Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Entrevistas
11/09/2016 (Nº 57) ENTREVISTA COM KARINA BRUNO PARA A 57ª EDIÇÃO DA REVISTA VIRTUAL EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM AÇÃO
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ENTREVISTA COM KARINA BRUNO PARA A 57ª EDIÇÃO DA REVISTA VIRTUAL EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM AÇÃO

Por Bere Adams

 

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Apresentação - A entrevistada desta edição é Karina Bruno. Ela atua como Estrategista Social, Palestrante, Conferencista no Instituto Internacional e Socioambiental Chico Mendes e é Diretora da empresa de consultoria Sustentabilidade Ideal. É graduada em Comunicação Social – Marketing pela Universidade Anhembi Morumbi. Pós-Graduada Coaching. Possui o Master of Business Administration (MBA), Empreendedorismo & Inovação, na BI Business International, instituição coligada à Havard, MTI e Xangai University. Com especialização em Redes Digitais, Terceiro Setor e Sustentabilidade Aplicada - Novo Homo Sapiens Tecnológico Sustentável, pela USP. Então, vamos ao que interessa, conhecer e aprender com suas experiências!

Bere – Prezada Karina! É um imenso prazer tê-la como entrevistada desta edição, muito obrigada por aceitar a este convite! A temática ambiental é, atualmente, uma temática que exige maior atenção por parte de todos nós, porém, muitas pessoas ainda não dão a devida atenção ao assunto, enquanto outras há muito tempo, já se sensibilizaram, destacando algum acontecimento específico. E com você, o que te inspirou para se dedicar às questões ambientais, e há quanto tempo se dedica a esta temática?

Karina – Bere, em primeiro lugar, quero muito agradecer a oportunidade e dizer que sou sua fã, acompanho o seu trabalho que certamente é muito inspirador, educativo e necessário.

Comecei a trabalhar muito jovem. Eu tinha 13 anos quando tive meu primeiro registro em carteira. Naquela época podia-se trabalhar nessa idade, e não tenho vergonha alguma em dizer que já fui auxiliar de office boy. Depois passei para área administrativa, e a vida foi me levando de emprego a emprego, sempre na área da comunicação e desenvolvimento de mercado, até “cair” na construção civil, aos 21 anos.

Através de um convite de uma grande amiga, conheci a SOBROSA construtora, primeira construtora que trabalhei. Lembro-me bem que para ter uma renda digna, antes de trabalhar na construtora, eu trabalhava em quatro lugares simultaneamente.  Morava em Santo André e, portanto, tinha quatro empregos.

Fui Hostess em um restaurante muito conceituado do Grande ABC, trabalhava na Revista ABC dos Empresários na parte editorial e de negócios. Trabalhei, também, no Diário do Grande ABC, na área dos anunciantes. Por fim, no meu dia de folga do restaurante (porque a puxada lá era forte: de segunda a segunda, rsrsrs) ainda fazia um programa na TV - Rede Vida de Televisão - com abrangência nacional, que era veiculado todos os sábados, às 8h da manhã. Puxa Bere, você está me fazendo relembrar tantas coisas, de tempos difíceis, mas muitas coisas boas também.

Vim de uma família muito humilde, mas sempre me esforcei para estudar muito. Não me vejo longe de uma sala de aula, seja como aluna, seja como educadora. Aprender e poder replicar, de alguma forma, o que foi aprendido, não tem preço! Nossa querida Cora já dizia: “Feliz é aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. Empreendi algumas vezes, na área da Beleza, (Idealize Fashion Hair) com uma clínica de estética, e na área da Engenharia e Arquitetura, com uma empresa focada em decoração e acabamentos de obras, a IDEAL, que ainda hoje se encontra atuante no mercado.

