EDUCAÇÃO
AMBIENTAL CRÍTICA NA ESCOLA: O CALOR DA PANELA DE PRESSÃO
NA ECONOMIA DO GÁS DE COZINHA
Gustavo
Krysnamurthy Linhares Brandão
1, Raphael Alves Feitosa2,
Raquel Crosara Maia Leite3,
Viviane Alves de
Oliveira Feitosa4
1Secretaria
Municipal de Educação de Fortaleza, membro do Grupo de
Estudo e Pesquisa em Ensino de Ciências (Gepenci) da
Universidade Federal do Ceará.
2Departamento
de Biologia, Universidade Federal do Ceará
3Departamento
de Teoria e Prática do Ensino, Faculdade de Educação,
Universidade Federal do Ceará
4Secretaria
Municipal de Educação de Fortaleza, Mestranda do
Programa de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática
(PGECM) do Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia do Ceará.
Resumo
Este
trabalho foi desenvolvido por trabalho com narrativas, na qual se
extrai e reflete sobre experiências diretas que ocorreram na
escola básica, haja vista que entre os autores do presente
artigo encontram-se um educador que participou diretamente da
intervenção na escola. Os resultados expostos na
narrativa evidenciam que a proposta de articulação
entre a Pedagogia Histórico Crítica e as ações
em prol da Educação Ambiental, permitiram o
desenvolvimento de práticas investigativas que potencializaram
a compressão dos estudantes envolvidos sobre a problemática
ambiental, sendo bem aceito pelos professores e os demais estudantes
da escola.
Palavras-chave:
Educação ambiental; educação crítica;
pedagogia histórico-crítica.
CRITICAL
ENVIRONMENTAL EDUCATION AT SCHOOL: THE HEAT OF THE PRESSURE COOKER IN
THE ECONOMY OF KITCHEN GAS
Abstract
This
papper has been developed with narratives, in which it is extracted
and reflected on direct experiences that occurred in the basic
school, since the authors of the present article find an educator who
participated directly in the intervention in the school. The results
presented in the narrative show that the proposal of articulation
between the Historical Critical Pedagogy and the actions in support
of Environmental Education allowed the development of investigative
practices that increased the compression of the students involved on
the environmental problem, has being well accepted by teachers and
other school students.
Keywords:
Environmental education; critical education; historical-critical
pedagogy.
Introdução
A
educação ambiental é um tema de fundamental
importância para a sociedade. Dentro das escolas, o tema possui
caráter não-disciplinar e ampla abrangência nos
currículos, possuindo diversas concepções e
vasta diversidade teórico-metodológica (HART et al.,
2018). No que diz respeito ao processo educativo nacional, no artigo
segundo das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Ambiental conta que a Educação Ambiental é
[...]
uma dimensão da educação, é atividade
intencional da prática social, que deve imprimir ao
desenvolvimento individual um caráter social em sua relação
com a natureza e com os outros seres humanos, visando potencializar
essa atividade humana com a finalidade de torná-la plena de
prática social e de ética ambiental. (BRASIL, 2012).
Diante
dessa amplitude do tema aqui em análise, Feitosa e Abilio
(2015) destacam que educação ambiental, grosso modo,
pode ser compreendida diante de duas linhas de desenvolvimento: uma
não-crítica, a qual agrupa as conotações
naturalísticas do tema; e uma crítica, a qual visa
integrar de maneira relacional os meios social, natural e cultural
dos ambientes naturais e urbanos. Para a exposição e o
desenvolvimento da narrativa do presente artigo, iremos recorrer a
supra indicada segunda linha.
Dito
isso, pode-se indicar que, após a segunda Guerra mundial, os
avanços científicos e tecnológicos estão
intimamente relacionados com a problemática ambiental, comenta
Borhein (2002). Acrescenta que a riqueza do que se vem fazendo com a
ciência, deixa-se alimentar pela presença de uma
criatividade humana levando-se a pergunta e naquilo que cabe ao homem
inventar a partir dela (MÉSZÁROS, 2005; SAVIANI, 2011).
