Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Relatos de Experiências
16/09/2018 (Nº 65) PRODUÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NA REDE DE ENSINO EM TEMPO INTEGRAL DE JOÃO PESSOA, PARAÍBA: PERFIL E PERCEPÇÃO DOS MANIPULADORES DE ALIMENTO ESCOLAR QUANTO AO PROCESSO
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PRODUÇÃO DE RESÍDUOS ORGÂNICOS DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR NA REDE DE ENSINO EM TEMPO INTEGRAL DE JOÃO PESSOA, PARAÍBA: PERFIL E PERCEPÇÃO DOS MANIPULADORES DE ALIMENTO ESCOLAR QUANTO AO PROCESSO

Lázaro Fialho da Cruz Ribeiro1, Márcia Batista de Fonseca2, Flávia de Oliveira Paulino3.



1 - Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal da Paraíba e Mestrando no Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da mesma instituição. E-mail: lazarofialhopb@gmail.com;

2 - Doutora em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco. Docente do curso de graduação em Economia e no Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: mbf.marcia@gmail.com;

3- Doutora em Higiene e Processamento Tecnológico dos Produtos de Origem Animal pela Universidade Federal Fluminense. Docente do curso de graduação em Biotecnologia e no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: flavia@cbiotec.ufpb.br.



RESUMO



Nas Escolas Municipais de Ensino em Tempo Integral de João Pessoa, Paraíba – EMETI/JP, a elaboração da alimentação escolar é de encargo dos manipuladores de alimentos, cardápios são elaborados por nutricionistas conforme recomendações do Plano Nacional de Alimentação EscolarPNAE. Este trabalho objetiva caracterizar o perfil e percepção dos manipuladores de alimentos das EMETI/JP, quanto à elaboração da alimentação escolar e à produção de resíduos orgânicos decorrentes do processo. O estudo foi realizado com manipuladores de alimentos de 15 EMETI/JP, no ano de 2017. A pesquisa seguiu preceitos de abordagem qualitativa, considerando e analisando a percepção dos sujeitos com a aplicação de questionário semiestruturado com questões de cunho socioeconômico, sobre a produção da alimentação escolar e dos resíduos decorrentes. Dos 56 entrevistados, 96,42%, (n=54) são mulheres, a faixa etária predominante é 36 a 45 anos (37%, n= 21), de maioria casados (66%, n=37) e com ensino médio completo (37% n=21). A renda familiar da maioria (52%) é de um salário mínimo. Para a produção dos alimentos, 100% dos atores confirmaram a existência do cardápio fornecido pelos nutricionistas, embora 100% deles tenham afirmado problemas com falta de ingredientes. Quanto ao aproveitamento integral dos alimentos, 75% afirmaram conhecer o conceito, embora apenas 36% tenham acertado o conceito correspondente. Comparando aproveitamento integral e reaproveitamento de alimentos, 69,6% dos atores não souberam diferenciá-los. O principal motivo de descarte de alimentos após a preparação, 43,63% (n= 48), é a sobra dos pratos. Quanto à separação dos resíduos alimentares dos demais, 91% afirmaram não realizar. Portanto, é necessário integrar ao processo de capacitação dos manipuladores de alimentos das EMETI/JP uma visão mais holística envolvendo estratégias de aproveitamento integral, reaproveitamento de alimentos e gestão adequada dos resíduos alimentares e, dessa forma, contribuir com efetividade para construção de escolas mais sustentáveis.

Palavras-chave: Desperdício de alimentos. Lixo orgânico. Segurança alimentar.



ABSTRACT



In the Escolas Municipais de Ensino em Tempo Integral de João Pessoa, Paraíba – EMETI/JP, the preparation of school meals is responsibility of the food handlers, the menus are prepared by nutritionists as recommended by the Plano Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. This work aimed to characterize the profile and perception of the food handlers of the EMETI/JP, regarding the elaboration of school feeding and the production of organic waste. The study was carried out with food handlers of 15 EMETI/JP in the year 2017. Following the precepts of a qualitative approach, considering and analyzing the subjects' perceptions with the application of a semi-structured questionnaire with socioeconomic issues, production of school meals and resulting residues. Of the 56 interviewees, 96.42% (n = 54) were women, the predominant age group was 36 to 45 years (37%, n = 21), mostly married (66%, n = 37), with complete high school (37% n = 21). The family income of the majority (52%) is a minimum wage. For food production, 100% of respondents confirmed the existence of the menu provided by nutritionists, although 100% of them reported problems with lack of ingredients. Regarding the full use of food, 75% said they knew the concept, although only 36% agreed on the corresponding alternative. Comparing full use and reuse of food, 69.6% of the actors did not know how to differentiate them. The main reason for discarding food after preparation, 43.63% (nº = 48), is the leftover food on the dish (food supplied and not consumed). Regarding the separation of food waste from the others, 91% said they did not perform. Therefore, it is necessary to integrate into the EMETI/JP food handlers' qualification process a more holistic view with strategies to the integral use end reutilization of food and adequate management of food waste.

Keywords: Food waste. Organic waste. Food Safety.



