Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Reflexão
SACI E O MILHARAL Cláudio Loes Naquele lugar, perdido no meio do nada, as pessoas não gostavam de passar. Dois caminhos se cruzavam. As pessoas que por ali passavam, faziam-no com muita pressa, afinal, era duro ser pego de surpresa pelo Saci, que vivia aprontando e ficava falando pelos cotovelos. O Saci não era mau, ele só não tinha com quem aprontar no fundo daquele grotão, de onde um dos caminhos vinha. A tapera dele, lá embaixo, era simples, ficava à beira do rio. Tudo o que ele precisava para viver, lá havia. O único problema era falta de gente e as espigas de milho. Da encruzilhada até a tapera do Saci, as pessoas plantavam milho. Elas se arriscavam, porque o Saci vivia assustando-as sustando, e a Mula-sem-cabeça também não deixava por menos. Quando o milho estava no ponto para ser comido cozido, o Saci, muito esperto, aproveitava sempre para pegar umas espigas. Tinha toda uma técnica para isso. Como ele gostava de ficar na encruzilhada, na subida, ele parava no milharal, pegava umas espigas e escondia. Assim, quando voltasse teria como levá-las, sem ser pego por ninguém, porque as pessoas já tinham medo de vir de dia, à noite, então, nem pensar. Por aqueles lados, o mato era preservado e o Curupira passeava para lá e para cá. Nesse dia, em especial, ele viu o Saci esconder as espigas e resolveu aprontar com ele. Quem diria, o Curupira dando uma de Saci! Ele foi, pegou as espigas e levou-as para a casa da Mula-sem-cabeça, do outro lado, na mata mais fechada, bem lá no alto. O Curupira voltou logo para ver a reação do Saci. Não demorou muito, e já estava anoitecendo. O Saci foi para o lugar onde tinha guardado as espigas. Não as encontrou, e ficou subindo e descendo por aquele caminho diversas vezes. Ele poderia ter se enganado e já cansado, quando resolveu voltar para sua tapera. O Curupira foi encontrar a Mula-sem-cabeça e comeram as espigas de milho, assadas no fogo. Fogo não era problema para a Mula-sem-cabeça. Ela ria muito com o Curupira, contando o ocorrido. Depois de se fartarem, ainda sobraram espigas. Decidiram levá-las para o Saci, afinal, ele tinha colhido as melhores, e feito uma boa seleção. Chegaram à tapera, de mansinho, e o Saci estava dormindo. Deixaram as espigas na soleira da porta e foram embora. Ao acordar e ver as espigas o Saci fiou intrigado. Se ele deixou-as escondidas, como foi que as espigas foram parar ali. Ele, que vivia aprontando, ficou com medo. Achou melhor colocar as espigas num saco e deixar na plantação de milho. Ele nem seguiu até a encruzilhada para assustar as pessoas. Ficou escondido, vendo quem chegaria por ali. O dono da plantação chegou com os filhos. Depois de examinar os pés de milho bem formados, viram o saco. Abriram e, para sua surpresa, estava com espigas de milho. Saci apareceu, de repente. Eles ficaram assustados e deram para ele o saco com as espigas e disseram que sempre que quisesse ele poderia se servir. E saíram correndo dali.
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