É dentro do coração do homem que o espetáculo da natureza existe; para vê-lo, é preciso senti-lo. Jean-Jacques Rousseau
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 89 · Dezembro-Fevereiro 2024/2025
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Artigos
AGRILCULTURA SUSTENTÁVEL: UMA FERRAMENTA PARA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO CAMPO
Elton John de Lírio¹, Erineti Arnholz², Leonardo Rauta Martins ³ & Jaquelini Scalzer4
[1] Biólogo, discente de mestrado, PPG Botânica, Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, CEP 22.460-036, Rio de Janeiro – RJ, Brasil. Endereço eletrônico: lirioeltonj@gmail.com. [2] Bióloga, discente de especialização, PPG Planejamento e Conservação, Escola Superior São Francisco de Assis, CEP: 29.650-000, Santa Teresa – ES, Brasil. Endereço eletrônico: erinetifes@gmail.com. [3] Historiador, discente de mestrado, PPG Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, CEP 20.071-003, Rio de Janeiro – RJ, Brasil. Endereço eletrônico: leorautam@hotmail.com. [4] Mestra em Educação, discente de doutorado, PPG em Educação, Universidade Federal do Espírito Santo, CEP 29.075-910, Vitória – ES, Brasil. Endereço eletrônico: jaqueliniscalzer.prof@gmail.com
Resumo
Palavras-chave: sustentabilidade, agricultura familiar, Santa Maria de Jetibá.
Introdução
Durante muitos anos sobressaíram-se de maneira hegemônica, no campo da economia e da política, teorias que explicaram o processo de desenvolvimento das nações a partir de seu crescimento econômico. Esta concepção, denominada paradigma desenvolvimentista, orientou a maioria dos países em suas políticas internas e externas com efeitos perversos sobre os países subdesenvolvidos, a saber: a concentração da riqueza e a produção da pobreza, dilema inconciliável do capitalismo (RAUTA-RAMOS et al., 2009); a criação e o reforço às desigualdades regionais e sociais; a apropriação privada de recursos da natureza (MOREIRA, 1995) e a destruição do meio ambiente e todos os conflitos que este tipo de prática enseja junto às comunidades que dependem destes recursos. Os primeiros sinais de questionamento a este paradigma surgem na década de 1930 com obras como The Jungle de autoria de Upton Sinclair, onde são questionadas as condições de trabalho e saúde dos alimentos (FAVARETO, 2007) que somada a outras produções e debates, provocaram mudanças no pensamento e, por conseguinte, nas instituições. A década de 1960 marca o início das discussões em relação ao meio ambiente e aos recursos naturais no âmbito da comunidade internacional. Tais preocupações culminaram na Conferência de Estocolmo em 1972, período em que a Educação Ambiental foi inserida no meio pedagógico, e quando foi criado o termo ecodesenvolvimento [termo cunhado na década de 1970 por Maurice Strong na Conferência de Estolcomo, Suécia, posteriormente, além da preocupação com o meio ambiente foram incorporadas as questões sociais, econômicas, culturais e éticas] (HESPANHOL, 2007) que muitos acreditavam poder se contrapor ao modelo de desenvolvimento vigente. Mais tarde o termo ecodesenvolvimento foi substituído por Desenvolvimento Sustentável [não se trata de uma simples troca de termos, o Desenvolvimento Sustentável abarca as discussões em relação à sustentabilidade de forma ampla presentes na concepção de ecodesenvolvimento e incorpora nesta outros elementos como a sustentabilidade cultural, econômica, social e política], consolidado nas Conferências das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Eco 92 (1992) e a Rio + 20 (2012), ambas realizadas no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro. Dois aspectos sobressaem na nova discussão do desenvolvimento. O primeiro é a dissociação de desenvolvimento e crescimento, e o segundo mostra-se na alteração da ideia de desenvolvimento, visto que tal noção passa a incorporar o discurso dos movimentos sociais e deixar de ser exclusiva da ciência (FAVARETO, 2007). No Brasil, a discussão em torno do Desenvolvimento Sustentável [utiliza-se aqui a concepção de