INTRODUÇÃO



Conforme as normativas legais vigentes, o fornecimento de alimentação escolar, popularmente conhecida por merenda, é regulamentado pelo Plano Nacional de Alimentação EscolarPNAE. Esse plano teve as suas origens ainda na década de 40, mas a sua efetividade deu-se com a criação do Plano Nacional de Alimentação e Nutrição – PNAN, na década de 50. Dentre outras iniciativas, como a Campanha da Merenda Escolar – CME, instituída por meio do Decreto 37.106/55 em 31 de março de 1955, as políticas quanto à alimentação escolar foram tomando destaque, mesmo que ainda com caráter assistencialista.

Somente em 1973, com o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição – PRONAN, foi criado o primeiro modelo integrado de política pública voltada para a alimentação escolar, conforme destacou Carvalho da Silva (1995). O PRONAN vigorou até 1979, quando então foi transformado no PNAE, mesmo que ainda apresentasse as suas operações centralizadas, diferente de como ocorre atualmente. Só em 1988 a alimentação escolar passou a ser um direito constitucional. De acordo com o Artigo 208 da carta constituinte é que houve esta prerrogativa, de dever do Estado, cujo texto destaca “...atendimento ao educando, no ensino fundamental, a partir de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde” (BRASIL, 1988).

Em 12 de julho de 1994, por normativa da Lei nº 8.913, foi instituída a descentralização do PNAE, sendo os recursos a partir de então direcionados diretamente aos estados e municípios. Esse processo ocorreu muito lentamente e só em 1998, por meio da Medida Provisória de n º 1.784 de 14 de dezembro 1998, foi de fato disseminado para todo país.

O PNAE é gerenciado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, desde 1997, que por sua vez é vinculado ao Ministério da Educação – MEC. Em termos quantitativos, o PNAE objetiva o fornecimento de pelo menos 15% das necessidades nutricionais diárias dos estudantes, respeitando-se sempre os hábitos alimentares e vocações agrícolas da comunidade, sendo responsabilidade dos Estados e Municípios tal fornecimento e, determina que os cardápios devam ser elaborados por nutricionistas (FNDE, 2004; WEIS et al. 2005).

No que diz respeito à promoção de alimentação saudável e com base na Lei nº 11.947, de 16 de julho de 2009, ao menos 30% do valor repassado pelo PNAE deve ser aplicado para compra direta de produtos da agricultura familiar. Nesse mesmo sentido também é incentivada a implantação de hortas escolares para o fortalecimento de hábitos alimentares saudáveis.

Atualmente, para as escolas de tempo integral do município de João Pessoa, os recursos para a compra de alimentos são destinados diretamente à Prefeitura Municipal e, a partir do cardápio elaborado pela equipe de nutricionistas, é realizada a compra e destinação dos alimentos para as escolas. No espaço escolar, a produção dos alimentos é de responsabilidade da equipe de manipuladores de alimento que é formada, normalmente, por um supervisor que é responsável pelo recebimento, controle do uso e qualidade dos alimentos e, “merendeiras(os)”, que alternam as funções entre a produção da alimentação e o auxílio a esse processo. A equipe é incumbida de produzir a alimentação escolar conforme o cardápio elaborado pela equipe de nutrição, bem como a organização, limpeza e gestão da cozinha.

Com as crescentes mudanças no atendimento escolar e consequentemente do atendimento, a alimentação fornecida, como a oferta de almoço e em alguns casos jantar, ao invés de lanches, o termo “merenda escolar” vem sendo substituído por “alimentação escolar” o que também contribuiu com o aumento do trabalho para os manipuladores e um consequente desgaste físico (PEIXINHO, 2013; TANAJURA e FREITAS, 2012). Essas mudanças também contribuíram com a substituição do termo “merendeiras(os)” para “manipuladoras(es) da alimentação escolar’’ (FERREIRA e LANFER-MARQUEZ, 2007; BRASIL, 2013).

Conforme Resolução nº 216 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), de setembro de 2004, que dispõe sobre o Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação, é considerado manipulador de alimentos qualquer indivíduo do serviço de alimentação que tenha contato direto ou indireto com o alimento durante as etapas da manipulação (BRASIL, 2004).

As pesquisas realizadas quanto ao papel dos manipuladores de alimentos no espaço escolar têm sido direcionadas para o perfil que os compõe e as funções operacionais que eles executam (MONLEVADE, 1995; TEO et al. 2010), bem como, sobre as relações de afeto que permeiam as interações com os educandos (CARVALHO et al. 2008; FERNANDES et al. 2014). No entanto, não foram encontrados estudos quanto à percepção ambiental voltada para a produção de resíduos que permeiam o processo de produção da alimentação escolar, sobretudo para as escolas que têm as suas atividades desenvolvidas em tempo integral.

As escolas de tempo integral são instituições de ensino que vêm ganhando cada vez mais espaço no cenário educativo (BRASIL, 2016a; BRASIL, 2016b; JOÃO PESSOA, 2015) por preconizarem a permanência dos estudantes por mais tempo na escola e, que estes, tenham acesso a fontes diversificadas de conhecimento, cultura, esporte e lazer. Para tanto, faz-se necessário a permanecia dos estudantes nos espaços escolares durante dois turnos, consequentemente necessitam de uma alimentação que lhes garanta a energia e rendimento necessários para o desenvolvimento de tais atividades.

