Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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13/03/2019 (Nº 67) EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA: VIVÊNCIAS PEDAGÓGICAS EM CONTEXTO DE UMA HORTA ESCOLAR EM ESCOLA PÚBLICA
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EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA: VIVÊNCIAS PEDAGÓGICAS EM CONTEXTO DE UMA HORTA ESCOLAR EM ESCOLA PÚBLICA

Augusto César Lopes Josetti1, Icléia Albuquerque de Vargas2

1Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – augustti@hotmail.com

2Docente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – icleiavargas12@gmail.com

Resumo: A Educação Ambiental se mostra como importante estratégica para se trabalhar e desenvolver valores socioambientais, sensibilizando e capacitando a sociedade para promover mudanças em sua realidade. Todavia, para que a Educação Ambiental cumpra com esse papel é necessário avançar além das práticas educativas mecanicistas, não se pautando apenas em projetos discursivos e teóricos, mas materializando-se em atividades práticas efetivas. Para tanto, a horta escolar surge como uma estratégia para o desenvolvimento de uma Educação Ambiental que una teoria e práxis de forma mais crítica, auxiliando no processo ensino-aprendizagem de professores e alunos sobre a temática socioambiental. Nesse sentido, foi desenvolvido um projeto na Escola Municipal Elpídio Reis, localizada em Campo Grande (MS), cujo objetivo principal foi analisar como a vivência em práticas pedagógicas desenvolvidas em espaços de hortas escolares pode contribuir para o desenvolvimento de uma Educação Ambiental Crítica. Para colocar em prática o projeto foi produzida uma sequência didática, baseada na dinâmica didático-pedagógica dos três momentos pedagógicos, inspirados na pedagogia freireana. O espaço da horta escolar foi utilizado como um laboratório vivo para se trabalhar temáticas socioambientais, como alimentação saudável, uso de produtos químicos na agricultura, água virtual, agroecologia, produção orgânica, dentre outros. Contribuiu também para se trabalhar a socialização dos alunos e a importância de valores, como o respeito, a cooperação, a solidariedade, a amizade, a responsabilidade e a dedicação. Além de ser utilizado para se desenvolver conteúdos das disciplinas escolares de Geografia, Ciências e outras áreas do conhecimento e de fornecer hortaliças orgânicas para a merenda da escola. Esse projeto compõe parte da pesquisa de mestrado que está sendo finalizada no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Palavras-chave: Educação ambiental; Horta escolar; Sequência didática.

Abstract: The Environmental Education shows itself as an important strategic for working and developing socio-environmental values, sensitizing and enabling society to promote changes in its reality. However, for Environmental Education to fulfill this role it is necessary to move beyond mechanistic educational practices, not only based on discursive and theoretical projects, but materializing in effective practical activities. For this, the school garden appears as a strategy for the development of an Environmental Education that a theory and praxis more critically, assisting in the teaching-learning process of teachers and students on the socio-environmental theme. In this sense, a project was developed at the Elpídio Reis Municipal School, located in Campo Grande (MS), whose main objective was to analyze how the experience in pedagogical practices developed in school gardens can contribute to the development of a Critical Environmental Education. To put into practice the project was produced a didactic sequence, based on the didactic-pedagogical dynamics of the three pedagogical moments, inspired by Freirean pedagogy. The space of the school garden was used as a living laboratory to work on social and environmental themes, such as healthy food, use of chemicals in agriculture, virtual water, agroecology, organic production, among others. The socialization of students and the importance of values ​​such as respect, cooperation, solidarity, friendship, responsibility and dedication have also contributed to the work. In addition to being used to develop contents of the school subjects of Geography, Sciences and other areas of knowledge and to provide organic vegetables for school lunches. This project composes part of the master's research that is being finalized in the Graduate Program in Teaching of Sciences of the Federal University of Mato Grosso do Sul.

Key-words: Environmental education; School vegetable garden; Following teaching.

Introdução

Desde as últimas décadas do século XX e início do século XXI temos presenciado uma profunda crise mundial que vai além da questão ambiental. Essa crise pode ser explicada pelo fato do ser humano, totalmente desintegrado do todo, não perceber mais as relações de equilíbrio da natureza. O ser humano “age de forma totalmente desarmônica sobre o ambiente, causando grandes desequilíbrios socioambientais” (GUIMARÃES, 2015, p. 32).

