Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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11/03/2017 (Nº 59) CONHECIMENTO E USO POPULAR DE PLANTAS MEDICINAIS EM DOM VIÇOSO, MG: UMA ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA
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Uso de plantas medicinais em Dom Viçoso, Minas Gerais

CONHECIMENTO E USO POPULAR DE PLANTAS MEDICINAIS EM DOM VIÇOSO, MG: UMA ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA

 

Cynthia Junqueira Pais

Especialista em Análises Clínicas pela Universidade de Taubaté;

Graduada em Ciências Biológicas pela Fundação Educacional de Machado;

e-mail: cynthiapaisbio@hotmail.com

 

Valdir Lamim-Guedes

Centro Universitário Senac-Santo Amaro, São Paulo-SP;

Programa de Pós-Graduação em Eduação, FE/USP

 

Resumo: Realizou-se um levantamento de plantas medicinais em relação ao uso, modo de preparo e frequência de uso das mesmas utilizadas pelos moradores no Município de Dom Viçoso, Minas Gerais. Foram realizadas entrevistas de março a maio de 2009, com pessoas de ambos os sexos. Foram realizadas 15 entrevistas, a partir das quais foram registradas 36 espécies de plantas consideradas medicinais, distribuídas em 17 famílias botânicas. Nesse contexto, verificou-se que o uso tradicional de plantas medicinais vem perdendo espaço gradativamente ao longo das gerações para outras formas de tratamento, situação que deve ser revertida em vista dos benefícios para a população das plantas medicinais.

Palavras-chave: Plantas medicinais; Ecologia de Saberes; Fitoterapia.

 

1. Introdução

As plantas têm sido desde a antiguidade, um recurso ao alcance do ser humano. Durante milênios, o homem empiricamente aprofundou seus conhecimentos afim de melhoria das condições de alimentação e cura de suas enfermidades, demonstrando uma estreita interrelação entre o uso das plantas e sua evolução (MIGUEL; MIGUEL, 2004).

O uso de plantas medicinais, plantas que tem atividade farmacológica, possuindo um ou mais princípios ativos úteis à saúde humana (FERREIRA et al, 1998), teve seu início provavelmente na pré-história. Os homens primitivos, assim como os animais iniciaram as "práticas de saúde", alimentando-se de determinadas plantas, pelo instinto de sobrevivência. Com isto poderiam ter observado determinados efeitos para minimizar suas enfermidades, acumulando conhecimentos empíricos que foram passados de geração para geração. Este instinto foi sendo perdido pelo homem moderno, porém, nos outros animais ainda podemos observar este fato. O acúmulo destas informações pelos homens primitivos propiciou o nascimento de uma cultura da arte de curar, que se tornou a base para o nascimento da medicina (CORREA et al, 2005).

No Brasil, o uso destas plantas teve início a partir dos conhecimentos indígenas, dos escravos e imigrantes, se restringindo principalmente às áreas rurais. Com o passar do tempo grande parte da população urbana passou a utilizá-la, praticamente mais de 50% da população faz uso de plantas medicinais como forma terapêutica complementar (CORREA et al, 2005).

Atualmente, a fitoterapia é atribuída a medicamentos originados exclusivamente de material botânico integral ou seus extratos usados com o propósito de tratamento médico (FERREIRA et al., 1998). Consequentemente, a utilização de fitoterápicos tem tido uma relevância sócio-econômica muito grande na qualidade de vida das comunidades de baixa renda dada a sua alta disponibilidade, baixa toxicidade, reduzido risco de efeitos colaterais e baixos custos e/ou sem ônus comparados aos medicamentos alopáticos (HOAREAU; DA SILVA, 1999; RODRIGUES; CARVALHO, 2001 apud AMARAL, 2006).

Nessa perspectiva, surge a etnobotânica, definida por Amorozo (1996) como sendo o estudo do conhecimento e das conceituações desenvolvidas por qualquer sociedade a respeito do mundo vegetal, englobando tanto a maneira como o grupo social classifica as plantas, como os usos que dá a elas, contribui para que se possa avaliar os recursos naturais utilizados em determinados locais. Por isso, são fundamentais, pois além de conseguirem avaliar e valorizar o conhecimento da população é o tipo de procedimento que proporciona o progresso dos estudos básicos e aplicados, fitoquímicos e farmacológicos, uma vez que fornece a matéria-prima aos pesquisadores de áreas afins e o conjunto de dados necessários para as análises pretendidas (SANTOS, 2008).