A
falta de políticas públicas que abram espaço
para uma articulação entre ensino e pesquisa dentre das
escolas de educação básica, possibilitando
nossas alternativa metodológicas ao ensino e a aprendizagem, é
real em nosso país (SAVIANI, 1989). Pedro Demo (2008) é
um crítico dessa lacuna e defensor da implantação
da pesquisa no ambiente escolar. Acrescenta que se deve agarrar a
teoria-prática advinda da pesquisa como princípio
educativo e fazer delas um trampolim para a própria autonomia
dos atores escolares – estudantes e educadores. Para Demo
(2008) o objetivo maior s
educação
não deve ser atrelar uma ação-reflexão
única, mas alimentar as chances de autoria e autonomia do
ambiente escolar, facilitando a aprendizagem do aluno e o trabalho
docente dos professores.
Notadamente,
a educação ambiental é vista como elemento de
caráter não-disciplinar, seja numa abordagem inter ou
transdisciplinar (BORHEIN, 2002; FEITOSA; ABILIO, 2015). São
vários os temas curriculares que podem ser concatenados com a
educação ambiental.
O
presente trabalho tem como objetivo analisar narrativas de
experiências advindas de educadores de uma escola pública
da rede municipal e ensino na cidade de Fortaleza, Ceará, que
desenvolveram atividades de ensino-pesquisa com a utilização
do calor da panela de pressão no cozimento dos alimentos como
mote gerador de uma discussão ligada à educação
ambiental crítica.
O
conteúdo escolar calor é um dos temas explorados nas
aulas de ciência da natureza na educação básica.
Contudo, apesar de sua difusão ser reconhecida (AMORIM; DIAS;
SOARES, 2015), ainda são escassas as propostas que vinculam
esse tema ao campo ambiental. Destarte, os educadores possuem
limitações para desenvolver ações-reflexões
de caráter prático e contextualizado sobre o tema
calor, sendo o assunto muitas vezes restrito a estratégias de
memorização de fórmulas físico-matemáticas
e a resolução de exercícios de cálculo
(AGUIAR JUNIOR, 1999).
Analisando
a pertinência do tema para a educação, Amorim,
Dias e Soares (2015) destacam que, muitas
vezes, não sabemos utilizar de maneira correta as trocas de
energia térmicas, em especial a produção de
calor em residências e indústrias, e acabamos por
desperdiçá-las. Do ponto de vista conceitual, Aguiar
Junior (1999) destaca
que o calor poder
ser compreendido como sendo um tipo de
energia
térmica que é transmutada de um corpo com maior para
outro com menor temperatura.
Dito
isso, destacamos que as fontes de calor são elementos capazes
de aumentar a temperatura
em outros corpos e muitos estão presentes no cotidiano, como,
por exemplo, o fogão, o forno e a lareira. Assim sendo, a
transmissão de calor pode ocorrer através da condução
(quando o calor passa de molécula a molécula do
material), da convecção (transferência de calor
em um fluído que ocorre em virtude de um deslocamento de massa
do próprio fluido) e da radiação (transmissão
de calor por meio de ondas eletromagnéticas).
Até
aqui, buscamos debater um pouco sobre a importância de se
aprender sobre o meio ambiente através da pesquisa introduzida
na escola e da relevância de ações-reflexões
sobre o tema calor dentro do campo do ensino de ciências da
natureza. A partir de então, a seguir, faremos um apanhado dos
principais referenciais utilizados para a elaboração e
das ações aqui narradas, focalizando no a utilização
do calor para cozinhar os alimentos, economizando gás e
contribuindo para a preservação do ambiente.