Pisei muito no “barro” e subi muitas escadas nos prédios em construção. Foi uma grande escola pra mim, porque eu ficava direto nas obras, fazendo as medições e a gestão “in loco” de tudo que precisava. “Meus meninos”, como carinhosamente eu gostava de chamar os meus colaboradores, que eram exemplares. Dedicação, esforço e muito trabalho, desde cedo, bem cedo. Todos os dias, às 7h já estávamos na obra, inclusive eu. Botas de biqueira de aço, capacete, protetor auricular e óculos de proteção compunham o meu uniforme. Consegui aprender um pouco na prática o dia a dia de grandes corporações. Construtoras, empreiteiras, empresas fornecedoras de material, de mão de obra, e era incrível o volume de insumos que gerávamos, de resíduos, e quantos impactos negativos causávamos para se fazer uma obra. Desde a desmobilização de pessoas e comunidades alojadas, até milhares de caçambas de lixo e/ ou resíduos, que muitas vezes viravam lixo mesmo, porque não havia uma separação efetiva dos materiais na hora do descarte. Fui então me especializar, e fiz vários cursos direcionados a esse segmento de mercado na Academia Engenharia e Arquitetura.

Hoje, posso dizer que, embora todos esses percalços e com 25 (vinte e cinco) anos de experiência profissional, dentre os quais 15 (quinze) focados na área da construção civil, notei, de forma literal e sentindo na pele mesmo, o quanto há desperdícios em materiais, produtos, mão de obra, valorização humana, tempo, dinheiro e, consequentemente, a própria vida mesmo! Mas nada é pior do que a perda da biodiversidade e da destruição do nosso bem mais precioso: o Planeta Terra, a nossa Gaya,  a nossa Pacha Mama.

Ainda vale ressaltar que, embora grande parte dessas obras receberam certificado Green Building  e, consequentemente, as empresas fornecedoras (incluindo a minha, na época a IDEAL FORROS E DIVISÓRIAS http://www.idealforros.com.br/) tivesse que respeitar e obedecer todos os critérios e procedimentos desse tipo de certificação, ainda assim, o impacto era muito violento e eu, particularmente, não conseguia trabalhar mais com amor e dedicação, uma vez que sabia que poderia contribuir para mais desperdícios e impactos ambientais.

Em função disso, e preocupada em fazer minimamente a minha parte nesse planeta, redirecionei 100% minha carreira para Sustentabilidade, Meio Ambiente, Ecologia e Responsabilidade Social. Comecei como voluntária dando aulas de Sustentabilidade Corporativa para algumas ONG´s da Grande São Paulo e depois expandi para o interior paulista, até ter a chance de abrir a minha própria consultoria, a Sustentabilidade Ideal. Através de um artigo “Sustentabilidade não é apenas um tema, um modismo”, fui convidada a conhecer o Instituto de Pesquisa e Responsabilidade Socioambiental Chico Mendes (INPRA) e hoje represento o Instituto aqui no Brasil e fora também. Desenvolvemos projetos específicos de cunho social e ambiental, e temos alguns programas para certificação socioambiental. Somos coligados à ONU e a ao Pacto Global, onde respondemos às normativas da ODSM e a agenda XXl.

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Turma: Jovem Aprendizes – Aula Sustentabilidade Corporativa Local: NAIA Núcleo Assistencial Irmãos Alfredo - São Paulo – Brooklin (Imagem disponibilizada pela entrevistada)

Bere – Realmente foi uma longa e árdua jornada, Karina, cheia de desafios e descobertas - desde muito cedo -, com experiências que te sensibilizaram e te motivaram a “abraçar” as questões ambientais. Agora, fale-nos um pouco sobre o trabalho desenvolvido pela sua empresa Sustentabilidade Ideal:

Karina – O nosso objetivo, acima de tudo, é aplicar na íntegra o conceito de respeito humano ao ambiente, promovendo o repensar antes de consumir! Essa é a nossa principal missão. Mudar o conceito de ser feliz para consumir ou consumir para ser feliz, aplicado deliberadamente pelos EUA após a segunda Guerra Mundial com o fenômeno dos “BabysBoomers”.

Assim, a nossa meta se desdobra em promover o repensar antes de consumir, recusar os produtos que agridam a saúde e o ambiente, reutilizar e reciclar (quando possível) insumos gerados a partir de quaisquer bases, novas ideias para compor uma visão holística e responsável de descartes, bem como o entendimento da cadeia logística reversa e responsabilidade sobre o ciclo de vida de cada produto. Só assim poderemos enriquecer o nosso mundo de forma genuína e sustentável. 

