Rico é aquele que sabe ter o suficiente. Lao Tze
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 90 · Março-Maio/2025
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Relatos de Experiências
10/09/2018 (Nº 55) USO DA TERRA E GESTÂO HÍDRICA: O CASO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO URUSSANGA/SC, BRASIL
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USO DA TERRA E GESTÂO HÍDRICA: o caso da Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga/SC, Brasil

 

Carla Spillere Busarello – carlaspillere@gmail.com

Igor Martello Olsson – igor.olsson@hotmail.com

Melissa Watanabe – melissawatanabe@unesc.net

Miguelangelo Gianezini – miguelangelo@unesc.net

 

Resumo: Sendo recursos garantidores de subsistência, a água e a terra se destacam por sua importância econômica, social e estratégica para as nações e seus povos. Tendo caráter essencial para a vida e possuindo característica de recurso para uso humano, é importante entender os impactos causados pelas ações humanas em sua qualidade. Observando-se os recursos por sua ordem finita, destaca-se a importância em compreender a gestão dos mesmos, na busca por meios que possam minimizar perdas e conferir qualidade à produção proveniente de sua utilização. Portanto, considerando as atividades agropecuárias não sustentáveis e outros usos inadequados da terra como alguns dos maiores poluidores, entende-se que a relação dos bens naturais deve ser compreendida visando prevenir e/ou combater excessos como contaminações, erosões e assoreamentos de cursos d’água. A conscientização populacional busca, por sua vez, instruir aqueles que possuem meios, ainda que diminutos, a fim de contribuir para a mudança nos métodos de uso e garantir assim a prevenção de novos impactos e na supressão e/ou extermínio de problemas já recorrentes. De caráter exploratório-descritivo e qualitativo, o presente estudo objetivou– por meio de abordagem documental e bibliográfica, aliada à pesquisa de campo –descrever a experiência regional (aqui representada pela Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga) com a gestão hídrica e uso da terra, bem como as complementaridades e discrepâncias em relação aos teóricos abordados. A má gestão hídrica e o mau uso do solo fazem parte de um circuito fechado de problemas que se agravam, consecutivamente, e só podem ser resolvidos com a implementação de gestões eficientes e a devida preparação e cuidado com o solo. Por fim, é possível reiterar que o crescimento não deve ser meramente quantitativo, mas qualitativo e sustentável, buscando crescer mantendo a capacidade futura de desenvolvimento.

Palavras-chave: Teoria Boserapiana; Gestão de recursos hídricos; Desenvolvimento; Santa Catarina.

 

INTRODUÇÃO

 

A água é um recurso fundamental a todos os tipos de vida, portanto, desde as civilizações mais remotas, o homem sempre se estabeleceu próximo às margens dos cursos de água. As áreas próximas a estes cursos apresentavam solo mais fecundo, ou seja, próprias para cultivo de alimentos devido a maior fertilidade natural quando comparados às áreas de campo e cerrado. A água com potencial de uso pode ser chamada de recurso hídrico, visto que se associa as atividades humanas, podendo destacar a agricultura, a indústria, a recreação e o abastecimento humano e ambiental. A partir destes fatores há a necessidade de manter o equilíbrio entre demanda e oferta de água em quantidade e qualidade suficientes.

Sobre a quantidade de água doce no mundo, é possível afirmar que o Brasil se mantém em posição confortável, visto que é detentor de 14% do montante de água voltado para atender as necessidades humanas. Entretanto quando se discute a qualidade da água com potencial de uso as evidências não são tão positivas, uma vez que muitos rios estão contaminados e acabam perdendo sua capacidade de uso. De acordo com Prado (2004), há muitos fatores que ocasionam a contaminação da água, sendo encarados como fontes pontuais e fontes difusas. As fontes pontuais são normalmente caracterizadas pelos resíduos domésticos e industriais, enquanto que as fontes difusas se caracterizam pelos rejeitos oriundos da agricultura, escoamento superficial urbano e de pátios industriais.