Para Leff (2009), a crise ambiental é também uma crise de civilização, enfatizando que “a crise ambiental é uma crise da razão, do pensamento, do conhecimento” (LEFF, 2009, p. 18). O autor ressalta que a Educação Ambiental emerge e se funda em um novo saber que ultrapassa o conhecimento objetivo das ciências.

A Educação Ambiental tem o importante papel de fomentar a percepção da necessária integração do ser humano com o meio ambiente. Em busca de uma relação harmoniosa, consciente do equilíbrio dinâmico na natureza, que possibilite, por meio de novos conhecimentos, valores e atitudes, a inserção do educando e do educador como cidadãos no processo de transformação do atual quadro socioambiental do nosso planeta (GUIMARÃES, 2015).

Todavia, a Educação Ambiental não pode se limitar ao acúmulo de conhecimentos, mas, sim, selecionar e interpretar os conhecimentos disponíveis e sem perder de vista que o objetivo principal é fazer com que esse conhecimento possibilite e amplie a participação política e social de todos os sujeitos presentes no processo educativo (REIGOTA, 2014).

Nesse sentido, deve-se colocar em ação uma Educação Ambiental pautada na perspectiva Crítica ou Transformadora, que se baseia no desenvolvimento de uma educação escolar voltada à formação de sujeitos críticos e transformadores, de modo que esta seja problematizadora, contextualizada e interdisciplinar. Buscando, dessa forma, a construção de novos conhecimentos, atitudes, comportamentos e valores pelos sujeitos escolares (TORRES; FERRARI; MAESTRELLI, 2014).

Na prática da Educação Ambiental (EA) Crítica ou Transformadora, destaca-se a importância dos aspectos lúdico e criativo das atividades e dos procedimentos para envolver integralmente o educando, tanto em seu lado racional como emocional (GUIMARÃES, 2015).

Nesse entendimento, a horta na escola é uma importante alternativa para colocar em prática a EA Crítica ou Transformadora, uma vez que é capaz de: “promover estudos, pesquisas, debates e atividades sobre as questões ambiental, alimentar e nutricional; estimular o trabalho pedagógico dinâmico, participativo, prazeroso, inter e transdisciplinar; proporcionar descobertas; gerar aprendizagens múltiplas; integrar os diversos profissionais da escola por meio de temas relacionados com a educação ambiental, alimentar e nutricional” (BARBOSA, 2008, p. 7-8).

A horta é uma ferramenta pedagógica capaz de integrar aprendizagens significativas e o cotidiano dos educandos. Na horta, aprende-se muito mais que plantar. No trabalho com a horta, ficam ressaltadas também outras importantes questões, como o melhor aproveitamento dos alimentos, a preservação da água, a reciclagem de produtos diversos e a importância do consumo de produtos sem contaminação (COSTA et al, 2010).

Layrargues (2014) destaca a obra de Paulo Freire como referência fundamental para Educação Ambiental – Crítica ou Transformadora –, em especial, pela vocação problematizadora com potencial de rompimento com o senso comum já incorporado à EA Tradicional, que é conteudista, normativa, instrumental, acrítica, etapista, a-histórica e ideologicamente neutra.

Em contexto de Educação Ambiental escolar o desenvolvimento do trabalho educativo pautado em Temas Geradores, representativos das relações entre sociedade, cultura e natureza, pode permitir a práxis pedagógica que é reflexão e ação dos educandos e educadores sobre a realidade sócio-histórico-cultural vivida e a ser transformada. Isso pode ocorrer por meio de processos formativos e práticas curriculares e didático-pedagógicas de Paulo Freire (TORRES; FERRARI; MAESTRELLI, 2014).

O presente trabalho se pauta no subgrupo “Tema gerador” como tema inicial/motivador definido a priori e sem investigação (TORRES; FERRARI; MAESTRELLI, 2014). A opção por essa abordagem se justifica pelo fato do objetivo principal da pesquisa ser o de analisar como a vivência em práticas pedagógicas desenvolvidas em espaços de hortas escolares pode contribuir para o desenvolvimento de uma EA Crítica. Nesse caso, a horta escolar seria o tema gerador que desencadeou trabalho de pesquisa e a intervenção em sala de aula, que iniciou a discussão em torno de diferentes questões socioambientais, sendo um sensibilizador e motivador da ação educativa e um importante recurso didático-pedagógico para desenvolver diversas atividades em Educação Ambiental.

