É dentro do coração do homem que o espetáculo da natureza existe; para vê-lo, é preciso senti-lo. Jean-Jacques Rousseau
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 89 · Dezembro-Fevereiro 2024/2025
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HORTA ESCOLAR COMO ESTRATÉGIA PARA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ITUPANEMA, BARCARENA, PARÁ, BRASIL Dandara Lima de Souza1; Jonathan Dias Marques2; Simon da cunha Tenório3; Italo Marlone Gomes Sampaio4; Mário Lopes da Silva Júnior5; Vânia Silva de Melo6 1Engenheira Agrônoma, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém – PA; dandaralima23@gmail.com 2Discente em Engenharia Florestal, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém – PA; jonathandiasmarques.2015@gmail.com 3Discente em Engenharia Ambiental, Estácio, Belém – PA; simon_tenorio@hotmail.com 4Doutorando em Agronomia, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém – PA; italofito@gmail.com 5Doutor em Ciências Agrárias, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém – PA; mario.silva@ufra.edu.br 6Doutora em Ciências Agrárias, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém – PA; vania.melo@ufra.edu.br
RESUMO: Objetivou-se a promoção da educação ambiental a partir da utilização da horta escolar em uma comunidade situada na região Amazônica. Conclui-se que a realização da horta escolar na Escola Municipal Noronha de Barros, se apresentou como um espaço que contribui no aprendizado dos alunos, em virtude do seu caráter interdisciplinar, assim como, incentiva o consumo de alimentos saudáveis. Palavras-Chave: Educação Ambiental, Produção orgânica, hortaliças.
ABSTRACT: the objective was to promote environmental education through the use of the school garden in a community located in the Amazon region. The school garden was presented as a viable space and capable of forming more sensitive and responsible individuals to promote environmental conservation. Keywords: Environmental Education, Organic production, vegetables.
INTRODUÇÃO O surgimento da educação ambiental se deu, inicialmente, por meio de movimentos ambientalistas (MATOS, 2009; MELO, 2019), no qual com o passar do tempo, essa temática passou a ser muito debatida e gradualmente passou a ganhar mais atenção, em vários cenários da sociedade, passando a ter cada vez mais importância no campo político e acadêmico, bem como na mídia (CRIBB, 2010). Segundo Silva et al. (2019), a educação ambiental é compreendida como uma prática do âmbito educacional que permite ao envolvido raciocinar acerca das questões ambientais, sendo muito importante para a sensibilização da população para com a qualidade de vida e com o meio ambiente, além de promover diretrizes de um desenvolvimento pautado na sustentabilidade. Dessa forma, nota-se a grande importância de trabalhar com a área da educação ambiental, tornando-se uma das exigências do âmbito educacional, uma vez que o futuro da civilização está em pauta (KRAETZIG, 2008). Assim, a educação ambiental deve ser conduzida pelo princípio da sustentabilidade, no qual, é necessário a reorientação da educação já existente, visando proporcionar o conhecimento, princípios, valores e outras virtudes voltadas para o campo sustentável, sendo importante adotar estratégias diferentes para cada nível de escolaridade (GADOTTI, 2008). Diante disso, são necessárias a promoção de atividades que aproximem as crianças dos componentes ambientais (abióticos e/ou bióticos), como exemplo dessas atividades, pode ser citada a horta escolar. Segundo Evangelista e Soares (2011), é comum observar alunos de vários níveis de escolaridade, demonstrarem problemas em aprender e discutir sobre assuntos da educação ambiental, uma vez que não compreendem o motivo de sua realização. Observa-se assim, a importância de espaços que possam abordar essa temática de forma prática e aplicada ao seu cotidiano de acordo com cada realidade. A realização de atividades na horta escolar possibilita diversos benefícios, entre eles, um maior entendimento acerca da sustentabilidade, estimula o trabalho coletivo, aproxima as crianças que moram no meio urbano da natureza (CRIBB, 2010), possibilita também melhor ensino-aprendizagem, a partir da realização de práticas, além de estimular a sensibilização e tornar as pessoas mais responsáveis em relação a assuntos de cunho ambiental (OLIVEIRA et al., 2018). Assim, a inserção da horta nas escolas é um laboratório vivo que proporciona avanços nas atividades pedagógicas que seguem o viés da educação alimentar e ambiental, relacionando a teoria com a parte prática, o que promove melhor ensino-aprendizagem (MORGADO, 2006; SANTOS et al., 2014). Além disso, é importante destacar, que quando se realiza a implantação da horta nas escolas, primordialmente, necessita haver a participação dos alunos, professores e todos os colaboradores que estão no projeto, princípios da cooperação entre indivíduos e da agroecologia, promovendo o equilíbrio entre o campo educacional e da produção de alimentos (LIMA et al., 2016). Diante do exposto, observa-se que a educação ambiental conquistada por meio da horta nas escolas contribui para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e atuarem na realidade socioambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar e posições relacionadas aos valores referentes à sua proteção e melhoria (CAPRA, 2003; CRIBB, 2018). Dessa forma, o presente trabalho teve como objetivo promover a educação ambiental por meio de práticas educativas utilizando a horta escolar em uma comunidade situada na região Amazônica, bem como estimular interesse pela alimentação saudável e a produção de alimentos orgânicos e, ao mesmo tempo, contribuir para o convívio e aprendizado de crianças, adolescentes e adultos.
MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi desenvolvido na Escola Municipal Noronha de Barros, localizada na comunidade de Itupanema, entre as coordenadas 1º 30’ 59, 43”S e 48°43'18,43"O (Figura 1). A comunidade situa-se na parte noroeste da cidade de Barcarena – PA, na margem direita do rio Pará, sendo caracterizada como uma pequena área urbana e sua população desempenha atividades voltadas para a agricultura, pesca e o pequeno comércio (TERFRON, 2005). O Município pertence a Mesorregião Metropolitana de Belém (SANTOS et al., 2016) e faz parte da microrregião de Belém, possuindo uma área territorial total de 1.310,340 km² e apresenta uma população estimada de 127.027 pessoas (IBGE, 2020). A classificação climática da Mesorregião de acordo com a classificação de Köppen é do tipo Afi, caracterizado como clima tropical úmido, o qual apresenta alta temperatura e chuvas abundantes o ano inteiro, sendo o período com maior índice pluviométrico entre os meses de dezembro e maio, com médias climáticas anuais de temperatura de 26º C, umidade relativa do ar de 85% e precipitação pluvial média anual de 2.870 mm (Santos et al., 2017). A cidade paraense tem como limites ao norte a Baía de Guajará e o Município de Belém, ao sul os municípios de Abaetetuba e Moju, a leste, além da Baía do Guajará a cidade de Acará e a oeste a Baía do Marajó. A sua vegetação primaria, foi quase completamente perdida pelo desmatamento ocorrido em substituição a produção de culturas agrícolas para a subsistência, favorecendo o surgimento de floresta secundária. Ainda, nas margens de rios e igarapés da cidade tem a predominância de florestas ciliares e de várzea, além de mangues que margeiam os rios e ilhas (PARÁ, 2011).
Figura 1 – Mapa de localização da Escola Municipal Noronha Barros na comunidade de Itupanema, cidade de Barcarena – PA. Fonte: Autores, 2020. As atividades foram realizadas no período entre janeiro e novembro de 2017, a partir do projeto “EDUCAÇÃO ECOEFICIENTE: Sociedade, Meio-Ambiente e Sustentabilidade”. O projeto é realizado pela Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), por meio do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) e tem como público alvo estudantes de escolas públicas de ensino fundamental e médio, e também agricultores. Os membros do projeto são compostos por estagiários de nível superior e profissionais técnicos da área de Ciências Agrárias, formados pelos cursos de Agronomia e Engenharia Florestal e Ciências Ambientais formado pelo curso de Engenharia Ambiental. Também possui estagiários do CEA (Centro de Educação Ambiental) que são alunos da Escola Municipal Noronha de Barros. O presente estudo está alicerçado em uma abordagem qualitativa e apoiado na metodologia da pesquisa participativa, onde, segundo Severino (2007), caracteriza-se por observações, compartilhamento de vivências e experiências dos sujeitos, onde todos são sujeitos da pesquisa, ao longo do período do estudo e das atividades executadas. Os estudantes da escola que participaram das atividades de implantação e manutenção da horta, tinham a faixa etária entre 6 e 12 anos e estavam entre o 2º e 5º período letivo. Em média, as turmas apresentavam 34 alunos, totalizando 469 alunos participantes do projeto. As atividades com os alunos ocorriam uma vez por semana. Para a implantação e manutenção da horta, foram utilizados materiais e espécies de hortaliças (Tabela 1). Vale ressaltar, que algumas espécies, como é o caso do jambu e a chicória, estão no grupo de plantas conhecidas como P.A.N.C (Plantas Alimentícias Não Convencionais), portanto, são plantas com importância regional. Dessa forma, a introdução dessas espécies possui o objetivo a manutenção da cultura alimentar da região, uma vez que pratos como o tacacá, considerado patrimônio imaterial da cidade de Belém (Silva et. al., 2020), possui o jambu como ingrediente. Tabela 1 – Materiais e hortaliças utilizadas na horta escolar da Escola Municipal Noronha de Barros, comunidade de Itupanema, Barcarena – PA
Fonte: Autores, 2020. Antes da implantação da horta e das atividades de manutenção, houve a apresentação de palestras educativas no espaço formal (Sala de aula). Assim as palestras tinham como objetivos destacar a importância da horta escolar como espaço para discussão sobre segurança alimentar, produção de alimentos orgânicos, preservação do meio ambiente, gestão de resíduos (uso de composto orgânico e garrafas PET- Tereftalato de Polietileno) e características gerais das espécies de hortaliças que seriam implantadas (Figura 2).