Desenvolvimento Sustentável proposta pela Comissão Brundtland, ou seja, “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”; muito embora possa ser feita uma crítica a tal concepção, que apesar de avançar em reconhecer o uso demasiado dos recursos naturais, mantém-se a favor do status quo ao naturalizar a apropriação privada dos recursos da natureza (Moreira, 1995)] se fortalece a partir da sua apropriação por parte dos diferentes movimentos sociais; alguns ligados diretamente à questão da preservação e defesa do meio ambiente, e outros chamados, pela conjuntura de época, a “ambientalizarem” suas discussões ao incorporar em suas pautas a questão ambiental (ACSERALD, 2010). O termo Desenvolvimento Sustentável, diferencia-se do anterior, ecodesenvolvimento, por abranger outras esferas para além da questão ambiental, como aspectos econômicos, culturais e sociais. Nessa perspectiva, a questão ambiental tem o mérito de tornar-se elemento comum às diferentes pautas dos movimentos do campo e da cidade. Esse elemento comum rompe com uma espécie de “isolamento” ou “segmentação” destes diferentes movimentos, e integra neste aspecto, as mais variadas lutas sociais. Emerge no início da década de 1980, em um contexto de crescente preocupação com os problemas ambientais, o debate em torno da Agricultura Sustentável. As diferentes definições de Agricultura Sustentável, em voga no debate internacional, convergem na necessidade de se adotar um modelo produtivo que afete minimamente o meio ambiente, conserve as características dos agroecossistemas por longos períodos, combinem práticas convencionais e inovadoras no cultivo dos alimentos, e se preocupem com a reprodução social dos agricultores (EHLERS & VEIGA, 1994). Discutir a Agricultura Sustentável é também contrapor-se ao modelo de agricultura convencional capitaneado pela Revolução Verde. Este processo de “modernização” da agricultura conhecido como Revolução Verde, implementado no Brasil a partir da década de 1960, período do regime militar, caracterizou-se pela alta especialização produtiva e pelo uso massivo de novas tecnologias, com o fim claro de expansão produtiva, sem dimensionar as consequências deste processo ainda em curso no espaço rural brasileiro (PORTO-GONÇALVES, 2011). A despeito do aumento da capacidade produtiva da agricultura brasileira nas últimas décadas, deve-se ter claro que o processo da Revolução Verde acumula ao longo dos anos efeitos perversos, principalmente, em relação ao meio ambiente e aos pequenos agricultores, manifestada no processo de concentração da terra e do crédito na mão dos grandes latifundiários, no endividamento dos agricultores familiares, na dependência de insumos e de sementes controladas por grandes empresas internacionais, na perda do conhecimento tradicional, na ineficiência energética, na redução da capacidade homeostática do ambiente, no desmatamento e perda da biodiversidade (inclusa a perda genética), na poluição e nos prejuízos à saúde (ALTIERI, 1992; PORTO-GONÇALVES, 2011). Percebe-se a polarização [a disputa de projetos para o campo brasileiro, evidenciada no tensionamento entre o agronegócio e a agricultura familiar, culminou com algo inédito no mundo: a criação de um Ministério específico para a agricultura familiar, o MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário, e se é mantido o MAPA – Ministério da Agricultura e Pecuária, associado historicamente às classes patronais] do debate em torno de duas concepções de agricultura distintas: a agricultura convencional representada pelo agronegócio, e a agricultura sustentável representada (potencialmente) pela agricultura familiar (LUZZARDI, 2006), constituindo-se um campo de disputa que permeia diferentes espaços da sociedade e suscita as mais variadas reações, desde aqueles que compreendem a necessidade da mudança nos padrões de produção, com vistas à sustentabilidade, até aqueles que veem nestas ideias elementos prejudiciais aos seus grupos de interesse - o que mantém estes pontos de vista em constante tensionamento.
