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Para a ganância, toda a natureza é insuficiente. Sêneca
ISSN 1678-0701 · Volume XXIII, Número 91 · Junho-Agosto/2025
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CONFUSÃO (Cláudio Loes) É domingo de manhã e minha editora, Bere Adams, lembrou-me, na semana passada, que esperava pela minha reflexão para a próxima edição da Revista Educação Ambiental. E uma reflexão está passeando comigo há meses — vai e volta — numa espécie de dança incerta e confusa. Digamos que ela foi, aos poucos, preparando a introdução para tratar da confusão que percebo existir na atualidade. A ideia não me parece estranha. A idade faz a memória esquecer o cardápio do último jantar, mas vasculha o passado e lembra do Dicionário de Expressões e Frases Latinas, compilado por Henerik Kocher (acesso em 25/05/25 – https://hkocher.info/minha_pagina/dicionario/0dicionario.htm ). Pesquisando, encontrei uma pérola: “Turbat aquas, ut plures capiat pisces.” Tradução: Ele agita a água para apanhar mais peixes. Pensando um pouco mais, quem quer agitar a água para apanhar mais peixes escolhe o lugar onde isso possa realmente gerar o resultado esperado. Há informações, sonares e as mais diversas tecnologias. Vamos além e olhemos para as nossas relações — tanto as mais próximas quanto aquelas dos grupos dos quais fazemos parte. Elas podem ser organizadas e previsíveis, permitindo certo planejamento dentro de uma oscilação, um risco aceitável. Imagine que você conversou com uma pessoa e julgou ser possível construir uma amizade duradoura. Os motivos podem ser os mais diversos, e há algo de bom nisso. Você se esforça para que tudo dê certo e que siga em frente. Essa é uma normalidade esperada nos relacionamentos humanos. Outro exemplo: você vai a determinados lugares naturais. Gosta de estar ali e se sente bem. Não deixa lixo e até recolhe o que outros deixaram. Afinal, pode querer voltar lá mais vezes. Nos negócios, é a mesma lógica. Você vive em sociedade e começa a perceber algo que falta, algo que as pessoas desejam. Faz-se o estudo, o planejamento, unem-se recursos — e mais sócios, dependendo da situação. Estabelece-se o negócio e ele segue em frente. No início da empreitada, é difícil; ao longo dos anos, vem a adaptação, os novos conhecimentos, e o caminho prossegue. Claro, muitos desaparecem no meio da jornada por algum erro ou risco não avaliado. Pode também ser por uma mudança no conjunto da sociedade. Um exemplo: a proibição de fumar em ambientes fechados. Percebo que, em tudo isso, temos a regularidade da água com seus peixes — um ambiente que vive de acordo com a natureza e seus mais diversos ciclos. Alguém ainda lembra-se do ciclo do carbono que estudamos no colégio? Hoje, sob meu ponto de vista, e a partir da minha experiência pessoal, a confusão aparece a todo instante. É como se fosse regra tornar tudo confuso, manter as águas agitadas para pegar mais peixes. É a “informação” que tenta convencer você a comprar algo de que nem sabia precisar. É o “tumulto geral” classificado como crime, enquanto um criminoso com recursos para se defender anda solto por aí. É a falta de conhecimento e de programas voltados a uma sociedade melhor, por parte daqueles que deveriam nos representar — e que usam os recursos em benefício próprio. É um escândalo atrás do outro, tantos que nos perdemos entre eles e nem sabemos em que terminaram. É a pessoa que você julgou ser boa e um possível amigo, que só veio pegar informações, resolver seu problema e desaparecer. É o local aonde você gostava de curtir a natureza, que agora recebeu uma tonelada de lixo — e não adianta dar queixas, porque tudo continua igual. Uma confusão feita para pegar mais peixes, que gera uma insatisfação melancólica, justamente pelo número de confusões no dia a dia. A quem isso interessa? Quem são os que se beneficiam? Como é possível resistir a tudo isso? Estamos cientes dessa confusão toda ou vamos sendo levados por ela? Minha prática é manter distância da confusão nesse sentido que apresentei. Poderíamos dialogar mais sobre a confusão e os momentos em que ela aparece sem ser para pescar mais “peixes”. Voltando ao dicionário: “Turbida sunt consilia eorum qui sibi suadent.” Tradução: São confusas as decisões dos que só se aconselham consigo mesmos. Essa seria uma variante que poderia ser abordada com mais profundidade. Manter distância da confusão não quer dizer apatia, nem deixar de reconhecê-la. Quero dizer que ela não está sob meu controle, e que só tenho a minha vontade e o uso da razão para decidir o que fazer com ela. Importa não se deixar levar pela confusão que se apresenta — e, mais ainda, não a passar adiante.
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