Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
27/09/2019 (Nº 69) A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS PRÁTICAS DE PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL DO IPHAN – OS CADERNOS TEMÁTICOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL DO IPHAN
Link permanente: http://revistaea.org/artigo.php?idartigo=3837 
  

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS PRÁTICAS DE PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL DO IPHAN – OS CADERNOS TEMÁTICOS DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL DO IPHAN

Márcio Rosseline da Silva Ferreira

Doutorando em Ciências Ambientais (UFS). marciorosseline@bol.com.br

Giane Florentino Rodrigues de Brito

Doutora em Ciências Ambientais (UFS). giaflor@hotmail.com



Resumo

Considerando a transversalidade da Educação Ambiental, sobretudo seu caráter sistêmico e integrador, este artigo teve por objetivo analisar como as práticas institucionais de preservação do patrimônio cultural incorporaram a temática ambiental em suas ações educativas. O Iphan, órgão responsável pela tutela do patrimônio brasileiro, tem desenvolvido ações educativas desde sua fundação em 1937. Porém, a Educação Patrimonial somente será sistematiza da maneira como se conhece, a partir da implantação de um Guia Básico visando às práticas educativas patrimoniais. E, ainda que à questão ambiental tenha sido incorporada a muitas ações da instituição, a perspectiva interdisciplinar entre educação ambiental e educação patrimonial ainda não se revela satisfatoriamente. Os cadernos temáticos de educação patrimonial, publicados pelo Iphan têm abordado muito pouco sobre a importância da educação ambiental para os espaços públicos tombados pelo órgão do governo federal.

Palavras-chave: Patrimônio cultural. Educação Ambiental. Educação Patrimonial.



Abstract

Considering the transversality of Environmental Education, especially its systemic and integrative nature, this article aimed to analyze how the institutional practices of preservation of cultural heritage incorporated the environmental theme in its educational actions. Iphan, the body responsible for the protection of the Brazilian heritage, has been developing educational actions since its foundation in 1937. However, Patrimonial Education will only be systematized in the way it is known, based on the implementation of a Basic Guide to equity educational practices. And, although the environmental issue has been incorporated into many actions of the institution, the interdisciplinary perspective between environmental education and heritage education has not yet been satisfactorily revealed. The thematic booklets on heritage education published by Iphan have addressed very little about the importance of environmental education for the public spaces laid down by the federal government body.

Keywords: Cultural heritage. Environmental education. Heritage Education.



  1. Introdução

Nas pesquisas do patrimônio cultural, durante muito tempo, o conceito de cultura nunca esteve vinculado à ideia de meio ambiente natural, de modo que a abordagem acerca da integralidade das duas dimensões tem sido tratada como algo “relativamente” recente. A separação entre cultura e natureza resultou na institucionalização de órgãos culturais específicos – o Iphan, no caso brasileiro – voltados para a implantação de políticas públicas exclusivamente reservadas para a preservação cultural desvinculada da dimensão ambiental.

Somente a partir de 1975, as políticas públicas de conservação dos bens culturais passaram a ser tratada de forma integrada ao meio ambiente, graça as recomendações deliberadas pela carta patrimonial conhecida por Declaração de Amsterdã (1975). Esta carta patrimonial é um marco na irrupção do conceito de ‘patrimônio ambiental urbano’ (LEMOS, 2013), ou seja, uma nova ideia de preservação do patrimônio surgiu considerando novas perspectivas entre o patrimônio cultural e o meio ambiente urbano.

Dito isto, este artigo visa tratar de um estudo cujo tema versa sobre a educação ambiental na preservação do patrimônio histórico brasileiro, tendo em vista o projeto de preservação patrimonial Educação Patrimonial realizado pelo Iphan.

Para tanto, este artigo realizou parte de uma discussão teórica sobre a formação do campo patrimonial da preservação cultural, apontando a desvinculação com a dimensão ambiental. No entanto, conforme Funari e Pelegrini (2006), com o transcorrer das décadas, as denominadas cartas patrimoniais vão estimulando a aproximação da preservação patrimonial à concepção de meio ambiente construído e natural.