Do Global ao Local: o município de Santa Maria de Jetibá e a sua agricultura O município de Santa Maria de Jetibá (SMJ) está localizado na Região Serrana do Espírito Santo (ES), a 80 km da capital Vitória. Sua população é formada majoritariamente por descendentes de europeus que migraram no final do século XIX da Pomerânia, região atualmente localizada entre Polônia e Alemanha (LIMA & DIAS, 2007). Atualmente esta comunidade é uma das últimas do mundo onde se fala o pomerano. A agricultura é a principal atividade economica da cidade, o município é considerado o maior produtor de hortifrutigranjeiros do ES (BAHIA, 2000). De acordo com o Censo Agropecuário do IBGE (2006), 88,99% das propriedades do município são consideradas como de base familiar, ou seja, propriedades com menos de 72 hectares (04 módulos fiscais [lei 8.629, de 25 de fevereiro de 1993 e Instrução Normativa Nº 11, de 04 de abril de 2003; em Santa Maria de Jetibá um módulo fiscal corresponde a 18 hectares]), que utilizam no seu processo de gestão e de trabalho mão-de-obra predominantemente familiar. Apesar de a estrutura fundiária favorecer o desenvolvimento da agricultura familiar, percebe-se no município uma forte presença da agricultura patronal, explicitada na figura dos grandes criadores de aves do município que, associados a agricultores familiares, posicionam SMJ como um dos maiores produtores de ovos do país. A presença da agricultura patronal pode ser observada na centralidade, no processo de produção e comercialização exercido pela COOPEAVI – Cooperativa Agropecuária Centro Serrana (COOPEAVI, 2012) e seu discurso em torno da tecnificação e do aumento da produção de seus associados dentro da lógica da modernização da agricultura, característica da Revolução Verde, o que contrasta com as iniciativas em torno da agricultura orgânica desenvolvidas na região (PIMENTA et al. 2009; PMSMJ, 2012), que atualmente representam minoria, uma vez que há 60 agricultores orgânicos (MAPA, 2013) e 4281 agricultores convencionais (IBGE, 2006). A situação é agravada com o uso intensivo de agrotóxicos, inclusive, sem o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) ; o dogma da necessidade de agrotóxicos para garantir a produção; e os problemas de saúde na região potencialmente relacionados com o uso de agrotóxico (JACOBSON et al. 2009; CHISTÉ & CÓ, 2003). Estas disputas entre as diferentes formas de se desenvolver a agricultura, próprias da expansão do modelo capitalista no campo, que em SMJ podem ser verificadas na presença da agricultura patronal e da agricultura familiar simultaneamente, extrapolam a questão produtiva e afetam outras esferas da vida social, tais como a organização coletiva destes agricultores, a relação com o governo local, com os bancos, prestadores de serviços e na própria educação que é ofertada nas escolas situadas em áreas rurais – área de especial interesse deste trabalho.