Vários são os fatores capazes de intensificar a contaminação da água no âmbito agropecuário, dentre eles, a irrigação na agricultura, dejetos e resíduos da produção animal, a compactação do solo em função da mecanização e atividades pecuárias, o desflorestamento principalmente da mata ciliar, a falta de conservação do solo, os processos de erosão, e a intervenção de fatores naturais. Loague et al. (1998) estimam que o grande agravante da contaminação do solo são as fontes difusas, pois estão atingindo cada vez mais os cursos de água. O mau uso da terra gera decomposição do ambiente, levando a processos contínuos de erosão, inundações, assoreamentos desenfreados de lagos e reservatórios (SANTOS, 1981; PRADO, 2004).

A gerência de terra e de água tem como foco, melhorar a produtividade agropecuárias e promover a utilização sustentável dos recursos da terra e da água por meio da melhoria na gestão, desenvolvimento e conservação. Esta gestão aborda os desafios que os países enfrentam para garantir o uso produtivo e eficiente dos recursos da terra e da água, a fim de atender às demandas atuais e futuras para os produtos agrícolas, garantindo a sustentabilidade, em longo prazo, da quantidade e da qualidade da terra e da água. Ela promove o acesso equitativo a estes recursos naturais com vistas a aumentar a produtividade, meios de subsistência e serviços ecológicos (FAO, 2015).

Na dinâmica territorial, o uso da terra está associado a questões biofísicas, atividades socioeconômicas e contextos culturais. Na identificação das causas das mudanças do uso da terra, é necessário um entendimento de como as pessoas tomam suas decisões e de como vários e certos fatores específicos interagem entre si (LAMBIN; GEIST; LEPERS, 2003; VERBURG et al., 2006).

Partindo da temática do uso da terra e da água e com respaldo no pensamento de Ester Boserup. O presente estudo tem como objetivo descrever o caso da Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga, cuja água é imprópria para consumo por herança do mau uso do solo em atividades econômicas executada na região em décadas passadas.

 

USO DA TERRA

 

Com a consolidação do sistema capitalista e a revolução industrial, os séculos XVIII e XIX contaram com um elevado aumento demográfico e, consequentemente, um aumento da demanda por alimentos. Com isso, Thomas R. Malthus (1798) passou a defender a teoria de que o crescimento demográfico ultrapassaria a capacidade produtiva da terra, ocasionando fome e miséria.

Entretanto, mais de dois séculos se passaram e as previsões de Malthus não se confirmaram por diversos fatores que ainda eram conhecidos pelo mesmo em seu tempo, incluindo a questão do avanço tecnológico. Assim, outros teóricos como a economista Ester Boserup (1965), propuseram uma releitura desta condição, em novas propostas que contrapunham a teoria malthusiana. Boserup acreditava que o crescimento demográfico não era um problema capaz de gerar a fome, uma vez que defendia a ideia de que a população aumenta em função do aumento da produtividade agrícola.

Segundo a teoria boserupiana, o uso eficaz da terra com inovações tecnológicas adequadas, permite a intensificação agrícola, em que há o aumento da produtividade sem a necessidade de expansão da área produtiva. Para isso a autora propõe um universo de cinco grupos diferentes para o uso da terra, conforme a figura 02 ilustra.

 

Figura 2 - Uso da terra em cinco grupos distintos de acordo com a teoria boserapiana.


Fonte: Adaptado de Boserup (1965).

 

Boseup (1965) caracteriza cada grupo da seguinte maneira:

1.    Cultivo de florestas pousio: neste sistema lotes de terra são apurados nas florestas a cada ano e semeadas ou plantadas por um ano ou dois, em um segundo momento a terra é deixada em repouso tempo suficiente para a recuperação da terra. Este período leva em média 20 a 25 anos, de sendo chamado de período de pousio.