Mediante um estudo interdisciplinar, o artigo procurou analisar como o importante tema da educação ambiental tem sido abordado no campo da preservação patrimonial considerando as práticas realizadas pelo agente institucional principal da preservação patrimonial no Brasil: o Iphan.

A pesquisa partiu do princípio de que os centros históricos tombados são espaços públicos que, ao serem revitalizados, revelam os valores culturais em que ocorrem as interações entre os residentes e o ambiente reabilitado (GONÇALVES, 2002). O mesmo raciocínio se aplica as comunidades tradicionais, cuja manifestação cultural intangível se expressa num ambiente transformado em lugar antropológico.

A educação ambiental contribui, conforme tem indicado a literatura especializada, para a qualidade de vida e o bem-estar dos frequentadores e moradores do ambiente. Além de contribuir para a saúde mental e física do cidadão (LEFF, 2011). A EA é um exercício de criticidade uma vez que tende a evidenciar a degradação ambiente no espaço público estimulando ações concretas do poder público (CASCINO, 2003). Junto com a educação patrimonial, desenvolvida nas cidades históricas, a EA pode atuar como relevante exercício de cidadania, refletindo sobre a associação entre a conservação ambiental em conjunto com as áreas do patrimônio histórico.



  1. Dos conceitos e da fundamentação teórica



    1. Patrimônio Cultural e Patrimônio Natural

Derivado do latim, a palavra patrimônio, ou melhor, patrimonium, foi instituído no sentido de bens familiares que eram deixados de herança pelo pater (pai) aos seus filhos. Portanto, patrimônio consiste em bens de herança (CHOAY, 2009). Que neste caso, desde a ascensão da modernidade a partir da revolução francesa, passou a ser entendida como monumentos históricos representativos de uma identidade cultural em comum. O patrimônio cultural passou a ser objeto de preservação no tempo presente uma vez que simbolizava uma herança do passado. Segundo Choay (2009), em torno da ideia de patrimônio, surgiu a preocupação com a conservação dos monumentos históricos e com a melhor forma de organizar o passado da nação, através da institucionalização e expansão dos museus.

Por um lado, se o conceito de patrimônio cultural emergiu na Europa a partir da ação do Estado em preserva o passado cultural em comum, por outro lado, nos Estados Unidos, a modernidade se organizou em torno das discussões acerca do patrimônio natural (DRUMMOND, 2012). E, se na Europa os museus foram instituídos tendo em vista a educação patrimonial dos cidadãos europeus, nos Estados Unidos o primeiro grande resultado do precursor movimento ambiental teve como principal legado a criação do Parque Nacional de Yellowstone (1972).

De acordo com Drummond (2012), os parques naturais são símbolos da concepção de uma das correntes que emergiu nos Estados Unidos em resposta dos impactos da revolução industrial e a urbanização na América. Surgido numa área que se acreditava selvagem e vazia, o Parque de Yellowstone representara aquilo que se convencionou a ser chamado nos Estados Unidos de Wilderness, onde implicitamente se desenvolveria uma sensibilidade ambiental, portanto, os germes de uma educação de viés ambiental.

O século XX pôs a sociedade norte-americana num debate ambiental tensionado entre as concepções preservacionistas e conservacionistas. De um lado, o ativismo preservacionista de John Muir e sua visão de áreas selvagens (wilderness) sem a presença humana em seu interior (DUARTE, 2005). E, do outro lado, o emergente movimento conservacionista cuja força advinha das ideias científicas de George P. Marsh a partir dos seus trabalhos publicados acerca do impacto da ação humana sobre o meio natural e de um manejo dos recursos naturais visando o seu bom uso.

O grande salto da teoria conservacionista se deu em definitivo com a geração do engenheiro florestal Gifford Pinchot. Estudioso, ativista e, sobretudo, gestor de reservas florestais, Pinchot concebe a natureza não como um ser intocável e estético para atender os desejos de fruição humana, mas, considerando o bom uso dos recursos naturais a fim de extrair um bem-estar para a sociedade (DRUMMOND, 2012). Do conservacionismo, temas importantes foram introduzidos no campo ambiental, tais como o conceito de manejo considerado pelo movimento ambiental de viés conservacionista como o leitmotiv da ideia de sustentabilidade e a principal característica que diferencia o conservacionismo do preservacionismo. A partir das discussões ambientais, algumas terminologias foram consagradas nas ciências ambientais, tais como: manejo sustentável, unidades de conservação, desenvolvimento sustentável e educação ambiental.