Ainda temos o Núcleo de Palestras, Cursos, Seminários e Workshops, para empresas, ONG´s e instituições de ensino público e privada.

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Turma: Jovem Aprendizes – Aula Sustentabilidade Corporativa Local: NAIA Núcleo Assistencial Irmãos Alfredo - São Paulo - Brooklin

 

Bere – Cite alguns projetos desenvolvidos pela Sustentabilidade Ideal que você considera mais significativos e que têm o enfoque na Educação Ambiental:

Karina –

è Flor da Sustentabilidade, as pétalas da perenidade.

è Biotecnologia sustentável, economia e inovação.

è Sustentabilidade corporativa, responsabilidade compartilhada.

è Eliminação de desperdícios. (água, ar, terra, tempo).

è Árvores: um bem universal.

è Eco Educação para Jovens Aprendizes.

è Importância destinação Resíduos Sólidos.

è Logística reversa e respectivas responsabilidades.

è Crise Hídrica: conscientização, informação e ação!

è Energia limpa e renovável, o futuro é agora.

è Descontinuidade de eletrônicos, a renovação através dos insumos descartáveis.

è Lixo ou Resíduo, eis a questão?

è Densidade Demográfica x Consumo x Recursos Naturais

è Consumo Consciente, economia circular.

è Gestão Evolutiva: do extrativismo a geração de valor sustentável.

Bere – E do público que você atende, qual deles se mostra mais engajado, ou mais envolvido na busca de soluções para os problemas ambientais, e quais as dificuldades?

Karina – Olha Bere, ainda encontramos resistências por parte de algumas corporações públicas e privadas para aderirem aos nossos programas e projetos, mas, como eu sempre digo, sou entusiasta por natureza e acredito sempre no “copo-meio-cheio”. Por incrível que pareça, o setor industrial vem se desenvolvendo de forma bem estruturada, não só para atender as leis, como também para serem vanguardas em algumas questões. Tomamos como exemplo algumas indústrias do setor bebidas/ alimentícios, que tem todo um processo bastante virtuoso em sua cadeia logística e gestão. Recentemente estava em Petrópolis e fomos convidados para palestrar na semana do SIPAT, e fui fazer um tour na indústria. Surpreendeu-me, de forma positiva, todos os procedimentos éticos e ambientais, desde a coleta e separação dos resíduos sólidos e orgânicos gerados, até o tratamento minuciosamente implementado da água para retornar a natureza, (Pasme!) mais pura do que o próprio rio que passava na região, já um pouco poluído. Além da logística reversa, também bastante avançada, a preocupação ambiental no sentido da educação e capacitação de crianças e jovens nas comunidades do entorno. Dei esse exemplo, porque está recente e fresquinho na minha cabeça, mas tenho sempre a chance de visitar muitas organizações e, como eu disse, sou entusiasta e fico muito feliz que as coisas estão sim acontecendo, de forma gradativa ainda, mas estão acontecendo sim.

Bere – Concordo com você, Karina, em manter vivo o entusiasmo e transformar as dificuldades em desafios para que as mudanças almejadas aconteçam! Não é o caminho mais fácil que nos leva às soluções, e nossas experiências comprovam isto não é? E você tem algumas práticas de Educação Ambiental com crianças e jovens?

Karina - Ahhh, agora você pegou no meu ponto fraco. É a minha paixão, e essa foi uma das principais questões que me fez mudar de vida. Quando comecei a dar aulas como voluntárias nessas ONG´s que te falei, percebi que muitos desses jovens aprendizes, eram “arrimo de família”, e acabei, de certa forma, me identificando na hora, porque como comecei a trabalhar muito cedo, sei o quanto é desgastante você ter que acordar as 4 horas da manhã, pegar todas as conduções, trabalhar, a noite ir para escola ou faculdade, muitas vezes sem se alimentar, estudar até quase meia noite, pegar todas as conduções de volta e ir pra casa tentar dormir umas 3 ou 4 horas para no outro dia começar tudo de novo. Por isso as minhas aulas eram leves, lúdicas, na maioria das vezes com vídeos, muitas figuras e imagens, mas ninguém escapava das provinhas não!