Em estudos realizados para escola de tempo convencional no estado da Paraíba Flor et al. (2002), evidenciaram uma produção de resíduos orgânicos equivalente a mais de 56% da produção de resíduos sólidos oriundos do espaço escolar. Para uma escola no estado do Mato Grosso do Sul, Maia e Molina (2014), encontraram valores de cerca 61,43% da composição física dos resíduos sólidos gerados como sendo de resíduos orgânicos. Nesse sentido fica evidenciada a representatividade que os resíduos orgânicos tem no tocante ao volume de resíduos oriundos desses espaços e da necessidade de estratégias de gestão eficiente, não apenas por questões econômicas, mas também dada a importância ambiental e educacional atrelada ao fato.

Concordando com as proposições de Rodrigues (2007), ao afirmar que existem poucas pesquisas realizadas com a temática de produção de resíduos orgânicos nas instituições de ensino, principalmente no tocante aos fatores que influenciam no processo de produção e na gestão dada a tais resíduos. Essa realidade intensifica-se principalmente no que se refere as escolas de tempo integral, dada a inexistência de dados publicados.

Os resíduos orgânicos quando destinados incorretamente no ambiente promovem uma série de problemas ambientais tais como: poluição do solo, de corpos hídricos, do ar e até visual; servindo como espaços de abrigo e proliferação de vetores de doenças etc., como também discute Jardim, (1995). Mesmo quando direcionados ao recolhimento periódica urbana, se não houver estrutura para um tratamento adequado contribuem para ineficiência dos aterros e lixões dada a sobrecarga desses materiais o que infere na diminuição da vida útil desses espaços, como afirma Besen (2011).

Uma das solução é investir em estratégias de redução na produção desses resíduos e no tratamento direto na fonte geradora. Caso esse tratamento não seja possível de ser realizado na fonte geradora que ao seja realizada a segregação correta dos diferentes tipos de materiais, por meio de coleta seletiva como recomendado no Plano Nacional de Resíduos Sólidos, (BRASIL, 2012a).

Considerando-se a expansão da proposta e instalações de escolas em tempo integral; a falta de informações referentes à percepção ambiental dos manipuladores de alimento escolar e a relação que os mesmos apresentam quanto ao fenômeno de produção de resíduos alimentares, uma vez que participam ativa e diretamente do processo, fica evidenciada a importância de avaliar qual a compreensão desses sujeitos acerca do fenômeno para que se possam desenvolver estratégias de gestão eficiente desses resíduos nos espaços escolares.

Esta pesquisa caracterizada por um viés qualitativo, apresenta dados que auxiliam na compreensão do fenômeno da produção de resíduos orgânicos no espaço escolar e contribuem para o desenvolvimento de demais estudos relacionados com a temática, em especial para escolas em tempo integral.

Nesse sentido, objetivou-se com este trabalho fazer um levantamento do perfil e percepção dos manipuladores de alimentação escolar, da Rede Municipal de Tempo Integral do município de João Pessoa, Paraíba, quanto à elaboração da alimentação escolar e o fenômeno da produção de resíduos orgânicos decorrentes do processo.



2 METODOLOGIA



Este trabalho segue os preceitos da pesquisa qualitativa, onde são considerados e analisados o conhecimento e a percepções dos sujeitos, o que reflete diretamente na construção social e o modo que estes interagem com o meio. Desse modo, a pesquisa qualitativa reflete as ideias, constatações, opiniões e significados oriundos do pensamento, das vivências e das práticas sociais de determinado grupo (BÔAS, 2010).

O estudo foi realizado junto aos manipuladores de alimentos das escolas de tempo integral da rede municipal de João Pessoa, capital do estado da Paraíba, no Nordeste brasileiro, durante o ano de 2017. Conforme dados da Secretaria de Educação e Cultura da Prefeitura de João Pessoa (SEDESC/PMJP), a rede é formada por 16 unidades educacionais localizadas na zona urbana do município (SEDESC/PMJP, 2015). No entanto, durante a execução da pesquisa, uma das escolas estava em processo de reforma e teve as suas atividades desenvolvidas fora do padrão de atendimento integral para os estudantes e, portanto, foi desconsiderada na pesquisa. Para a realização deste trabalho foi recolhida a Carta de Anuência da SEDESC/PMJP, permitindo a realização do estudo nas 16 escolas previstas.

Para a obtenção dos dados quanto ao perfil socioeconômicos e percepção dos manipuladores da alimentação escolar foram utilizados questionários semiestruturados (GIL, 1999), com questões objetivas, linguagem simplificada e voltadas para a segurança alimentar e produção de resíduos alimentares. Esse questionário foi subdivido em quatro blocos: no primeiro constavam dez questões de cunho socioeconômico; o segundo bloco, com onze questões, foi composto por informações quanto à produção do alimento escolar; o terceiro, com 7 questões, quanto à produção de resíduos oriundos da alimentação escolar e; por fim, o quarto, com 4 questões de cunho ambiental, voltadas ao gerenciamento dos resíduos orgânicos.

