Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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Relatos de Experiências
SIMULAÇÃO DE COLETA DE MACROFUNGOS: UMA PROPOSTA PARA ABORDAR CONCEITOS DE ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO Larissa Trierveiler-Pereira & Juliano Marcon Baltazar2 1Docente do Curso de Gestão Ambiental, FATEC “Prof. Antonio Belizandro Barbosa Rezende”, Itapetininga-SP. E-mail: Lt_pereira@yahoo.com.br 2Docente do Centro de Ciências da Natureza, Campus Lagoa do Sino, Universidade Federal São Carlos, Buri-SP. E-mail: baltazarjmb@gmail.com
Resumo: Com o intuito de discutir temas de ecologia e conservação, uma atividade de simulação de coleta de macrofungos foi realizada em sala de aula com os alunos do curso de Gestão Ambiental da Faculdade de Tecnologia (FATEC) de Itapetininga, São Paulo. Os alunos também tiveram a oportunidade de avaliar anonimamente a atividade proposta, sendo que a grande maioria avaliou a experiência como sendo interessante e útil na fixação do conteúdo teórico abordado em sala de aula. Palavras-chave: Curva Acumulativa de Espécies, Diversidade de fungos, Educação, Ensino Superior, Meio-Ambiente Abstract: With the aim to discuss ecology and conservation issues, an activity simulating macrofungi collection was conducted in the classroom with Environmental management students from the Faculty of Technology of Itapetininga (São Paulo). The students also had the opportunity to evaluate the activity, and most of them reported that the experience was interesting and helped to understand concepts discussed in theory. Keywords: Education, Environment, Fungal Diversity, Higher Education, Species accumulation curve
Introdução É de amplo conhecimento que a realização de aulas práticas constituem um importante recurso metodológico que auxilia os alunos na fixação do conteúdo teórico, além de aproximar os alunos de práticas científicas e desenvolver a habilidade de resolver problemas. As atividades que aliam teoria à prática despertam a curiosidade e o interesse dos alunos e já foi apontado que em aulas de ciências e biologia essas atividades apresentam maior eficácia no ensino do conteúdo (LIMA; GARCIA, 2011; PERUZZI; FOFONKA, 2014; SILVA et al., 2016; BARTZIK & ZANDER, 2016). Peruzzi e Fofonka (2014) destacam que as saídas de estudos (aulas a campo) e práticas em laboratórios são importantes recursos nas aulas de Ciências da Natureza, entretanto, ainda outros podem ser utilizados para a quebra da rotina em sala de aula, como a apresentação de vídeos, debates, feiras, entre outras atividades práticas. Dentro do ensino da Biologia, é importante que o aluno tenha conhecimentos sobre ecologia e conservação, entre outros motivos, pelo fato dessas disciplinas integrarem conhecimentos de diversas outras. Uma das frases mais conhecidas no meio conservacionista diz que “é preciso conhecer para preservar”, destacando a importância do conhecimento básico de biologia e biodiversidade para o desenvolvimento de ferramentas de conservação. Além do valor intrínseco de cada espécie, e a importância delas atuarem em conjunto para a manutenção dos ecossistemas naturais, a biodiversidade tem importância para o para o bem-estar e saúde humana, além do imenso potencial para a economia humana em geral (JOLY et al., 2011; ALHO, 2012). Dessa forma, fica explícito que há necessidade de conservar ecossistemas naturais e recursos vivos. E uma das formas de agir em prol da conservação da natureza in situ é o desenvolvimento de ações de Educação Ambiental. Assumindo que conhecer a biodiversidade é de suma importância, nos cabe refletir sobre o conhecimento atual das espécies que ocorrem no Brasil. Apesar de ser considerado um país megadiverso, ainda há pouca informação sobre as espécies fúngicas brasileiras. Segundo um levantamento de Maia et al. (2015), 5.719 espécies de fungos eram conhecidas até aquele momento para o Brasil, o que representa uma pequena porcentagem levando em conta o número total de espécies registradas no mundo – cerca de 144.000 espécies segundo Taylor et al. (2014). Os macrofungos, ou seja, aquelas espécies que produzem basidiomas ou ascomas (corpos de frutificação) visíveis, como os cogumelos e as orelhas-de-pau, estão entre as espécies que mais chamam a atenção da população em geral, porém, pouco são abordados no ensino de ciências nas escolas brasileiras (ROSA; MOHR, 2010). Com o intuito de trabalhar em sala de aula conceitos e conhecimentos sobre métodos de estudo de fungos, ecologia e conservação, um exercício de simulação de coleta de macrofungos foi elaborado e realizado com alunos da disciplina de Ecologia do curso de Gestão Ambiental da Faculdade de Tecnologia (FATEC) de Itapetininga. Nesse artigo apresentamos a dinâmica da atividade, além dos resultados obtidos, a partir da avaliação dos próprios alunos quanto à atividade. Metodologia Para o desenvolvimento dessa atividade em sala de aula, na tentativa de reproduzir um trabalho de micologia de campo, foram confeccionados oito cartazes, cada cartaz correspondendo a uma localidade fictícia (Brejinho – Almas – Turvo – Dois Corações – Rio Claro – Pedra Branca – Quebrada – Buraquinho), contendo nomes de espécies de macrofungos (Figura 1).