Então, Berê, acredito que a sinergia foi imediata, porque eu falava a mesma linguagem deles. Foram 3 anos muito gratificantes, e hoje muitos deles, a maioria eu diria, são meus amigos mesmo. Me acompanham, e eu também, na medida do possível, os acompanho. Alguns já ingressaram na faculdade, outros conseguiram um bom emprego e isso tudo não há dinheiro no mundo que pague. O Voluntariado só é gratuito porque realmente não tem preço!

Bere – É muito gratificante poder perceber, com clareza, quando se faz a diferença, Karina, e certamente você fez muita diferença na vida desses “meninos e meninas”, assim como eles e elas também fizeram a diferença na sua. Muito linda mesmo a sua experiência voluntária e quando a amizade dos alunos se perpetua, realmente, não tem preço! Parabéns! E qual é, para você, a importância da Educação Ambiental neste mundo tão multifacetado e interdisciplinar, apesar de fragmentado?

Karina – A Educação Ambiental é a base para a mudança! É a única forma que temos para “consertar” o que quebramos, e é a relação mais necessária hoje, para transformar mentes que até então eram programadas para destruir e consumir, independente da ordem dos fatores. A EA é a reestruturação de base para que possamos, dessa vez, fazer a coisa de forma mais planejada, conectada. É a percepção cada vez mais forte de que somos todos interdependes.

Bere – Eu também acredito nisto, Karina, que a EA é a base para as necessárias mudanças, e penso que uma das maiores dificuldades que nós temos é mudar hábitos, e por isso é tão difícil, por vezes, alcançar o objetivo da mudança. Mas, com o compartilhamento de experiências, práticas, vivências aliadas e alinhadas com diferentes metodologias e teorias, é possível aprimorar as nossas ações educacionais e promover mudanças, mesmo que por vezes imperceptíveis, através da EA! Temos, para nos apoiar, maravilhosas publicações à nossa disposição, e autores inspiradores! Quais são os autores que te inspiram?

Karina – Gosto demais do Sebastião Salgado, que tem uma visão holística e uma experiência, uma vivência inigualável. Gosto do Amir Klink, baita estrategista. Quero ainda citar André Henrique Rosa, contemporâneo autor de um livro-bíblia: Meio Ambiente e Sustentabilidade, muito acadêmico. Aprecio o trabalho do Luciano Munk, na questão da gestão corporativa. Leonardo Boff, um ícone. Agora a versão 4.0 do Plano de Lester Brown é simplesmente um fenômeno de interpretação e integração sistêmica de grandes pesquisas. Cada vez que leio Brown percebo o quanto eu ainda não sei. Eterna aprendiz. Não posso deixar de citar meu querido mestre da USP, Massimo Di Felice com o pragmático livro: Redes Digitais e Sustentabilidade, a interação com o meio ambiente na Era da informação.  Hoje meu livro de cabeceira é: O Amor fecunda o Universo – ecologia e espiritualidade de Marcelo Barros e Frei BETTO.

Bere – Estas tuas indicações de leitura dos autores que te inspiram são riquíssimas e certamente vão inspirar mais e mais pessoas, Karina. Agora, sobre empresas e governo, como você percebe a responsabilidade ambiental destes dois setores?

Karina – Berê, percebo que cada vez mais as empresas têm se movimentado para fazer algo independente do governo. Hoje já há, por exemplo, o chamado ICMS Verde, mas se você pegar a lei e for ler a fundo, existe muitas lacunas e ainda está passando por algumas revisões para ser mais efetivo. O que me anima é que as corporações estão, sim, se movimentando, mas eu ainda acredito que todo esse movimento se dá, principalmente, por conta do consumidor.

Estamos cada vez mais exigentes, hoje, e com o poder das mídias sociais ninguém quer ver seu nome explorado de forma negativa, por isso, mesmo que as grandes corporações ainda obtêm lucros absurdos, começaram a se movimentar em pró as mitigações, preservações, conservações ambientais. Aliás, não é nada mais que devolver para GAYA aquilo que retiramos. O planeta está febril e nosso “modus-consumus” atual não da conta do planeta se regenerar, ou seja, deveria ser obrigação mesmo, não por conta da lei, mas por conta da consciência mesmo. Por isso, mais uma vez a importância da Educação Ambiental.