Recentemente, tem crescido o interesse sobre este assunto e uma preocupação com a extinção destes conhecimentos. No Brasil, apenas nos últimos anos se iniciaram estudos etnobotânicos de metodologia científica bem definida que visam recolher e preservar por escrito esta quota-parte da nossa tradição, ao contrário de muitas regiões do globo como, por exemplo, na Espanha (CAMEJO RODRIGUES, 2007).

Deste modo, o resgate do “saber popular”, mesmo em comunidades que não são consideradas tradicionais, como indígenas, quilombolas, entre outras, mas rurais, contribui de forma significativa para a pesquisa no campo da fitoterapia, uma vez que o conhecimento da comunidade abre caminhos para pesquisas de determinadas plantas, que popularmente são conhecidas por possuírem propriedades medicinais e contribui para a obtenção de dados sobre a tradição de determinados grupos.

A contribuição deste tipo de pesquisa para a área de educação ambiental está ligada a dois aspectos: Tecnologias Sociais e a Ecologia de Saberes. As Tecnologias Sociais são um “conjunto de técnicas e metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições de vida" (ITS, 2004, p. 26). Nessa perspectiva, as TS podem ser “avaliadas e valorizadas tanto pela sua dimensão de processos de construção de novos paradigmas e novos atores sociais, de fortalecimento da democracia e da cidadania, quanto pelos resultados que proporcionam em termos de melhoria da qualidade de vida” (BAVA, 2004, p. 105). Neste sentido, as plantas medicinais podem ser alvo de ações que reforçam a vida comunitária, através da toca destes produtos, assim como, pelos benefícios de saúde e econômicos.

O posicionamento da Ciência em relação a outras formas de conhecimento é chamado de pensamento abissal pelo português Boaventura de Souza Santos (2007). Este autor parte desta percepção para falar de um pensamento pós-abissal, que permite a ocorrência de uma ecologia de saberes.

 

O pensamento pós-abissal pode ser sintetizado como um aprender com o Sul usando uma epistemologia do Sul. Ele confronta a monocultura da ciência moderna com uma ecologia de saberes, na medida em que se funda no reconhecimento da pluralidade de conhecimentos heterogêneos (sendo um deles a ciência moderna) e em interações sustentáveis e dinâmicas entre eles sem comprometer sua autonomia. A ecologia de saberes se baseia na ideia de que o conhecimento é interconhecimento (SANTOS, 2007, p 85).

 

Para Santos (em entrevista a CARNEIRO; KREFTA; FOLGADO, 2014, p. 332), “a ecologia de saberes é um conceito que visa promover o diálogo entre vários saberes que podem ser considerados úteis para o avanço das lutas sociais pelos que nelas intervêm”, sendo um “processo coletivo de produção de conhecimentos que visa reforçar as lutas pela emancipação social” (p. 332). Neste processo deve-se saber ouvir, pois esta construção de conhecimento é coletiva, como em um mutirão indígena. Neste contexto, a sabedoria popular deve ser encarada como um saber válido, que tem muito a contribuir com a nossa sociedade.

Este trabalho tem por objetivo analisar o conhecimento e uso popular de plantas medicinais no Município de Dom Viçoso, Minas Gerais, contribuindo assim para auxiliar no resgate e valorização do conhecimento da comunidade. E também procura evidenciar como os fatores sócio-econômicos têm influenciado essa prática, através de questionários realizados com os moradores do local.

 

2.  Metodologia

2.1 Área de Estudo

O trabalho foi realizado no município de Dom Viçoso, no sul de Minas Gerais, Brasil. Localizado entre as coordenadas 22° 15' 14" de latitude S e 45° 09' 39" de longitude O (IBGE, 2009). A cidade está a 920 metros de altitude em relação ao nível do mar, esta inserida no bioma Mata Atlântica, com área de 113,18 km2, aproximadamente 3.020 habitantes, com economia voltada para a produção agrícola e pecuária diversificadas. O setor industrial contribui com fábricas de laticínios e tijolos (IBGE, 2009). O município é predominantemente rural, evidencia a prática do cultivo de hortas em quase todas as propriedades, onde os moradores possuem desde pequenos arbustos a grandes árvores, hortaliças e plantas para fins terapêuticos.