Contribuições do trabalho pedagógico com horta escolar para uma Educação Ambiental Crítica

Para colocar em prática o projeto da horta escolar, foi produzida uma Sequência Didática (SD) que guiou o desenvolvimento do trabalho. Essa SD foi desenvolvida com base na dinâmica didático-pedagógica dos três momentos pedagógicos, inspirados na proposta freireana: problematização inicial, organização do conhecimento e aplicação do conhecimento. De acordo com Torres, Ferrari e Maestrelli (2014), os Três Momentos Pedagógicos podem ser sintetizados da seguinte maneira: no primeiro momento pedagógico, o educador busca levantar e problematizar as concepções prévias dos educandos em torno da temática significativa, a fim de, em um segundo momento introduzir o conhecimento sistematizado da área que permite melhor compreendê-la com vista à superação do conhecimento prevalente, tendo em conta, no último momento, a proposição de atividades que permitam a junção do conhecimento do educando e do educador em torno da temática inicial para novas apropriações cognitivas.

O projeto foi realizado na Escola Municipal Elpídio Reis, situada no bairro Mata do Jacinto, na cidade de Campo Grande/MS. Os participantes desse trabalho foram os alunos do 6º ano do ensino fundamental do período matutino da escola – envolvendo ao todo 67 alunos, 33 do 6º ano A e 34 do 6º B. A escolha do local se dá pelo motivo da escola ser nosso local de trabalho, como professor da disciplina de Geografia. Já a escolha das turmas se deu pelo fato de os conteúdos dispostos no Referencial Curricular do 6º ano de Geografia e de Ciências da Rede Municipal de Ensino de Campo Grande abordarem temáticas socioambientais que foram devidamente trabalhadas durante o projeto.

Dentro do 1º Momento Pedagógico (Problematização Inicial) a primeira atividade (Atividade 1) foi a aplicação de um questionário – que contou com um total de sete questões que abordavam temáticas como meio ambiente, degradação ambiental, alimentação saudável, origem dos alimentos, agrotóxicos, fertilizantes químicos, horta escolar e educação ambiental – e teve como objetivo fazer um levantamento das representações e concepções dos alunos acerca de questões socioambientais e de conceitos que foram trabalhados durante o desenvolvimento do projeto. Esse questionário foi respondido por 61 alunos que estavam matriculados e presentes no dia a aplicação.

Figura 1 – Aluna respondendo ao questionário no 6º ano B.

A Atividade 2 do projeto foi um debate sobre alimentação saudável e o perigo dos agrotóxicos. O início da aula se deu por meio de uma pergunta colocada na apresentação em PowerPoint e projetada no Datashow: “Você pratica uma alimentação saudável?” Após o momento inicial com o questionamento apresentado, foi mostrado aos alunos o Gráfico 1 que mostrava as respostas deles sobre a pergunta se praticam uma alimentação saudável – questão 3 do questionário.

Gráfico 1 – Você pratica uma alimentação saudável?

Em torno dessa questão os alunos responderam da seguinte maneira: 28 estudantes responderam “sim”, que praticam uma alimentação saudável; 13 alunos responderam “sim e não” e justificaram citando alimentos que consideram saudáveis e não saudáveis; 9 estudantes “não responderam” se sim ou não, apenas citaram os alimentos que eles julgam ser saudáveis ou não; 6 alunos responderam “mais ou menos”; 2 alunos responderam que “as vezes” praticam uma alimentação saudável; outros 2 alunos responderam que não praticam uma alimentação saudável; e 1 aluno respondeu que sua alimentação é “um pouco de bom e de ruim”.

Para complementar e estimular o debate, foi apresentado o Gráfico 2 – que mostra os alimentos mais consumidos pelos anos.

Gráfico 2 – Alimentos mais consumidos pelos alunos.