O questionário utilizado, bem como, outras partes requeridas, como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE, foram submetidos para aprovação no Comitê de Ética da Universidade Federal da Paraíba – UFPB para pesquisa envolvendo seres humanos e desse modo asseguradas as normativas de pesquisa exigidas pela Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2012b). A aprovação para esta pesquisa se deu através do protocolo Nº 1.862.846.

Para a aplicação dos questionários foram agendadas e realizadas visitas a cada uma das escolas e os mesmos foram aplicados de forma individual e voluntariamente pelos 56 manipuladores de alimentação escolar responsáveis pela produção de alimentos nessas unidades educacionais.

Os dados coletados foram analisados e processados através da estatística descritiva para uma apresentação mais precisa e consistente. Para tanto, foi utilizado o software de análise Excel 2016®, apresentando médias, gráficos e correlações entre as variáveis.



3 RESULTADOS E DISCUSSÃO



Dos 56 manipuladores de alimentos das Escolas Municipais de Ensino em Tempo Integral de João Pessoa – EMETI/JP, a maioria (96,42%, n=54) corresponde a representantes do sexo feminino, o que evidencia a predominância e papel da mulher nesse processo. Essa função que a mulher exerce na alimentação escolar também foi descrita por Oliveira et al. (2017), ao avaliarem o papel do manipulador de alimentação escolar em 57 municípios, com amostras de todas as regiões do país, constatando a predominância feminina de 98,25% no exercício da função.

O destaque para presença dos homens na produção da alimentação escolar encontrados nessa pesquisa, está para o exercício de ações que demandam maior força bruta, como relocação de instrumentos, utensílios e manipulação dos alimentos preparados, mas não necessariamente excluindo a participação desses indivíduos no preparo da alimentação produzida.

Corroborando com os estudos de Fernandes et al. (2014) e Tanajura et al. (2012) em relação à proporção predominante nesta pesquisa de pessoas do sexo feminino na manipulação da alimentação escolar, também é entendido que os dados encontrados nesse estudo reafirmam o processo histórico e social em que é atribuído à mulher o papel de cuidadora do lar, incluindo a manipulação dos alimentos.

É importante destacar que essa importância atribuída à mulher vem incumbida de muitas responsabilidades. As atividades do lar continuam a ser desempenhadas por elas, tais como: cuidar dos filhos, limpeza e organização do lar, produção de alimentos, etc., além disso, somadas às desempenhadas na produção da alimentação escolar promovem uma sobrecarga de trabalho sobre essas mulheres. Embora não tenha sido foco desta pesquisa é importante destacar que nas falas das “merendeiras” eram frequentes as afirmações de cansaço.

Outro ponto que contribui com a sobrecarga aplicada aos manipuladores da alimentação escolar das EMETI/JP e que foi constatado com o desenvolvimento das coletas de dados, é a execução de atividades que vão além da produção da alimentação escolar e limpeza da cozinha. É possível destacar atividades como: produção de lanches e cafés para professores e demais funcionários e limpeza do ambiente escolar além do espaço da cozinha. Tais fatos foram recorrentes e apontam para falhas na gestão de pessoas, seja pela falta delas ou pela má delimitação das funções de cada agente.

É preciso reavaliar as atribuições que são dadas aos sujeitos na execução das atividades da rotina escolar, principalmente no caso das “merendeiras” levando em consideração “o cansaço do labor de quem limpa, prepara, cozinha e distribui a refeição. Depois recolhe, lava, limpa e guarda, numa roda-viva que não cessa até o término do turno, quando retira o avental e, de mãos úmidas, à casa retorna” (TANAJURA et al.128p. 2012).

Para os manipuladores das EMETI/JP, esse desgaste passa a ser ainda maior uma vez que ao invés de duas preparações diárias, como ocorre nas escolas convencionais, são elaboradas 3 refeições. Com uma carga horária de 8 horas diárias de trabalho os atores chegam nas escolas às 6:00 horas da manhã para preparar e fornecer a primeira refeição que é servida às 8:00 ou 9:00 horas, dependendo da escola, concomitante a isso já estão preparando o almoço e mal termina de servir o almoço já têm de dar andamento no lanche da tarde.

A predominância feminina nesse processo também pode ser entendida como uma busca por complementação de renda familiar, levando-se em consideração os fatores histórico sociais, apontados por Fernandes et al. (2014) e Tanajura et al. (2012), que atribuíram para a mulher a atividade de manipulação dos alimentos, diferentemente dos homens. Sendo constatado nessa pesquisa uma maioria de manipuladores (66%, n=37) casados e do total de entrevistados, 43% (n=24) são provedores da casa.

Fortalecendo a ideia de complementação de renda associada a predominância da mulher na manipulação da alimentação escolar, levando em consideração os fatores histórico-sociais, está a quantidade de indivíduos que compõem o núcleo familiar, sendo destacado nessa pesquisa uma predominância (37%, n=21) dos lares dos atores com 3 a 4 pessoas e de 30% com 5 a 6 indivíduos (Figura - 1) compondo esse núcleo familiar e, com uma maioria dos atores apresentando uma renda mensal de 1 salário mínimo.



