Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Relatos de Experiências
11/03/2017 (Nº 59) PERCEPÇÃO AMBIENTAL E USOS DE UMA LAGOA TEMPORÁRIA EM UMA CIDADE NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO
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Nova Ocorrência de Nematanthus fissus (Vell

PERCEPÇÃO AMBIENTAL E USOS DE UMA LAGOA TEMPORÁRIA EM UMA CIDADE NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

 

Francisco José de Sousa1, Artur Henrique Freitas Florentino de Souza2, Gil Dutra Furtado3

 

[1] Graduação em Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Piauí,e Especializando em Meio Ambiente pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí, Picos-PI. Email: francissousa1@hotmail.com

 

[2] Professor Assistente II do Curso de Ciências Biológicas da UFPI, Campus Senador Helvídio Nunes de Barros, Picos-PI; Doutorando em Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFPB; Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFPB e Bacharel/Licenciado em Ciências Biológicas pela UFPB. Email: ahffs@ufpi.edu.br

 

[3] Professor colaborador no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal da Paraíba; Pós-doutor em Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFPB; Doutor em Psicobiologia/UFRN; Mestre em Manejo de Solo e Água/UFPB; Especializado em Psicopedagogia pelo Centro Universitário Internacional/UNINTER; Graduado em Agronomia/UFPB. Email: gdfurtado@hotmail.com

 

 

RESUMO

 

Este estudo investigou a percepção ambiental de uma população amostral na cidade de Paquetá, Piauí, Brasil, a respeito de uma lagoa temporária, inserida às margens da cidade com o objetivo de conhecer as relações existentes entre ela e a população. Foram aplicados 80 questionários com questões abertas e fechadas. O perfil dos entrevistados se mostrou composto por pessoas com variação de idade entre 21 e 78 anos e média de 41 anos, escolaridade composta pela maioria com ensino fundamental incompleto, lavradores, com média de residência no local de 35 anos. Percebem que, geralmente, a lagoa permanece cheia em torno de 7 a 12 meses e caracterizam o ambiente geralmente com concepção estética, utilizam, sobretudo para a agricultura e criação de animais e propõem medidas a fim de minimizar principalmente a poluição do local causada por esgotos, revelando preocupação com os animais caso a lagoa deixasse de existir. A população mostra-se de visão utilitarista dos recursos da lagoa, com práticas quase inexistentes de preservação do local, sendo preciso despertar a consciência da população para a proteção desse ambiente.

 

Palavras-chave: Lago. Paquetá. Percepção ambiental. Bioma Caatinga.

 

ENVIRONMENTAL PERCEPTION AND USES OF A TEMPORARY POND IN A CITY IN BRAZILIAN SEMIARID

 

ABSTRACT

 

This study investigated the environmental perception of a sample population in the city of Paquetá, Piauí, Brazil, about a temporary pond, set on the banks of the city with the purpose of investigating the relationship between the population and it. 80 questionnaires with open and closed questions were applied. The profile of respondents was composed of people with ages ranging from 21 to 78 years, with a mean of 41 years, scholarly composed mostly by rural workers with incomplete primary education and who live in that place around 35 years. They realize that usually the pond remains full around 7 to 12 months and characterize the environment usually with aesthetic design, they use it particularly for agriculture and livestock and proposes measures to minimize pollution mainly caused by local sewers, revealing concern for animals if the pond ceased to exist. The population shows up for utilitarian view of the resources of the lagoon, with almost nonexistent preservation practices of the place, being necessary to awaken public awareness for the protection of this environment.

 

Keywords: Lake. Paquetá. Environmental perception. Caatinga Biome.

.

 


1 INTRODUÇÃO

 

Considerar um espaço físico ou um território consiste em envolver, os elementos físicos do ambiente natural ou construído, como também as relações sociais existentes e suas interações, interdependências, conflitos, disputas e problemas presentes entre o homem e o ambiente e suas diferentes formas de visão e interação com eles (BIELLA 2006).

