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Quando pequeno, eu era
fascinado pelos heróis. Meu primeiro herói, ainda criança, foi “Nacional Kid”.
Meu pai me disse que o principal herói dele tinha sido Flash Gordon, na década
de 50. Como todo mundo, eu também tenho os meus heróis do esporte e do riso.
Meus primeiros heróis do riso foram “Os Três Patetas”. A geração de meu pai se
deliciava com as palhaçadas dos “Irmãos Marx”. Tirando os heróis do riso e do
esporte, quando falamos em heróis queremos mesmo é falar de seres com talento e
força extraordinária. Além disto, são indivíduos que realçam suas qualidades,
colocando-as a serviço da humanidade, na defesa do bem e da liberdade. É lógico que o tempo atual
também elegeu os seus heróis. Os heróis de hoje carecem deste brilho de caráter
e desta dignidade e honra que caracterizaram os heróis do passado. Fora alguns
heróis do esporte, nossos heróis costumam ser opacos em virtudes e valores
maiores. Em sua maioria, são apenas celebridades, uns pelo poder político,
outros pelo poder econômico, alguns sabichões e uns poucos pelos talentos ou
beleza física. Costumam ter vidas superficiais e serem viciosos em seus prazeres
e vaidades. Em sua maioria coincidem com os interesses da sociedade de consumo,
pois são imagens muito vendáveis. Embora eficientes em seus ofícios não passam
de caroços duros e ocos. Um bom exemplo é o talentoso cantor Michael Jackson,
que terminou seus dias como uma triste figura, que mal podia se olhar no
espelho. Nos tempos da Roma antiga, os
heróis eram heróis da guerra e do poder. A única virtude que os destemia era a
sua bravura e coragem no combate. Em Roma, o combate era o centro das virtudes
e da política. Os assassinatos e traições eram cenas costumeiras nos palácios do
poder. Nesta época, os heróis eram aqueles que se impunham pela violência e
esperteza à barbárie absoluta. Mas nem sempre foi assim. Antes
de Roma, a cultura egípcia e a grega arcaica eram radicalmente diferentes. Nem
o Egito nem o mundo Grego (fora Tróia) possuíam grandes muros protegendo suas
cidadelas e, seguramente, não tinham uma mentalidade expansionista. Na Grécia arcaica (900 até 500
anos antes de Cristo), os heróis, além de serem cantados por seus talentos e
proezas, eram muito queridos por suas qualidades espirituais e morais (Aretê).
Era exatamente a Aretê que os levava à justa medida de todas as coisas (Dick). A
falta de Aretê se dava pelo fato da Psiquê (“individualidade”) não ter se casado
com Eros (o Amor). Era a falta de Aretê que causava a desmedida, o desvario, a
vaidade e todos os vícios humanos (Hibris). Na antiguidade arcaica era o
Amor ou a falta dele que explicava todos os fenômenos do Cosmos humano. Só para
o leitor ficar informado, na Grécia existiam 100 templos para Afrodite (a Deusa
do Amor) e apenas um templo para Ares (o Deus da Guerra). Em Roma, era
justamente o contrário: 97 templos para Marte (Deus da Guerra) e apenas um
templo para Vênus (Deusa do Amor). Heróis gregos como Teseu,
Perseu, Jasão, Hércules, Úlisses, Édipo e Antígona, entre outros, vivenciaram,
na sua adolescência, um rito de passagem conhecido como: “O casamento de Eros
com Psiquê”, onde juravam que tudo o que fizessem em suas vidas seria
orientado pelo Amor e sua busca. Por isto, estes heróis nos legaram grandes
ensinamentos de dignidade e honra. Para os gregos, o próprio
destino era considerado como um caminho de afirmação do Amor. Diferente de nós
que consideramos o destino como uma coisa externa que acontece conosco, para
eles, o destino era um caminho para dentro de sí, uma comunhão consigo
mesmo, uma opção de seguir sempre aquilo que se é, uma estrada de
autoconhecimento e afirmação de sonhos, talentos e mistérios. Para os gregos, o
destino era o Amor da Vida dentro de cada um. Só amando a nós mesmos somos
capazes de amar o outro. Só respeitando aquilo que somos e mergulhando em nossos
potenciais, é que poderemos nos compartilhar com o mundo. Se alguém não segue a si mesmo,
procurando se conhecer e experimentar seus potenciais, está fora do seu destino
e condenado a viver uma vida ao sabor dos ventos da conveniência, da necessidade
e das paixões menores, longe da paz, numa existência patética, sem direção e
sentido. Uma frase da época dizia assim: “O destino acalenta quem o segue e
arrasta quem o nega”. E o mistério do destino estava no enigma da Esfínge: “Quem
é você? O que está fazendo aquí? De onde vens? Para onde vais?” Seguir a sí mesmo, ser
espontâneo, natural, verdadeiro, transparente e digno como o Amor; este era o
caminho do herói grego. O sábio Calcas, vendo que Aquiles estava incorrendo em
hipocrisia repreendeu-lhe severamente: “Escondes no teu coração aquilo que teu
rosto não revela.” A Idade de Ouro da humanidade foi o tempo em
que a aparência do ser humano coincidia com a sua essência. A essência do ser humano é o
Amor. O Amor é o seu início e a sua finalidade. Todos os seres humanos desejam
amar e serem amados. Toda pessoa quer experimentar seus potenciais e talentos.
Cada um deseja ser reconhecido pela sociedade por sua contribuição. Atualmente, bilhões de pessoas
estão desviadas do seu destino próprio, sem tempo para um encontro consigo
mesmas, vivendo uma vida de aparências, a serviço do poder econômico, comandados
por um bando de outros tantos cegos. A dura e competitiva rotina mascara a
desmotivação total e nos torna como vagabundos espirituais, que estão na vida
como num fútil passeio na busca de compensar seu vazio com conquistas materiais,
tolos passatempos e prazeres fugidios. Com toda esta confusão entre
meios e fins criamos multidões de humanos infelizes e sufocados, que se tornam
vaidosos e gananciosos, além de excessivamente sensualizados. E a doença das
pessoas está adoecendo o mundo. O mundo não vai mudar se não mudarmos as
pessoas. E as pessoas só serão transformadas pelo Amor e por Amor. Por: Dib Curi -
dib_curi@uol.com.br |