Essa composição do núcleo familiar com predominância de três ou mais indivíduos também pode ser reflexo da baixa escolarização apresentada para a região Nordeste, quando comparadas com outras regiões do país. Os estudos de Santos (2016) ao comparar as taxas de fertilidade no Brasil correlacionando-as com as encontradas na região Sudeste e Nordeste, levando em consideração os indicadores sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, do ano de 2010, constatou a predominância de maiores taxas de fertilidade associadas à menor quantidade de anos de estudos, conforme descrito na Figura - 2:





Dos cinquenta e seis manipuladores das EMETI/JP, 37% concluíram o ensino médio, 9% apresentam o ensino médio incompleto, 9% o ensino fundamental completo, 30% ensino fundamental incompleto, 2% não estudaram e 13% cursam ou possuem formação superior. Os indivíduos que compõem a última categoria, em sua maioria (71%), desempenham a função de supervisor de merenda, atividade que não está diretamente ligada à produção do alimento em si, mas no ordenamento do processo.

Ao comparar a escolaridade dos manipuladores de alimento das EMETI/JP com estudos realizados para outras regiões, a exemplo da Região Sul, município de Chapecó/SC, Teo et al. (2010) observaram a predominância do ensino fundamental completo (64,0%); já para os da região Sudeste, munícipio do Rio de Janeiro/RJ, Fernandes et al. (2014), destacam a predominância de atores com ensino médio (70%) e 18,6% ensino superior.

Nesta pesquisa, somadas as categorias de atores que não estudaram (2%), com os que apresentam ensino fundamental incompleto (30%) e ensino fundamental completo (9%), tem-se uma maioria de 41% dos atores que apresentam até esse nível de ensino, as demais categorias apresentando o ensino médio incompleto (9%), ensino médio completo (37%) e ensino superior (13%). Dessa forma, os dados encontrados corroboram com os estudos Teo et al. (2010) para a predominância de indivíduos com ensino fundamental no exercício da atividade.

Levando em consideração os dados encontrados nessa pesquisa e os processos de escolarização no Brasil, as regiões Norte e Nordeste sempre apresentaram maiores dificuldades como evidenciado ainda pelas altas taxas de analfabetismo encontradas, quando comparadas com a média nacional (Figura – 3).



As variações nas taxas de analfabetismo são resultantes dos processos histórico políticos que incidiram sobre cada uma dessas regiões e que repercutem até hoje nos problemas ligados a desigualdades sociais, tais como: baixa remuneração salarial, vulnerabilidade social, etc.

Em relação à faixa etária dos atores da pesquisa foi constatada a predominância de indivíduos com idades entre 36 a 45 anos como destacado no Figura - 4:



A maioria dos manipuladores (55%) é formada por pessoas advindas de municípios do interior (41%) e até mesmo de outros estados (12,5%), a exemplo do Rio de Janeiro, Distrito Federal, Pernambuco e Rio Grande do Norte. Ao chegarem nas cidades destino essas pessoas acabam encontrando um cenário competitivo, que muitas vezes, lhes direcionam a empregos precários ou de baixa remuneração. Estas constatações podem ser um reflexo das pressões migratórias que levam as pessoas a abandonar as suas cidades natais em busca de melhores condições de vida e salários, como afirmam Duarte e Fusco (2012) em suas pesquisas.

Quanto ao tempo em exercício da função, 52% dos atores afirmaram trabalhar nas escolas entre um e cinco anos completos, 27% deles há mais de cinco e menos de dez anos e, apenas 5% permanecem na profissão por mais de dez anos, os demais estão há menos de um ano (16%). Os dados encontrados nesta pesquisa contrapõem-se aos encontrados por Teo et al. (2010), que constaram a permanência de 56%, dos atores de sua pesquisa, por mais de dez anos no exercício da função.

Essa diferença entre os anos no exercício da função encontrada na pesquisa, quando comparada aos dados de Teo et al. (2010), pode estar ligada ao fato de que as escolas em tempo integral para o município de João pessoa sejam resultantes de iniciativas relativamente recentes, tendo início no ano de 2011, conforme informações do Plano Municipal de Educação (JOÃO PESSOA, 2015). Muitas dessas escolas foram construídas especificamente com esse padrão o que reflete no tempo de contratação dos funcionários, na relocação para outras unidades e dessa forma compondo o atual cenário.

No que diz respeito à produção da alimentação escolar, 100% dos atores confirmaram a existência de um cardápio elaborado pela equipe de nutricionistas do município e que o mesmo é fornecido semanalmente para cada uma das escolas. Quando o cardápio enviado pela equipe de nutricionistas não é possível de ser realizado, fica a critério dos manipuladores e da direção escolar a escolha do cardápio do dia. Dessa forma, fragilizando a segurança alimentar dos estudantes uma vez que conforme a Resolução FNDE nº 26/2013, esta atividade é de encargo do Responsável Técnico pelo PNAE, no caso o nutricionista, agente capacitado para tanto.