Portanto, tanto o patrimônio cultural quanto o patrimônio natural surgiram no mesmo contexto histórico, ainda que em continentes diferentes. No entanto, o patrimônio cultural surgiu como “consciência” na Europa fundamentando a organização da sociedade e tutelado pelo Estado (DRUMMOND, 2012). O mesmo, comparativamente, pode ser atribuído aos caminhos trilhados pelo patrimônio natural nos Estados Unidos. Uma nova sensibilidade – “consciência” – ambiental surgiu em razão dos movimentos ambientais (preservacionismo e conservacionismo) de modo que inspiraram as práticas de conservação ambiental em todo o mundo.



    1. O Iphan e suas práticas preservacionistas

Se por um lado na Europa e nos Estados Unidos a ideia de patrimônio percorreu caminhos distintos, no Brasil, a assimilação dos modelos europeus e norte-americano auxiliou na construção da sociedade e do Estado brasileiro. O patrimônio, seja cultural ou natural, teve um papel preponderante no projeto de modernidade da qual o Brasil passou a adotar, sobretudo, a partir de 1930 com a institucionalização do Iphan em 1937 (FONSECA, 2009). E desta conjuntura que o Iphan emergiu com o papel de tutelar a cultura nacional através de uma narrativa cujo ponto de partida seria a preservação do patrimônio cultural e natural.

As práticas institucionais do Iphan consagraram primeiramente o tombamento de um monumento histórico ou monumento natural. Neste tocante, atribuía-se valor a um determinado bem cultural ou bem natural que fosse considerado de “excepcional” pelo valor nacional ou que estivessem vinculadas as glórias “memoráveis” do passado; como indicava o decreto-lei de 1937. Decreto que instituiu sua fundação:



Capítulo 1

Do patrimônio Histórico e Artístico Nacional



Artigo 1º - Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e dos bens imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.



§ 1º - os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do patrimônio histórico e artístico nacional depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro livros de tombo.



§ 2º - Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela Natureza ou agenciados pela indústria humana. (BRASIL, 2018, p. 01-02).



Porém, se nos anos de 1930 o Iphan fora erguido tendo em vista assegurar à preservação do patrimônio brasileiro através do tombamento do patrimônio cultural e natural, foi a partir dos anos 70 que a difusão do sentido de patrimônio cultural ganharia novos contornos nas práticas preservacionistas e gestão patrimonial. Além do tombamento, surgiu com Decreto-lei Nº 3.551/2000 o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial instituindo mais uma forma de preservação: o registro dos bens culturais imateriais.

Mas, o Decreto-lei Nº 3.551 (BRASIL, 2018) abriu um importante canal de perspectiva patrimonial ao aproximar o bem cultural intangível ao “contexto ecológico” dos grupos sociais dependentes do meio natural para a sobrevivência da comunidade. Conforme Emperaire (2005) Os objetos “biológicos” e “ecológicos” do ecossistema a qual se encontra inseridos os indivíduos pertencentes ao grupo social, nomeiam tais objetos e criam e recriam seus modos de fazer através da interação dos membros do grupo com o contexto ecológico, produzido e modelando os recursos naturais do meio ambiente a qual estão vinculados.

A Conferência Internacional das Nações Unidas de 1992 (Rio-92) consagrou a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB), um importante documento assinado pela cúpula da conferência uma vez que se reconhecia a necessidade dos Estados participantes em conservar os recursos biológicos das populações locais usuárias destes meios ecológicos (BRASIL, 2019). A CDB considera a diversidade ecológica um valor intrínseco, bem como valora intrinsecamente o ecológico, o genético, o social e o cultural contido nesta interação envolvendo populações locais com o contexto ecológico (EMPERAIRE, 2005).

