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A
vida como “descartável” Édison
Cardoso Teixeira1,2 1.
VIDA SILVESTRE – Grupo de Pesquisas em Ecologia e Conservação da Vida
Silvestre. Rua Arthur Bernardes, 43, Bom Sucesso, Gravataí, RS. E-mail: grupovidasilvestre@gmail.com 2.
Professor da Rede Estadual do Município de Novo Hamburgo
A discussão de assuntos relacionados ao uso de animais em experimentos
de pesquisa, seja em âmbito empresarial, científico ou mesmo de ensino não
deve mais ser encarada como algo movido pela emoção. A rejeição destes métodos
é uma questão racional, digo além disso, é uma questão de sabedoria. Alguns
autores adotaram há algum tempo uma posição cientificista nesses
assuntos, argumentando que a objetividade da ciência obriga a adotar o
postulado da neutralidade
weberiano, segundo o qual as questões éticas seriam meramente subjetivas,
irracionais ou inargumentáveis, ao passo que a ciência permaneceria no domínio
da racionalidade, da objetividade e da comunicabilidade, e por isso se recomenda
que os cientistas
deixem de lado as considerações éticas e se concentrem em um estudo
neutro dos fatos (Cortina, 2005). Porém nos dias atuais argumentos baseados na
justificativa dos fins não são mais tão indiscutíveis. Fora isto, cresce de
forma rítmica a percepção do desenvolvimento da idéia de um mundo holístico
onde cada porção do planeta possui seu valor e sua importância para o todo. A
ética não pode mais ser manipulada no sentido de que enquanto serve e defende
os interesses de alguns é valida, e a partir do momento que isto não for de
tal viável, é descartada ou vista como algo que foge a racionalidade científica. Não
é verdade que não se
pode argumentar de um modo intersubjetivamente válido sobre os fins
últimos da pesquisa científica, como tampouco é verdade que as questões éticas
em geral pertencem ao terreno do puramente emocional. Ao contrário, existem
boas razões para
afirmar que certas questões, como as apresentadas mais acima
escapam claramente ao âmbito da ciência, mas nem por isso devem ser confinadas
ao perigoso terreno da irracionalidade. Ao contrário,
a ética possui os recursos intelectuais necessários para abordar essas questões
com racionalidade, ajudando a encontrar soluções justas (Cortina, 2005). De
fato, enquanto as chamadas "éticas antropocêntricas" afirmam que o
que está em jogo nas
questões científicas são as necessidades, os interesses e os direitos das
pessoas, as chamadas "éticas centradas na vida" consideram
moralmente relevantes os interesses de todos os seres vivos. “...que
direito nós temos de subjugar estas formas de vida?” “Se
precisamos de leis para controlar e coagir quem nos causa dor e sofrimento,
porque não criamos leis que controlem
os abusos e a dor por nós causadas a estes seres?” Instituto
Nina Rosa, 2008 Exemplo
disto é a manutenção e insistência de práticas como a “Vivissecção”,
“experimentação animal”, e de “testes
em animais”. Ao ouvir estas palavras, muitas pessoas reagem com descrença ou
repulsa, ou mesmo acreditam que é “um mal necessário”. Agem assim porque
foram educadas a acreditar que esse é o único modo possível para melhorar a
saúde humana e mesmo desenvolver novos produtos a serem utilizados pelos seres
humanos com pré comprovação de sua ação não prejudicial. Na verdade, essas
palavras são somente nomes diferentes para um mesmo crime: cortar, queimar,
envenenar, torturar, enlouquecer animais vivos com o intuito de prevenir ou
curar males em seres humanos (Instituto Nina Rosa, 2008). O fato de utilizar
animais para buscar o conhecimento sobre seres humanos está baseado na semelhança
entre os seres vivos. Os animais poderiam, então, servir de modelos para nossas
doenças e reações, substituindo seres humanos em estudos sobre nós mesmos.
Mas essa semelhança, logicamente, não os dotaria também de sentimentos, emoções,
fraquezas, medos, assim como nós? Quando questionados sobre o lado ético de
fazer seres tão parecidos conosco sofrerem, os pesquisadores alegam que eles não
são tão semelhantes assim... Esse é um paradoxo que os defensores da vivissecção
não conseguem justificar. Fazemos experimentos em animais para que seres
humanos não sofram sem necessidade, traçando uma linha arbitrária que separa
as espécies que devem e as que não devem sofrer. Se os atos praticados dentro
dos laboratórios ocorressem em qualquer outro lugar, que não em “benefício
da ciência”, seus praticantes certamente seriam condenados. Além do lado ético
e moral, existe o lado científico. Os testes em animais extrapolam dados de
outras espécies para os seres humanos e os resultados não podem ser confiáveis.