Escola rural: espaço de prática e de saberes O meio rural brasileiro constituiu-se historicamente à margem dos processos educacionais, conduzidos por uma elite que concebia o meio rural brasileiro enquanto um espaço de atraso, condenado ao desaparecimento, onde o campesinato inevitavelmente daria lugar a agricultura patronal, ou à sua versão moderna, intitulada agronegócio. Neste sentido, as decisões sobre investimentos na área educacional estiveram influenciadas por esta visão do campo brasileiro, associada a certa racionalidade da aplicação de recursos, onde investir no atraso significava automaticamente não ter retorno (ARROYO, 2005, apud SANTOS, 2012). Ou ainda, os investimentos eram realizados ao sabor dos interesses do capital em manter a população no campo, como nas décadas de 1930-1940, ou ainda, formar mão-de-obra para a indústria nacional nas décadas de 1950-1960 (RIBEIRO, 2010). Após amplas lutas sociais, obteve-se o reconhecimento da educação enquanto um direito universal, garantido por lei na Constituição Federal. Importa-nos efetuar uma crítica ao tipo de educação ofertada pelo Estado, marcada por um forte componente ideológico característico do capitalismo e dos interesses das classes dominantes. Para Frigotto (2008 apud SANTOS, 2012), a educação dos diferentes grupos sociais de trabalhadores, institui-se com o fim de habilitá-los técnica, social e ideologicamente para o trabalho, ao subordinar a função social da educação às demandas do capital. De acordo com Ribeiro (2010), o modelo de educação implementado pelo Estado diz muito sobre os efeitos que se espera produzir numa dada realidade. No caso brasileiro, o modelo educacional esteve associado a projetos de desenvolvimento nacionais, onde o campo constituiu-se objeto de intervenção, ao desconsiderar as práticas, vivências e saberes das populações locais. Um processo que esteve associado à integração da agricultura ao capitalismo, com perda significativa da autonomia do agricultor em relação ao processo produtivo, como expressa Martins (1995), transformando a terra de trabalho em terra de negócio. Construir dentro do modelo formal de educação, estratégias para garantir uma educação crítica e contextualizada, emerge enquanto um desafio para todos aqueles que trabalham com a educação, especialmente no contexto das escolas do campo. A Educação do Campo surge como uma proposta de educação que partilha todas estas preocupações, alimentada pela experiência e luta de diversos movimentos sociais do campo e preocupada acima de tudo com a formação humana de seus alunos. Para Santos (2012), a Educação do Campo, possui três grandes desafios: O primeiro deles é assegurar o direito ao acesso dos camponeses ao conhecimento, como instrumento político fundamental para a ruptura de sua histórica condição de subordinação frente ao capital. O segundo desafio diz respeito ao direito à diferença. Que os novos sujeitos políticos camponeses que emergiram das novas lutas surgidas neste final/inicio de século – da questão agrária, do debate sobre um novo modelo de agricultura articulado com a questão ambiental – sejam reconhecidos pelas suas práticas e pelo acúmulo de conhecimento construído no âmbito de suas organizações e movimentos sociais, identificados nas políticas educacionais como portadores de tal patrimônio cultural [...]. O terceiro desafio é trabalhar um novo projeto no campo da elaboração e da disseminação do conhecimento historicamente acumulado pela humanidade, que rompa com o paradigma hegemônico do capital na educação. Rompa, portanto, com a racionalidade instrumental nos processos educativo-escolares. (grifos nossos). Para Vendramento (2004), educar significa promover o desenvolvimento moral e social do sujeito, no intuito de interá-lo socialmente e individualmente ao ambiente. Fato que é consumado através da troca de informações, da reorganização de ideias, da construção de conceitos e integração da teoria com a práxis, que leva ao entendimento do indivíduo como um sujeito ativo dentro desse processo. Neste sentido, tomar a escola pública no campo como espaço de discussão e de acesso à Educação Ambiental contextualizada [o conceito aqui empregado refere-se a um conjunto de práticas que buscam o envolvimento de escola e comunidade como preceitua a Lei de Diretrizes e Bases da educação (BRASIL, 1996)] a indivíduos ligados às atividades agrícolas, se mostra como ferramenta estratégica para a produção de um processo de conhecimento, que proporcione uma reflexão sobre os problemas ambientais do meio em que está inserido, levando-se em consideração a construção sociocultural local, envolvendo a escola, a família e a comunidade. A questão fundamental para educação ambiental orienta-se para a construção de um modelo de ação pedagógico que tenha como ação o debate de questões ambientais, junto aos trabalhadores rurais e sua coletividade (RUSCHHEINSKY, 2002). Como desafio neste processo está romper com visões de mundo e valores que fizeram com que até hoje os agricultores estivessem reféns da lógica do capital, trata-se de politizar a participação destes indivíduos no cenário da educação e na construção de alternativas de superação do capitalismo, fazendo destes agricultores sujeitos da sua história e sua própria formação (CALDART, 2009). Um processo contra-hegemônico que pode produzir um novo modelo de produção, de tecnologia e a renovação da relação destes com a sociedade e com o planeta. Desta forma, a proposta da presente pesquisa-ação é apresentar e discutir a agricultura sustentável com o viés da educação ambiental, na educação regular, localizada no meio rural, apresentada em um estudo de caso.