Figura 2 – Apresentação sobre a importância horta por meio de palestras educativas em sala de aula. Fonte: Autores, 2017. Após o período de palestras, o segundo passo foram as atividades na horta que foram executadas com os membros do projeto, nesse caso estudantes estagiários do CEA, estagiários de ensino superior e técnicos responsáveis pelo gerenciamento do projeto, alunos e professores. As atividades tiveram as seguintes etapas: preparo do solo; semeadura- em que foram apresentadas as formas de semear; plantio; e cuidados gerais das plantas até a colheita. Dessa forma, em todos os processos os estudantes puderam conhecer as diferentes plantas, assim como, estreitar o seu contato com a natureza. Além disso, era estimulado a introdução das hortaliças no preparo da alimentação escolar.
RESULTADOS E DISCUSSÃO De maneira geral, as palestras, bem como a implantação e manutenção da horta, levaram assuntos que permeiam a questão produtiva, de cidadania e saúde, segurança alimentar, além do contexto histórico da agricultura e sua relação com o ambiente. Além disso, tais ações deixaram evidente que todos devem e podem se envolver no processo da formação da horta escolar. Adicionalmente, esta atividade possibilita uma ligação mais estreita entre os educandos e a natureza, o que pode promover a redução de uma relação conflituosa e dominadora que ocorre entre o homem e a natureza (NAVES & BERNARDES, 2014). Segundo Gadotti (2008), a estratégia que deve ser adotada para o ensino da sustentabilidade para o nível de ensino primário, é por meio da vivencia do aluno diretamente com o meio ambiente. Neste sentido, a realização do projeto horta na escola, permite um maior contato dos estudantes com o solo, por meio do seu preparo, além de passarem a entender melhor e associar os ciclos dos vegetais desde a sua semeadura até a fase de colheita, percebendo a importância das hortas no ambiente escolar, da sustentabilidade e do trabalho coletivo, além de aprenderem a ter respeito pela terra (FIOROTTI et al., 2011). Assim, a relação de proximidade com os recursos da natureza deve ocasionar uma mudança de valores e atitudes dos sujeitos envolvidos na horta. Dessa forma, percebeu-se que o contato com a horta e suas rotinas na Escola Noronha de Barros, despertou grande interesse por parte dos alunos e professores, observando-se significativa satisfação e prazer dos alunos ao realizarem as atividades de rotina da horta (Figura 3).
Figura 3 – Contato dos alunos com os componentes do meio ambiente e a felicidade na realização das atividades. Fonte: Autores, 2017 Quanto a etapa de implantação e manutenção da horta, verificou-se interesse dos alunos na realização das atividades. Isso ocorreu devido a participação ativa dos mesmos no preparo do solo, na semeadura e no plantio, bem como no manejo (cuidado) diário do cultivo (Figura 4). Além disso, ressalta-se que um dos fatores que viabilizou a implantação e cuidado da horta, foi a participação dos estagiários e técnicos do CEA, pois apesar de as crianças estarem participando ativamente das atividades, a ausência de conhecimentos técnicos mais aprofundados e de prática impediam a realização de algumas atividades, como a adubação, fato que poderia comprometer a produção.
Figura 4 – Orientação sobre as atividades a serem realizadas na horta escolar (A e B), preparo da área e colheita de plantas (C e D) e plantios de mudas de hortaliças (E e F), Itupanema, Pará, 2017. Fonte: Autores, 2017.