2.    Cultivo de arbusto pousio: neste sistema o pousio é muito mais curto, geralmente uma média de seis a dez anos. Nenhuma verdadeira floresta pode crescer em um período tão curto, mas a terras deixadas em pousio são coberto com mato e, em alguns casos, também com pequenas árvores. Este período pode ser tão curto,levando entre 1 ano e 2 anos e pode ser tão longo como o período comum, ou seja, de seis a oito anos.

3.    Cultivo de curto pousio: neste sistema, o pousio dura cerca de 1 ano a 2 anos apenas. Apesar de o período ser curto, é necessário tomar cuidado para que as ervas daninhas não invadam a terra antes do retorno da atividade. É válido ressaltar que embora semelhante, este sistema se difere das áreas de grama utilizadas no sistema de longo pousio e das áreas de grama utilizadas em sistemas de rotações de curto pousio.

4.    Corte anual: este normalmente não é considerado um sistema de pousio, mas pode ser classificado como tal porque a terra é deixada sem cultivo, geralmente por vários meses, entre a colheita de uma cultura e o plantio da próxima. Este grupo pretende incluir sistemas de rotação anual, em que um ou mais dos cultivos sucessivos são sementes de ervas ou de outras forragens produzida.

5.    Múltiplo corte: este é o sistema mais intensivo do uso do solo, uma vez que a mesma área de cultivo traz duas ou mais culturas sucessivas a cada ano. O plantio de uma nova safra deve ter lugar logo após a colheita da anterior, logo, o período de pousio é curto ou mesmo inexistente.

Corroborando com a proposta boserapiana, aplicada à atualidade a Food and Agricultural Organization – FAO defende práticas de boa gestão da terra, além de frisar a relevância do planejamento (FAO, 2015). A preservação e conservação dos recursos naturais dependem também do uso adequado da terra, portanto planejamento é uma atividade indispensável que deve ser executada de acordo com a aptidão, capacidade e produtividade do solo a fim de potencializar a eficácia dos recursos naturais garantindo a sua permanência para as gerações futuras (SILVA et al., 2011).

Desta forma é possível gerenciar o uso da terra nas esferas biofísica, socioeconômica e cultural sempre buscando a melhor utilização do espaço geográfico, a fim de aperfeiçoar a utilização destas áreas para alcançar um maior retorno econômico (WATANABE, 2009). Tais cuidados precisam estar em evidência uma vez que, se analisado o processo histórico, o Brasil já enfrentou alguns problemas de origem natural, como o aumento das pressões sobre o meio ambiente, processos erosivos, perda de biodiversidade, contaminação ambiental, desequilíbrios sociais entre outros (SILVA et al., 2011).

Considerando a importância do uso do solo para os processos agrícolas, seja para a manutenção do setor econômico, seja para a produção de alimentos, torna-se relevante considerar os recursos hídricos como matéria-prima fundamental na produção agropecuária. Isto porque a água é outro recurso natural que precisa de gerenciamento, planejamento e tomada de decisão adequados por ser considerado um recurso escasso, mas que precisa atender desde as necessidades básicas do ser humano até a demanda como matéria-prima para a produção de um bem ou produto agropecuário ou mesmo agroindustrial.

Para tanto, o manejo integrado da terra e da água é promovido por meio do desenvolvimento e melhoria da agricultura irrigada e de sequeiro, em uma abordagem científica de gestão de bacia hidrográfica (apresentada na seção a seguir), com especial atenção para melhorar a qualidade da terra e dos recursos hídricos e para reduzir o impacto de eventos climáticos extremos (FAO, 2015).