 

2.2 Coleta de Dados e Entrevistas

Foram realizadas entrevistas de março a maio de 2009, com pessoas de ambos os sexos. Inicialmente, entrevistou-se moradores a fim de obter indicações de pessoas da comunidade consideradas detentores de grande conhecimento sobre plantas medicinais, posteriormente, os mesmos foram procurados para que fosse aplicado o questionário. As entrevistas aconteceram em residências rurais e urbanas, com questionários pré-estruturados, com perguntas sócio-econômicas, sobre como a comunidade utiliza e adquire o conhecimento sobre plantas medicinais, questões sobre quais partes das plantas são utilizadas, qual a utilidade de cada espécie, modo de preparo e freqüência de uso. Todas as entrevistas foram gravadas com aparelho Media Player 3 (MP3), para posteriormente serem transcritas e analisadas detalhadamente. Foram visitados os locais de cultivo das plantas pelos moradores, para se confirmar quais espécies são utilizadas.

 

2.3  Consolidação dos Dados

Primeiramente foram listadas todas as plantas citadas de acordo com o nome científico, agrupando-as pelas famílias botânicas e indicação do uso popular. De tal modo, as informações sócio-econômicas foram analisadas qualitativamente e agrupadas procurando-se perceber pontos em comum e divergentes que pudessem subsidiar uma caracterização de como tais fatores influenciam na utilização das plantas medicinais e buscar um entendimento e interação das informações.

 

3. Resultados e Discussão

Foram realizadas quinze entrevistas com pessoas indicadas como detentoras de grande conhecimento sobre plantas medicinais, sendo que 64 % são mulheres e 36% homens, na faixa de idade de 21 a 85 anos, todos conhecem e utilizam algum tipo de planta como medicamento, possuindo conhecimento sobre as plantas medicinais. Provavelmente, o maior número de mulheres citadas se deve ao fato de seu maior envolvimento com as atividades diárias na residência, como preparo da alimentação e também cuidados dispensados aos membros da família, estando sempre prontas a ajudar parentes, vizinhos e conhecidos (SANTOS, 2006).

Fotos Dom Viçoso

Figuras a-f: a) e b) Paisagem do município de Dom Viçoso; c), d) e e) moradores  de Dom Viçoso que utilizam plantas medicinais; f) Eucalyptus sp. ; g) Plectranthus barbatus Andrews.

 

Em relação à renda dos entrevistados, 66,67% possuem renda familiar entre um a três salários mínimos e 33,33% vivem com até um salário mínimo. Com relação à ocupação, registrou-se que 6 dos entrevistados fazem apenas o serviço doméstico, 3 são lavradores, 2 são lavradores aposentados, 1 agente de saúde, 1 auxiliar de escritório, 1 pedreiro, e 1 costureira.

Em relação ao nível de escolaridade, o conhecimento e uso de plantas medicinais é maior nas pessoas com ensino fundamental incompleto e analfabetos. A relação entre o baixo nível de escolaridade e a maior familiarização com o poder medicinal de espécies vegetais pode refletir a busca, devido ao baixo poder aquisitivo, de formas alternativas de tratar as doenças, que não envolvam a compra de medicamentos caros (SANTOS, 2008). Outro fator, é que se a pessoa possui pouco nível de estudo, ela possivelmente tem um menor contato com informações científicas, as quais, geralmente, desconsideram a importância do conhecimento tradicional.

E de acordo com a naturalidade, dez entrevistados são naturais de Dom Viçoso (MG); dois entrevistados são de São Paulo (SP), dois são de Virgínia (MG), um é de São Lourenço (MG), sendo as duas últimas cidades vizinhas de Dom Viçoso. De todos os entrevistados, 60% disseram que se preocupam com a coleta, plantio e quantidade usada das plantas para que não haja risco de intoxicação por excesso de consumo ou utilização de espécies semelhantes que podem causar danos à saúde.

Observou-se que as pessoas com idades mais avançadas entre 45 e 85 anos possuíram inúmeras citações de fitoterápicos, já os mais jovens praticamente não citaram uso destes produtos. E também se identificou que o conhecimento de maior parte dos entrevistados foi adquirido através de pais e avós, sendo passado de geração em geração, outras fontes de informação indicadas foram vizinhos e livros, não sendo examinado nenhum tipo de conhecimento adquirido através dos meios de comunicação como rádio, televisão e internet, e nem por profissionais de saúde. Estes dados indicam uma queda quanto ao uso de plantas medicinais na comunidade, que segundo os mesmos “compra remédio pronto na farmácia é mais fácil do que pranta”. De acordo com muitos moradores, isto se deve a inúmeros fatores, como facilidade na obtenção e indicação médica de medicamentos alopáticos, perda do conhecimento popular em relação ao uso, cultivo, preparo destas plantas, e principalmente, pela desvalorização do conhecimento tradicional pelos mais jovens.