Em comparação com o patrimônio cultural imaterial, mencionado acima, o patrimônio cultural material também é direcionado à questão ambiental. Ou seja, a cidade, como objeto de estudo, passa a ser motivo de preocupação em razão do crescimento desordenado, sobretudo se considerar que a urbanização nas cidades tombadas apresenta riscos aos seus sítios históricos.

Para alguns especialistas, o modelo de preservação adotado até 1964, nem sempre levava em conta o ambiente urbano que estava no entorno ao bem cultural tangível. As cartas patrimoniais (Carta de Veneza de 1964 e a Declaração de Amsterdã de 1975) e o desenfreado crescimento urbano, aliado a uma consciência ambiental, deu margem para que fosse criada uma nova concepção de patrimônio edificado: o Patrimônio Ambiental Urbano (MENESES, 2017). Portanto, mais uma categoria de proteção patrimonial é instituída para as práticas institucionais do Iphan.

O Patrimônio Ambiental Urbano desenvolveu uma metodologia de preservação diferente do Patrimônio Cultural Intangível, pois, enquanto este último se baseia no registro cultural dos modos de fazer, criar e se expressar das comunidades tradicionais, o primeiro consiste na prática de tombamento como política de preservação e no uso do inventário urbano (MENESES, 2017). O conceito de patrimônio ambiental urbano deu margem à ideia de patrimônio integrado dando sentido às novas diretrizes da preservação do ambiente urbano histórico.

Reconhecendo a introdução da questão ambiental no campo do patrimônio urbano, Meneses (2017) evoca a ideia de sustentabilidade que é inseparável de qualquer plano de intervenção urbanística que ocorra em cidades históricas. Mesma impressão possui Zancheti (2012), ao analisar a trajetória histórica do conceito de conservação integrada. Neste caso, ambos os autores ressaltam que a atualidade conceitual de conservação integrada, ancorada na noção de Patrimônio Ambiental Urbana, deve muito à “consciência ambiental” que, segundo os pesquisadores, “modificou e ampliou a concepção de conservação integrada” (ZANCHETI, 2012, p. 27).



    1. Educação Ambiental

A noção de natureza é considerada como resultado da construção cultural decorrente do contexto histórico vivida pelo sujeito. Ao longo da história, a maneira como a natureza foi percebida variou em conformidade tanto com o tempo histórico quanto com o espaço geográfico a qual esteve inserido uma determinada sociedade (PORTO, 2004). Porém, foi com o advento da modernidade que emergiu a concepção polarizada entre homem e natureza em que a natureza passou a ser entendida como externa ao homem, como um objeto suscetível a manipulação humana.

Entretanto, desde a publicação de pesquisas que indicavam os limites do crescimento demográfico e dos riscos do esgotamento dos recursos naturais, que passou a grassar na sociedade contemporânea uma “consciência ambiental” (REIGOTA, 2010). A Conferência de Estocolmo de 1972 e o Encontro Rio-92 têm sido tratados como marcos no que concerne a ideia de que uma sensibilidade ambiental social deve ser acompanhada pelas ações governamentais a fim de conservar o meio ambiente (GARCIA, 1993).

Entre a Conferência de Estocolmo (1972) e a Conferência do Rio de Janeiro (1992), houve em 1977 a Conferência de Tbilisi que é considerada referência para o surgimento da Educação Ambiental (REIGOTA, 2010). A EA possibilitou que emergisse uma reflexão sobre as relações entre o homem e o meio ambiente levando em conta um saber ambiental cujo conhecimento teria caráter transversal.



    1. Educação Patrimonial

Ainda que seja considerado um termo recente, a Educação Patrimonial tem suas origens, no Brasil, associada aos primeiros anos de fundação do Iphan (1937). À época, acreditava-se que a expansão dos museus, as coleções etnográficas, os acervos históricos e as exposições culturais, se constituíam num ato educativo para aqueles que frequentavam este espaço cultural (IPHAN, 2014).

Até meados de 1960, essa prática cultural prevaleceu nas ações institucionais do Iphan. Somente a partir dos anos de 1970, sobretudo com a implantação do Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC), é que a noção de educação cultural passou a ser interpretada como processo educativo de educação popular. Neste contexto, a ideia de patrimônio cultural imaterial vai ganhando força até a normatização através do Decreto-lei Nº 3.551/2000 (BRASIL, 2018) que instituiu o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial.

