Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Relatos de Experiências
26/01/2018 (Nº 62) COMPORTAMENTO DE PEIXES BETTA SOB INFLUENCIA DE INIBIDOR NEUROLOGICO: ETANOL (CH3CH2OH).
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COMPORTAMENTO DE PEIXES BETTA SOB INFLUENCIA DE INIBIDOR NEUROLOGICO: Etanol (CH3CH2OH).

Gabrielle Diniz dos Santos¹; Gil Dutra Furtado²; Cíntia Cleub Neves Batista³.

¹Ecologa, Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA/UFPB, E-mail: gabrielledsantos90@gmail.com

²Doutor em Psicobiologia/Professor colaborador do PRODEMA/UFPB, E-mail: gdfurtado@hotmail.com

³Zootecnista, Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA/UFPB, E-mail: cintiacleub@gmail.com

RESUMO

Vários são os elementos químicos que podem influenciar no desempenho neural de um ser vivo (neurotóxicos), como o etanol, mercúrio, chumbo, dentre outros, os quais contribuem para a alteração de seu comportamento natural dentro do meio em que se encontra. A compreensão das interferências que ocorrem nas ocasiões em que um organismo está sob a influência destes agentes químicos, favorecem na compreensão das ações que estes organismos passam a apresentar. O presente estudo teve como objetivo a observação comportamental de peixes Betta Splendens sob efeito de álcool. Os dois indivíduos utilizados no experimento foram submetidos a um ambiente contaminado com o inibidor neurológico e após 20 minutos de exposição, foi feita a observação dos efeitos deste. Os resultados mostraram que o álcool possui efeito direto no sistema motor dos peixes, deixando os mais lentos quando em situação adversa ao seu ambiente. O estudo de observação dos peixes Betta em aquário proporcionam a oportunidade de observar estes comportamentos alterados sob a exposição de etanol em seu ambiente natural e em decorrência deste realizar avaliações de pesquisa académica importantes.

Palavras-chave: Psicobiologia. Educação ambiental. Neurologia.

ABSTRACT

Several are the chemical elements that can influence the neural performance of a living being (neurotoxic), such as ethanol, mercury, lead, among others, which contribute to the change of its natural behavior within the environment. The understanding of the interferences that occur in the occasions in which an organism is under the influence of these chemical agents, favor in the understanding of the actions that these organisms come to present. The present study had as objective the behavioral observation of Betta Splendens fish under the effect of alcohol. The two individuals used in the experiment were submitted to an environment contaminated with the neurological inhibitor and after 20 minutes of exposure, the effects of the latter were observed. The results showed that alcohol has a direct effect on the motor fish system, leaving the slowest when in an adverse situation to its environment. The observation study of Betta fish in aquarium provides the opportunity to observe these altered behaviors under the exposure of ethanol in its natural environment and as a result of conducting important academic research evaluations.

Keywords : Psychobiology. Environmental education. Neurology.

  1. INTRODUÇÃO

    1. Comportamento Animal

A vida animal é definida por seu comportamento, e assim com a forma que o mesmo interage com seu hábitat natural, sendo definido do momento em que nasce, de como interage com sua prole ou com o grupo que convivem, alguns vivem solitários e apenas buscam parceiros para reprodução, e estas interações seguem até o momento de senescência. Tais características são partes do comportamento e etologia dos indivíduos das diferentes espécies, sendo algumas complexas até mais que as relações dos seres humanos. Dentro do contexto de comportamento animal, Snowdon, 1999 afirmou que:

O estudo do Comportamento Animal é uma ponte entre os aspectos moleculares e fisiológicos da biologia e da ecologia. O comportamento é a ligação entre organismos e o ambiente, e entre o sistema nervoso e o ecossistema. O comportamento é uma das propriedades mais importantes da vida animal. O comportamento tem um papel fundamental nas adaptações das funções biológicas. O comportamento é como nós definimos nossas próprias vidas. O comportamento representa a parte de um organismo através da qual ele interage com o ambiente. O comportamento é parte de um organismo tanto quanto sua pele, suas asas etc. A beleza de um animal inclui seus atributos comportamentais.