A partir disso, foram apresentados outros questionamentos para provocar reflexão e debate: Será que manter uma dieta baseada nos alimentos mais citados pelos alunos é garantia de uma alimentação saudável? O modo como os alimentos são produzidos mantém um equilíbrio socioambiental? Esses alimentos estão livres da contaminação de produtos agrotóxicos?

Para ampliar o debate, foram apresentados quatro vídeos sobre a temática alimentação saudável e agrotóxicos: Os perigos dos agrotóxicos para a saúde (https://www.youtube.com/watch?v=VuYuYzClPNg); Agrotóxicos no Brasil??? (https://www.youtube.com/watch?v=xb9qEO6Req4); Alimentação saudável e agrotóxico nos alimentos (https://www.youtube.com/watch?v=8JEQpGSBkKw); Como ter uma alimentação mais saudável (https://www.youtube.com/watch?v=DpmbU38wkpw).

A partir desses vídeos, buscou-se fomentar um debate a respeito do perigo dos agrotóxicos, questionando se os alimentos que consomem no dia a dia estão livres dessas substâncias químicas. Para corroborar com as informações dos vídeos, alguns dados foram apresentados para provocar maior reflexão, dentre eles, destacam-se: o fato do Brasil ser, há quase uma década, o país que mais adquire agrotóxicos proibidos no mundo; que todos nós, mesmo sem saber, consumimos, em média, cinco litros de veneno por ano; que 70% dos alimentos in natura estão contaminados com esses venenos; dentre outros (ROSSI, 2015).

Outros dados preocupantes apresentados: dos 504 ingredientes ativos presentes nos agrotóxicos permitidos por lei no Brasil, 149 são proibidos na União Europeia (UE) e, dentre os dez agrotóxicos mais vendidos no Brasil, dois são proibidos nos países da UE, ou seja, 30% dos venenos utilizados em lavouras no Brasil não são permitidos nesses países europeus (BOMBARDI, 2017).

Também foram apresentados dados sobre os alimentos com maior nível de contaminação por agrotóxicos, de amostras analisadas dos 26 estados brasileiros, distribuídas pelas culturas agrícolas da seguinte maneira: pimentão (91,8%), morango (63,4%), pepino (57,4%), alface (54,2%), cenoura (49,6%), abacaxi (32,8%), beterraba (32,6%), couve (31,9%) e mamão (30,4%), assim como de outras culturas analisadas e registradas com resíduos de agrotóxicos, com destaque para o tomate (16,3%), a maça (8,9%), o arroz (7,4%) e o feijão (6,5%) (ANVISA, 2011).

O objetivo da Atividade 2 foi promover um debate e estimular os alunos a refletirem sobre a alimentação saudável, levando-os a questionarem se os alimentos que eles consomem no dia a dia contém agrotóxicos ou não.

Além disso, pediu-se para os alunos fazerem uma reflexão sobre quais seriam as possíveis soluções para o problema do uso excessivo de agrotóxicos, sendo proposto a pensarem sobre a proposta de construção da horta escolar como parte da solução para esse problema.

Ao final dessa segunda atividade os alunos tiveram uma tarefa – Atividade 3 do projeto – que foi realizar uma pesquisa (na internet, livros, revistas, etc.) sobre os conceitos de: agrotóxicos; fertilizantes químicos; produção orgânica; agroecologia; água virtual; compostagem; sustentabilidade; e horta escolar. Essa Atividade 3 deu início ao 2º Momento Pedagógico – Organização do Conhecimento.

Ainda dentro do 2º Momento Pedagógico, a Atividade 4 consistiu em uma aula expositiva-dialogada. A partir da pesquisa realizada pelos alunos na atividade anterior, deu-se início a um debate em que o professor estimulou à participação dos alunos, levando-os a questionarem, interpretarem e discutirem a respeito dos conceitos pesquisados na atividade anterior.

Para enriquecer o debate, novos vídeos foram apresentados: ANVISA divulga lista de alimentos com níveis elevados de agrotóxicos – CN Notícias (https://www.youtube.com/watch?v=u9XvRrP1xJM); O que é agroecologia? (https://www.youtube.com/watch?v=NsAhdn1581k); 3 mitos que você sempre ouviu sobre a agroecologia - mas ninguém teve coragem de negar (https://www.youtube.com/watch?v=FpEL21Lr8kk); Cartilha Planeta Água - água virtual (https://www.youtube.com/watch?v=MoVRmwEsdmE); Comida Que Alimenta (https://www.youtube.com/watch?v=z6xAkNPV3QI); Compostagem (https://www.youtube.com/watch?v=FAT5MfyAeaw); Sistemas de Produção Sustentável (https://www.youtube.com/watch?v=7_7OlrlDxsA).