Mas, ainda é possível verificar pessoas que utilizam esse tipo de medicamento devido à tradição, por ser mais barato, por ser algo natural, entre outros fatores. Muitos relataram que sempre veem resultados no tratamento com plantas medicinais, pois acreditam que o produto natural extraído, muitas vezes de seus próprios quintais, é mais eficiente que os remédios industrializados. Isto reflete certo distanciamento no imaginário destas pessoas, que acham que os medicamentos receitados pelos médicos não têm analogia com os de origem natural, os quais muitas vezes são produtos naturais, porém industrializados. Segundo uma entrevistada, “não basta apenas utilizar as prantas é preciso ter fé pra dá resultado”, evidenciando que a prática dos moradores também está relacionada com fatores religiosos e crendices.

Foram identificadas 36 espécies de plantas consideradas medicinais pelos entrevistados, distribuídas em 17 famílias botânicas. As famílias mais representativas em número de espécies foram Asteraceae com 9 espécies, Laminaceae com 6 espécies e Myrtaceae com 3 espécies. Lima (2007) estudando uma comunidade de Bandeirantes, PR, encontrou 43 espécies, enquanto Santos (2006), encontrou para uma comunidade rural da Margem Grande em Natividade da Serra, SP, 115 espécies de plantas consideradas medicinais.

TABELA 1 – Família, nome vulgar, científico, indicação popular, parte utilizada e modo de preparo de plantas com fins medicinais utilizadas pelos moradores de Dom Viçoso, MG, Brasil.

  Família 

Nome vulgar            

  Científico

 Indicação

Pu

 Mp

Amaranthaceae

 

 

 

 

 

 

Dipirona

Alternanthera dentata (Moench) Stuchlik

Dor

Fo

Ch

 

Menstruz

Chenopodium ambrosioides L

Machucado

Ra, Ca, Fo

Mi

Apiaceae

 

 

 

 

 

 

Erva doce

Pimpinella anisum L.

Calmante, gases,
intestino preso,
pressão alta,
dor de estômago
e vesícula

Fo, Se

Ch, In

Asteraceae

 

 

 

 

 

 

Alcachofra

Cynara scolymus L.

Enjoo

Fo

Mpa

 

Arnica

Arnica montana L.

Dor, machucado.

Fo, Ra

Ep

 

Camomila

Chamomilla recutita (L.) Rauschert.

Calmante

Fo

Ch

 

Carrapicho-de-carneiro   

Xanthium strumarium  L.

Rins

Fo

Ch

 

Erva de São João

Unxia camphorata L. F.

Rins

Fo

Ch

 

Guaco

Mikania spp.

Gripe

Fo

Xa

 

Marcelinha

Achyrocline ssp.

Enjoo

Fo

Ch

 

Novalgina, ponta alivio

Achillea millefolium L.

Dor de cabeça,
gripe

Fo

Ch, In, Mpa

 

Picão-preto

Bidens pilosa L.

Enjoo

Fo

Ch

Caricaceae

 

 

 

 

 

 

Mamão

Carica papaya L.

Tosse

Br

Xa

Celastraceae

 

 

 

 

 

 

Espinheira santa

Maytenus spp.

Infecção de urina

Fo

Ch

Crassulaceae    

 

 

 

 

 

 

Bálsamo

Cotyledon orbiculata L.                             

Dor de ouvido, ferida, coceira, alergia,
machucado

Fo

Ep

Cucurbitaceae

 

 

 

 

 

 

Abóbora

Cucurbita spp.

Verme

Se

Mi

 

Chuchu

Sechium edule  (Jacq.) Swartz

Pressão alta

Br

Ch

Euphorbiaceae

 

 

 

 

 

 

Mamoninha

Ricinus communis L.

Cicatrizante

Fo

Ep

 

Quebra-pedra

Phyllanthus niruri. L.