Desta forma podemos concluir que o estudo comportamental (etologia) modifica a ideia de animal, onde o comportamento é simultaneamente organizado e organizador, diferentemente da ideia em que o comportamento animal parecia regido por ações automáticas ou reflexos, ou até mesmo “instinto” buscando a sobrevivência e reprodução do indivíduo. Os animais se comunicam e se comportam de formas específicas para cada situação. Um comportamento é originado a partir de uma determinada situação, na qual é transportado para fora dessa situação para exprimir uma mensagem simbólica (Morin, 1973). Da perspectiva etológica, o comportamento, os órgãos e estruturas corporais são produtos da evolução através de seleção natural ao qual os seres vivos vêm sendo submetidos durante os séculos até os dias atuais.

A etologia elenca que o sistema de comunicações une os indivíduos numa relação social, na qual era invisível, e a o que parecia um ajuntamento sem forma revela sua ordem organizada, como por exemplo o formigueiro, ou o galinheiro. A sociedade é uma das formas fundamentais da auto-organização dos sistemas vivos, ressaltando que de forma muito desigual, porém, variada. De acordo com Moscovici, (1972), a sociedade é “uma variante e um desenvolvimento prodigioso do fenômeno social natural”, e assim, a sociologia, perde sua insularidade e passa a ser o coroamento da sociologia geral. Sendo assim, as consequências da etologia e da sociologia animal são igualmente mortais para o paradigma fechado do antropologismo (Morin, 1973). Chegando assim, a conclusão de que as diversas formas de comunicação e simbologismo, não são exclusivos humanos, porém, tem suas raízes muito remotas na evolução das espécies.

Para a compreensão do comportamento humano são utilizadas diversas metodologias desenvolvidas pela etologia. E muitas vezes a utilização de resultados obtidos em estudos com animais para a complementação e aprofundamento de conhecimentos sobre o ser humano. Entrando aí na conclusão de que a etologia não é uma teoria, mas sim, uma abordagem no estudo do comportamento no qual é caracterizado por um enfoque ou perspectiva e que como qualquer área de trabalho científico, utiliza modelos e conceitos teóricos para a interpretação dos fenômenos ocorridos (Carvalho, 1998).

Segundo o autor acima, a perspectiva etológica pode ser resumida em um pressuposto, que orienta as perguntas do etólogo e suas opções metodológicas, sendo o comportamento produto e instrumento do processo de evolução através da seleção natural. Sendo auto evidente em alguns casos que a organização corporal do animal não poderia ser funcional, e assim, não poderia ser testada e moldada pela evolução, se não estivesse acompanhada por uma organização comportamental adequada, concluindo que a evolução não poderia, portanto, produzir estruturas físicas se não pudesse usar e moldar também os comportamentos que as tornam funcionais.

    1. Inibidores Neurológicos

Os antigos povos já ingeriam álcool, mostrando que a ligação das bebidas alcoólicas e a sociedade é bem antiga (Viala-Artigues & Mechetti, 2003).

A bebida derivada da fermentação de açucares, álcool (CH3CH2OH, conhecida como etanol) é encontrado em concentrações variadas, podendo ir de 4 a 75%, dependendo da bebida (Chacon, 2013).

Este é uma substancia psicotrópica, atuando no sistema nervoso central (SNC), provocando várias alterações a nível fisiológica e comportamental, podendo ser estes causadores de efeitos neurológicos e psicológicos em curto e em longo prazo (Carlini, 2001).

Vários estudos apontam os efeitos negativos que o álcool proporciona nos neurônios, tanto na liberação dos neurotransmissores (dopamina, serotonina, noradrenalina e peptídeos opioides (Le et al., 2005).