No 3º Momento Pedagógico – Aplicação do Conhecimento – foi realizada a Atividade 5, que consistiu no preparo e plantio das sementes. Por meio do trabalho coletivo e cooperado, os alunos trouxeram de casa cartelas de ovos que foram preenchidas com uma mistura de terra adubada e húmus de minhoca, disponibilizados pelo professor, e fizeram o plantio das sementes de salsinha, cebolinha, rúcula e couve – sob a orientação dos professores de Geografia, Ciências e do Laboratório de Ciências. Essas sementes foram transplantadas, posteriormente, para o canteiro definitivo.

Nessa etapa, os alunos foram orientados sobre o plantio das sementes e a diferença entre elas. Além disso, foi demonstrado e explicado para os estudantes sobre a importância da presença de matéria-orgânica no solo, do uso racional da água para irrigação e da exposição ao Sol para o desenvolvimento das plantas (Figura 2).

Figura 2 – Explicação sobre a importância da matéria-orgânica, da água e do sol.

A Atividade 6 consistiu na observação e irrigação das sementeiras (Figura 3). O objetivo dessa atividade foi realizar a observação e irrigação diária das sementeiras. Em grupos, os alunos – sob a orientação dos professores de Geografia, Ciências e do Laboratório de Ciências – fizeram diariamente (de segunda à sexta-feira) a irrigação e a observação do estágio de desenvolvimento das sementes (a germinação, crescimento das mudas, etc.).

Figura 3 – Alunos fazendo a irrigação e observação das sementes

Para a realização dessa atividade, o professor responsável pelo projeto pediu a colaboração dos demais professores da turma para que liberar os grupos de alunos por alguns minutos (cerca de 10 minutos) para que pudessem desenvolver essa etapa do projeto.

A Atividade 7 consistiu na preparação do canteiro e a adubação do solo e no plantio das mudas no canteiro definitivo da horta. Nesse momento, por meio do trabalho coletivo e cooperado, os alunos – sob a orientação dos professores – efetuaram: a limpeza do terreno, o revolvimento do solo, a adubação inicial do solo (com o uso de adubo orgânico e o plantio das mudas das espécies que foram semeadas durante a Atividade 5 do projeto. Além disso, foi instalado um sombrite para proteger as mudas da incidência direta da radiação solar nas horas mais quentes do dia e de fortes chuvas.

A Figura 4 exibe um aluno do 6º ano A executando a limpeza do terreno com um rastelo. Nesse primeiro momento da Atividade 7 da SD, os alunos da turma se revezaram com os dois rastelos disponíveis na escola para fazer essa limpeza.

Figura 4 – Aluno executando a limpeza do terreno para a construção da horta escolar.

Após esse momento, os alunos foram organizados em grupos para iniciar a etapa do revolvimento do solo com o auxílio de algumas ferramentas de jardinagem que trouxeram de casa ou que foram disponibilizadas pelo professor, como o escarificador manual, o rastelo (ou ancinho) de mão e a pazinha (ou colher) de transplante – Figura 5.

Figura 5 – Alunos do 6º A realizando a limpeza do terreno para a implantação da horta escolar.

Em seguida iniciou-se a adubação do solo e o preparo do canteiro da horta. Nesse estágio da atividade foi misturada um pouco de terra adubada e adubo orgânico ao solo original (Figura 6).

Figura 6 – Alunos realizando a etapa da adubação do solo.

Depois disso os alunos com o auxílio dos rastelos e o professor utilizando uma enxada fizeram a elevação do canteiro onde serão plantadas as mudas (Figura 7) – cerca de 20 cm acima do nível original do terreno – para facilitar a drenagem da água do solo

Figura 7 – Grupo de alunos executando a elevação da área do canteiro da horta.

Após a adubação do solo e a preparação canteiro, demos início ao plantio das mudas de hortaliças em que cada aluno, dos 6º anos A e B, ficou responsável pelo transplante de uma mudinha para o canteiro definitivo da horta escolar (Figura 8).