Essa situação de substituição de dietas por profissionais não habilitados para tal, causa vulnerabilidade ao estado de segurança alimentar dos educandos. Quando uma dieta que é calculada por um profissional especializado e atende às necessidades diárias de uma criança não pode ser praticada em sua totalidade, surge um estado de alerta para o sistema de gestão escolar.

Dos cinquenta e seis atores, 93% afirmaram tentar seguir o cardápio proposto, muito embora, 100% deles tenha afirmado ter problemas quanto à frequente falta de ingredientes no momento do preparo das refeições, e 71,4% que muitas vezes o cardápio tem de ser alterado por não haver quantidade suficiente de ingredientes para a sua realização. Estes dados corroboram com os encontrados por Issa et al. (2014), que avaliaram a execução de cardápios escolares na cidade de Belo Horizonte/MG. Dos 210 cardápios avaliados, 166 (79%) foram alterados e 37,10% das respostas alegaram que a alteração ocorreu em função da falta de ingredientes.

A falta de recursos para aquisição de alimentos ou problemas com logística na entrega desses alimentos nas escolas atendidas podem ser dois dos motivos que levem a tal situação. Faz-se necessário que haja um empenho de vários setores ligados à alimentação escolar, desde a aquisição até à distribuição do alimento pronto no prato do estudante.

Para 100% dos atores entrevistados os alimentos mais frequentes na cozinha correspondem a grãos, verduras e frutas, seguidas das hortaliças (tomate, cebola, batatinha, alho, etc.). Nesse sentido, a produção de resíduos orgânicos como cascas, aparas e partes não comestíveis são uma realidade frequente nesses espaços. Isso foi constatado com a execução desta pesquisa, onde observou-se que, na prática, essa fração dos alimentos são descartados como lixo.

Essa observação remete a outra discussão que é o não aproveitamento de partes comestíveis pelas cozinhas escolares, contribuído com o aumento da parcela de resíduo orgânico nos lixos escolares. A falta de gestão adequada desses resíduos contribui para a problemática do lixo urbano, frequentemente apontados nos estudos de impacto ambiental decorrentes das ações antrópicas (JARDIM, 1995; BESEN, 2011; JACOBI e BESEN, 2011; ABRELPE, 2016). A parcela orgânica encontrada nesse lixo está geralmente associada com a poluição de solos, corpos hídricos (rios, lagos, lençóis freáticos), liberação de gases que contribuem com o aumento do efeito estufa, sobrecarga em lixões e aterros sanitários, além da destinação inadequada servindo de atração e proliferação de vetores de doenças, entre outros.

A escola tem papel importante no processo de formação e incentivo às práticas ambientalmente sustentáveis, como defende a Lei de Educação Ambiental nº 9.795 (BRASIL, 1999). Os manipuladores de alimentos, como agentes diretamente ligados ao processo, devem ser capacitados para uma melhor gestão, objetivando a diminuição e/ou não geração desses resíduos. O desenvolvimento de tais estratégias também é assegurado pelo Plano Municipal de Educação – PME (JOÃO PESSOA, 2015), que estabelece como estratégia de fortalecimento à Educação Ambiental, a seguinte afirmativa:

Garantir a Educação Ambiental como prática educativa integrada, continua e permanente, em conformidade com a Lei nº 9.795/99, com as Diretrizes Nacionais para Educação Ambiental (Parecer CNE/CP nº 14/2012), com o Programa Nacional Escolas Sustentáveis e com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/10) e o Plano Municipal de Resíduos Sólidos.” (JOÃO PESSOA, 2015).

Quando questionados em relação ao aproveitamento integral dos alimentos, 75% afirmaram conhecer sobre o conceito. Os meios de comunicação (rádio, tv, internet, etc.) foram as principais fontes de informações para este conceito (37,5%), seguido por curso de capacitação (18%), informações da própria escola (11%) e outras fontes diversas (33,5%). No entanto, quando foram apresentadas cinco alternativas de frases representando o conceito de aproveitamento integral, em que apenas uma das alternativas correspondia ao conceito corretamente, apenas 36% dos atores foram assertivos. Além disso, ao confrontar os conceitos de aproveitamento integral de alimentos e reaproveitamento de alimentos, 69,6% dos atores afirmaram não saber diferenciá-los.

Esses dados mostram que ainda existe uma grande confusão por parte dos colaboradores escolares em relação aos termos reaproveitamento de alimentos e aproveitamento integral de alimentos. É importante que os atores que estão ligados diretamente com alimentos na cadeia escolar tenham esse esclarecimento. Ações educativas, palestras, rodas de conversas, workshops são exemplos de atividades que podem ser úteis no entendimento desses termos e assim diminuir o descarte de resíduos orgânicos nos lixos escolares.

Em relação aos motivos do descarte de alimentos após a sua preparação, os atores afirmaram que os principais descartes correspondem à sobra dos pratos (43,63%), que é a fração de alimentos fornecida para o estudante e que não é ingerida por ele. A não utilização da sobra limpa, que corresponde ao alimento produzido e que não foi servido para os estudantes, foi o segundo motivo de descarte, com 39,1%. Outro fator que leva ao descarte de alimentos nas escolas estudadas é a produção excedente (10,9%), que é a quantidade de refeições produzidas em quantidade superior às necessidades dos estudantes. Outro achado da pesquisa é que 6,36% dos alimentos são descartados em função de alguma falha no armazenamento. Outros fatores também foram citados, porém com menor expressividade.