Rins

Ra, Ca, Fo

Ch, In

 

 

 

 

 

 

 Lamiaceae

 

 

 

 

 

 

Alecrim

Rosmarinus officinalis L.

Coração

Fo

Ch

 

Boldo, falso boldo

Plectranthus barbatus Andrews    

Estômago, dor de cabeça, ressaca.

Fo

Ch, In,
Mpa, Mf

 

Erva-terrestre

Glechoma hederacea
L.

Coração, gripe

Fo

Ch

 

Hortelã

Mentha spp.

Gripe, dor de
estômmago, intestino,
verme, calmante,
garganta.

Fo, Ca

Ch, Xa

 

Manjericão, alfavaca

Ocimum sp.

Calmante, resfriado, tosse, gripe, alergia

Fo

Ch

 

Melissa

Melissa officinalis  L.

Calmante

Fo

Ch

 

Poejo

Mentha pulegium L.

Tosse

Ra, Ca, Fo

Ch, Mi

 

Salva

Salvia officinalis L.

Dor de cabeça,
coração

Fo

Ch

Lauraceae

 

 

 

 

 

 

Abacate

Persea americana Mill.

Rins

Fo

Ch

 

Cânfora

Cinnamomum camphora (L.) J. Presl

Dor, machucado

Fo

Ch, Ep

Loganiaceae

 

 

 

 

 

 

Fava de Santo Inácio

Strychnos nux-vomica L.

Enjoo

Fr

Mpa

Malvaceae

 

 

 

 

 

 

Malva

Malva sylvestris L.

Coração

Fo

Ch

Myrtaceae

 

 

 

 

 

 

Eucalipto

Eucalyptus spp.

Tosse

Fo

Xa, Ch

 

Pitanga

Eugenia uniflora L.

Cólica menstrual

Fo

Ch, In

Plantaginaceae

 

 

 

 

 

 

Tanchagem, tanchagem

Plantago major L.

Garganta, dor de dente,
infecção de urina e próstada

Fo

Ch, Ga

Poaceae

 

 

 

 

 

 

Cabelo-de-milho

Zea mays L.

Rins, pedra na vesícula
e na bexiga.

Fo

Ch

 

Capim cidreira

Cymbopogon citratus (DC) Stapf.

Calmante

Fo

Ch

Pteridaceae

 

 

 

 

 

 

Avenca

Adiantum sp.

Catarro

Fo

Ch

Rutaceae

 

 

 

 

 

 

Arruda

Ruta graveolens L.

Reumatismo

Fo

Ch

 

Laranjeira

Citrus sp.

resfriado, dor de dente,
gripe

Fo

Ch

 

Limão

Citrus sp.

Tosse, gripe

Fr, Fo

Xa, Su

 

 

 

 

 

 

Verbenaceae

 

 

 

 

 

 

Canelinha

Aloysia gratissima (Gillies & Hook.) Tronc.

Pressão alta

Fo

Ch

 

Erva cidreira

Lippia alba (Mill.) Blume

Calmante, coração, resfriado, gripe, pressão alta, febre

Fo

Ch

Zingiberaceae

 

 

 

 

 

 

Caninha-do-brejo

Costus spicatus (Jacq.) S.w.

Rins

Fo

Ch, In

 

 

 

 

 

 

Pu - Parte Utilizada: Br - Broto; Ca - Caule; Fo - Folha; Fr - Fruto; Ra - Raiz; Se - Semente. MP - Modo de Preparo: Ch - chá; Ep - emplatro; Ga - gagarejo; In - infusão; MPA - maceração da planta em agua; MF - mastigação da folha; Mi - misturada; Xa - xarope; Su - suco.

 

Das plantas fitoterápicas citadas pelos entrevistados, algumas foram relatadas com maior freqüência. A seguir estão relacionadas às indicações de uso popular destas plantas e os seus efeitos curativos segundo a literatura científica. Capim-cidreira (os nomes científicos estão na tabela 1) foi citada em doze entrevistas, seu uso popular: gripe, resfriado, problemas de coração, calmante, febre, pressão alta. Na literatura suas propriedades medicinais são: calmante, combate gases intestinais, combate febre, alivia dores (de estômago, barriga e cabeça), digestivo e sedativo da tosse (RIGUEIRO, 1997). Erva-doce foi citada em onze entrevistas, seu uso popular: pressão alta, dor de estômago e vesícula, intestino preso, gases, calmante. Na literatura suas propriedades medicinais são: combate gases intestinais, combate cólicas, facilita a menstruação, estimula a produção de leite materno, digestivo e diurético na raiz (RIGUEIRO, 1997). Hortelã foi citada em onze entrevistas, seu uso popular: calmante, dor de barriga, bicha, gripe, infecção de garganta, dor de estômago. Na literatura suas propriedades medicinais são: digestivo, estimulante e tônico geral, combate gases intestinais, combate cólicas (RIGUEIRO, 1997).