Figura 1 – Cartazes contendo o nome de espécies de macrofungos e suas respectivas localidades. No total, foram escolhidos nomes científicos de 25 espécies de macrofungos (Tabela 1), e em cada localidade os alunos poderiam encontrar de 13 a 14 espécies. Esses cartazes foram fixados aleatoriamente pela sala de aula (nas paredes e quadro-negro) e os alunos precisavam passar por cada cartaz anotando o nome da localidade e as espécies de fungos ali encontradas. Tabela 1 – Espécies de macrofungos selecionadas para a atividade e seus respectivos números de ocorrência nas oito áreas fictícias inventariadas.
Após esse período de anotações, os alunos, divididos em grupos de até quatro participantes, foram instruídos a construir uma curva acumulativa de espécies, tema abordado durante as aulas de Ecologia. A curva acumulativa de espécies é uma relação espécie-área que indica suficiência/insuficiência amostral (SCHILLING & BATISTA, 2008). Foi fornecido para cada grupo uma folha com linhas de gráfico onde tal atividade pudesse ser realizada (Figura 2).
Figura 2 – Folha de exercício para os alunos, exercício 1 e 2. Com a curva acumulativa de espécies construída, os alunos precisariam responder ainda outras perguntas do exercício (Figura 3), levando em conta a curva construída e os nomes dos fungos anotados.
Figura 3 – Folha de exercício para os alunos, exercício de 3 a 6.
Resultados Os alunos tiveram o tempo de 2 horas-aula para a realização da atividade (anotar nome das espécies fúngicas e localidades, construção da curva acumulativa de espécies e responder questionário). Nas 2 horas-aula seguintes, foram discutidos com os alunos os resultados e algumas fotos de fungos (espécies mais comuns, mais rara) foram exibidas em diapositivos de Powerpoint projetadas com um Datashow (Figura 4).
Figura 4 – Diapositivo apresentado aos alunos com fotos de espécies fúngicas mais comuns e rara, de acordo com a atividade. Fotos de L. Trierveiler-Pereira. Foi discutido com os alunos os conceitos de espécies abundantes e raras, especialistas e generalistas. Também se discutiu políticas de preservação e conversação, seleção de áreas prioritárias para conservação e aspectos legais de parques e áreas de conservação. Ainda, foi debatido problemas com a conservação de espécies fúngicas, já que as legislações ambientais vigentes geralmente abordam espécies vegetais e animais. Ao final da atividade, foi solicitado aos alunos participantes (28 no total) que respondessem um questionário (Figura 4) sobre a atividade, sendo que a resposta do questionário era anônima e não obrigatória. Todos os alunos responderam as questões 1‒3 (nota de acordo com escala), porém nem todos responderam as questões abertas (4‒6).
Figura 4 – Questionário entregue aos alunos sobre o exercício de Curva Acumulativa de Espécies. Analisando as respostas dos alunos, pudemos observar que a grande maioria dos participantes achou a atividade “muito boa” de uma maneira geral e que tal atividade foi importante para compreender o conteúdo trabalhado em sala de aula. Alguns alunos acharam que a experiência da realização da atividade em grupo foi “regular” (Figura 5). Não houve respostas “ruim” e “regular” para as questões de 1‒3.
Figura 5 – Gráfico com as respostas dos alunos para as questões 1‒3. Quanto aos resultados da questão 4 (pontos positivos da atividade), os alunos comentaram os seguintes aspectos: Gostaram da atividade por ter sido prática e dinâmica; Acharam a atividade interessante por quebrar a rotina de sala de aula; Maneira descontraída de aprender; Atividade auxiliou na fixação de conteúdo teórico; facilitou compreensão do conteúdo; A atividade proporcionou interação entre os alunos; A atividade gerou mais conhecimento; Gostaram de trabalhar com um grupo de organismos pouco conhecidos (fungos). Sobre aspectos negativos da atividade (questão 5), a grande maioria dos alunos (total = 21) respondeu que não teve aspectos negativos na atividade. Os demais, ressaltaram alguns pontos: Dispersão do grupo; dificuldade em realizar atividade em grupo; Realização da atividade em sala de aula (local pequeno); Não conseguiram se organizar para escrever os nomes das espécies; nomes em latim dificultou escrever os nomes das espécies; Ausência de fotos de todas as espécies fúngicas nos cartazes com as localidades. Foram sugestões apontadas pelos alunos (questão 6): Realização de mais atividades como essas ou realizar atividades assim com maior frequência; Utilização de programas de computação (Excel) para realização da atividade; Ilustração de todas as espécies fúngicas nos cartazes das localidades; Realização da atividade em grupos menores (até três alunos); Realização da atividade em campo; coleta de espécimes para realização da atividade.