Educação
Ambiental Crítica
A
Reprodução social também se encontra na
complexidade educacional, pois a sociedade de classes na atual
conjuntura sob o escudo do capital reproduz suas relações
sociais alienadas. No período de crise do capitalismo, Segundo
Mészáros (2005), a função da escola foi
redefinida como um organismo que continue a manter seu
desenvolvimento dentro de uma lógica mais perversa e sem
incitar a classe trabalhadora à ação
revolucionária, propondo assim uma educação
capaz de pacificação dos homens e de resolução
de seus problemas.
A
educação institucionalizada, especialmente, nos últimos
cento e cinquenta anos, serviu – no seu todo – ao
propósito de não só fornecer os conhecimentos e
o pessoal necessário à maquinaria produtiva em expansão
do sistema capitalista, mas também o de gerar e transmitir um
quadro de valores que legitima os interesses dominantes, como se não
pudesse haver nenhum tipo de alternativa à gestão da
sociedade [...]. (MÉSZÁROS, 2005, p. 36)
Nesse
contexto, encontramos numa reportagem na Gazeta do Povo (2017)
denunciando que no Brasil, de alguns anos para cá, percebemos
uma crise estrutural do capitalismo nas suas diferentes esferas:
política, econômica, fiscal, previdenciária,
instituições e até crise moral. Nessa espiral de
crises sem fim, toda a agenda nacional parece estar reduzida,
restrita a buscar soluções para sairmos o mais rápido
possível do buraco ou, ao menos, pararmos de cair. Ainda de
acordo com a Gazeta do Povo (2017) medidas foram tomadas para a
recuperação econômica sacrificando o sacrifício
do desenvolvimento futuro. Um exemplo disso pode ser encontrado
nas áreas de educação, ciência e
tecnologia.
Com
isso, políticas públicas sempre são afetadas nas
crises produzidas pelo sistema capitalista. E a escola não se
encontra distante de tal realidade, como vimos nos pensamentos acima.
E é nesse sentido crítico que conecta os campos
natural, social e político que emerge a Educação
Ambiental Crítica (FEITOSA;
ABILIO, 2015)
No
Brasil, a história da educação ambiental possui
uma trajetória que fornece elementos para mostrar que apesar
de todas as barreiras, a iniciação ao pensamento
científico é pertinente para uma compreensão
ampla do ambiente que nos cerca (BORHEIN, 2002).
Desta
feita, defende-se a ideia central de que a educação
ambiental deve ser inserida na escola através de realidade
cientifica, conectada com uma visão crítica de
sociedade, sendo a Pedagogia Histórico-Crítica (PHC)
uma perspectiva educativa coadunada com a Educação
Ambiental Crítica relevante para o desenvolvimento de uma
práxis ambiental nas escolas públicas (FEITOSA; ABILIO,
2015). É a respeito dessa visão que iremos explorar a
seguir.
A
Pedagogia Histórico-Crítica (PHC)
Como
elemento articulador da visão crítica exposta acima,
percorremos os campo de uma práxis que busque enfatizar tal
conotação dentro do trabalho docente na escola. Assim,
buscamos nos alinhar a PHC proposta por Saviani (2005) e pesquisada
por outros investigadores (FEITOSA; ABILIO, 2015; GERALDO, 2009;
SANTOS, 2012).
A
Pedagogia Histórico-Critica enquanto movimento pedagógico
nasceu na década de 1970 como resposta as necessidades
conhecida entre os educadores brasileiros de superação
das teorias vigentes. Seu mentor, Saviani (2005),
buscava alternativa a uma pedagogia dominante que se expressava no
cenário educativo da época, uma crítica a
pedagogia oficial. Diante das claras contradições que
marcavam as relações sociais brasileira, Saviani
indicou caminhos para resolver os problemas existentes, admoestando
que era necessário transformar as relações
humanas e partir com essa lógica de opressão, que são
orgânicas e não apenas conjunturais, pois compreendiam
que só através da revolução cultural
poderia mudar as bases da sociedade.