Além de inibidor neurológico, pois atua diretamente no sistema nervoso central, o álcool é considerado uma droga psicotrópica. Ele ocasiona mudança no comportamento e pode causar dependência ao consumidor. O álcool possui diversos efeitos, o qual se apresenta em duas fases: uma estimulante e uma depressora (Carlini et al, 2001).

Durante os primeiros momentos após a ingestão do álcool, temos o efeito estimulante, o consumidor fica eufórico, desinibido e com maior facilidade de falar do que o normal. Com o decorrer do tempo, é percebido o efeito depressor, o indivíduo começa a perder a coordenação motora, descontrole e sono. Quando o consumo é exagerado, esses efeitos são aumentados e podem levar o indivíduo ao coma (Carlini et al., 2001). Ainda de acordo com os mesmos autores, tais efeitos podem variar conforme a estrutura física do indivíduo, quanto maior o volume corpóreo, maior a resistência aos efeitos.

Diante de tais informações, podemos destacar como sendo fundamental o estudo do comportamento animal e que o mesmo está ligado às demais áreas da ciência, o qual deve ser aprofundado para buscar respostas quanto aos processos evolutivos das espécies e para o entendimento de tais processos, de forma a auxiliar no campo sociológico e etológico seja humano ou das demais espécies. Pode-se afirmar também a importância do desenvolvimento de estudos relacionados aos efeitos do álcool, pois o mesmo é uma droga licita e é extremamente comercializada em todo o mundo, podendo se tornar um problema para a sociedade.

  1. OBJETIVOS

Essa pesquisa teve como objetivo mostrar o comportamento de peixes da espécie Betta sob efeito de álcool inserido em seu ambiente e a partir disso observar seu comportamento agonístico, de forma que tais eventos possam ser comparados e correlacionados com outros trabalhos voltados para comportamentos humanos e animais diante de tal inibidor neurológico.

  1. MATERIAIS E MÉTODOS

O trabalho foi realizado na Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Campus I, durante aula no Programa de Pós-graduação de Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA.

Durante o experimento, foram utilizados dois peixes machos da espécie ornamental Betta splends, sendo um de cor vermelha e outro de cor azul, obtidos em mercado local, trazidos em sacos plásticos transparentes. Os indivíduos foram colocados separadamente em dois recipientes de vidro transparente de 500 ml (mililitros) com água potável. Os dois peixes permaneceram em período de aclimatação por 48 horas (dois dias) no ambiente em que foi realizado o experimento. Foram alimentados diariamente com ração peletizada.

Os animais foram submetidos ao composto químico apenas no dia da realização do experimento, sendo este a inserção de 5 ml de solução de álcool etílico hidratado em cada ambiente para assim após 20 minutos observar as reações.

  1. RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com Almeida (2011), o álcool é uma espécie de suporte, um facilitador das relações e interações sociais, estando muitas vezes associado ao status social. Sendo assim, estudos científicos têm demonstrado o quão importante é o conhecimento do padrão de uso do álcool que, associado ao volume alcoólico total consumido, tem mostrado um grande vetor de problemas no campo da saúde, bem como em outros setores da sociedade (Rehm et al., 2006).

Para a observações desses padrões sociais, os peixes foram colocados em recipientes de vidro, e os mesmos conseguiam ter contato visual, por isso foi colocada uma barreira visual entre os dois aquários. O primeiro passo foi colocar comida para eles e tirar o papelão, podendo observar que, com a retirada, os dois pararam de comer e tiveram a reação de se arquear em posição de ataque. Em seguida o papelão foi colocado novamente e os mesmos voltaram a se concentrar na comida e em seguida relaxaram.

