que é Reciclagem?”. Na primeira apresentação do trabalho, mostramos imagens de um pátio escolar cheio de lixo, de cadeiras escolares quebradas e sem utilidade, de lixeiras da coleta seletiva, apresentamos também um vídeo educativo com personagens falando sobre as consequências do lixo jogado na natureza e imagens do planeta com os efeitos da poluição. Em outra atividade as crianças assistiram a um vídeo educativo animado que falava sobre o sofrimento do planeta terra e dos animais com o acúmulo de lixo, gases, desmatamento, poluição das águas e aquecimento global. Na segunda palestra foi apresentado o conceito de lixo segundo Luiz Mário Queiroz Lima, em seu livro: LIXO – TRATAMENTO E BIORREMEDIAÇÃO (1995: p. 11), que define o lixo como todo e qualquer resíduo que resulte das atividades diárias do homem na sociedade.  Mostrou-se também a classificação do lixo, como: residencial, comercial, especial, hospitalar e industrial; assim como o tempo de decomposição dos materiais presentes no cotidiano dos estudantes, como: chiclete, plásticos, papel e madeira.

Posteriormente foi apresentado sobre o que é a coleta seletiva (Figura 4), sua importância para o meio ambiente e o que é feito com o material recolhido e sua transformação em novos materiais. Em outra palestra que teve como tema, Destino do lixo, foi questionado para onde era encaminhado o lixo da sua casa e da escola, algumas alunos tinham o conhecimento do Lixão, mas não sabiam sobre Aterro Sanitário. Mostraram conhecimento sobre compostagem e um pouco sobre reciclagem. Foi dito também, sobre o processo de incineração, salientando as vantagens e desvantagens de todos os destinos do lixo.

 

Figura 4. Palestra: O que é Coleta Seletiva, ministrada por Aline Santos e Vanessa Reis.

 

Percebeu-se que durante as palestras e até mesmo nas atividades práticas, os estudantes relatavam sobre situações vivenciadas ligadas ao lixo, como por exemplo, a rua que moravam tinha um terreno baldio cheio de lixo, familiares que ficaram doentes por conta de vetores que habitam lugares onde há o acúmulo do lixo e água parada, apresentaram também situações que presenciaram no momento de lazer, como por exemplo, praias sujas de copos e pratos plásticos.  Com as palestras e atividades práticas

os estudantes foram estimulados a colaborar para a melhoria da à qualidade de vida, com a conscientização sobre questões ambientais ligadas ao lixo na área da escola, como na cidade de Cruz das Almas.

Dessa forma, a educação ambiental deve ser incorporada desde o Ensino Fundamental, com projetos na sala de aula levando conhecimento sobre o assunto aos alunos.  Neste aspecto Britto, (2000) destaca que, a escola é o ambiente mais propício para a abordagem de temas relativos à ecologia, saúde, higiene, preservação do meio ambiente e cidadania.

 

CONCLUSÃO

Com a realização desse trabalho de extensão espera-se disseminar a ideia de que os resíduos sólidos não são mais considerados LIXO, e sim matérias-primas de grande valor, também, desconstruir a ideia que consumir mais traz felicidade. Além de formar cidadãos responsáveis com o meio em que vive, com a natureza através da preservação do meio ambiente e da utilização consciente, dos recursos naturais, para que com isso os mesmos possam viver de uma forma melhor e que seja passada para as gerações futuras, buscando sensibilizar e despertar a consciência crítica das inter-relações da sociedade e natureza.

 

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, C. J. C. Concepção e prática da população em relação ao lixo domiciliar na área central da cidade de Uruguaiana- RS. Uruguaiana, PUCRS- Campus II, Monografia de pós-graduação. Educação ambiental. 1996.

FADINI, P.S.; FADINI, A.A.B. Lixo: desafios e compromissos. Cadernos temáticos de Química Nova na Escola. São Paulo: Sociedade Brasileira de Química. no 1. maio de 2001. p. 9-18.

PENTEADO, H. D. Meio Ambiente e Formação de Professores. 6 ed. São Paulo: Cortez, 2007.

ZUBEN, F. V. Meio Ambiente, Cidadania e Educação. Departamento de Multimeios. Unicamp. Tetra Pak Ltda. 1998.

 

Ilustrações: Silvana Santos