Neste contexto, a percepção ambiental é um tema recorrente que vem colaborar para a consciência e prática de ações individuais e coletivas, desse modo, o estudo da percepção ambiental é de tal relevância para que se possam compreender melhor as inter-relações entre o homem e o ambiente, suas expectativas, suas satisfações, insatisfações, julgamentos e condutas (PACHECO; SILVA, 2007).

A partir disso, entende-se que os comportamentos humanos procedem de suas percepções de mundo, cada indivíduo reage de acordo com sua compreensão e relação com o meio, desenvolvida durante sua vida (MENGHINI, 2005 apud FREIRE et al., 2013). Sendo assim, é necessário o envolvimento de cada um para compreender melhor o seu espaço, embora nem todas as manifestações psicológicas sejam evidentes, são constantes, e afetam nossa conduta, na maioria das vezes, inconscientemente (FAGGIONATO, 2007).

A percepção e a interpretação dos níveis e dimensões das realidades ambientais, das singularidades e da importância do patrimônio paisagístico, das atitudes e condutas humanas, dos valores ambientais devem contribuir, essencialmente, para a compreensão das transformações visíveis e não-visíveis, tangíveis ou não, da paisagem, percebida e interpretada como patrimônio de um povo, de um país, legado das futuras gerações, considerando-se as várias instâncias e conjunturas, pois um horizonte de possibilidades individuais e coletivas é desvendado numa expressão de valores locais, regionais e universais (COSTA; MAROTI, 2007).

Interpretar realidades ambientais significa adentrar em estudos de características qualitativas e inclusivas, pois, põe em evidência a participação de atores sociais locais. Tal fato suscita cuidados na seleção das ferramentas de análises, sobretudo quando se apropria de narrativas dos atores participantes do processo investigatório (LEITE et al., 2013).

Neste sentido, este trabalho tem como objetivo, analisar a percepção da população da cidade de Paquetá do Piauí, a respeito de uma lagoa presente às margens da cidade, com o propósito de conhecer as relações existentes entre a população e esse espaço natural, como também documentar informações que possam enriquecer o conhecimento e a prática de medidas sociais sustentáveis, a fim de gerar benefícios para a comunidade estudada.

 

2 MATERIAL E MÉTODOS

 

  2.1. Área de Estudo

 

O presente trabalho, de caráter qualitativo e descritivo, foi realizado na sede do município de Paquetá - PI (07º06’16”S; 41º42’14”W), localizado na mesorregião sudeste do Estado do Piauí, na microrregião de Picos. Possui 490 km2, situando-se a 314 km da capital Teresina (BRASIL, 2004).

A população total deste município segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, (BRASIL, 2010) é de 4.147 habitantes e na cidade de Paquetá, há 557 habitantes. As condições climáticas de Paquetá (com altitude da sede a 340 m acima do nível do mar) apresentam temperaturas mínimas de 22 ºC e máxima de 36 ºC, com clima predominantemente semi-úmido e quente, com precipitação pluviométrica média anual entre 800 a 1.400 mm (BRASIL, 2004).

A cidade apresenta transições vegetais, floresta subcaducifólia/caatinga e domínio hidrogeológico correspondente a rochas sedimentares, ocorrendo numa área expressiva, correspondendo a cerca de 40% da área do município (BRASIL, 2004).

A escolha dessa cidade foi justificada pelo fato de existir um ambiente úmido, a lagoa do Paquetá (7º6´8.97´´S; 41º42´17.00´´W), localizada nas intermediações da cidade (Figura 01), cuja vontade política local e o setor imobiliário tenta viabilizar sua urbanização.

 

2.2. A Pesquisa

 

Para a realização deste trabalho, foram realizados estudos exploratórios sobre a comunidade da cidade de Paquetá, através de visitas em campo e também para subsidiar a elaboração dos formulários que foram aplicados. Após esta etapa, foi traçado um questionário semiestruturado.