Hoje, métodos modernos já poderiam ter substituído a maior parte da
experimentação animal, mas a continuidade da mentalidade opressora, baseada
somente no prestígio e no lucro, ainda assassina mais de 100 milhões de
animais todos os anos (Instituto Nina Rosa, 2008). Em última análise, esses
problemas precisam ser vistos, exatamente, como diferentes facetas de uma única
crise, que é, em grande medida, uma crise de percepção. Há soluções para
os principais problemas de nosso tempo, alguns delas até mesmo simples. Mas
requerem uma mudança radical em nossas percepções, no nosso pensamento e nos
nossos valores (Capra, 2000). Muito além disto, cria-se a necessidade de buscar
a sabedoria sobre a manutenção da vida e o entendimento do mundo. “ Em cada
átomo dos domínios da universo existem
vastos oceanos de sistemas de mundo” O grande
ornamento floral – antiga escritura budista “Assim
como o dedo de uma pessoa só pode funcionar se relacionado com a palma da mão, também os
cientistas devem estar cientes de sua conexão com a sociedade como um todo” Dalai Lama -
2006 O
novo paradigma pode ser chamado de uma visão de mundo holística, que concebe o
mundo como um todo integrado, e não como uma coleção de partes dissociadas.
Pode também ser denominado visão ecológica, se o termo "ecologia"
for empregado num sentido muito mais amplo e profundo que o usual. A percepção
ecológica profunda reconhece a independência fundamental de todos os fenômenos
e o fato de que, enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos
processos cíclicos da natureza (e, em última análise, somos dependentes
desses processos). A ciência atual é encravada em conceitos antropocêntricos,
ou centralizada no ser humano. Ela vê os seres humanos como situados acima ou
fora da natureza, como a fonte de todos os valores, e atribui apenas um valor
instrumental, ou de "uso", à natureza. A ecologia profunda não
separa seres humanos - ou qualquer outra coisa do meio ambiente natural. Ela vê
o mundo não como uma coleção de objetos isolados, mas como uma rede de fenômenos
que estão fundamentalmente interconectados e são interdependentes. A ecologia
profunda reconhece o valor intrínseco de seres vivos e concebe os seres humanos
apenas como um fio particular da formulação da vida (Capra, 2000). É uma visão
de mundo que reconhece o valor inerente da vida não-humana. Todos os seres
vivos são membros de comunidades ecológicas ligadas umas às outras numa rede
de interdependências.
De forma geral é difícil conceber esta conduta de descarte da vida –
o que leva ao questionamento do sentido da palavra humano como algo proveniente
de compaixão. Mas cabe salientar que o homem, segundo o que defendem os
pensadores, é um animal racional, o que vem a agravar seu julgamento enquanto
seres inferiores aos demais seres vivos no mundo natural em que nos inserimos.
Pois se defendemos a idéia de raciocínio, como justificar tais atos? Ao que parece dependendo dos interesses dos
homens é que a ética se desenvolve, e enquanto for assim a ética, a moral e
mesmo o direito de nada valem como ponto concreto. O homem ainda não possui uma
noção básica de valores reais. Vive na ilusão de um mundo egocêntrico por
tratar-se de um ser que se considera racional e se posiciona acima de todos os
demais seres. Desta forma suas normas morais, éticas e o direito se baseiam no
seu modo de ver o mundo. “...os
animais criados para o abate e experimentos não podem nem escolher o que comem, e
isto é uma das maiores torturas que um ser vivo com autonomia prática pode
sofrer” Instituto Nina Rosa “...a
sensação de afeto é que traz o respeito” Instituto Nina Rosa É um exercício de poder, como os utilizados
na época da escravatura: Admitir que os escravos não tinham alma.... É o que
se faz com os animais. É mais fácil não admitir esta “alma, psiquismo, fluído
(seja o que for)” dos animais, pois assim podemos usar a nosso bel prazer. Acredito que todo sofrimento humano é
proveniente do não entender de fato o mundo em que vivemos... o apego traz
sofrimento. Referências
e Leituras Sugeridas: Capra,
Fritjof, 2000. A
Teia da Vida - Uma Nova Compreensão
Científica dos Sistemas Vivos, ed.
Cultrix. Cortina,
Adela e Martinez, Emílio. Ética. São Paulo: Loyola, 2005. Dalai
Lama, 2006. O universo em um átomo. Rio de Janeiro, Ediouro. Nina Rosa: Site http://www.institutoninarosa.org.br |