Material e métodos
O trabalho foi realizado com alunos do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Médio “Francisco Guilherme” (EEEMFG), na cidade de SMJ – ES, situada em área rural. Optamos por trabalhar com pesquisa-ação, ao entender ser o método mais apropriado a esta situação concreta, na medida em que pressupõem-se um contato maior com a realidade local, na qual o pesquisador assume uma função proativa diante dos fatos (THIOLLENT, 1986). As atividades foram realizadas em etapas, desenvolvidas durante o horário de aula, complementadas com tarefas para casa; e atividades desenvolvidas no contra-turno, durante junho, julho e agosto de 2011. Para a execução optou-se pelo uso de metodologias que aproximassem escola e comunidade, em vista da importância desta integração para o processo de aprendizagem realizado a partir da confluência entre saberes científicos e realidade local, tal como expresso por Dowbor (2007). QUESTIONÁRIOS: Foram aplicados com perguntas abertas e fechadas, a sessenta alunos, que puderam discutir as respostas com seus familiares, com o intuito de verificar se praticavam atividades agrícolas, se enquadravam-se como de base familiar, os problemas ambientais que os permeava, para captar o nível de conhecimento sobre questões relacionadas às práticas utilizadas em Agricultura Sustentável. A partir do diagnóstico obtido, foi realizada a estruturação das etapas seguintes. CONCEITUAÇÃO, DISCUSSÃO E VISITA DE CAMPO: Foram discutidos conceitos e práticas relativas à Agricultura Sustentável utilizando-se de exemplos visuais do entorno da comunidade. Para contextualização local, foram confrontados elementos de processo acentuado de degradação ambiental, oriundos de práticas agrícolas, e foi realizada visita a uma propriedade agrícola, com práticas relativas ao conceito de Agricultura Sustentável. SOCIALIZAÇÃO DO CONHECIMENTO: Os alunos construíram oficinas com atividades lúdicas – maquetes, desenhos e fotografias, demonstrando práticas sustentáveis e insustentáveis e apresentações teatrais relacionadas à agricultura sustentável. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO: Foi elaborado pelos alunos, com orientação dos executores, um projeto piloto para introdução de práticas sustentáveis, em uma propriedade de agricultura familiar, de pais de um aluno envolvido no projeto. Para evitar frustrações, os estudantes foram orientados no sentido de que nem todas as soluções propostas poderiam ser implantadas. SÍNTESE: Com a finalidade de processar uma síntese das atividades, os alunos foram orientados para a elaboração de uma redação com o tema: “desafios e perspectivas de uma agricultura sustentável no contexto local”.
Resultados e discussão
Foram analisados questionários de sessenta alunos, 28 do sexo masculino e 32 do sexo feminino, com idade entre 16 e 24 anos. Em análise aos questionários (Tab. 1), foi possível constatar que a maioria dos entrevistados são filhos de agricultores familiares. Apesar de 67% respondeu que sabe o que é agricultura sustentável, apenas 20% conhece práticas relativas à Agricultura Sustentável e 10% utilizada tais práticas em suas propriedades como o não uso de agrotóxico, a utilização da matéria orgânica em compostagem e o plantio em curva de nível. Luzzardi (2006) aponta que dentre as dificuldades para a adesão à Agricultura Sustentável, uma delas é a falta de conhecimento e domínio de tais práticas por parte dos agricultores, como pode ser inferido neste resultado.
Tabela 1. Resultado dos questionários aplicados aos alunos.