Para a obtenção dos informantes da comunidade, foram pré-definidos dois critérios: a) pessoas com idade igual ou superior a 21 anos e b) pessoas com tempo de moradia na comunidade acima de 10 anos, sendo uma pessoa por família.

Dentre as técnicas de pesquisa de campo para os estudos de percepção acerca daquele ambiente aquático, foram utilizadas, nesta pesquisa, a observação direta e a interrogação por meio da aplicação de formulários, conforme Whyte (1977).


 

 

Figura01. (A) Localização do município de Paquetá, semiárido do Piauí, evidenciando o local da lagoa do Paquetá. (B) vista aérea da cidade de Paquetá – PI e a sua principal lagoa. A linha cinza representa o perímetro máximo de quando este ambiente aquático temporário está com a sua capacidade total.

Fonte: Adaptação do Google Earth (2014) e da CPRM (2004).

 

 


 A observação direta entendida como sendo o fazer perguntas e ouvir; com isso o investigador participa da vida e das ações do povo que ele está estudando. O pesquisador desempenha, assim, dois papéis: observador e participante. O trabalho consiste em observar as conversas com os informantes e anotar o mais rapidamente possível. Ainda segundo este autor, a observação do comportamento humano no ambiente é um método básico de todas as abordagens da percepção ambiental.

A aplicação de formulários com questões abertas: as perguntas tratam de questões abertas, porque o entrevistado tem maior liberdade de expressão, maximizando o ponto de vista dele com pouca influência do pesquisador. A entrevista com questões abertas compreende 09 variáveis que são referentes às experiências, características individuais, identidade, atitudes, informações, escolhas e comportamentos dos entrevistados.

Com o auxílio destas técnicas foram avaliadas duas dimensões de variáveis de pesquisa, adaptadas de Whyte (1977), para conhecer a percepção ambiental dos moradores da comunidade de Paquetá-PI em relação à lagoa: a) Dimensão 1- Variáveis pessoais: características dos sujeitos, tais como idade, gênero, escolaridade, profissão e quanto tempo residem no local; b) Dimensão 2- Processos de percepção que a população amostral tem em relação ao ambiente de estudo.

Para avaliar as percepções que os entrevistados possuíam a respeito da lagoa, escolheu-se por utilizar uma forma investiga­tiva optativa, em que as pessoas deveriam escolher aquela que melhor traduzia suas idéias sobre o meio, justificando em seguida a sua escolha.

As análises referentes às concepções perceptivas foram feitas conforme as categorias representativas baseadas nas proposições de Daniel; Vining (1983), Sauvé (2000), Reigota (2001) e Giuliani (2004).

Após as entrevistas, foi realizada a tabulação dos dados e transcrição das respostas, as quais foram qualificadas e agrupadas em categorias. Em seguida, calculou-se a freqüência de ocorrência de cada categoria e os resultados da pesquisa foram descritos e apresentados em gráficos e tabelas.

 

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

3.1. Perfil dos Entrevistados

 

Dentre os 80 entrevistados que compõe a população amostral, verificou-se a variação de idade de 21 a 78 anos (Figura 02), apresentando uma média de 41 anos. Em referência à idade do gênero dos atores sociais, a maioria foi do sexo masculino, apresentando 54%, com variação de idade de 21 a 78 anos (média de 42 anos).

Já a população amostral feminina representou 46%, com variação de idade de 22 a 67 anos e média de 40 anos.

No que diz respeito ao tempo de moradia dos entrevistados na cidade, a (Figura 03) mostra que 11 pessoas estavam dentro dos requisitos mínimos de 10 anos, e o tempo máximo foi de 78 anos. A média foi de 35 anos de residência no local.