Santos et al. (2014), avaliando a importância da horta na Escola Municipal de Ensino Fundamental Tertuliano Pereira de Araújo, cidade de Picuí – PB, como instrumento motivador do processo de ensino-aprendizagem, de sensibilização socioambiental e na mudança de hábitos alimentares, observaram grande engajamento dos alunos e professores na realização das atividades na horta. Da mesma forma, Santos et al. (2020), observaram que a criação da horta na Escola Estadual Thomé de Medeiros Raposo, cidade de Coari – AM, promoveu união, cooperativismo e uma maior responsabilidade por parte dos alunos. Bai Filho et al. (2014), avaliando o efeito de uma horta de base agroecológica localizada no munícipio de Curitibanos (SC) na mudança de hábito alimentar de crianças do ensino fundamental (4 e 5º ano), observaram que a participação dos acadêmicos de Ciências Agrárias foi um dos fatores que possibilitou a implantação e manutenção da horta agroecológica na escola, onde afirmam que por meio dessa ação integrada (crianças, professores e acadêmicos) evitaram-se possíveis problemas ao desenvolvimento das culturas. Portanto, estes resultados corroboram com os obtidos na Vila de Itupanema, demonstrando que essa relação é exitosa tanto na formação dos acadêmicos, pois colocam os conhecimentos em prática, como dos alunos devido a introdução de novos conhecimentos. Ainda, quanto aos aspectos de produção das hortaliças, ressalta-se que as culturas foram produzidas seguindo princípios de produção orgânica de alimentos. Nessa oportunidade, destacou-se a importância da produção desse tipo de alimento para a preservação do ambiente e na promoção da saúde. Segundo Cunha et al. (2010), o uso dos alimentos orgânicos produzidos pelos alunos em espaço escolar, pode abrir possibilidades de novas abordagens educativas para estudantes, e de toda comunidade escolar. Em adição, a horta orgânica produz alimentos livres de agrotóxicos (SILVA et al., 2017), além de enriquecer o cardápio das escolas com uma alimentação mais nutritiva (PIMENTA & RODRIGUES, 2011), melhorando assim a saúde alimentar, pois, esses alimentos conseguem controlar e também evitam doenças, como a diabetes e a obesidade, entre outros benefícios (LUCENA et al., 2015). Quanto a interdisciplinaridade, observou-se que no decorrer ficou evidente a relação que a horta escolar teve com as disciplinas seja ela matemática, ciências, dentre outras (Figura 5). Pois, a partir da análise dos professores da escola, constatou-se maior rendimento no ensino-aprendizagem dos alunos que frequentavam a horta, visto que, os professores sempre que possível, relacionavam suas disciplinas com a horta e todos os seus componentes. Resultados semelhantes foram obtidos nos estudos de Santos et al. (2014) e Oliveira et al. (2018), em que esses autores constataram que a horta escolar é uma excelente ferramenta pedagógica, pois promove um melhor ensino-aprendizagem devido a uma maior interdisciplinaridade. Segundo Silva et al. (2015), o professor é agente social de primordial importância para a formação de pessoas, que após isso se tornam multiplicadoras dos saberes ambientais.
Figura 5 – Melhor interação entre professores e alunos, por meio da horta escolar. Fonte: Autores, 2017. Dessa forma, observa-se que a horta escolar é uma excelente aliada para promover a educação ambiental, uma vez que, conscientiza, socializa, aproxima o indivíduo da natureza, melhora os hábitos alimentares, estimula o trabalho coletivo, de forma geral transforma a forma de viver das pessoas, propicia a interdisciplinaridade, melhora o ensino-aprendizagem, entre vários outros benefícios. Todas essas vantagens de trabalhar com a horta escolar foram identificadas na realização desse projeto na Escola Municipal Noronha de Barros em Barcarena (Vila de Itupanema), assim como, em diversos outros trabalhos feitos, entre eles, por Silva et al. (2015) que trabalharam com a horta escolar na Escola Municipal de Educação Básica Guilherme Calheiros, na cidade de Flexeiras – AL; Silva et al. (2016) que realizou atividades na Escola Doutor José Correia Filho localizado no povoado de Jardim Cordeiro, município de Delmiro Gouveia – AL; e Silva et al. (2018) na Escola Municipal Dom Bosco, localizada na cidade de Recife – PE .
CONCLUSÃO A realização de atividades de educação ambiental tendo a horta escolar como um ponto consolidador na formação de cidadãos mais sensíveis e responsáveis em promover a conservação ambiental, bem como de serem agentes multiplicadores dessa conservação, mostrou-se como um espaço viável e capaz de alcançar tais propósitos. Além disso, a horta escolar na Escola Municipal Noronha de Barros, mostrou-se como um espaço não formal que contribui no aprendizado dos alunos, devido ao seu caráter interdisciplinar, bem como estimula o consumo de alimentos saudáveis.
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