A constatação do período de maior descarte de alimentos apontada pelos manipuladores de alimentos das EMETI/JP, como sendo decorrentes das sobras dos pratos dos estudantes, associada à sobra limpa, é caracterizada como etapa de consumo. Para Rodrigues (2007), Engstrom e Carlsson-Kanyama (2004), essa fase também corresponde ao período de maior descarte de alimentos, apontando respectivamente 68,1%, e 50%, da produção de resíduos orgânicos ao avaliarem a produção de resíduos orgânicos em espaços educativos.

Desses dados sobre as causas do descarte de alimentos, é importante ressaltar as falhas de armazenamento que foram reveladas. Embora esse motivo tenha atingido apenas 6,36% das respostas, em regiões de clima subtropical e com média de temperatura elevada na maior parte do ano, como é o caso das regiões Norte e Nordeste no Brasil, esses índices podem ser facilmente superados, uma vez que a maior parte dos insumos são perecíveis e requerem um armazenamento adequado. Dessa forma, atenção especial deve ser dada ao armazenamento de insumos alimentares, especialmente aos perecíveis, como leites, carnes, ovos, pescados, frutas, legumes e verduras. Sempre que possível, tais categorias de alimentos devem sofrer armazenamento adequado, preferencialmente sob refrigeração.

Sobre as sobras limpas e a destinação dada, 82% dos atores afirmaram descartá-las por orientações da equipe de nutrição escolar. Ainda de acordo com as orientações que recebem da equipe especializada, 100% dos manipuladores afirmaram ser proibido o reaproveitamento para outras refeições. Vale ressaltar que essa situação poderia ser revertida e existe amparo legal para isso. A Resolução nº 216/2004 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) estabelece que, para que ocorra o reaproveitamento, os alimentos devem ser conservados a quente, em temperatura superior a 60°C, durante o período máximo de 6 horas (BRASIL, 2004). Infelizmente essas condições não são encontradas nas escolas de tempo integral alvo deste estudo e, por isso, o reaproveitamento não pode ser aplicado.

Apenas 18% dos atores afirmaram que ocorre outra destinação para os alimentos gerados na escola que não seja o lixo. Deste total que não é descartado, 92% dos entrevistados informaram que os alimentos podem ser destinados para distribuição entre os funcionários da própria escola ou doados para criação animal (porcos, galinhas, etc.). Apenas 8% dos participantes da pesquisa informaram que o excedente de alimentos produzidos é doado para comunidades de vulnerabilidade social localizadas no entorno das escolas.

Quando questionados se existe algum incentivo ao melhor aproveitamento dos alimentos, 66% dos atores afirmaram que sim. Segundo os participantes, o principal incentivo é voltado para a redução do desperdício (100%) e isso ocorre geralmente sob a forma de cursos de capacitação (82,5%), que são realizados uma vez ao ano pelo município.

Tão importante como o treinamento técnico dos manipuladores para uso de novas técnicas ao não desperdício é uma formação mais holística sobre o tema. É necessário que haja uma abordagem ampla e sistêmica sobre alimentos, desde a sua produção, passando por questões nutricionais, ambientais, econômicas e sociais. Esse tipo de abordagem promove maior sensibilização dos ouvintes e, desde que realizada com linguagem acessível, promove maior entendimento sobre a real necessidade do não desperdício.

Faz-se ainda necessário que ações práticas sejam realizadas periodicamente. O intervalo anual, atualmente adotado para esses cursos, talvez esteja aquém das reais necessidades da realidade escolar. Oficinas sobre novos alimentos, novas formas de aproveitamento, perspectivas de novos sabores na merenda escolar são ações estimulantes não só para merendeiras, mas para toda a comunidade escolar.

Esse treinamento anual também foi identificado na pesquisa de Teo et al. (2010). Os autores também ressaltaram críticas ao modelo de capacitação voltado para “formação de trabalhadoras manuais, operacionais e tarefeiras”, sem um direcionamento para uma formação humana integral.

Ao serem questionados se existia algum tipo de separação entre os resíduos alimentares, 91% dos atores afirmaram não desenvolver nenhum tipo de separação. Esse informação é relevante principalmente por se tratar de um ambiente de educacional, pois a separação de resíduos alimentares em categorias poderia não só facilitar o melhor aproveitamento deles como também é uma forma de promover educação ambiental. O cenário atual mostra que os resíduos alimentares são direcionados para a coleta de resíduos urbanos e isso contribui para problemática de sobrecarga de resíduos orgânicos destinados a aterros e lixos, o que também foi enfatizado por Besen (2011). Segundo esta autora, os resíduos orgânicos chegam a corresponder a 57,41% de aterros e lixões sanitários, contribuindo para a diminuição da vida útil desses espaços.