 

COMITÊ DE BACIA HIDROGRÁFICA

 

Neste início de século a água é considerada como um bem econômico limitado. Por ser de domínio público, seu uso é valorado e regulamentado legalmente, pertencendo, no Brasil, às pessoas jurídicas de direto público, a citar: União, Estado e Município. Desta forma, a distribuição constitucional de competências sobre águas pode gerar uma aparente contradição, principalmente quando se fala de gerenciamento, por centralizar na União a competência legislativa sobre as águas, incluindo os cursos de águas estaduais. Viegas (2005) destaca que a concentração de determinadas competências sobre recursos hídricos na União não exclui dos Estados e Municípios a responsabilidade de tratarem do assunto, além disso, essa divisão possibilita que o país tenha regulamentação uniforme em seus aspectos fundamentais.

Por conseguinte, no Brasil, os agentes sociais se articulam em Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas, previstos na Constituição Federal e também nas leis estaduais. Assim, o cenário institucional é formado pela atuação do Estado, responsável legal pelas águas, em interação com representações das organizações privadas e da sociedade civil organizada. As ações diretivas da Lei Federal nº. 9.433, de janeiro de 1997, denominada ‘Lei das Águas’, já foram traçadas de forma a apresentar um envolvimento dos interesses dos grupos em Bacias Hidrográficas (MMA, 2004). Pode-se dizer que tal legislação permitiu ao país alcançar uma mudança efetiva nas práticas de uso dos recursos hídricos com o intuito de buscar soluções que sejam mais sustentáveis às comunidades do seu entorno.

Watanabe et al. (2014) explicam que a constituição de um comitê começa por meio da articulação com o Conselho de Recursos Hídricos (CRH) e este institui uma comissão prévia composta pelos membros da bacia, que tem por responsabilidade buscar setores que tenham interesse na bacia. Quando o CRH reconhece esta comissão, então a criação do comitê está autorizada e, a partir de então é realizada a eleição para a escolha dos membros deste mesmo comitê que legalmente deve ser constituído por 40% de usuários dos recursos hídricos, 40% de representantes da sociedade civil e 20% de representantes do poder público.

É nas bacias hidrográficas que ocorre todo o planejamento e gerência destes recursos naturais. Assim, cabe aqui nesta seção reiterar a definição de Bacia hidrográfica adotada para o estudo. Trata-se de uma compactação geográfica natural delimitada por divisores de águas, ou seja, um conjunto de rios em que seus afluentes deságuam em um rio principal. Assim, tudo o que é feito na bacia hidrográfica reflete no curso d’água. Para um melhor entendimento, este estudo define bacia hidrográfica como sendo:

 

[...] um conjunto de terras drenadas por um rio principal e seus afluentes. A noção de bacia hidrográfica inclui naturalmente a existência de cabeceiras ou nascentes, divisores d'água, cursos d'água principais, afluentes, subafluentes, etc. Em todas as bacias hidrográficas devem existir uma hierarquização na rede hídrica e a água se escoa normalmente dos pontos mais altos para os mais baixos (SEMA, 2006).

 

A composição diversificada e democrática dos comitês contribui para que todos os setores da sociedade, que tenham interesse sobre a água na sua bacia, possam ser representados e que tenha poder de decisão sobre a sua gestão. Um comitê de bacia hidrográfica não pode pensar somente na água e seus poderes e/ou empoderamentos, mas precisa apresentar um olhar voltado para todo o seu entorno, as quais a contaminação da água e o modo de vida daqueles que moram próximo à bacia sejam também questões pautadas e discutidas.

 

METODOLOGIA

 

A pesquisa apresenta caráter exploratório e descritivo, com abordagem qualitativa. As estratégias adotadas foram bibliográfica, documental e pesquisa de campo, em que foram entrevistados experts da área. A técnica de coleta de dados utilizada foi a pesquisa em profundidade, a qual foi gravada facilitando a análise dos dados e também viabilizando a observação das complementaridades e discrepâncias dos teóricos abordados.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

O caso da bacia hidrográfica do Rio Urussanga/SC, Brasil

 

O comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga foi criado no dia 01 de dezembro de 2006 através do Decreto Estadual nº 4.934, seguindo as diretrizes das Leis Estaduais nº 9.748/94 e Federal nº 9.433/97. É um órgão colegiado formado por quarenta entidades, sendo: i) dezesseis representantes de usuários de água; ii) dezesseis representantes da sociedade civil; e, iii) oito representantes do poder público.