A partir da análise dos resultados, percebeu-se a importância da realização de trabalhos de educação e sensibilização ambiental na comunidade, principalmente no que está relacionado ao cotidiano da maioria dos moradores - as atividades agrícolas. Abordar conceitos, discutir com os alunos e promover a experiência de campo foram passos estratégicos, para conciliar teoria e prática. A conceituação foi entendida como a introdução ao assunto; a discussão como uma atividade de apreensão do conteúdo; e a experiência de campo, como uma forma de visualizar a aplicação prática do assunto com foco no cotidiano da comunidade, seja na visita à propriedade, seja na construção de uma proposta de intervenção da realidade local. De acordo com Thiollent (1986), a pesquisa-ação tem como objetivo esclarecer o problema da situação e acompanhar a tomada de decisões, das ações e de toda atividade funcional vinculada à pesquisa, com a intenção de elevar o conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou nível de “sensibilidade” ambiental dos envolvidos. No processo de socialização do conhecimento e abordagem conceitual, os alunos construíram oficinas com atividades lúdicas – maquetes, desenhos e fotografias, demonstrando propriedades sustentáveis e insustentáveis e apresentações teatrais relacionadas à agricultura sustentável, que foram apresentados à comunidade escolar. O trabalho com os alunos mostrou-se produtivo, uma vez que foram utilizados métodos que exploravam diferentes canais de apropriação para a Educação Ambiental, entre eles a arte, entendida como forma de expressão, que favorece a manifestação de conteúdos internos, os quais se concretizam no objeto (CARVALHO et al., 2010). Nas experiências em campo, foi possível que os alunos verificassem in loco uma propriedade sustentável, que aplica na sua prática diária os conceitos desenvolvidos em sala; e outra experiência com a elaboração, por parte dos alunos e equipe, de uma proposta de intervenção numa propriedade de um pai de aluno da escola questão. A extensão do trabalho desenvolvido para além da sala de aula através de visita de campo, a inserção de práticas sustentáveis em uma propriedade e acompanhamento dessas, são etapas que viabilizam a ação prática e experimental do que estava sendo discutido em sala de aula. Podemos analisar o cotejo das visitas de campo à luz de Freire (2007, p. 75), com o qual compartilhamos a ideia de que a relação do aluno com sua realidade favorece a politização e a criticidade; e ainda constitui-se de uma forma eficaz para se alcançar resultados no que tange à educação ambiental (RUSCHEINSKY & COSTA, 2002). A partir da análise dos textos-síntese, ao qual os alunos foram solicitados a elaborar ao fim do projeto, foi possível perceber que estes, em sua maioria, são favoráveis às práticas sustentáveis na agricultura. Dos sessenta alunos envolvidos, 93% disseram diretamente ou indiretamente, que são favoráveis à implantação da agricultura sustentável na localidade onde vivem. Estes dados corroboram com trabalhos correlatos, no sentido de que a maioria dos alunos da escola no campo estão abertos a serem adeptos a novas práticas de fazer agricultura (MEDEIROS & BARROS, 2011). 25% citaram que o impedimento para implantação de práticas sustentáveis é o desconhecimento de como fazê-las e seus benefícios, pelos agricultores locais. Esta deficiência de conhecimento também é relacionada em outros trabalhos nas atividades de adubação, controle de pragas e irrigação, que acarretam desde o desperdício de insumos e água (SILVA et al. (2012), até a contaminação do solo e riscos aos usuários, principalmente com o não uso de EPI, o que é, apesar de absurda, uma prática ainda frequente em muitas regiões (SILVA et al. 2012; SANTOS et al. 2013; JACOBSON et al. 2009; CHISTÉ & CÓ, 2003). A situação de desconhecimento de práticas sustentáveis faz alusão ao discurso de Lima (2003), o qual defende que o tema sustentabilidade ainda é superficial e pouco abordado na literatura e na relação educação-meio ambiente. Outros problemas apontados são a