Entretanto, é em 1983 com o 1º Seminário sobre o uso de educacional de museus e monumentos, sediado em Petrópolis (RJ), que o termo Educação Patrimonial é finalmente introduzido no contexto cultural popular. A partir desta data, a EP passa a ser vista como estratégica para a preservação do patrimônio cultural e histórico.

E, cada vez mais incorporado às práticas institucionais do Iphan, a EP parte do pressuposto de que “conhecer é preservar”, de modo que os conteúdos culturais das comunidades são tratados nos espaços onde tais grupos estão vinculados. Nos anos de 1990, o Iphan desenvolve um Guia Básico de Educação Patrimonial tendo em vista implantar uma metodologia para a realização de uma educação dirigida para o patrimônio. Na ocasião, foi instituída as Casas do Patrimônio, que, entre diversas competências, responder pela orientação da EP através dos Cadernos Temáticos de Educação Patrimonial (IPHAN, 2014).



  1. Procedimentos Metodológicos

O presente artigo teve como principal objetivo metodológico analisar as relações aproximativas entre o campo cultural e o campo ambiental, considerando a dicotomia historicamente formada entre as duas áreas. Para isso, foi levando em conta a incorporação da temática ambiental nas práticas preservacionistas do Iphan, principal agente institucional da preservação cultural.

Assim sendo, a pesquisa visou compreender se a EP tratada no Guia Básico de Educação Patrimonial e os Cadernos Temáticos de Educação Patrimonial, contemplam a EA como estratégico na reconstrução da percepção do ambiente urbano num contexto de patrimônio histórico.

Deste modo, a pesquisa lançou mão da consulta bibliográfica (GIL, 2011) a fim de fundamentar o estudo de documentação (guias educativos e cadernos educativos) das práticas educativas do Iphan. A interdisciplinaridade e a abordagem sistêmica foram utilizadas com o fito de entender as aproximações entre a educação ambiental nos espaços de patrimonialização cultural a partir do método qualitativo.



  1. Resultados e Discussões

Foram analisados os quatro primeiros cadernos temáticos de educação patrimonial publicado pelo Iphan através da Casa do patrimônio. Assim, considerou as seguintes publicações:

  1. Educação Patrimonial: orientação ao professor (caderno temático nº 1). Neste caderno sobre EP voltado para os professores, a abordagem tem como foco o processo sistemático da EP. Como se tratou do primeiro caderno de uma série, a preocupação com os conceitos de patrimônio, memória e cultural prevaleceram sobre outros. O caderno visou lembrar acerca das diretrizes da EP e da transversalidade do mesmo.

  2. Educação Patrimonial: reflexões e práticas (caderno temático nº 2). Nesta publicação de 2012, objetivou-se explicitar as experiências das práticas educativas nos ambientes escolares de ensino formal e não-formal.

  3. Educação Patrimonial: educação, memórias e identidades (caderno temático nº 3). Caderno publicado em 2013, como indica o título visou às relações entre educação, à memória coletiva e as identidades culturais. Neste tocante, o caderno deu margem às experiências das comunidades nas suas reproduções culturais.

  4. Educação Patrimonial: diálogos entre escolas, museus e cidades (caderno temático nº 4). Publicação de 2015 este número procurou evidenciar as experiências de práticas educativas em escolas e museus através das narrativas de experiências subjetivas com a cultura.

À luz do principal documento do Iphan que orienta a EP, isto é, do Guia Básico de Educação Patrimonial editado em 1995, a metodologia da prática educativa patrimonial, não contempla a interação dos bens culturais com o meio ambiente. O Guia Básico preconiza que, “as expressões [culturais] resultantes da relação entre indivíduos e seu meio ambiente” deve ser relacionado.