Bere – E como você define o termo “sustentabilidade” em poucas palavras, se é que isto seja possível?

Karina – Escrevi um artigo com 15 páginas sobre o conceito de sustentabilidade, agora você me pede para dizer em poucas palavras, eu acho meio difícil, mas vou pegar, se me permitir, um trechinho então do próprio artigo, pode ser?!

Bere – (Risos) Claro, realmente o objetivo foi te desafiar, pois sim, é muito difícil definir em poucas palavras um conceito tão amplo!

Karina – “É o compartilhamento responsável com todos os biomas, floras, faunas, ecossistemas e biodiversidades, porque somos apenas um em meio a milhares; É a capacidade de viver de forma mais simples, mas paradoxalmente de forma mais perene e rica, através da Educação de base de um sistema mais inteligente, conectado e integrado na simbiose humana e do planeta”.

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Imagem: acervo pessoal

Local: Nascentes de São Paulo, Projeto Nascentes – “Existe Água em São Paulo” em parceria com Adriano Sampaio.

 

Bere – É Karina, cada vez mais fica muito claro que no conceito “Sustentabilidade” não entra individualismo, competição, nem as vaidades e os desejos humanos exagerados, focados no ter cada vez mais, e esta sua frase pode ser, digamos, o supra-sumo deste conceito: “É a capacidade de viver de forma mais simples, mas paradoxalmente de forma mais perene e rica.“ Agora, fale um pouco do seu trabalho com o Instituto Internacional e Socioambiental Chico Mendes:

Karina – Hoje atuo, principalmente, como uma apaixonada. Sou estrategista social, palestrante, educadora, conferencista, superintendente e membro integrante do corpo Diretor do Instituto Internacional de Pesquisa e Responsabilidade Sócio Ambiental Chico Mendes INPRA, e atendemos todo o território nacional através de Núcleo Eco Educacional, Certificações Sustentáveis e Consultoria Estratégica para ações pontuais e projetos especiais. PROCERT, PRONEC e PEA, e também represento o Instituto em Conferências Internacionais coligadas ao Pacto Global e a ONU. Costumo dizer que hoje eu não trabalho mais. Porque quem tem o privilégio de fazer o que ama e ama o que faz todas as segundas-feiras podem virar domingos de lazer e diversão. O prazer é tão grande que não me vejo fazendo outra coisa até meus 95 anos!

Bere – É um privilégio muito grande, sim, poder trabalhar naquilo que se ama fazer, e penso que seja uma conquista que se alcança depois de muito esforço, como você bem detalhou na sua trajetória. Porém, mesmo gostando do que fazemos, e isso não quer dizer que dificuldades não existam. Enfrentam-se muitas dificuldades quando lidamos, principalmente, com a temática ambiental. Quais são as dificuldades que você enfrenta, ou já enfrentou, ao longo do seu percurso?

Karina – Claro, nem tudo é um mar de rosas, mas como nossa obrigação e dever é principalmente certificar as empresas e organizações que fazem a coisa de forma correta, ou pelo menos já se movimentam pra isso, eu diria que as dificuldades maiores são mesmo os entraves burocráticos, na maioria das vezes.

A estrada é longa, o caminho é sensível, (trocadilhos à parte sobre seu livro) temos muito, mas muito a fazer. O que me motiva é ver que novos empreendedores estão se formando, paradigmas estão sendo quebrados, conceitos arcaicos estão ficando cada vez mais obsoletos, está sim, surgindo uma nova ERA, mais conectada, conectiva, preocupada, integrada. Uma simbiose humana perceptiva que a natureza não é aquilo que está aí pra ser destruída, e sim, natureza somos todos nós. Todos interligados no mesmo cordão umbilical de um ecossistema frágil.  Temos que incentivar esses jovens, promover sempre a capacitação.

Bere – Para você, qual é o papel dos gestores, tanto de empresas, governo, escolas, instituições, para minimizar os impactos que provocamos no meio ambiente devido ao nosso modo de vida hiper-consumista?