Discussão De acordo com a avaliação dos alunos, podemos concluir que a grande maioria dos envolvidos se interessou pela atividade proposta. Ainda, muitos alunos sugeriram que mais atividades como essa fossem realizadas com maior frequência no curso. Devido à complexidade do estudo de identificação de fungos, aliado ao cronograma apertado das aulas e as dificuldades para realizar atividades em campo, não foi possível realizar a atividade em diferentes locais abertos e real coleta de espécimes (como sugerido por alguns alunos). Ainda assim, acreditamos que essa simulação de atividade micológica em campo serviu como uma experiência inovadora para os alunos. A apresentação dos nomes das espécies em latim, embora possa parecer muito diferente para alguns alunos, serviu como um exercício interessante para aproximar os alunos de atividades científicas como a taxonomia, além de exigir dos alunos paciência, atenção e organização para realizar a atividade com sucesso. Quanto à apresentação de fotos das espécies fúngicas em todos os cartazes, tal adaptação torna a elaboração desse material didático mais complexa e cara, mas como alternativa, fotos de todas as espécies poderiam ser mostradas aos alunos em diapositivos de PowerPoint, já que alguns alunos se interessaram pela aparência das espécies. Apesar da faculdade ter salas de computadores à disposição dos alunos, acreditamos que a realização dessa atividade de uma forma não digital (construção da curva acumulativa de espécies), ao invés da utilização de programas de computador (ex. Excel), favorece o aprendizado do aluno. Acreditamos que, no geral, a atividade foi válida para alcançar os objetivos propostos, além de fomentar discussões importantes sobre ecologia, biologia da conservação e educação ambiental em sala de aula.
Bibliografia ALHO, Cleber José Rodrigues. Importância da biodiversidade para a saúde humana: uma perspectiva ecológica. Estudos Avançados, São Paulo, n. 26, v. 74, p. 151-165, 2012. BARTZIK, Franciele; ZANDER, Leiza Daniele. A importância das aulas práticas de ciências no ensino fundamental. Revista @rquivo Brasileiro de Educação, Belo Horizonte, v.4, n. 8, p. 31-38, mai./ago., 2016. JOLY, Carlos Alfredo. Diagnóstico da pesquisa em biodiversidade no Brasil. Revista USP, São Paulo, n. 89, p. 114-133, mar./mai., 2011. LIMA, Daniela Bonzanini de; GARCIA, Rosane Nunes. Uma investigação sobre a importância das aulas práticas de Biologia no Ensino Médio. Cadernos do Aplicação, Porto Alegre, v. 24, n. 1, p. 201-224, jan./jun., 2011. MAIA, Leonor Costa et al. Diversity of Brazilian Fungi. Rodriguésia, Rio de Janeiro, v. 66, n. 4, p. 1033-1045, 2015. PERUZZI, Sarah Luchese; FOFONKA, Luciana. A importância da aula prática para a construção significativa do conhecimento: a visão dos professores das ciências da natureza. Educação Ambiental em Ação, 2014. Link permanente disponível em: <http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1754 >. Acesso em: 04 de dezembro de 2018. ROSA, Marcelo D’Aquino; MOHR, Adriana. Os fungos na escola: análise dos conteúdos de Micologia em livros didáticos do ensino fundamental de Florianópolis. Experiências em Ensino de Ciências, Cuiabá, v. 5, n. 3, p. 95-102, 2010. SCHILLING, Ana Cristina; BATISTA, João Luis Ferreira. Curva de acumulação de espécies e suficiência amostral em florestas tropicais. Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, n. 31, v. 1, p. 179-187, 2008. SILVA, Angélica Tomazeli da, et al. Aulas práticas: sua importância e eficácia no ensino de Biologia. Revista UNIVAP, São José dos Campos, v. 22, n. 40, 2016. Disponível em: <https://revista.univap.br/index.php/revistaunivap/article/view/1202. Acesso em: 04 de dezembro de 2018. TAYLOR, D. Lee, et al. A first comprehensive census of fungi in soil reveals both hyperdiversity and fine-scale niche partitioning. Ecological Monographs, Washington, n. 84, v.1, p. 3-20, 2014. |