fragmentação do conhecimento em disciplinas, e a falta de integração destes fragmentos, o que dificulta programas de Educação Ambiental com a ênfase em sustentabilidade, de forma integradora e interdisciplinar, ao longo de toda a formação escolar. Durante a análise do texto foi possível sistematizar elementos-chave, devido à frequência que alguns destes apareciam - estes elementos faziam alusão a práticas que foram abordadas durante a vigência do projeto. Na análise destes elementos, 79% citaram a importância da conservação das florestas; 38% relacionaram a conservação do solo; 20% sobre os problemas causados pela poluição por meio de resíduos sólidos ou líquidos; 58% sobre Agricultura Orgânica - onde foram alocados os textos que defendiam o não uso de agrotóxico; 20% sobre a preservação direta das águas; 6% sobre a falta de estrutura e recursos e 6% sobre agroecologia. Os resultados foram tidos como satisfatórios, uma vez que, todos os textos abordaram de alguma forma, elementos importantes dos pressupostos da Agricultura Sustentável (ALTIERI, 1992; EHLERS & VEIGA, 1994). Foram expressivos relatos dos alunos no sentido de que se sentiram insatisfeitos com o atual modelo de praticar agricultura, e que o projeto foi importante para esclarecer os conceitos de agricultura sustentável e introduzir as primeiras práticas sustentáveis. Nesse sentido entende-se que o projeto contribuiu de maneira direta, para mudança de pensamento dos atores envolvidos, por meio da reflexão sobre a realidade, o diálogo e a participação e a associação entre teoria e prática.
Considerações finais
Durante o desenvolvimento das etapas do projeto e através da análise dos relatórios ficou evidente que a maioria dos alunos participantes desconheciam os princípios e as práticas de modelos sustentáveis de produção em atividades agrícolas. A elaboração e efetivação de trabalhos que tangem na educação ambiental se tornam mais significativos e efetivos, se desenvolvidos diretamente com os possíveis agentes sociais de mudança de uma realidade em questão, como ocorreu no desenvolvimento deste projeto, o que se efetivou através de jovens rurais, colabores diretos no cotidiano agrícola de suas famílias. O método da pesquisa-ação revelou significante eficiência no desenvolvimento de projetos educacionais, principalmente no âmbito da educação ambiental, uma vez que, é necessário conhecer a realidade na qual pretende se atuar antes de levar uma proposta de intervenção ou modificação de uma realidade. Percebeu-se que o processo de construção de conhecimento utilizado durante o desenvolvimento do projeto, no qual direcionou o sujeito a se debruçar e refletir sobre sua prática e ação cotidiana, é um método eficaz ao alcance da aprendizagem significativa, que possivelmente pode se tornar precursora na mudança da realidade ambiental e social de uma comunidade rural. Observou-se que o espaço escolar é um ambiente favorável para a realização programas de educação ambiental, e que podem envolver não somente os alunos, mas uma interação entre estes e a comunidade; os autores julgam representar um dos mais eficazes meios de disseminação de conhecimento científico em um ambiente rural, pois implicam diretamente no cotidiano de uma comunidade. O grande desafio da Agricultura Sustentável se conforma em envolver políticas públicas para que o tripé social-ambiental-econômico seja disseminado nas diferentes formas de fazer agricultura, e especialmente que seja fortalecida a agricultura familiar, a opção social de uso da terra que melhor se ajusta aos preceitos da agricultura sustentável. O alcance destas medidas se constitui de uma forma para as buscadas reorganização social, conservação dos ecossistemas e da biodiversidade.
Agradecimentos
Aos funcionários e alunos da EEEMFG; à toda equipe da Secretaria Municipal de Agricultura e do Instituto Capixaba de Pesquisa e Extensão Rural; e ao Sr. Adelino Schliewe pela receptividade para experimentação das atividades práticas sustentáveis em sua propriedade.
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