Quanto às formas de preparação citadas, encontramos oito tipos: chá (a planta é fervida em água); infusão (a água fervida é colocada sobre a planta); maceração da planta em água para ser ingerida (geralmente para plantas muito amargas); emplastro (é feita uma pasta que é aplicada no local dolorido); xarope (feito com a mistura de outras plantas e ingredientes como açúcar, alho e mel); misturada (planta mistura com leite, sal entre outros ingredientes), gargarejo (a planta é amassada com água) e mastigação da folha. Sendo que o chá e infusão foram as mais citadas. Isso também foi observado por Santos et al. (2008) durante o levantamento do uso de plantas medicinais pela população do município de Ariquemes, em Rondônia. Destacou-se também nas entrevistas que grande parte dos entrevistados utiliza a combinação de plantas com outros ingredientes como: poejo com mel e açúcar queimado. Outro fator, é que não há um padrão na quantidade utilizada nas preparações, foram citados apenas, um pedacinho, um punhadinho, uma mão, entre outras. As partes citadas das plantas utilizadas pelos moradores foram semente, broto, raiz, caule, folha e fruto.

Em relação à toxicidade das plantas citadas, o boldo, segundo Costa (2006), constitui uma das plantas mais citadas em levantamentos etnobotânicos de plantas medicinais do Brasil, para a qual muitos estudos visando detectar ações farmacológicas foram desenvolvidos. Todavia faltam informações sobre riscos à saúde, decorrentes do uso prolongado de doses repetidas de preparados à base dessa espécie, o qual na revisão dos trabalhos publicados no período de 1970 a 2003 envolvendo ações farmacológicas de P. barbatus evidencia o potencial medicinal da espécie, o que justifica sua grande utilização na medicina popular. Por outro lado, a constatação de efeitos tóxicos sobre o fígado e rins de animais tratados pelo extrato metanólico das raízes e aquoso das folhas, feita por Costa (2002), deixa claro a necessidade de se orientar as comunidades para o uso racional da espécie.

A partir do exposto, um programa elaborado para orientar a população em relação ao uso adequado das plantas medicinais, seria uma ótima opção no Sistema Único de Saúde (SUS) no município de Dom Viçoso, uma vez que essa prática melhoraria a qualidade de vida da comunidade de baixa renda, devido à alta disponibilidade e baixo custo das plantas medicinais no município. Além de resgatar e valorizar a cultura popular no que se refere à utilização das mesmas.

 

4. Conclusões

Tendo como referência os dados obtidos na pesquisa com a população de Dom Viçoso (MG) foi possível constatar um número relativamente alto (36 espécies) de espécies indicadas como medicinais pelos entrevistados. A principal parte utilizada foi a folha, as principais formas de uso foram chá e infusão e as principais indicações do uso popular foram calmante e dor de estômago. As mulheres de faixa etária mais avançada possuem um maior conhecimento e utilização dos fitoterápicos.

O uso tradicional de plantas medicinais vem perdendo espaço gradativamente ao longo das gerações para outras formas de tratamento. Ainda assim, a relação dos moradores com plantas medicinais revelou-se bem expressiva, mesmo com o declínio de pessoas que possuem o conhecimento e utilizam, sendo essa prática significante para o município. Dessa forma, existe a necessidade de um trabalho que resgate e valorize o conhecimento popular em relação aos fitoterápicos no município, dado a importância dessa prática tanto como alternativa para as comunidades mais carentes, orientação sobre a toxicidade e como melhoria da qualidade de vida dos mesmos.

 

5. Referências Bibliográficas

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AMOROZO, M. C. M. A abordagem etnobotânica na Pesquisa de Plantas medicinais. In: DISTASE, L. C. (Org.). Plantas medicinais: Arte e Ciência, Um guia de estudo interdisciplinar. EDUSP, São Paulo, 1996. p.47-68.

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Ilustrações: Silvana Santos