Karina – Berê, eu sempre digo nas apresentações que quando, de fato, nos apropriarmos de nossa Terra, veremos que precisamos de tão pouco para realmente sermos felizes. Não sou hipócrita de dizer que não vamos mais consumir, mas há uma grande distância em Consumismo x Consumerismo*.

O Consumerismo acontece quando o ato de consumir se torna realmente consciente e é exatamente isso, que nós, como gestores, formadores de opinião, autores de livros, multiplicadores, temos que cada vez mais, comunicar para a sociedade civil como um todo. Claro que encontramos entraves, principalmente nas grandes corporações, onde o principal objetivo é obter lucro, mas hoje há um fenômeno acontecendo e crescendo vertiginosamente chamado ECONOMIA CIRCULAR e RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA. Eu diria pra você que isso não é o futuro e sim o presente. Já estamos fazendo, tudo começa - como você mesma disse - pelo consumo ou “HIPER-CONSUMO”. A partir do momento em que percebemos o desperdício gerado através do “hiper-consumo” e de todos os malefícios causados, o nosso comprometimento será maior. Ainda acredito que isso possa durar uma geração, mas os movimentos já estão aí, acontecendo a todo vapor. Aliás, se continuarmos agindo dessa forma, não nos restará muito mais tempo, não é verdade?!

*O termo consumerismo se relaciona com o consumo responsável, ético e solidário, segundo critérios apropriados e racionais que levem em conta a origem dos produtos adquiridos e os impactos ambientais e sociais desse consumo. (Pedro Papastawridis)

 

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Fotos: Acervo particular — com Karina Bruno em Génova — com Sustentabilidade Ideal.

O velho mundo nos ensina muito. Na Itália, por exemplo, temos o chamado "ECOPUNTO", bem como enormes recipientes separados pela cor para destinação correta de cada material "espalhados" nas principais avenidas de Genova, Milão e praticamente toda a Europa. Há ainda, nos hotéis, no hall dos elevadores, locais apropriados descartes para garrafas de vinho.

Bere – Bem bacana isso que você trouxe! Existem muitas iniciativas importantes, como esta dos ecopontos, entre outras, espalhadas pelo mundo. Isso mostra que uma mudança está em curso, está acontecendo mesmo. É uma pena que vemos poucas iniciativas como estas por aqui. Para mim, lidar de forma correta e consciente com os nossos resíduos é um dos maiores desafios que temos, além de o de reduzirmos o nosso consumo, mas dependemos, principalmente, da gestão pública para alcançar bons resultados. Aqui na minha cidade participei, recentemente, de um fórum de catadores, e eles têm uma luta muito grande para conseguirem apoio, uma luta que começou em meados de 1980 e ainda hoje, em nosso País, menos de 2% do lixo produzido é enviado para a reciclagem. A coleta seletiva, por aqui, vai e volta, e nesse vai e vem, ela não vinga, o que é uma pena! O velho mundo se mostra mais maduro ao lidar com tais questões relacionadas ao saneamento básico, e o próprio nome já evidencia a sua importância para a saúde como um todo, ambiental, social, planetária. Nesse sentido, desenvolver uma cultura que se relacione bem com o meio ambiente é também, muito importante. Como você acha que cultura e educação ambiental estão relacionadas?