A segunda parte do experimento consistiu em colocar 5 ml de solução de álcool etílico hidratado em cada ambiente e esperar 20 minutos para observar a reação da solução em cada peixe. Após esse tempo observou-se que os peixes estavam menos ativos e quando disponibilizado alimento, eles comeram em menor quantidade, e subsequentemente quando foi retirado o papelão, se observou que eles tiveram a mesma reação de ataque que ocorreu anteriormente, porém estavam muito mais lentos. Observou-se também que o peixe vermelho estava mais retraído do que o azul, comportamento antes não observado.

Segundo Chacon (2013) altas doses de álcool interferem na capacidade cognitiva de aprendizado de peixes, sendo esta uma droga depressora do SNC (Charness, 1989), também responsáveis pela minimização dos reflexos e cognição (Koike & Sobue, 2006) reduzindo ainda a atividade elétrica das células neurológicas (Little, 1991) e reduzindo a atividade do comportamento social (Gerlai et al., 2009). Interfere na percepção que o peixe quanto ao ambiente e a presença de predadores (Gerlai et al., 2000, 2009).

  1. CONCLUSÕES

Os resultados da pesquisa intitulada: ESTUDO DO COMPORTAMENTO DE PEIXES BETTA SOB INFLUENCIA DE INIBIDORES NEUROLOGICOS, permitiram chegar as seguintes conclusões:

  1. Enquanto os indivíduos estavam sem visão um do outro, os mesmos não apresentaram comportamento agressivo.

  2. Quando expostos um ao outro, mesmo sem efeito do álcool, tal espécie demonstra comportamento agressivo, determinado pela territorialidade comum dos betta.

  3. Os indivíduos quando expostos ao álcool etílico apresentaram comportamento de relaxamento, os mesmo se mostraram mais calmos, ainda tendo forte comportamento de competição quando tirada a barreira visual, apresentaram este, de forma mais branda.

  4. O peixe vermelho apresentou comportamento mais calmo, mais rapidamente comparado ao peixe azul, fator este, que está relacionado ao seu tamanho corporal.

  1. REFERENCIAS

CARLINI, E. A.; NAPPO, S. A.; GALDURÓZ, J. C. F.; NOTO, A. R. Drogas psicotrópicas: o que são e como agem. Revista Imesc, 3, 9-35. 2001.

CHACON, D. M. M. Álcool e comportamento: efeitos na aprendizagem e memória. Dissertação (Mestrado em Psicobiologia) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal/RN. 2013.

CHARNESS, M.E. Ethanol and opioid receptor signalling. Experientia 45:418-428, 1989.

GERLAI R.; LAHAV M.; GUO S.; ROSENTHAL A. Drinks like a fish: zebra fish (Danio rerio) as a behavior genetic model to study alcohol effects. Pharmacol Biochem Behav. 67(4): 773–782. 2000.

GERLAI R. Zebrafish antipredatory responses: A future for translational research? Behav Brain Res. ARTICLE IN PRESS. 2009.

KOIKE H. & SOBUE G. Alcoholic neuropathy. Curr Opin Neurol. 19(5):481-6. 2006.

LE, A. D.; HARDING, S.; JUZYTSCH, W.; FUNK, D.; SHAHAM, Y. Role of alpha-2 adernoceptors in stress-induced reinstatement of alcohol seeking and alcohol self-administration in rats. Psychopharmacology, [S.1.], n. 179, p. 366-73, 2005.

LITTLE, H. J. Mechanisms that may underlie the behavioral effect of etanol. ProgNeurobiol 36: 171-194. 1991.

MORIN, E. O paradigma perdido: a natureza humana. 1973.

MOSCOVICI, S. Society and theory in social psychology. 1972.

SNOWDON, C. T. O significado da pesquisa em comportamento animal. Estudos de Psicologia (Natal), v. 4, n. 2, p. 365-373, 1999.

VIALA-ARTIGUES, J.; MECHETTI, C. Histoire de l´alcool archéologie partie 1. Viala-Artigues, 2003. Disponível em: http://wwwalcoologie.org/documentation/article.php3?id_article=118 Acesso em: jun. 2017.

Ilustrações: Silvana Santos