Neste
sentido a PHC tinha um caráter revolucionário, se
nutriu da ideologia de esquerda e teve influência da filosofia
marxista, portando um caráter do materialismo histórico
e dialético, que procura esclarecer que todo acontecimento são
causados a partir da
prática
social humana. Dessa forma, os conhecimentos científicos
produzidos pela humanidade ao longo do tempo, a linguagem, as
relações sociais, são entendidos como
empreendimentos históricos, contextualizados e definidos pelas
finalidades e necessidades humanas e portam em si as marcas do tempo,
do lugar e das intenções de quem os geraram.
Numa
análise social da educação brasileira, nota-se
que a mesma sofre influência de políticas internacionais
ditadas pelo sistema capitalista. Em contra partida, Saviani (2005,
2010, 2011) defende um político-estratégico baseado na
luta socialista, em que a educação se encontre no
centro do desenvolvimento. Saviani (2010) busca mostrar que se apoiou
na análise dialética e materialista feita por Marx,
identificando a unidade entre produção, distribuição,
troca e consumo no processo de produção social enquanto
totalidade orgânica. Ele ainda acrescenta que “[...] cabe
entender a educação como um bem de produção,
e não apenas um bem de consumo” (SAVIANI, 2010, p. 260).
O
autor ainda diz que o saber escolar deve ser explicitado às
massas e vinculado à educação, abrindo espaço
para a luta socialista, e argumenta que desta forma “[...]
estaremos solapando a própria base do sistema capitalista, uma
vez que, socializando o conhecimento, que é uma força
produtiva, um meio de produção, estaremos contrariando
o princípio da apropriação privada dos meios de
produção” (SAVIANI, 2011, p. 199). Com isso,
ele deixa claro que a educação como determinante para o
desenvolvimento da produção e da economia brasileiras,
além de significar um instrumento estratégico na luta
pela superação do capitalismo e construção
do socialismo.
Seguindo
a conotação crítica da Pedagogia
Histórico-Crítica, alguns autores defendem a sua
utilização nos campos do ensino de ciências
(GERALDO, 2009; SANTOS, 2012) e da educação ambiental
(FEITOSA; ABILIO, 2015). Na intervenção aqui analisada
e narrada, utilizamos a didática da Pedagogia
Histórico-Crítica como elemento basilar para a práxis
desenvolvida na escola pública.
Isso
exposto, a seguir, apresentados os aspectos metodológicos que
foram empregados na presente investigação.
Procedimentos
Metodológicos da Investigação
A
coeva pesquisa tem como fundamento basilar a pesquisa qualitativa,
caracterizada pela ausência de análises estatísticas,
enfocando aspectos mais densos e objetivos/subjetivos do tema
estudado (SILVERMANN, 2009).
Dentre
a diversidade de pesquisa que se enquadram dentro das de caráter
qualitativo, utilizamos aqui o trabalho com narrativas (LIMA;
GERALDI; GERALDI, 2015). Nele, extraímos e refletivos sobre
experiências diretas que ocorreram na escola básica,
haja vista que entre os autores do presente artigo encontram-se um
educador que participou diretamente da intervenção na
escola.
O
uso de narrativas tem se constituído no cenário
educacional de pesquisas qualitativas como uma das opções
metodológicas. É, por natureza, carregada de
significados e características próprias, permitindo-nos
entender como seus sujeitos compreendem as ações
desenvolvidas. De maneira mais direta, fizemos uso de narrativas de
experiências planejadas para a pesquisa, a qual se caracteriza
por haver uma experiência significativa dentro do contexto
escolar feita pelos professores-pesquisadores-narradores, e estes a
toma como objeto de compreensão (LIMA; GERALDI; GERALDI,
2015).