Karina – Estão intrinsecamente relacionadas. Recentemente tive a chance de conhecer a Ilha de Páscoa. Considerada o “Umbigo do mundo” O continente mais próximo está a 4 mil quilômetros.  Praticamente tudo que é consumido por lá, em termos de alimentação, vem do mar e da própria terra, embora seja uma ilha é muito fértil. Além disso, como praticamente todos que habitam lá são descendentes dos RAPA NUI, têm um amor tão grande por aquela terra que é quase impossível, você turista, fazer algo que esteja em desacordo com as “leis e costumes”. Tudo o que é consumido e descartado tem um local certo. Bom, de fato, não se consome muito por lá, uma vez que geograficamente a ilha se encontra na zona equatorial e faz calor praticamente o ano todo, então, é muito comum você ver as pessoas de biquíni o dia todo. Eu só dei esse exemplo para dizer que quando as pessoas, de fato, se apropriam da terra onde moram, do lugar onde nasceram, das coisas que ali estão desde a época de seus antepassados, é muito mais difícil você perceber a destruição. Inúmeras tribos africanas, os próprios aborígenes, os esquimós, tem um cuidado muito grande, porque sabem que dependem daquele local para sobreviver. Agora, falando um pouquinho do Brasil, nós seres “evoluídos” ocidentalizados, colonizados, fomos doutrinados a obedecer e explorar, retirar, mandar para fora tudo que era de melhor, e isso já dura mais 500 anos! O BRASIL de dimensão continental, teve influência praticamente do mundo todo, desde a Ásia, Europa e principalmente Norte Americana, e assim fomos condicionados a uma cultura pluralizada, miscigenada, o que não é ruim, mas perdemos um pouco nossa identidade no sentindo do cuidado com a TERRA/ Natureza, como os índios por aqui fizeram durante séculos, talvez milênios e foram dizimados no processo de colonização.  O que torna tudo mais relevante é que hoje temos como reverter a situação através da Educação Ambiental. Precisamos ir tão longe para ver que a cura dos nossos problemas estava, de fato, em nossas raízes.

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Imagem: Acervo particular à Local: Machu Picchu – Peru 2015

Bere – O retorno a uma vida mais simples, mais conectada e que nos aproximasse mais da natureza, sem dúvida, já faria uma grande diferença. Depois de falarmos sobre dificuldades e desafios, o que te dá mais satisfação realizando seu trabalho nesta área tão desafiadora?

Karina – Como disse Berê, hoje eu AMO o que eu faço, e faço só porque AMO. Minha maior satisfação, além de poder ter a virtuosa chance de acompanhar de perto os projetos socioambientais que estão sendo desenvolvidos no Brasil, tanto em empresas públicas como em privadas, é poder ainda ter a possibilidade de ver o nosso Planeta ser regenerado, mesmo que aos poucos, de forma contida e gradativa. É saber que podemos ter uma alimentação mais saudável, porque as hortas urbanas estão a todo vapor, é ver a criançada botando a “mão na massa”, aliás, na terra. É acompanhar lá nos rincões de Goiás as cooperativas das quebradeiras de Babaçu, tendo a chance de ter uma vida digna através do sistema agroflorestal e extrativismo sustentável. É ver o desenvolvimento das matrizes de energia limpa e renovável sendo multiplicadas em todo o País.  É poder pensar que um dia, se eu tiver um filho, vou poder colocar uma vida numa Gaya mais limpa, regenerada e acreditável.

Bere – Finalizando a nossa troca de ideias tão gostosa, com a qual muito aprendi e muitos aprenderão, deixa para o nosso público uma frase, um pensamento, uma palavra para inspirá-los nesta luta por um mundo mais equilibrado:

Karina – Gosto muito do Exupèry! O Pequeno Príncipe, para mim, é um dos livros mais lindos e complexos na sua simplicidade.  Suas frases, sua história de vida sempre me motivaram. Tenho um lema que levo comigo sempre:

“Sou um pouco de todos que conheci, um pouco dos lugares onde fui, um pouco das saudades que deixei e sou muito das coisas que gostei” Gratidão Berê!

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Bere – Nós te agradecemos Karina, pelo compartilhamento da sua trajetória que é, no mínimo, inspiradora, cheia de vivências, experiências e batalhas, e em nome de toda a equipe da EA em Ação, te agradecemos, de coração, pela sua participação neste trabalho que, igualmente, realizamos de forma muito apaixonada.

Muito obrigada e votos de muito sucesso na sua caminhada!!!

Bere Adams e Equipe da EA em Ação.

Para entrar em contato com Karina:

Karina Bruno Estrategista social | Palestrante INPRA | Instituto de Pesquisa e Responsabilidade Socioambiental CHICO MENDES Pacto Global | ONU Brasil Karina@institutochicomendes.org.br (11) 98026-5488 (41) 3672-3681

 

Ilustrações: Silvana Santos