Está situado na região hidrográfica RH-10, localizada no extremo sul catarinense e integra um total de dez municípios na área de sua bacia, sendo: Urussanga, Pedras Grandes, Treze de Maio, Cocal do Sul, Criciúma, Morro da Fumaça, Içara, Jaguaruna, Sangão e Balneário Rincão. Vale ressaltar que somente os municípios de Cocal do Sul e Morro da Fumaça têm sua área total inserida na bacia.

Desta forma, é de responsabilidade do Comitê do Rio Urussanga promover o gerenciamento descentralizado, participativo e integrado dos recursos hídricos na área da Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga. Além de realizar reuniões ordinárias periodicamente e abertas ao público, com o objetivo de tratar de assuntos relacionados ao comitê, bem como informar sobre o desenvolvimento de suas atividades e ações propostas (SANTA CATARINA, 2015).

A região do extremo sul catarinense sofre os efeitos da poluição proveniente da atividade mineradora do carvão. Poluição que acaba por gerar impactos ambientais de grande magnitude na Bacia Hidrográfica o Rio Urussanga e seus afluentes, sendo o próprio Rio Urussanga um dos mais poluídos da região, contando com uma concentração significativa de metais pesados e alta acidez. Corroborando, o entrevistado 02 afirma:

 

“[...] o carvão na época foi considerado como um produto de segurança para a nação por questão de energia e etc. Então, quer dizer, fica difícil condenar (as antigas gerações), mas hoje fica assim, as novas gerações tem uma nova visão e precisa ter. [...] E assim, por dentro do nosso comitê existem as várias correntes e todas precisam, de uma maneira ou de outra, alcançar seus objetivos” (E02, 2014).

 

Neste sentido, o desassoreamento do Rio Urussanga e a revitalização da Lagoa da Urussanga Velha era desejo das lideranças e população da região há mais de vinte anos. Para a resolução deste problema foi criado na Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, o Fórum Permanente sobre o Desassoreamento do Rio Urussanga. Um dos trabalhos deste Fórum foi solicitar do Governo do Estado de Santa Catarina recursos financeiros para a execução da obra de Desassoreamento do Rio Urussanga e revitalização da Lagoa da Urussanga Velha (SANTA CATARINA, 2015).

Com a identificação da dificuldade de captação de recursos dos governos estadual e federal, observou-se que a Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga não possuía um Comitê de Gerenciamento estruturado, logo, não detinha um Plano de Bacia. Diante desta situação o Governo do Estado de Santa Catarina, por meio da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Criciúma e da Assembleia Legislativa, e do Fórum Permanente sobre o Desassoreamento do Rio Urussanga, convidou as lideranças e a população residente nos arredores da Bacia Hidrográfica para participar de uma Audiência Pública que foi realizada na Comunidade de Esplanada, município de Içara.

Tal audiência ocorreu no ano de 2004, dois anos antes da fundação efetiva do comitê, com o objetivo de formar um grupo pró-comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica, discutir o desassoreamento do Rio Urussanga (SANTA CATARINA, 2015), promovendo medidas socioeducativas, como as descritas a seguir.

                                           

Medidas Socioeducativas

 

Como o comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Urussanga tem um histórico negativo do passado quanto ao uso do solo pelas mineradoras de carvão, a contaminação da água acabou sendo recebida como herança pela sociedade local. Entretanto, com o atual conhecimento quanto a necessidade do uso eficaz e sustentável da água, os gestores do comitê já há alguns anos vêm executando medidas socioeducativas de conscientização pelo uso da água.