 

Figura 02. Faixa de idade, geral e por gênero, dos entrevistados da cidade de Paquetá – PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 

Figura 03. Faixa de tempo de residência, geral e por gênero, dos entrevistados da cidade de Paquetá – PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 

Quanto à escolaridade dos entrevistados, os resultados mostraram que 5% deles são analfabetos; 34% possuem ensino fundamental incompleto; 29% ensino fundamental completo; 1% ensino médio incompleto; 20% ensino médio completo; 5% ensino superior incompleto e 6% ensino superior completo, como observado na (Figura 04).

 

Figura 04. Faixa de escolaridade, geral e por gênero, dos entrevistados da cidade de Paquetá – PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 

 

No que diz respeito à escolaridade, grande parte da população analisada não conseguiu se quer iniciar o ensino médio, abandonando a escola. Este fato pode ser justificado devido às dificuldades encontradas, antigamente, pelos entrevistados quanto ao acesso ao ensino (no caso os analfabetos) como também a necessidade de trabalhar para o sustento da casa e da sua família.

A respeito da profissão dos entrevistados, foi constatado que 63% são lavradores, 10% professores, 9% domesticas, 4% pedreiros, 3% profissionais técnicos (técnica em enfermagem, técnica odontológica) 3% estudantes, e os demais 8% são formados pelas profissões de: zeladora, vendedora, merendeira, marceneiro, eletricista, conselheira tutelar, comerciante e agente de saúde, somando 1% cada uma na pesquisa (Tabela 01).

 

Tabela 01. Tipos de profissões relatadas pela população analisada da cidade de Paquetá do PI, no mês de janeiro de 2014.

Fonte: Pesquisa de campo realizada pelos autores, 2014.

 

Ficou constatado que a população analisada na cidade de Paquetá do Piauí é formada em sua maioria, por agricultores pelo fato de sobreviverem da agricultura de subsistência. Estes, por sua vez, nasceram e/ou migraram de comunidades rurais vizinhas, permanecendo no local até hoje, demonstrando uma forte ligação com o mesmo.

Segundo Souza (2009) em estudo semelhante no açude Jatobá I, na Paraíba, os atores sociais envolvidos apresentaram, em sua totalidade, um forte sentimento de topofilia, o que pode influenciar as suas crenças, seus hábitos, costumes e as formas de uso do ambiente. O termo topofilia significa o elo entre o indivíduo e o lugar ou ambiente físico em que vive e o arraiga a sentimentos de amor à terra quase sempre difíceis de remover (TUAN, 1980).

 

3.2. Percepções da lagoa Paquetá

 

A fim de conhecer a percepção dos moradores de Paquetá a respeito do tempo de vazão da água armazenada na lagoa, foi perguntado para os mesmos qual seria o período de tempo que a lagoa permaneceria com a água quando cheia.

Os resultados mostraram que 84% dos entrevistados (67 entrevistados) informaram que a lagoa permanece com água entre 7 a 12 meses; em seguida, 9% disseram que o ambiente permanece com água cerca de 19 a 24 meses, 5% citaram que a mesma permanece com água cerca de 13 a 18 meses, enquanto que 2 % citaram 1 a 6 meses (Figura 05).

 

Figura 05. Faixa de variação de tempo em que a lagoa permanece cheia, geral e por gênero, dos entrevistados da cidade de Paquetá – PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 

Já para entender os diferentes tipos de concepções perceptivas que entrevistados tinham quando caracterizavam a lagoa como ambiente, foram perguntados se a mesma, quando estava seca e\ou cheia, representava um ambiente feio ou bonito.

A maioria dos entrevistados, 97%, considerou que quando cheia, a lagoa era um ambiente bonito e, quando no período de estiagem, tornava-se um ambiente feio. No entanto, apenas 3% não quiseram qualificar o ambiente úmido.