A
narrativa foi organizada numa escola da rede municipal de ensino da
Cidade de Fortaleza, subordinada à Secretaria Executiva
Regional I e funciona nos turnos da manhã, da tarde e da
noite, com tais modalidades de ensino: Básico Fundamental e
Educação de Jovens e Adultos (EJA) I e II. Nesta
instituição, atualmente, os 568 alunos estão
matriculados da seguinte maneira: 455 nas séries finais do
Básico Fundamental (6º ao 9º ano), 24 no EJA I e 112
no EJA II. Já em termos de profissionais, a Escola conta com
40 profissionais do magistério, 15 funcionários-educadores
e 4 gestores.
Em
relação à infraestrutura, a escola encontra-se
assim dividida: uma biblioteca, uma sala de informática, oito
banheiros, um refeitório, quatorze salas de aula, um sala de
vídeo, doze computadores, uma sala de direção,
um laboratório de ciências, uma sala de atendimento
educacional especializado, uma secretaria, uma sala de professores,
um parque infantil, um pátio interno, um almoxarifado e uma
quadra de esportes.
Para
efetivar a pesquisa, o professor de ciências da natureza
escolheu uma de suas equipes orientadas para a Feira
de Ciência, Cultura e Arte de Fortaleza
para conduzir os trabalhos planejados. Seis alunas foram responsáveis
por pesquisar informações a respeito dos temas (calor,
problemática ambiental, educação ambiental,
energia, etc.) dentro do prazo de duas semanas. Foram quatro reuniões
de planejamento com os envolvidos, totalizando quatro horas de
atividades de idealização. Por fim, foi proposto a
apresentação do trabalho do grupo como mecanismo de
culminância do processo, a qual divulgou o resultado dos
trabalhos para os demais estudantes da escola. As ações
que culminaram com a Feira de Ciências duraram cerca de um mês,
iniciando-se na metade de agosto e finalizando na metade de setembro
de 2017.
Resultados
& Discussão
A
proposta de pesquisa iniciou como meio de análise da prática
social advinda da didática da PHC (FEITOSA; ABILIO, 2015;
GERALDO, 2009; SANTOS, 2012), com a análise de um vídeo
exposto no aplicativo YouTube,
no qual continha uma dona de casa explicando uma técnica de
como cozinhar arroz e feijão economizando gás butano
através do calor e da pressão (Vídeo disponível
no endereço: <https://www.youtube.com/watch?v=6ps4L5GrFiI>.
Acesso em 14 abr. 2019.).
O
vídeo foi exposto pelo professor de ciências da escola
para o grupo de alunos envolvido. A estratégia foi
interessante para divulgar o tema através da feira de
ciências, para incentivar os estudantes da escola a buscar
informações que ajudem na preservação
ambiental e levarem os alunos a perceber que as cozinheiras da rede
escolar da Prefeitura de Fortaleza não recebem cursos que
utilizem técnicas parecidas para manutenção de
um meio ambiente saudável. Assim, o mesmo também serviu
como estratégia de problematização, passo
seguinte da didática da PHC (FEITOSA; ABILIO, 2015; GERALDO,
2009; SANTOS, 2012).
Em
seguida, os envolvidos iniciaram a preparação de
material para uma Feira
de Ciência, Cultura e Arte de Fortaleza,
iniciativa da Secretaria Municipal de Educação de
Fortaleza (SME) em parceria com um
setor da Universidade Federal do Ceará, a Seara da Ciência,
cujo objetivo foi o de proporcionar e incentivar a pesquisa na rede
escolar básica. Assim, conta com uma
programação que integrava a política educacional
da Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF), trouxe como premissa o
desenvolvimento de ações educacionais que possibilitem
a apropriação de conhecimentos e valores. Essa
atividade municipal conta com a destinada a estudantes do 5º ao
9ª ano e da EJA (FORTALEZA, 2017).
Antes
das inscrições da Feira de Ciência, o professor
da matéria reuniu suas equipes para propor temas em que as
experiências realizadas sirvam de orientação para
a mudança de postura em relação à maneira
da utilização do calor na economia do gás da
escola.