Figura 8 – Alunos realizando o plantio das mudas no canteiro da horta.

Antes do plantio, os alunos foram orientados a manter uma distância de cerca de 15 a 20 cm entre cada muda de cebolinha, salsinha e rúcula e cerca de 40 a 45 cm de distância entre as mudas de couve.

Além dessas espécies de hortaliças, também foi realizado o plantio de algumas mudas de tomate cereja doadas pelo professor e uma muda de morango, doação de uma aluna.

Nessa etapa, foi destacada, mais uma vez, a importância da matéria-orgânica no solo, uma vez que as plantas necessitam de nutrientes para se desenvolver e que podemos utilizar adubo orgânico em vez de adubo químico e industrializado.

Foi enfatizado também que a horta escolar seria considerada orgânica pelo fato de não ser utilizado nenhum tipo de agrotóxico ou produto químico que prejudique a saúde humana ou o meio ambiente. Além disso, foi demonstrado aos alunos que todos podem ter uma pequena horta orgânica em casa ou até mesmo em um apartamento, visto que não haver necessidade de grandes espaços para sua implantação.

Para finalizar a Atividade 7 da sequência didática, instalamos um sombrite (Figura 9) para proteger as mudas recém plantadas da intensa radiação solar nas horas mais quentes do dia e também de fortes chuvas.

Figura 9 – Sombrite instalado para a proteção das mudas.

Todavia, ocorreu um importante contratempo que não constava no planejamento do projeto. Na mesma semana em que fizemos plantio das mudas iniciou-se um período de fortes chuvas na cidade de Campo Grande/MS.

Mesmo com a instalação do sombrite, essa condição adversa do tempo atmosférico provocou a morte da maioria das mudas plantadas, já que ainda estavam pequenas e frágeis, se adaptando ao transplante para o canteiro definitivo da horta.

Dessa forma, para reverter esse incidente que prejudicou o desenvolvimento do projeto, foi preciso planejar uma nova atividade de replantio das mudas. Assim, foi necessário mais uma vez conciliar essa nova atividade com o calendário escolar e a solução encontrada foi agendar uma aula extra com os alunos das turmas participantes no contraturno.

Para o replantio foram adquiridas novas mudas em um comércio de sementes e mudas na CEASA/MS (Centrais de Abastecimento de Mato Grosso do Sul). Foram compradas mudas de cebolinha, salsinha e couve, além de mudas de berinjela e pimentão.

Antes do plantio das novas mudas foi explicado aos alunos que a ação de intempéries – fortes chuvas, granizo, ventos, calor extremo, geadas, entre outros – podem prejudicar o desenvolvimento das mudas ou até mesmo eliminá-las.

Foi orientado também aos alunos observarem se algumas plantas espontâneas haviam nascido no canteiro e efetuarem sua retirada, já que muitas delas competem por luz, água e nutrientes com as espécies cultivadas, podendo prejudicar o desenvolvimento das mudas plantadas na horta, especialmente nos primeiros dias após o plantio.

Figura 10 – Grupo de alunos preparando o solo para receber as mudas

Figura 11 – Alunos executando o plantio das novas mudas.

Considerações finais

A horta escolar precisa ser entendida como um instrumento passível de auxiliar no processo de ensino-aprendizagem de professores e alunos sobre temáticas socioambientais, de forma a contribuir para a construção de novos conhecimentos que levem a uma maior conscientização sobre a importância de se discutir temas como água, compostagem, agricultura orgânica, agrotóxicos, degradação ambiental, a necessidade de práticas alimentares mais saudáveis, dentre outros. Sendo assim, uma ferramenta pedagógica capaz de integrar aprendizagens significativas ao cotidiano dos educandos.

Para tanto, é necessário pensar e planejar cada etapa do projeto. Na experiência relatada, foi importante produzir uma sequência didática na qual todas as atividades pudessem oportunizar um trabalho pedagógico mais dinâmico, participativo e prazeroso, proporcionando novas descobertas e promovendo aprendizagens múltiplas por parte de alunos e professores.