No entanto, percebeu-se na pesquisa documental, que o componente ambiental e sua vertente educacional (EA), em nenhum dos cadernos temáticos analisados, consideraram a importância da EA como complemento da EP. Ainda que os cadernos temáticos reconheçam as interações do homem com o ambiente (construído ou natural), a relevância da EA para a qualidade de vida e o bem-estar do espaço público em que os atores sociais vivem não foi levando em conta nas práticas educativas.



  1. Considerações Finais.

A principal razão da existência tanto da EP quanto da EA têm sido contribuir para a formação consciente, crítica e reflexiva dos sujeitos, transformando-os em cidadãos. Portanto, há, na filosofia da EP e da EA um objetivo em estimular o exercício da cidadania daqueles que participam de suas práticas.

Para tanto, se a EP tem como propósito a ideia de “conhecer para preservar”, despertando a sensibilidade identitária do cidadão, a EA visa “conscientizar” para a importância ambiental para a qualidade de vida e bem-estar da população que faz uso dos espaços públicos ou que vivem nos espaços “territorializados” (lugar cultural). A EA aponta para as estreitas relações entre o homem e seu meio ambiente construído ou natural, fazendo sentido, portanto, em conjunto com a EP que tem por propósito a preservação dos bens culturais que estão inseridos nos espaços em que vivem as pessoas.



Referências.

BRASIL. Decreto Nº 3551/2000 (Programa Nacional do Patrimônio Imaterial) 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3551.htm. Acesso em: 27 de agosto de 2018.

___________. Convenção sobre a Diversidade Biológica. Disponível em: http://www.mma.gov.br/informma/item/7513-conven%C3%A7%C3%A3o-sobre-diversidade-biol%C3%B3gica-cdb Acessado em 03 de janeiro de 2019.

CASCINO, F. Educação Ambiental: princípios, história e formação de professores. 3ª ed. São Paulo: Editora Senac, 2003.

CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. Tradução de Luciano Vieira Machado. 4ª ed. São Paulo: Unesp, 2009.

DRUMMOND, José A. História Ambiental: fronteiras, recursos naturais e conservação da natureza. Rio de Janeiro: Editora Garamond Universitária, 2012.

DUARTE, Regina Horta. História e natureza. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2005.

EMPERAIRE, Laure. A Biodiversidade Agrícola na Amazônia Brasileira: recurso e patrimônio. In: Patrimônio Imaterial e Biodiversidade. Brasília (DF): IPHAN, 2005.

FONSECA, Maria Cecilia Londres. O Patrimônio em Processo: Trajetória da Política Federal de Preservação no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2009.

FUNARI, Pedro Paulo; PELEGRINI, Sandra de C. A. Patrimônio histórico e cultural. 1ª ed. 3ª reimpressão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

GARCIA, L. R. Educação Ambiental. Campinas (SP): Editora Papirus, 1993.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2011.

GONÇALVES, José Reginaldo S. A retórica da perda: discurso nacionalista e patrimônio cultural no Brasil. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2002.

HORTA; Mª de Lourdes P. GRUMBERG; E. Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Museu Imperial, 1999.

IPHAN. Educação Patrimonial: história, conceitos e processos. Brasília (DF): Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2014.

LEFF, Enrique. Saber Ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade e poder. Tradução de Lúcia Mathilde E. Orth. 8ª ed. Petrópolis (RJ): Editora Vozes, 2011.

LEMOS, Carlos A. C. O que é patrimônio histórico. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2013 (Coleção Primeiros Passos).

MENESES; Ulpiano T. B. O campo do patrimônio cultural: uma revisão de premissas. São Paulo: I Fórum nacional do Patrimônio Cultural Vol. 1, Conferencia Magna, p.25-39.

PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. O Desafio Ambiental. Rio de Janeiro: Editora Record, 2004.

_______________. Os (Des)caminhos do meio ambiente. 14ª ed. – São Paulo: Editora Contexto, 2006.

REIGOTA, Marcos. Meio Ambiente e Representação Social. 8ª ed. São Paulo: Cortez Editora, 2010 (Coleção questões da nossa época, v. 12).

ZACHETI; Sílvio M (org.). A Conservação do Patrimônio Integrado – Teoria e Prática. Olida (PE): Centro de Estudos da Conservação Integrada, 2012.





Ilustrações: Silvana Santos