A figura 06, a seguir mostra os diferentes tipos de concepções perceptivas, conforme as categorias representativas baseadas nas proposições de Daniel; Vining (1983), Sauvé (2000), Reigota (2001) e Giuliani (2004). Dessa forma, foi possível constatar que 57,6% dos entrevistados têm uma percepção do tipo estética, evidenciando o caráter de beleza física do ambiente, enquanto que 27% revelam percepção de recurso, principalmente para os animais, como também para atividades cotidianas.

Os autores Mucelin; Bellini (2008), em estudo da percepção ambiental com moradores da cidade de Madianeira-PR, observaram que os entrevistados também tem uma visão utilitarista do rio Alegre, percebendo como um recurso hídrico.

Entretanto, para 11% dos entrevistados, a percepção da lagoa tem mais um caráter afetivo, destacando a importância do ambiente em suas vidas e; para 4% dos entrevistados revela mais uma concepção de natureza, vendo o ambiente como algo que faz parte de suas vidas e que tem influência direta no seu futuro (Tabela 02).

 

Figura06. Concepções prévias dos entrevistados a respeito da lagoa analisada na cidade de Paquetá-PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.


 

Tabela 02. Respostas, categorizadas, sobre a percepção dos entrevistados a respeito da lagoa analisada na cidade de Paquetá do PI, no mês de janeiro de 2014.

 

 

Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor com adaptações, 2014.

 

 


Quando indagados se a mesma lagoa deveria permanecer do mesmo jeito como se encontrava ou se deveria sofrer intervenções antrópicas, os resultados mostraram que 99% dos entrevistados foram favoráveis que ocorressem mudanças no ambiente.

A partir destas respostas, pediu-se para detalhar que mudanças deveriam acontecer no ambiente. A maioria, 36%, disse ser necessário retirar os esgotos, pois a lagoa se tornaria um lugar poluído e favoreceria a proliferação de doenças; a segunda resposta mais frequente entre os entrevistados, 17%, disseram ser necessário adotar medidas de preservação, no entanto, não mencionaram quais medidas deveriam ser tomadas.

Ainda sobre as mudanças que a população sugere para a lagoa Paquetá, 13% informaram que seria importante escavá-la para acumular mais água no inverno, já que as chuvas costumam ser irregulares. E apenas 8% dos entrevistados disse ser importante fazer valetas, (vulgarmente conhecida pela população como “levadas”), que são pequenas escavações em forma de córregos feitas para canalizar o máximo de água possível advinda dos morros ao redor para dentro da lagoa, facilitando assim o seu enchimento na temporada das chuvas. Na Tabela 03, abaixo, é possível ver as medidas sugeridas que a população indicou para o ambiente.

A fim de entender a verdadeira importância da lagoa para os moradores de Paquetá, os entrevistados foram perguntados sobre o que mudariam em suas vidas e da comunidade, se a lagoa deixasse de existir.

Mediante este questionamento, 31% demonstraram preocupação pelos animais já que o ambiente quando cheio é o principal ponto para matar a sede daqueles. Através das citações pode-se constatar tal fato:

 

“Se ela deixasse de existir seria muito ruim para quem cria, os bichinhos iria passar muita sede, muitos iam morrer”(E35-Idade de 48 anos).

 

“Quem ia sofrer mais era os bicho bruto, por que teria que cassar outro lugar para beber água, e aqui eles já estão acustumado”(E69-Idade 53 anos).

 

Tabela 03. Medidas sugeridas pelos entrevistados para preservação da lagoa do Paquetá, obtidas no mês de janeiro de 2014, na cidade de Paquetá-PI

Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 

Para 26% a percepção fica mais voltada para o recurso “água”, salientando a importância da mesma não só para os animais, mas também para toda a comunidade, especialmente, em atividades básicas como (lavar roupa), revelando ainda a preocupação financeira com gasto de água durante todo o ano, evidenciando assim uma percepção mais ampla da situação.

 

“Se faltasse essa lagoa, seria complicado pra todo mundo,por que essa água que fica nela ai “importante para quem cria, para quem tem pranta em casa, já que pode pegar um balde para aguar, a gente pode lavar uma roupa e tal”(E51-Idade: 30 anos).

