Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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REDE BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL: 10 anos construindo relações cidadãs para uma sociedade sustentável Vivianne Amaral, facilitadora e secretaria executiva da Rede Brasileira de Educação Ambiental. rebea@uol.com.br 1. Um pouco de história A Rede Brasileira de Educação Ambiental – REBEA tem origem no ambiente dos Fóruns de Educação Ambiental promovidos em São Paulo nos anos 90, por uma articulação de ongs, universidades e órgãos governamentais. Podemos identificar na Rede, desde seu início, a vocação e o objetivo de uma articulação nacional dos educadores brasileiros. No II Fórum, em 1992, no clima que antecedia a Eco92, é lançada a idéia de uma Rede Brasileira de Educação Ambiental. Adotou-se como carta de princípios o “Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global” e como padrão organizacional uma estrutura horizontal em rede, formato que apresenta possibilidades inovadoras no campo relacional, político e operacional e tem surgido como uma alternativa da sociedade organizada para enfrentar situações complexas, onde ações isoladas não apresentam resultados. O III Fórum, realizado 1994, em São Paulo, reforça o compromisso dos educadores em torno da REBEA e a articulação e comunicação posteriores consolidam a Rede. “A intenção era ampliar experiências locais, possibilitar o intercâmbio, pressionar por políticas públicas para atender as demandas de base”, explica Marcos Sorrentino , um dos articuladores. A história da organização das redes de educadores ambientais no Brasil teve um avanço significativo em 1995, durante a realização do III Fórum de Educação Ambiental. Pela dimensão que o evento alcançou, reunindo educadores ambientais do Brasil inteiro, os organizadores assumem como a nacionalização dos Fóruns e a necessidade de fomentar uma comunicação continuada entre os educadores presentes ou não aos eventos. Segundo Sorrentino, “Já no início do III Fórum seus organizadores tinham a clareza que o evento não pertencia e não retratava a educação ambiental somente de São Paulo. De todas as regiões do país centenas de pessoas e trabalhos estavam inscritos. Tinha-se clareza, também, que a continuidade da caminhada e na direção dos objetivos apontados não poderia se limitar aos momentos de encontros presenciais. Era necessário fomentar uma comunicação continuada entre os educadores presentes ou não aos Fóruns. para consolidar a realização dos Fóruns optou-se por realizar os encontros seguintes fora do estado de São Paulo e sob a coordenação da Rede Brasileira de Educação Ambiental”. Assim, a partir do III Fórum os eventos ficaram sob a coordenação da Rede Brasileira. O IV Fórum realizado em Guarapari, Espírito Santo, em agosto de 1997, foi um momento rico para a consolidação da Rede Brasileira e para o fortalecimento de metodologias e práticas voltadas para a EA no país. Sua realização, precedida pelos fóruns regionais, expande a Rede no país, estruturando sua malha em abrangência nacional, com as instituições parceiras atuando como nós de uma grande rede. Os Pré-Fóruns democratizaram a realização do IV Fórum permitindo que educadores sem condições de participar das discussões em Guarapari pudessem contribuir nos encontros regionais. O período pré IV Fórum durou 5 meses, de março a julho de 97. Nele foram realizados 8 Pré-Fóruns, os quais envolveram 39 entidades em sua organização. A articulação representou um avanço na organização dos educadores ambientais brasileiros e da própria REBEA. Apesar do refluxo natural vivido após o IV Fórum, a REBEA continuou o trabalho de articulação nacional, apoiando a criação de novas redes, difundindo a cultura de redes e procurando alternativas para sua atuação. Participou ativamente do trabalho de discussão da regulamentação da Lei da Política Nacional de Educação Ambiental, por ocasião de sua análise na câmara técnica de Educação Ambiental no CONAMA. Através de elos locais e regionais foram realizadas reuniões para apresentar propostas para a regulamentação e a REBEA participou de reunião da Câmara Técnica de EA, em Brasília. Cumprindo seu propósito de difusão da cultura de redes e apoiando a criação de novas redes, a Rede Brasileira participa de eventos em todo o Brasil. A partir de 96 e tendo como data chave o ano de 1997, considerado o ano da educação ambiental devido aos inúmeros eventos de EA que aconteceram, passaram a atuar as seguintes redes: Rede de Educação Ambiental de São Carlos- SP, Rede Mineira de Educação Ambiental - RMEA (1º Assembléia Geral em novembro de 1997), Rede Mato-grossense de Educação Ambiental REMTEA (Seminário Panorama atual da Educação Ambiental – Conjunto de Painéis sobre Educação Ambiental), Rede de Educação Ambiental da Paraíba – REA/Pb (Iº Conferência Nacional de Educação Ambiental – 1997, comissão provisória) Rede de Educação Ambiental da Bacia do Vale do Itajaí – REABRI (Compromisso de Blumenau – Iº Conferência de Educação Ambiental da Bacia Hidrográfica, novembro de 99), Rede Paulista de Educação Ambiental – REPEA (rearticulação a partir de Encontro Estadual de EA, em 1999) . Em setembro de 2000, a REBEA realizou no Rio de Janeiro, com apoio da RITS – Rede de Informações para o Terceiro Setor e da WWF Brasil a reunião “Cultura de Rede e Educação Ambiental”, momento rico de reflexão sobre o fazer redes de educadores ambientais em diversos locais do país. Desde 2001 a Rede Brasileira e redes elos trabalham ativamente na construção da parceria com o Programa Nacional de Educação Ambiental com o objetivo comum da estruturação do Sistema Brasileiro de Informações sobre Educação Ambiental e Práticas Sustentáveis, projeto do Ministério de Meio Ambiente. O Sistema, um banco de dados com site na web, atende à necessidade de democratizar o acesso às informações ambientais, necessárias para a implementação da Educação Ambiental. 2. Sobre a experiência de trabalhar em rede Os dez anos de história da REBEA são dez anos de teste da força mobilizadora de uma idéia: a de que é possível vivenciar outras formas de organização e de relações de poder que não contradigam, em sua natureza e no cotidiano, as propostas democráticas, emancipadoras da Educação Ambiental. Muito da energia ainda tem sido empregada para vencer a cultura tradicional a que estamos acostumados e que vivemos nas nossas instituições. Nesse sentido, a experiência de implementar a cultura organizacional de rede revela-se uma experiência política transformadora. A estrutura horizontal em rede rompe com as relações tradicionais, piramidais, de poder e de representação, possibilitando a vivenciar nas relações sociais e políticas as idéias e princípios que defendemos. Organizar-se em rede resgata a radicalidade de propostas libertárias e a fé no ser humano como um ser de afetividade e liberdade. Na rede o poder que tradicionalmente é vivido como poder sobre os outros ou sobre as coisas surge como potência de realizar objetivos compartilhados. É claro que “a rede ‘simbiótica’, na qual todos os atores colaboram com uma obra comum em pé de igualdade e com zelo permanente, não existe, é ilusória”. O que há é um esforço individual e coletivo para superação da cultura autoritária. As redes questionam frontalmente as relações interpessoais e interinstitucionais de poder. Participar verdadeiramente de uma rede implica em aceitar o desafio de rever as formas totalitárias de comportamento as quais estamos acostumados e que reproduzimos apesar dos discursos e intenções democratizantes. Como numa rede tem poder quem tem iniciativa, a localização do poder muda constantemente e não se concentra num só lugar. Esse fenômeno causa um certo atordoamento, já que estamos acostumados a obedecer ou mandar, a partir de funções fixas, determinadas hierarquicamente. Não estamos acostumados a decidir e compartilhar. Não temos o hábito de conviver com diversos focos de poder atuando simultaneamente e de forma independente, ao mesmo tempo, compartilhando objetivos comuns, numa só estrutura. Isso é novo e salutar. Nesse sentido, participar de uma rede, com radicalidade, assumindo seus fundamentos, representa uma revolução política individual, uma nova forma de organizar e vivenciar espaços de poder. A matéria prima das redes são as pessoas, pois as redes sociais são basicamente estruturas de comunicação por onde circulam informações. E quem se comunica são indivíduos, pessoas. A sustentabilidade das redes repousa e depende do interesse das pessoas em se comunicarem e compartilharem seus conhecimentos, seus anseios, seus objetivos. Por isso um dos maiores desafios dos animadores ou facilitadores das redes é estimular e manter a conectividade dos participantes. As redes não substituem as organizações piramidais e não são alternativas para todos os tipos de organizações e objetivos. É impensável uma igreja ou um exército com a organização horizontal. No entanto, as redes são estruturas adequadas a todos os objetivos de empoderamento e emancipação da sociedade, o que explica a atração que têm para os educadores ambientais, comprometidos com a consolidação de cidadania local e planetária. |