O Rio Urussanga e seus afluentes têm sofrido os impactos da poluição já há algumas décadas, e nos dias atuais suas águas são impróprias para: consumo, lazer, uso terapêutico e abastecimento da agricultura irrigada. Ao longo do Rio, por muito tempo, foram lançados rejeitos piritosos, além da prática da mineração de carvão, fluorita e argila. A extração de areia do solo e/ou subsolo também era uma ação comum, o que acabou por gerar o assoreamento da calha do Rio, resultando em inundações e enchentes nas comunidades dos entornos, além da água ácida do Rio que escoa para lagos próximos e impossibilita a criação de peixes ou o seu uso para atividades recreativas.

Entretanto é importante destacar que o comitê do Rio Urussanga tem envolvimento significativo com a sociedade, em que além de conscientizá-los, os responsabiliza pela recuperação da qualidade da água e também do solo. Para isso são realizados muitos projetos envolvendo principalmente as crianças, pois se acredita que elas são a geração capaz de usufruir da qualidade da água do Rio Urussanga.

 

“[...] a sociedade já tem identificado o comitê de bacia, elas já relacionam com uma entidade que está trabalhando com a gestão dos recursos hídricos. Então a gente tem sentido um maior espaço na mídia por conta do nosso trabalho” (E01, 2014).

 

A aceitação social permitiu o sucesso destes projetos, como é o caso do projeto “Urussanga vira criança”, executado em parceria com a Secretaria de Educação do município, que ganhou o prêmio nacional Palma de Ouro, em 2013. Este projeto teve por objetivo estimular a participação dos estudantes nas decisões sobre o desenvolvimento da área urbana e rural de Urussanga, por meio de elaboração de um documento composto por percepções e projeções a respeito dos enfoques econômicos, social e da gestão de recursos hídricos do município.

Outro projeto que merece destaque é o Piava Sul, desenvolvido em parceria com o comitê de Bacia Hidrográfica do rio Araranguá. É um caderno desenvolvido para o educador ambiental das escolas dos municípios de Urussanga e Araranguá. Sua primeira edição foi lançada no ano de 2010, e a segunda edição foi lançada em dezembro de 2014 com o objetivo de socializar o conhecimento produzido nas bacias com relação aos recursos hídricos e ao uso da terra, a fim de orientar os usuários de água, a sociedade civil e o poder público dessas bacias na gestão dos recursos hídricos. O intuito do material também é formar novos educadores ambientais e estimulá-los a desenvolver a educação ambiental de forma interativa e motivadora. 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

As gerações atuais estão sofrendo com a má utilização do solo pelas gerações passadas, o que culminou na alta poluição do Rio Urussanga. Entretanto a comunidade já entendeu a se conscientizou sobre a importância de manter a água limpa e com qualidade. Os agricultores também já estão mais conscientes quanto ao uso sustentável do solo, de maneira que não venha a afetar na qualidade da água do rio e seus mananciais para as atuais e futuras gerações.

A pesquisa evidencia que a qualidade da água do Rio Urussanga é crítica, entretanto com a união dos poderes público e civil está sendo possível o alcance de resultados positivos a curto e médio prazo, aumento a expectativa de uma melhora na qualidade da água em longo prazo. Como medidas corretivas, o comitê de bacia hidrográfica do Rio Urussanga vem buscando conscientizar a população, principalmente as crianças, além de estar melhorando a estrutura gerencial do comitê a fim de executar ações maiores no futuro, como por exemplo, a limpeza da calha do rio.

 

AGRADECIMENTOS

 

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela bolsa de mestrado; Ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Socioeconômico – PPGDS, da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC; Ao Núcleo de Empreendedorismo da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC; e. ao Grupo de Pesquisa em Inovação, Educação e Empreendedorismo Social – GIEES.

 

REFERÊNCIAS

 

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Ilustrações: Silvana Santos