 

“Ah! Seria complicado por que ia aumentar muito o gasto com água, tinha que dar água o gado o ano todo na torneira, desse jeito a gente ia gastar muito e a conta vinha cara pra pagar”(E11-Idade: 24 anos).

 

Tem-se ainda 12% dos entrevistados que não demonstraram preocupações práticas com a falta do ambiente, apenas uma percepção afetiva voltada para a hipótese da inexistência do lago. Porém, os moradores afirmam que a inexistência da lagoa é justificável do ponto de vista divino, haja vista que isto seria um processo de origem divina, sendo, portanto, inevitável.

 

“Se faltasse deixaria muita saudade restando apenas as boas lembranças”(E75-Idade: 45 anos).

 

“Se deixasse de existir seria por que Deus quis né, foi ele que criou e só ele quem pode tirar dagente”(E64- Idade:77 anos).

 

Outros 10% revelaram uma percepção voltada à identidade da cidade, revelando um vínculo com o ambiente, já que em tempos passados a mesma era chamada de Lagoa Grande em função de ter sido um ponto de referência natural no decorrer dos tempos.

 

“Perderia o sentido viu, desde quando existiu essa cidade essa lagoa existiu, antigamente era até chamada de lagoa grande por causa dessa lagoa, só depois foi que mudou” (E18-Idade: 62 anos).

 

“Ficaria sem aquela referência na cidade sabe, até por que é muito difícil uma pessoa vim aqui na cidade quando a lagoa tava cheia e não lembrar dela”(E44- Idade: 55 anos).

 

Já para 10% dos entrevistados seria muito prejudicial para o turismo e o lazer que a lagoa proporciona, não só para a população local, como também das comunidades vizinhas e até de outras cidades que costumam visitar o local para banhar e se divertir nas margens aos finais de semana, consumindo alimentos como peixes, fator que influencia também na questão econômica do local.

 

Seria ruim demais pra nois, a cidade já é pequena, e aqui é onde a gente se interte com os amigos no final de semana, se não existisse ai tinha que cassar outro lugar pra relaxar”(E30- Idade: 35 anos).

 

“Seria ruim por causa que agente não ia ter aquele intertimento nos finais de semana”(E42- Idade:29 anos).

 

Também 5% alegaram que a ausência da lagoa seria ruim por razões paisagísticas, demonstrando preocupação com o visual do ambiente, considerando este como desagradável para os sentidos em relação ao presente e principalmente ao passado.

 

“Ficaria um ambiente feio, sem aquela paisagem bonita que esfriava o clima”(E77- Idade:66 anos).

 

“Ficaria só o lugar ai acabado, feio pra quem olha e lembra do passado”(E63- Idade: 45 anos).

 

E por fim 6% não souberam informar ou informaram que não mudaria nada em suas vidas caso o ambiente deixasse de existir.

 

“Acho que não mudaria nada não, ficaria a mesma coisa”( E8 –Idade: 21 anos).

 

“Mudaria nada, nossas vidas não depende dessa lagoa”(E-19-Idade: 22 anos).

 

Segundo Souza (2009) em estudo semelhante no açude Jatobá I, na Paraíba, os atores sociais envolvidos apresentaram, em sua totalidade, um forte sentimento de topofilia, o que pode influenciar as suas crenças, seus hábitos, costumes e as formas de uso do ambiente. O termo, topofilia, significa o elo entre o indivíduo e o lugar ou ambiente físico em que vive e o arraiga a sentimentos de amor à terra quase sempre difíceis de remover (TUAN, 1980).

 

 

3.3. Usos da Lagoa Paquetá

 

O ambiente analisado demonstra que a sua importância se deve, sobretudo, a sua utilidade para a população local, estando diretamente ligados a um contexto sócio-natural. Assim, quando perguntados para que eles utilizam a lagoa, a maioria (98% das citações) disseram que utilizam a lagoa para alguma atividade, enquanto que 2% disseram que não utilizam para nenhuma atividade.