Em
relação à equipe cujo tema é a utilização
do calor da panela de pressão para o preparo de alimentos, o
professor de ciência realizou sua primeira reunião com
as seis alunas, em agosto de 2017, para planejarem em conjunto o
trabalho que seria apresentado na Feira de Ciências da escola
do ano de 2017.
Partindo
da prática social dos próprios alunos, foi acordado que
os ingredientes escolhidos para o preparo do experimento foram:
arroz, feijão, macarrão, alho, sal, óleo, cheiro
verde, cebola e colorau. Cada estudante ficou de pesquisar o modo de
fazer dos alimentos para reunirem-se e prepará-los, a fim de
aprenderem a utilizar o calor e economizar gás de cozinha. Com
isso, problematizou-se uma crítica a PMF, pois esta deveria
proporcionar cursos de formação as cozinheiras a fim de
planejarem melhor o funcionamento da cozinha e minimizar os gastos
das verbas públicas, haja vista que ficou constato na escola
que tal prática não ocorre na capital alencarina.
Numa
segunda reunião, em outubro, a equipe se reuniu novamente sem
nenhum retorno do que pesquisaram. “Pois a dificuldade da
pesquisa se deu por falta de uma cultura investigativa, algo que não
há na escola”, argumentou o professor. Tal constatação
vai ao encontro das críticas de Demo (2008) e de Saviani,
(1989). “É preciso se criar uma lógica que
possibilite o aluno a ter noções básicas de
pesquisa para estes produzirem conhecimento e libertarem-se da
cultura capitalista”, acrescentou o educador.
Assim,
o professor tornou a orientar as alunas, onde cada uma ficou
responsável por buscar informações sobre o
cozimento dos alunos por parte do calor da panela de pressão,
e sugeriu que o grupo assistisse vídeos na internet com
orientações sobre o modo de fazer. Esse mecanismo foi
encarado pelo grupo como o início do processo de
instrumentalização, advindo da proposta da didática
da PHC (FEITOSA; ABILIO, 2015; GERALDO, 2009; SANTOS, 2012).
No
encontro seguinte, em seu horário de planejamento, o professor
convocou o grupo para o preparo do feijão e arroz, já
que o macarrão não foi encontrado nenhuma informação
sobre o preparo de tal alimento. Os estudantes dirigiram-se à
cozinha da escola e juntos com as cozinheiras começaram o
colocar em prática o que pesquisaram. Parte do grupo ficou
responsável por fazer o feijão e outra do arroz.
Nesta
etapa o grupo passou a gravar um vídeo da prática
proposta, no qual uma aluna ia mostrando o modo de fazer: “primeiro
iremos colocar óleo, alho e sal a gosto na panela de pressão
e dourar o alho. Depois colocaremos uma xícara de arroz para
refolgar no óleo com alho e em seguida colocar três
xícaras de água”. Daí a aluna continuou a
gravação e a outra deu continuidade na explicação:
“iremos então tampar a panela de pressão e
esperar chiar - o vapor começar a sair da tampa. Quando
começar a chiar, contaremos um minuto e dez segundos e
desligar o fogo, daí o próprio calor da panela
cozinhará o arroz. Iremos esperar até que não
haja mais pressão dentro da panela para depois abri-la”.
O vídeo serviria para ser apresentado aos demais estudantes da
escola, mostrando todo o processo de utilização da
técnica.
Enquanto
o grupo esperava o arroz ficar pronto no canto da cozinha, o processo
de fazer o feijão deu início com outra panela de
pressão. Novamente, o grupo fez a gravação de um
vídeo autoral, no qual uma aluna ia mostrando o modo de fazer:
“primeiro iremos colocar duas xícaras de feijão
(de molho de um dia para outro) na panela de pressão com três
xícaras de água, tampar e levar ao fogo até que
comece a chiar. Então contaremos três minutos e
desligaremos o fogo”. Após seis minutos, o grupo esperou
a pressão se reduzir e seguiram a abertura da panela,
colocaram sal e tornaram a explicar na continuidade do vídeo.