A destinação incorreta dos resíduos também contraria as indicações do PME/JP, que estabelece como meta seguir as recomendações da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, instituída pela Lei nº 12.305/10, (JOÃO PESSOA, 2015; BRASIL, 2010) que indica a segregação dos resíduos direto na fonte geradora, como um ponto primordial para que se possam desenvolver estratégias de compostagem, aplicação do composto em hortas, dentre outras destinações mais nobres e sustentáveis para os resíduos orgânicos.

A compostagem além de contribuir para gestão dos resíduos orgânicos ainda apresenta outras vantagem uma vez “...que é um material estável, rico em nutrientes minerais, que pode ser utilizado em hortas, jardins e para fins agrícolas, devolvendo à terra os nutrientes de que necessita, e evitando o uso de fertilizantes sintéticos.” Batista et. al. (2016).

Das quinze escolas participantes da pesquisa, em apenas duas delas (13,33%) existem hortas e destas, apenas em uma escola os manipuladores afirmaram fazer algum tipo de uso dos produtos da horta para a merenda escolar. Geralmente os alimentos mais utilizados são classificados por eles como “temperos e verduras”.

A proposta de hortas escolares é defendida pelo PNAE, como forma de fomento e fortalecimento de hábitos alimentares mais saudáveis. Hortas escolares podem abrigar frutas, verduras, legumes e temperos que, desde que produzidos com orientação técnica e preferencialmente sem uso de agrotóxicos, podem ser usados na confecção da merenda escolar, proporcionando uma dieta mais variada, rica, saudável e participativa. Essas hortas servem como instrumento para valorização de espaços e prática de educação ambiental e por isso, deveriam ser mais presentes no ambiente escolar, especialmente nas escolas de tempo integral.



4 CONCLUSÕES



O perfil dos manipuladores das escolas de tempo integral do município de João Pessoa/PB, reflete também o panorama encontrado nos estudos de mesmo cunho realizados com abrangência nacional, incidindo na predominância de mulheres no exercício da função que, em sua maioria, não concluíram o ensino médio, que trabalham para manter ou complementar a renda familiar e que expressão capacitação voltada para o exercício técnico da função.

Ficou evidenciado também o importante papel que a mulher desempenha no tocante à segurança alimentar para as EMETI/JP, muito embora tenham o seu trabalho pouco valorizado, uma vez que a maioria delas trabalha em regime de contrato de prestação de serviços atrelado ao calendário letivo, ou seja, nos meses de férias escolares não recebem o salário que corresponde a um salário mínimo.

Apesar da existência de cardápio, regularmente planejado pela equipe de nutrição da prefeitura municipal, ficou evidenciado na pesquisa a problemática do não abastecimento de determinados itens alimentícios que ocasiona alterações no cardápio fornecido aos estudantes, conforme relatado pelos manipuladores. Nesse mesmo sentido, o não abastecimento de alguns itens alimentícios interfere também na dinâmica de entrada e saída de alimentos, contribuindo para as perdas de alimentos e consequente aumento na produção de resíduos orgânicos.

Com base nas respostas dos manipuladores e nas constatações realizadas no momento das visitas às escolas, foi evidenciada a presença de frutas e hortaliças frequentemente na alimentação dos estudantes, o que representa um fator positivo na garantia de uma alimentação mais saudável e balanceada, conforme estabelece o PNAE. Todavia, existe a problemática decorrente da destinação inadequada dos resíduos oriundos dessa alimentação, uma vez que os atores afirmaram não fazer nenhum tipo de separação dos mesmos e que a maior fração é descartada e recolhida como lixo.

Com relação à produção de resíduos, o Plano Municipal de Educação, preconiza a segregação dos resíduos, a promoção de compostagem e a implantação de hortas escolares. Na prática pouco é realizado. Dessa forma, cabe às escolas, junto à secretaria de educação, promover iniciativas de gestão eficiente desses resíduos de modo que envolva toda a comunidade escolar, em especial as equipes de manipuladores de alimentos, uma vez que estes estão intimamente ligados ao processo.

A maioria das escolas visitadas, apresentam espaços do terreno subtilizados em que poderiam ser instaladas hortas escolares, bem como o processo de compostagem da fração orgânica dos resíduos. Dessa forma podem ser desenvolvidas atividades de educação ambiental com os estudantes, por meio de oficinas, palestras, tratos com a horta e a compostagem, além da destinação adequada dos resíduos provenientes da alimentação escolar.

Também ficou evidenciado nas respostas dos atores que a capacitação realizada anualmente é voltada para a execução mecânica do processo de produção dos alimentos, tendo em vistas a redução da alimentação produzida, como resposta ao melhor aproveitamento dos alimentos. No entanto, as questões voltadas para a alimentação escolar e para a produção de resíduos vão além de evitar a produção de “sobra limpa”, por exemplo.

É preciso integrar ao processo de capacitação dos manipuladores de alimentos das EMETI/JP estratégias de aproveitamento integral; reaproveitamento de alimentos e; de gestão adequada dos resíduos decorrentes do processo de produção da alimentação escolar. Dessa forma, contribuindo com a formação dos sujeitos, de maneira holística e integrativa, reforça-se a ideia de uma alimentação escolar mais eficiente, no tocante à segurança alimentar e em relação à gestão dos resíduos gerados.



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Ilustrações: Silvana Santos