 Dentre os que citaram utilizar a lagoa para alguma atividade, destaca-se 36% (num) revelou que utilizavam o ambiente principalmente para atividades voltadas à agricultura, geralmente, os habitantes são agricultores já que a maioria dos entrevistados se definem como lavradores, em que 81%  afirmaram utilizar a lagoa para dar água a animais, principalmente gados, jumentos e cavalos, que são geralmente domesticados por uma boa parcela da população que utilizam-nos para sua subsistência e também para auxiliá-los em suas atividades diárias 14% das citações.

  Já 18% disseram utilizar o local para lavar roupa quando cheia, principalmente as pessoas do sexo feminino, devido à abundância de água, enfatizando também o lado econômico que permite menos gasto com água encanada com a realização de tal procedimento. Cerca de 11% revelam utilizar a lagoa para atividades voltadas ao lazer como: banhar 67% e pescar 33% em relação ao percentual observado, relacionado também a questões econômicas devido atrair pessoas para a prática de esportes e lazer no ambiente o que é fator positivo para a cidade.

A utilização com fins de abastecimento foi ressaltada por 4% dos entrevistados, já que nem todas as residências possuem água encanada para as diferentes necessidades do cotidiano habitacional. No que se referem à utilidade do ambiente quando em período de seca, somente 3% consideram que o local traz benefícios, devido ao fato de utilizarem a areia e o barro para a construção civil, sendo geralmente, compostos por pedreiros ou pessoas que de certa forma precisam construir ou reformar imóveis.

Somente 3% dos pesquisados revelaram que não utilizam a lagoa para nenhuma finalidade, considerando o ambiente como sem utilidade devido à seca e também um local que pode oferecer perigo em razão da presença de esgotos e lixo, os habitantes da cidade alegam ainda que esses lugares são fatores que influenciam na proliferação de doenças e no bem estar da comunidade. Resultados que podem ser comparados de acordo com o gráfico abaixo (Figura 07).

 


 

Figura 07. Formas de utilização da lagoa Paquetá de forma geral e por gênero, dos entrevistados da cidade de Paquetá – PI, no mês de janeiro de 2014. Fonte: Pesquisa de campo realizada pelo autor, 2014.

 


4. CONCLUSÃO

 

Os diferentes tipos de utilização da lagoa estão diretamente ligados aos tipos de percepção de importância dadas a mesma, remetendo ao fato dela ser um recurso que ajuda as pessoas em seu dia-a-dia e em suas atividades, não havendo, uma percepção multidisciplinar de conhecimento da importância da lagoa pela população em geral e com as diferentes formas de vidas envolvidas.

 Nota-se, principalmente, uma percepção de preocupação de caráter utilitarista com a ausência dos recursos fornecidos pela lagoa para o suprimento das necessidades dessa população, sendo quase ausente o conhecimento da finalidade de conscientização dos danos gerados pelas atividades dessas pessoas, como também pelos danos gerados para as outras formas de vida existentes e raramente é perceptível uma postura prática de preservação dos serves vivos que lá se encontram, demonstrando que as necessidades e problemas ocorridos neste lugar passam a ser de cunho político.

Desse modo, torna-se muito importante para o caso, o desenvolvimento de programas de educação ambiental junto às escolas e à população em geral, a fim de despertar a consciência dos mesmos para a conservação e preservação do ambiente.

 

REFERÊNCIAS

 

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WHYTE, A.V.T.. Guidelines For Field Studies In Environmental Perception. Paris: UNESCO, 1977.

 

AGRADECIMENTOS

 

Agradecemos imensamente a toda população da cidade de Paquetá-PI, em especial os entrevistados que nos recebeu com atenção e a todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desse trabalho.

 

 

Ilustrações: Silvana Santos