Todavia, podem surgir contratempos capazes de prejudicar o desenvolvimento do trabalho. A grande dificuldade em se desenvolver um projeto dessa magnitude em uma escola pública está em organizar as atividades do trabalho de acordo o calendário escolar, conciliá-lo com o desenvolvimento dos conteúdos dispostos no referencial curricular que devem ser trabalhados bimestralmente, adequar-se às demandas pedagógicas que vão surgindo no cotidiano da escola, além da pouca quantidade de aulas semanais com as turmas envolvidas no projeto.

Outra dificuldade que merece ser destacada e pode retardar o andamento desse tipo de projeto diz respeito às condições climáticas e à ação de intempéries – fortes chuvas, granizo, ventos, calor extremo, geadas, entre outras – que podem prejudicar o desenvolvimento das mudas e hortaliças.

Porém, o projeto desenvolvido na Escola Municipal Elpídio Reis confirmou que a horta escolar pode sim auxiliar no processo ensino-aprendizagem e na tomada de consciência sobre diferentes questões socioambientais, por meio da construção de novos valores, do desenvolvimento do senso crítico dos alunos em relação ao modo de produção dos alimentos e na opção por novas escolhas na busca de uma alimentação mais saudável.

Além disso, um trabalho desse tipo contribui para a criação de um espírito de cooperação entre os alunos que participam do projeto, desenvolvendo valores como respeito e dedicação e criando novos laços de amizade entre os estudantes e professores.

Outro ponto marcante a se destacar foi o maior interesse e envolvimento dos alunos nas aulas de Geografia, especialmente, nos conteúdos relacionados às temáticas socioambientais trabalhadas durante as atividades do projeto.

Além do mais, é preciso enfatizar também que o apoio recebido do grupo gestor da escola, assim como dos professores, promove a total diferença para que um projeto como esse seja desenvolvido de forma positiva.

A ideia é que esse projeto seja apenas o início, pois o grande objetivo é torná-lo contínuo e permanente dentro da escola, tornando a horta escolar um espaço a ser usado como um laboratório vivo, destinado para se desenvolver diversos conteúdos das disciplinas de Geografia, Ciências, História, Matemática, Inglês e outras áreas do conhecimento. A horta escolar como um palco para debates acerca de variadas temáticas socioambientais; um espaço democrático a ser utilizado pelos professores e alunos dos diferentes anos (séries) – da pré-escola ao nono ano – e por toda a comunidade escolar. Além de se levar em consideração as infinitas possibilidades de se enriquecer a merenda fornecendo hortaliças orgânicas produzidas pela própria comunidade escolar.

Bibliografia

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BOMBARDI, L. M. Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. São Paulo: FFLCH - USP, 2017.

COSTA, E. S.; ALEXANDRE, J. C.; FERNANDES, M. do C. A.; OLIVEIRA, M. S. de. Mapeamento do processo de desenvolvimento do projeto educando com a horta escolar. Brasília: FNDE, PNAE, FAO, 2010.

GUIMARÃES, M. A dimensão ambiental na educação. Campinas, SP: Papirus, 2015. (12ª edição)

LAYRARGUES, P. P. A dimensão freireana na Educação Ambiental. In: LOUREIRO, C. F. B.; TORRES, J. R. (org.). EDUCAÇÃO AMBIENTAL: dialogando com Paulo Freire. São Paulo, 2014. p. 7-12.

LEFF, E. Complexidade, Racionalidade Ambiental e Diálogo de Saberes. Educação & Realidade, vol. 34, núm. 3, setembro-dezembro, 2009, p. 17-24.

REIGOTA, M. O que é educação ambiental. São Paulo: Brasiliense, 2014.

ROSSI, M. O “alarmante” uso de agrotóxicos no Brasil atinge 70% dos alimentos. 2015. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/29/politica/1430321822_851653.html>. Acesso em: 20 fev. 2018.

TORRES, J. R.; FERRARI, N.; MAESTRELLI, S. R. P. Educação ambiental crítico-transformadora no contexto escolar: teoria e prática freireana. In: LOUREIRO, Carlos Frederico Bernardo; TORRES, Juliana Rezende (Org.). EDUCAÇÃO AMBIENTAL: dialogando com Paulo Freire. São Paulo: CORTEZ, 2014, v. 1, p. 13-80.

Ilustrações: Silvana Santos