Disse uma das integrantes: “iremos continuar a segunda etapa
colocando sal e repetindo o mesmo que fizemos, ou seja, colocar de
volta ao fogo, com a tampa fechar a esperar chiar e depois contar
três minutos e desligar novamente o fogo”.
Depois
de todo o processo, o grupo abriu as panelas e se surpreenderam com o
que viram: “deu certo, deu certo!” falava uma. “Gente
nunca tinha feito arroz e conseguiu!” dizia outra. A comida
produzida pelo grupo serviu de ingredientes para o almoço do
grupo, no qual professor e estudantes comemoraram juntos
o sucesso do experimento. Esse momento foi decisivo para a catarse do
grupo, passo fundamental da didática da PHC (FEITOSA;
ABILIO, 2015).
Em
outro momento, o grupo dirigiu-se
as cozinheiras da escola para questionar sobre a formação
para atuação na cozinha da escola. Uma das cozinheiras
relatou: “quase não temos formação, mas
cobrança temos de mais”. Quando elas citaram a cobrança,
referiram-se a visita de nutricionistas nas escolas públicas
municipais. Segundo a diretora existe um nutricionista concursado por
distrito (o município de Fortaleza é dividido em seis
distritos de educação sob a orientação da
SME) e outros nutricionistas terceirizados para acompanharem as
cozinhas das escolas.
Outra
informação foi colhida pelas alunas da funcionária
responsável pelo depósito da merenda: “quando a
nutricionista aparece, trata da limpeza da cozinha e do vestuário
das cozinheiras”. Fortalecendo a crítica social das
cozinheiras, elas destacaram a falta de preocupação da
PMF de uma política de formação continua para
que os funcionários cuidem da cozinha escolar de uma maneira
sustentável, como por exemplo técnicas que economizem o
gás de cozinha.
O
trabalho de pesquisa do grupo foi apresentado na Feira de Ciências
da escola e, em momento posterior, foi exibido na Feira
de Ciência, Cultura e Arte de Fortaleza.
Considerações
Finais
A
presente investigação analisou narrativas de
experiências desenvolvidas em uma escola pública da rede
municipal de ensino da cidade de Fortaleza, Ceará. Com base da
PHC, a atividade investigativa em torno do tema do calor da panela de
pressão, proporcionou uma ponte entre o real e o aprendido,
algo que foi além de estruturas de conteúdo científico,
indo para algo significativo para o grupo, haja vista que o tema se
ligou a prática social dos mesmos.
A
principal tarefa da escola é ajudar o aluno a desenvolver a
capacidade de construir relações e conexões
através das novas metodologias do ensino de ciências
(FEITOSA; ABILIO, 2015; GERALDO, 2009; SANTOS, 2012). Daí, a
utilização do calor da panela de pressão para o
aprendizado em ciências pode auxiliar na construção
dessas relações e na crítica aos problemas
sociais coligados a prática social do grupo envolvido.
A
ação aqui narrada pode ser encarada como constante
troca interdisciplinar, buscando não só na área
de ciências da natureza e ambiental, mas nas ciências
sociais, na economia e linguística, enfim, nas diversas áreas
de construtos teóricos-práticos que ajudaram a melhor
definir o objeto de trabalho.
Por
fim, cabe
a crítica de aos projetos e as políticas públicas
para as redes de ensino enquanto aos cortes de verbas da educação,
podendo surgir até questionamentos: como ficam projetos como
as Feiras de Ciências no que diz respeito à aquisição
de material para sua efetivação? Cabe aos professores
bancarem financeiramente o projeto sacrificando seus próprios
salários? O material a ser usado nos experimentos deve partir
dos pais dos estudantes que já se encontram com suas vidas tão
sofridas nos lares das comunidades escolares? Qual é o real
apoio que o poder público vem implementando para potencializar
as ações de pesquisa na escola básica?
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